quinta-feira, 27 de junho de 2013

Julian Assenge pergunta: “quem traiu os EUA?”

Julian Assenge pergunta: “quem traiu os EUA ?”
Edward Snowden e Bradley Mannig, que revelaram mega-espionagem sobre cidadãos? Ou Obama, que prometeu fazer governo mais transparente da História
Faz agora um ano que entrei nessa embaixada, buscando refúgio porque estava sendo perseguido. Resultado dessa decisão, tenho conseguido trabalhar em relativa segurança, protegido contra os agentes dos EUA que investigam uma acusação de espionagem. Mas hoje, está começando o suplício de Edward Snowden.
Dois perigosos processos foram postos em movimento na última década, com consequências fatais para a democracia. O sigilo dos governos expandiu-se numa escala aterrorizante. E, simultaneamente, a privacidade dos seres humanos foi erradicada, em segredo. Há poucas semanas, Edward Snowden revelou ao mundo a existência de um programa secreto – que envolve o governo Obama, a comunidade de inteligência e gigantescas empresas que vendem serviços de internet – para espionar todos, em todo o mundo. Resposta automática, como mecanismo de um relógio: Edward Snowden foi acusado de crime de espionagem pelo governo Obama.
O governo dos EUA espiona todos e cada um de nós… Mas é Edward Snowden quem é acusado de espionagem, porque nos alertou. Estamos chegando ao ponto em a honra internacional por serviços prestados à humanidade não recai sobre quem tem um prêmio Nobel da Paz. Recai, isso sim, sobre quem seja acusado de espionagem pelo Departamento de Justiça dos EUA.
Edward Snowden é o oitavo vazador de informação secreta a ser acusado de espionagem no governo do presidente Obama. Na segunda-feira, o julgamento-show de Bradley Manning entrará na quarta semana. Depois de uma lista enorme de crimes e perversidades cometidas contra ele, o governo dos EUA tenta condená-lo por “ajudar o inimigo”.
A palavra “traidor” foi muito usada nos últimos dias. Mas quem é realmente o traidor, aqui? Quem prometeu “esperança” e “mudança” a uma geração, para imediatamente trair as próprias promessas, dando à população só miséria crescente e estagnação? Quem jurou defender a Constituição dos EUA, para imediatamente se pôr a alimentar a besta-fera de uma lei secreta, que vai devorando viva a Constituição dos EUA, de dentro para fora?
Que fim levou a promessa de fazer o governo mais transparente da história, mas que não faz outra coisa que perseguir um vazador depois do outro, nessa sequência macabra, esmagando-os sob o peso de acusações de espionagem? Quem assumiu, com mão de ferro, no Executivo, os poderes de acusador, juiz e carrasco, tentando fazer-se de dono do planeta, sobre o qual vai impondo todos esses poderes ilegítimos? Quem se arroga o poder de espionar o planeta inteiro – cada um de nós – e, quando é apanhado com as mãos sujas de sangue, explica que “teremos de escolher”? Quem é esse homem? Não pode haver dúvida alguma sobre quem declaramos “traidor”.
Edward Snowden está conosco. É um de nós. Bradley Manning é um de nós. São jovens interessados em tecnologia, inteligentes: são a própria geração que Barack Obama atraiçoou, traiu. São da geração que cresceu na Internet, modelada pela Internet.
O governo dos EUA sempre carecerá de analistas de inteligência, de administradores de sistemas, e terá de buscá-los nessa geração e nas gerações posteriores. Um dia, essa geração comandará a Agência de Segurança Nacional, a CIA e o FBI. Não é fenômeno passageiro. É absolutamente inevitável. Ao tentar esmagar esses jovens vazadores, acusando-os de espionagem, o governo dos EUA ataca mortalmente uma geração inteira. E essa batalha, os EUA perderão.
Acusar, prender, matar, não é o modo certo de consertar coisa alguma. O único modo de consertar o que deva ser consertado é: mudem suas políticas! Parem de espionar o mundo. Ponham fim às leis secretas. Ponham fim à prisão por tempo indefinido, sem processo e sem acusação. Parem de matar gente. Parem de assassinar. Parem de invadir países e de mandar milhares de jovens norte-americanos para matar e ser mortos. Parem de ocupar terras de outros. Ponham fim às guerras clandestinas. Parem de destruir os jovens: Edward Snowden, Barrett Brown, Jeremy Hammond, Aaron Swartz, Gottfrid Svartholm, Jacob Appelbaum e Bradley Manning.
A acusação formalizada contra Edward Snowden visa a intimidar qualquer país que esteja pensando em ajudá-lo a defender seus direitos. Não se pode admitir que essa monstruosidade se consume.
Todos temos de intensificar os esforços para encontrar país que dê asilo a Edward Snowden. Que país valoroso o defenderá, reconhecendo o inestimável serviço que prestou à humanidade? Diga ao seu governo, onde você estiver, que se apresente. 
Apresente-se você mesmo. Defenda Snowden!
Tradução Vila Vudu

Na periferia, as balas são de verdade – por Wedencley Alves

Na periferia, as balas são de verdade
Chacina na Maré relembra mortos esquecidos pelas Comissões da Verdade. É hora de saber quem realmente merece ser ouvido
Desde segunda-feira, a polícia vem demonstrando sua costumeira violência no complexo da Maré. Resultado: sete mortos (até agora, às 11h do dia 25/06). Mas sempre foi assim. Há algum tempo está pronta para ser escrita a genealogia da “violência urbana estimulada” no Brasil.
Desde seu alvorecer, a ditadura (militar e civil, é bom que se frise) e seus aliados foram complacentes e até fomentaram os grupos de extermínio, cujo modelo é a Scuderie Lecqoc, famosa e aplaudida até os anos 70. Seguiram-se outros “esquadrões da morte” e “polícias mineiras”, para controle dos que incomodavam o desenvolvimento conservador e concentrador do regime de exceção.
Vejam nas figuras abaixo: a caveira “oficial” do Bope e a “extra-oficial” da Rota fazem parte de uma longa memória discursiva brasileira.
Os perseguidos políticos não foram as maiores vítimas (quantitativamente). Aliás, promovendo expulsão do campo e concentração urbana, o regime literalmente encurralou pessoas nas favelas e periferias, sob a ponta do fuzil. Não vejo comissões da verdade para este fato: a origem da nossa cultura urbana de violência extrema.
O mesmo aconteceu nos anos 80, quando a Rota em São Paulo fez a fama. Nos anos 90, o ex-governador do Rio, Marcelo Alencar, por exemplo, condecorou o morticínio, na chamada “Gratificação Faroeste”. Ao menos 200 mortos. Em entrevista com um coronel da PM, ouvi dele: “Colegas meus escolhem uns pretos, atiram, registram como resistência e ganham medalhas”.
Esse coronel estava enojado e resolvera denunciar na imprensa alternativa, justamente porque ninguém queria publicar na imprensa tradicional. Mídia e PM aliadas. Mas também bons jornalistas – como Caco Barcellos, que denunciara 3 mil mortos em SP, sem passagem pela polícia, e Carlos Nobre, com sua denúncia sobre mortes no Rio. E bons policiais – como os coronéis Ivan Bastos e Carlos Magno Nazareth Cerqueira, este assassinado, por não compactuar – furaram o bloqueio e trouxeram luzes para o que estava acontecendo.
Ainda nos anos 90, tivemos a demonstração lúgubre da insensatez do Carandiru – ação que até hoje muitos defendem. Mas o pior estaria por vir em 2006. Em maio, depois da balbúrdia do PCC, vingativa, a polícia de SP sai às ruas para caçar bodes expiatórios: 400 mortos, em quatro dias, sem qualquer ligação com o crime, muitos deles menores de idade.
No Brasil, historicamente não é a guerra a continuidade da política por outros meios, mas a opressão, o racismo e o preconceito de classe e região, a continuidade da escravidão por outras formas. Os chicotes de ontem são os fuzis de hoje. Bem piores, como se pode ver.
Tudo com o beneplácito de quem hoje se diz espantado. Como se os 60 mil mortos em uma década tivessem ocorrido em outro país.
Em parte, o aprofundamento da violência, que se acentuou nos anos 90, se deu graças ao que já foi teorizado pela criminologia crítica como o mais grave efeito social do neoliberalismo: o surgimento do Estado centauro, liberal apenas para quem pode, o governo penal da miséria. Este é um debate que surge em países desenvolvidos. Ora, não precisamos ser neoliberais para sermos tão trogloditas. Somos vanguarda. Antecipamos a tendência.
A força política da classe média (vide grande mobilização recente contra as balas de borracha) nunca foi usada contra o extenso currículo da política de eliminação sumária de vidas que importunam. Podemos dizer: seguramos as armas, para os policiais apertarem os gatilhos. Nenhum governo, principalmente os estaduais, responsáveis diretos pela violência, se sustentaria, se tais mortes causassem alguma comoção.
Um amplo debate está para ser estimulado em nível nacional, embora o responsável direto por estas políticas de violência sejam os estados. Não nos deixemos enganar. Os grupos de estudo não bastam. As ações pontuais do Ministério da Justiça são interessantes, mas não bastam. O aprofundamento e o estímulo à pesquisa na área, que aumentou em muito, também não bastam.
Por outro lado, é a primeira vez em décadas e décadas (talvez desde Getúlio), que a população mais pobre e miserável tem alguém que olhe por ela (no seio de uma politica de Estado). Isso faz dez anos. Daí a necessidade de distinguir as vozes que se dizem indignadas.
Os mesmos que ontem se enojavam em pagar melhor empregadas domésticas, que acham que programas sociais são desperdício de dinheiro, que acreditam que mais diversidade nas universidades é “perda de qualidade”, estão assanhados em capitalizar as balas de borracha. E, quiçá, as balas de fuzil.
Só há um percurso que devemos respeitar: quem chorou pelos mortos de antes, quem se importunou com o preconceito, quem defende a continuidade dos programas sociais, e quem nunca desdenhou de pessoas, qualquer que seja a origem, a cor da pele, e o nível de renda.
Todo o resto deve ser ignorado: indignados de última hora, hipócritas em busca de luzes, oportunistas cujos interesses são basicamente capitalizar a desgraça, para, ao final, mantê-la como está ou ainda, quem sabe, devolvê-la aos níveis anteriores.
Esta é a hora de saber quem você realmente pode ouvir. E quem merece, no máximo, um sorriso irônico.

terça-feira, 25 de junho de 2013

Violência policial no Brasil: breve resumo - por Latuff

Fonte: http://latuffcartoons.wordpress.com/

Esperança: Cães sobreviventes de Santa Cruz do Arari (PA) se recuperam - Por Fátima Chuecco

Esperança: Cães sobreviventes de Santa Cruz do Arari (PA) se recuperam.
O final de semana foi de festa para mais de 80 sobreviventes da chacina de Santa Cruz do Arari, em Marajó (PA).  Os cães passaram 15 dias sem comer numa ilha afastada e muito pobre onde foram deixados para morrer.  Alguns ainda tinham patas e focinho amarrados com arame farpado quando foram encontrados pela equipe de resgate. A viagem de volta ao continente foi difícil. Horas de barco e depois mais algumas de caminhão até chegar ao abrigo da protetora Raquel Viana, em Outeiro, onde foram imediatamente vacinados pelo CCZ de Belém. No sábado, dia 22, os cães tomaram seu primeiro banho com a ajuda de veterinários e voluntários da região. “Alguns pareciam sorrir com nossos cuidados. O abrigo já estava lotado com outros 300 animais e não havia baia para eles. No entanto, o  interessante é que não tivemos problemas com brigas mesmo mantendo-os soltos num único saguão. Desde que chegaram dormiram uns sobre os outros em paz, como que compartilhando de um mesmo sentimento de gratidão”, conta Raquel.
Raquel Viana com uma cachorrinha sobrevivente, a direita. (Foto: Divulgação)
Mas esse não foi o único motivo de alegria de quem se empenhou no salvamento dos cães.  Teve até bolo para comemorar o afastamento por 90 dias, por medida cautelar, do prefeito de Santa Cruz do Arari, Marcelo Pamplona, acusado de mandar exterminar os animais pagando de R$ 5 a R$ 10 a quem os capturasse pelas ruas. As cenas de caça chocaram o país.  Por conta do valor oferecido, alguns animais que já tinham lar também foram sequestrados de suas casas. Alguns deles foram atirados no Rio e outros abandonados na Ilha do Francês, onde vive uma população ribeirinha extremamente carente.  Os sobreviventes já estavam pele e osso quando a ajuda finalmente chegou. Uma cachorrinha não resistiu, mas muitos casos demonstraram a vontade de viver desses cães que tanto sofreram.
 “Um deles é bem velhinho. Já está cego, surdo e não tem nenhum dente, mas mesmo assim sobreviveu”, conta Raquel. Uma cachorrinha e seus cinco filhotes também foram resgatados, além de outra cadelinha que deu à luz semana passada. Assim, as “boquinhas” a serem alimentadas foram se multiplicando e a situação ficou bastante complicada. “Precisamos de muita coisa, desde produtos de limpeza e material de construção, até xampus e anti-pulgas para cães. Temos que construir baias e acomodar melhor os animais. Por enquanto só estamos separando machos de fêmeas. As mamães e seus filhotes estão numa casa vizinha ao abrigo”, relata a protetora que começou o trabalho de tirar animais das ruas há seis anos. “Comecei com gatos que estavam sendo ameaçados de morte e depois foram chegando, aos poucos, os cães. Conto com a ajuda de doações e veterinários voluntários”.
Para ajudar o abrigo que deverá, daqui para a frente, manter os sobreviventes do massacre de Arari até que se recuperem e possam ser colocados para adoção, as contas são:
Itaú
Agência 1573
Conta Corrente 37509-2
Allan Maues Menezes
CPF 015.746.242.02
Banco do Brasil
Agência 1882-1
Conta Poupança 6164078-6
Laydes Martins
As contas divulgadas na matéria da semana passada, que tratou do resgate dos cães, também são válidas e o dinheiro, segundo o resgatante Correa do Mel, está sendo utilizado nos gastos com a operação e manutenção dos cães que continuam sendo resgatados. Outros 20 foram retirados da Ilha do Francês e restam mais alguns. Um vídeo foi feito reunindo diversas fases e fotos do resgate dos 82 cães entre os dias 11 e 16 de junho.

Uma charge para a Frente Integralista Brasileira @integralismo_ - por Latuff

Fonte: http://latuffcartoons.wordpress.com/

sábado, 22 de junho de 2013

Técnicas para a fabricação de um novo engodo, quando o antigo pifa - por Silvia Biana

Técnicas para a fabricação de um novo engogo, quando o antigo pifa
Um bom começo para a reflexão que deve se seguir ao dia de ontem (e acompanhar aqueles que virão): observar atentamente a reconstrução do discurso da grande mídia. Nesse momento, é possível assistir, com nitidez cristalina e ao vivo, cada etapa da linha de produção de uma nova ideologia. E já que a mercadoria ainda não está pronta, é fundamental tomarmos nota de seus componentes para não corrermos o risco de fornecer matéria-prima.
As anotações que se seguem são relativas à audiência da cobertura do Globo News de ontem e da quinta-feira passada; do Jornal da Record e do Jornal do SBT de ontem; e do Cidade Alerta de quinta (sim, eu ainda tenho estômago).
O elemento central do discurso que ora se monta é a minimização dos fins em relação aos meios. Ao longo das duas horas que assisti ao GN, em momento algum foi discutida a questão do aumento das tarifas. O fundamental são os meios: o manifesto foi violento ou não, houve, ou não, negociação entre as partes, quais os trajetos e pontos ocupados, quantas pessoas aderiram etc. Essa técnica tem um foco político autoevidente: ignorar o objetivo do movimento; e outro opaco: apontar para a manifestação como um fim em si.
Não os subestimemos, a manobra é esperta, pois reflete uma forma de fazer política que tem se tornado usual em SP: ocupar espaços públicos por ocupar, “sem bandeiras”, “por amor”, “porque a cidade é nossa” etc. Desse modo, a manifestação se assemelha a uma forma de terapia: faz bem, é gostoso, alivia frustrações etc. Ela é democrática, logo, vale por si mesma…
Mas não mencionar o verdadeiro mérito da questão é apenas uma das técnicas de anulação da causa e, nesse momento, seria frágil, não fosse a técnica complementar de abstração dos fins: “não são só 20 centavos, não é só o transporte, não é só a copa…”. As negativas crescem até que o protesto pareça um movimento por nada.
Por outro lado, é importante construir uma falsa positivação, também ela vaga. Uma matéria significativa foi feita na GN nesse sentido (e reprisada duas vezes): os repórteres entrevistaram pessoas aleatórias na passeata, cada qual com uma demanda diferente e nenhuma delas referente à finalidade concreta do ato: “saúde”, “educação”, “segurança” etc.
Essa tipificação clássica e simplificadora é útil, pois, por um lado, compartimenta a política em módulos passíveis de gestão, excluindo a estrutura que as amarra; por outro, recusa soluções imediatas – por exemplo, a exigência é por educação, e não pelo aumento de 17% para os professores da rede municipal. Nesse âmbito médio, tanto a crítica sistêmica quanto a exigência do movimento se esfumam.
Nesse tópico (abstração dos fins), cabe um comentário: assisti ontem aos dois blocos finais do Roda Viva, com os líderes do Movimento Passe Livre, sua postura foi um belo antídoto contra o que estou descrevendo: eles afirmaram que as passeatas são sim pela redução dos R$ 0,20. A partir dessa “migalha” foi possível a construção de inúmeras contradições e a recomposição de questões estruturais: dos 20 centavos ao transporte, à estrutura urbana, ao sentido do público, chegando à matriz que, hoje, o organiza: o mercado.
Então vamos à terceira técnica no que tange aos fins. Como eu afirmei antes, a classificação da política por nichos de demanda é útil por excluir a lógica estrutural subjacente. Mas a mídia está fabricando uma amarração artificial: a “corrupção”. As palavras finais da âncora de um dos jornais do GN foram mais ou menos essas: “Encerramos, então, nossa cobertura desse dia de manifestações contra a corrupção, o superfaturamento e tudo o que está errado no país”.
A corrupção, que também é uma abstração, aparece como fonte original de todas as mazelas e móbile principal das expressões de descontentamento. Trata-se da falsa bandeira mais útil para a grande mídia por uma razão ideológica: ninguém em sã consciência seria favorável à corrupção, trata-se de uma bandeira imune ao conflito (que é o princípio da política). Mas é útil também por ser moeda valiosa nas negociatas entre as grandes empresas de mídia e os partidos e governos.
Por fim, a corrupção é um produto ideológico pronto. Ela aparece como um problema moral, portanto pontual, que toca apenas o poder público, e não tem relação alguma com o assim chamado “livre mercado”.
Também nesse ponto, o Movimento Passe Livre e sua reivindicação precisa, são uma criação política extraordinária. É impossível discutir o aumento das tarifas sem nos darmos conta da origem sistêmica da corrupção: a relação, ao mesmo tempo espúria e estrutural, entre as empresas privadas (nesse caso, de transporte) e o poder público.
Dito isso, cabe pensar o gigantismo dos meios nos discursos midiáticos. O ponto central é, evidentemente, o uso ou não da violência. Quanto a isso, foi possível acompanharmos quatro momentos discursivos claramente delimitados:
1. “Os manifestantes são vândalos, bárbaros, imbecis e a polícia cumpriu muito bem o seu papel” (Marcante nesse momento foi aquela coisa proferida por Arnaldo Jabor, que dispensa adjetivações).
2. “Há uma violência equivalente de ambos os lados, a polícia está despreparada para lidar com esses malditos vândalos”.
3. A mudança no segundo discurso ocorreu ao vivo, durante a transmissão do ato de quinta-feira, em São Paulo: a tarja explicativa das imagens (não sei o nome técnico dessas tiras de engodo destilado) no GN afirmava: “briga e confusão no protesto…”. Após a divulgação da notícia de que alguns repórteres haviam sido feridos, a frase mudou: “confronto no protesto…”. Já a fala do âncora do Cidade Alerta se tornou esquizoide, oscilando entre posições irreconciliáveis contra e a favor da ação da polícia, do Estado, dos manifestantes, da violência.
4. O quarto momento é (está sendo) a reorganização desse ponto de ruptura. Os telejornais já não podem manter o primeiro ou o segundo discursos, não apenas pela aprovação popular às manifestações, mas porque o reacionarismo anti-manifestação, que se alastrou nos últimos anos, apareceu em seu paradoxo de modo irrecusável: não é possível defender a democracia e ser contra o conflito.
Visto que, de uns dias para cá, ficou inviável associar qualquer forma de dissenso à violência (oh! Meu direito de ir e vir…), a solução, por ora, é negar o conflito por outra via: o problema não são as manifestações, mas o momento em que elas “descambam” graças a alguns “elementos extremistas desgarrados”.
Esses, que passaram do total de manifestantes, no primeiro momento, a parte do movimento, no segundo, tornaram-se uma exceção que deve ser prontamente eliminada. Ontem, esse argumento apareceu de modo sutil no GN através de uma interminável e repetitiva entrevista a um repórter que acompanhou os conflitos no Rio – sua visão “objetiva” dispensou o âncora de articular a mentira de forma direta.
Já no Jornal SBT, bem menos sofisticado, a balela era escancarada, algo como: “a imensa maioria é pacifista e apenas quer se manifestar, os demais são aproveitadores que só querem fazer baderna; para esses, a força policial ainda é indispensável e deve ser enérgica”. Mais uma vez, os fins somem: uns estão lá para uma linda terapia de massa, outros para fazer baderna.
Essa dualização ficou plasmada na transmissão ao vivo da Record. Intencionalmente ou levados por algum tipo de automatismo inconsciente, os editores dividiram a tela ao meio: de um lado, imagens dos manifestantes na avenida Paulista, em um ponto no qual já não caminhavam, pois haviam chegado a seu destino; do outro, imagens dos confrontos no Rio de Janeiro. Naquela metade, a imagem estava clara e brilhante; na outra, a iluminação vinha das fogueiras, tudo em volta era escuridão. A narração confirmava a edição (lembremo-nos: edição, pois as imagens em São Paulo eram ao vivo e as do Rio, corriam em loop): o bem e o mal, o aceitável e o inaceitável.
Através dessa simplificação é possível a construção, não apenas de um novo discurso, mas também de uma nova pauta: o importante é a Paz!!! Os meios, então, se convertem, ainda uma vez, em objetivo e o reacionarismo se segura como pode, rearticulando os acontecimentos sob a chave-mestra da ideologia contemporânea: a segurança.
Outra técnica para lá de esperta, pois a mídia não apenas desloca o conflito verdadeiro, como dá a pinta de ter matizado seu segundo momento discursivo (e as “desculpas” do Seu Jabor se encaixam aqui); ou seja, a noção de que há uma equivalência de forças e razões entre manifestantes e o aparato repressivo dos estados, se mantém: os policiais ainda “apenas reagem”.
Há ainda muito a se refletir se partirmos desse material asqueroso que subitamente se tornou rico (para quem quer pensar, é claro!): o retorno de uma patriotada descabida (nada como uma ideologia basilar como a Nação para nublar o conflito); os descontentamentos específicos que ficaram de escanteio, como os reais motivos das manifestações contra a copa (o problema não é a corrupção, mas o fato de que os grandes eventos são, em si mesmos, a subtração de tudo o que ainda possa haver de público); o ponto de inflexão que foi a brutalização dos jornalistas na quinta-feira passada – e a ideia subjacente de que há os espancáveis e os não espancáveis; o uso descarado dos embates em torno das bandeiras partidárias nas manifestações; a fácil apropriação do slogan “acorda Brasil”, que poderia ter sido formulado pelo publicitário da Johnnie Walker, e por aí vai.
Mas muito ainda pode mudar tendo em vista a despolitização, pois se há algo ilimitado é a cara-de pau de nossa mídia monopolista, bem como o poder de urgência das ruas.
Eu acabei de escutar, no boteco aqui em frente, o Marcelo Rezende afirmando: “eu também estou nas ruas com eles”. Para que não esteja, e saiba que não está, vale a pena escutar quem importa. O atendente do boteco, um motoboy e um morador de rua, que presta serviços esporádicos para o comércio local, conversavam: “Eles estão certos, quem é pobre que sabe o que é pagar ônibus”. “Mas tem o vandalismo…”. “Eu acho que só não tem que quebrar comércio pequeno, se quebrar o Congresso vou achar ótimo”. “Não é vandalismo não, que vandalismo é quando não tem porquê”.
* Publicado originalmente no site Prática Radical,
em 19 de junho de 2013.
Silvia Viana é professora de sociologia da FGV-SP. Graduada em ciências sociais pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (FFLCH-USP), possui mestrado e doutorado pela mesma instituição.

O povo nos acordou? A perplexidade da esquerda frente às revoltas - Por Caio Martins Ferreira

O povo nos acordou? A perplexidade da esquerda frente às revoltas
A situação nos coloca a urgência de reformular nossa postura na luta de rua e reafirma a centralidade do trabalho de base; assumem crucial importância os movimentos sociais que têm enraizamento na periferia. Por Caio Martins Ferreira
A força e as proporções assumidas pela luta contra o aumento das tarifas em São Paulo e outras capitais surpreenderam quase toda esquerda organizada. Um mês antes, dificilmente se previa que uma mobilização de rua fosse alterar de tal modo a conjuntura e impor uma derrota ao governo estadual e à Prefeitura, logo às vésperas da Copa das Confederações. Nossa dificuldade de compreender e responder a esse processo pode nos ajudar a explicar o preocupante avanço conservador no interior da mobilização.
10 anos de revoltas
O que aconteceu em São Paulo nas últimas semanas não começou agora, nem é novidade na maior parte do Brasil. Nos últimos 10 anos, várias capitais vêm sendo sacudidas por revoltas contra aumentos na tarifa, que assumem formas semelhantes: tomada e travamento de ruas, protagonismo de jovens (mas não exatamente estudantes universitários de esquerda), ausência – e aversão – da lógica da representatividade, e uma dose de espontaneidade e rebeldia. Descolados de estruturas, esses movimentos encontram no próprio espaço da cidade seu meio de ação e decisão.
Desde a Revolta do Buzú de 2003 em Salvador [1] e as Revoltas da Catraca de 2004 e 2005 em Florianópolis [2], essas lutas só cresceram e se fortaleceram (para citar outros casos vitoriosos: Vitória, Teresina, Porto Velho, Aracajú, Natal, Porto Alegre, Goiânia etc). O Movimento Passe Livre (MPL) surgiu em 2005 como uma tentativa de constituir uma expressão organizada dessas lutas, mas seu alcance é necessariamente limitado frente à forma como se desenvolvem as revoltas.
A mobilização por transporte público é certamente uma das principais lutas sociais urbanas da década.
Hoje é possível arriscar que na pauta do transporte estava uma rachadura. Uma rachadura no modelo político de consenso e apaziguamento da última década. Uma rachadura que, quando aberta em centros como São Paulo e Rio, virou um rombo. E o que fazemos frente a esse rombo?
A esquerda e as revoltas
A esquerda nunca deu a devida atenção à pauta do transporte e nunca tentou compreender seriamente as formas de luta desses movimentos, mesmo com eles acontecendo debaixo do seu nariz o tempo todo.
Essa falta de familiaridade explica a dificuldade das esquerdas em lidar com o processo atual. Da parte da esquerda institucional e moderada, isso ficou claro na postura desastrada do prefeito Haddad, do Partido dos Trabalhadores (PT), que demonstrou total inabilidade em lidar com os protestos.
Já entre as organizações da extrema-esquerda, parece haver muitas vezes um desencaixe entre sua forma e a forma que o movimento assume na rua. Não tanto – como se poderia supor – por causa da estrutura hierarquizada do partido, mas muito mais por uma diferença do ritmo e da linguagem que exige a política da rua. Isso fica visível, por exemplo, na dificuldade dos militantes em estabelecer relação com os demais manifestantes. Parece que passamos tanto tempo em reuniões, negociando e escrevendo notas, que desaprendemos a lutar na rua! Agora estamos reaprendendo na marra…
Nos atos, o MPL foi acusado diversas vezes de irresponsável, de inconsequente. Mas teria sido inconsequente ou ousado? São Paulo foi uma das poucas cidades onde o MPL conseguiu se estabelecer de forma permanente e sólida, aprofundando o debate sobre a pauta do transporte e desenvolvendo trabalho de base em escolas e bairros. Observando os erros cometidos aqui em outros anos e os acertos das cidades que baixaram a tarifa, o MPL-SP elaborou um planejamento estratégico para esta luta contra o aumento: deveria ser um tiro curto, intenso, radical e descentralizado. Esse planejamento não só foi aplicado como cumpriu seu objetivo: o aumento caiu.
Na última semana, porém, entraram em cena elementos que ninguém havia previsto. Primeiro, o impressionante grau de massificação, a nível nacional, com centenas de milhares de pessoas indo aos atos, o que, além de nos impor dificuldades práticas para a organização de uma manifestação tão grande, abriu margem à descaracterização da luta. Segundo, a entrada em cena da direita organizada, disputando o sentido das manifestações tanto internamente (distribuindo bandeiras do Brasil e hostilizando partidos de esquerda) quanto externamente (pela cobertura midiática, que impõe a tônica pacifista e dá suas pautas, diluindo as originais).
Para as organizações de esquerda ficou claro que resistir à direita significava garantir a centralidade da pauta única: a revogação imediata do aumento [3]. Mas, com o aumento revogado, se abriu um vácuo de pauta e nossa unidade se desmanchou.
Para onde vamos?
As mobilizações, no entanto, não pararam. A rachadura aberta parece mesmo virar um rombo. Agora que começou, o povo não quer parar de sair às ruas. Em seu jogo de manipulação, a mídia incentiva os protestos e orienta ao senso comum que a próxima pauta é o problema geral do Brasil: a corrupção.
Desorientada pelo vazio de pauta e pelas rápidas transformações na conjuntura, a esquerda se encontra isolada – e agora hostilizada pela direita – no interior de uma mobilização cuja dinâmica ela mesma não entende. Se a lógica das revoltas populares contra os aumentos já era estranha para boa parte de nós, a abrupta massificação tornou o processo ainda mais incompreensível para todos.
Neste momento, se faz urgente que a esquerda apresente uma pauta capaz de preencher o vazio, retomando politicamente o sentido das mobilizações. Mas é preciso que seja uma demanda concreta e objetiva, que de fato possa se reverter em uma conquista real, como foram os 20 centavos. Reivindicações genéricas e difusas tendem a só fortalecer a manipulação operada pela direita.
Ao mesmo tempo em que a mediocridade da classe média tomou conta do espetáculo cujo palco é a Avenida Paulista, começaram a proliferar manifestações nos bairros da periferia. De forma mais ou menos espontânea na terça-feira à noite (18 de junho), e encabeçadas por movimentos sociais organizados a partir da quarta-feira (19 de junho), a quebrada entrou na luta. Estaria nessas ações um potencial de retomada da radicalidade e combatividade do processo?
Ora, mais do que saber se o potencial existe, o importante é que tenhamos capacidade de desenvolvê-lo. Aí deparamos com outra fragilidade nossa: a escassez no trabalho de base. Assumem agora crucial importância os movimentos sociais que têm inserção e enraizamento na periferia. É sua atuação que pode dar corpo às pautas concretas a partir das quais avançaremos daqui em diante, dando espaço para que os trabalhadores assumam as rédeas do processo.
A situação nos coloca a urgência de reformular nossa postura na luta de rua e reafirma a centralidade do trabalho de base permanente (como bem explicou outro artigo neste site, pouco adianta combater o conservadorismo erguendo cartazes na Avenida Paulista: é preciso solapar sua base material [4]).
Sem medo de nós mesmos
É preciso tomar muito cuidado para não se deixar levar pelo clima de alarmismo que vem tomando boa parte da militância. Não podemos nos deixar assustar por termos chegado onde chegamos. Seria temer a nós mesmos. Fomos surpreendidos pela capacidade da nossa própria luta e, ao constatar que o processo nos levou a um cenário completamente novo e massivo, que nos escapa ao controle, tentamos nos censurar e assumir uma postura de imobilismo.
Concentremo-nos em nosso potencial e não em nossas fraquezas. Acabamos de viver uma vitória histórica para os movimentos sociais no Brasil, cujo impacto para nossas lutas ainda não pode ser claramente avaliado [5]. Não podemos assumir um clima de derrota só porque tá cheio de coxinha na Paulista. Recuar agora é fortalecer a investida conservadora. Quem derrubou os 20 centavos fomos nós – com nossas bandeiras e barricadas – e não ela. E agora temos diante de nós a chance de avançar ainda mais nas conquistas.
Notas
[1] Teses sobre a Revolta do Buzú http://passapalavra.info/2011/09/46384
[2] VINICIUS, Leo. Guerra da Tarifa. Faísca, 2004
[3] Por um vintém http://passapalavra.info/2013/06/79281
[4] Protestos virtuais e impotência política (2) http://passapalavra.info/2013/03/74500
[5] Barramos! 15 anos em 15 dias http://passapalavra.info/2013/06/79596

Dilma Rousseff: esquerda ou direita?

Fonte: http://latuffcartoons.wordpress.com/

MPL comemora vitória e debate próximos passos - Por Maria Inês Nassif

MPL comemora vitória e debate próximos passos
Apesar do grande apoio de partidos de esquerda – inclusive de setores dentro do próprio Partido dos Trabalhadores – e de movimentos sociais, o saldo da mobilização é do Movimento Passe Livre. O MPL continua o grande protagonista desta história e tem que dar respostas rápidas ao enorme contingente de jovens que colocou nas ruas (a maioria deles num primeiro ato político), para impedir a apropriação dessa energia contestadora que o movimento catalisou nas últimas semanas pela direita.
São Paulo - Encerrada com uma grande vitória, o cancelamento do aumento dos preços do transporte público na cidade de São Paulo, a mobilização iniciada pelo pequeno coletivo de jovens, com idade entre 20 e 25 anos, que se transformou num grande fenômeno de massas e se espraiou pelas outras capitais do país, termina com desafios maiores ainda. Apesar do grande apoio de partidos de esquerda – inclusive de setores dentro do próprio Partido dos Trabalhadores – e de movimentos sociais, o saldo da mobilização é do Movimento Passe Livre. O MPL continua o grande protagonista desta história e tem que dar respostas rápidas ao enorme contingente de jovens que colocou nas ruas (a maioria deles num primeiro ato político), para impedir a apropriação dessa energia contestadora que o movimento catalisou nas últimas semanas pela direita.

Esta convicção foi o saldo de reuniões que envolveram os integrantes do grupo desde que o movimento contra o aumento do preço do transporte público tomou a dimensão de movimento de massas, na última semana, com partidos de esquerda e movimentos sociais.

No final do dia de ontem (19), quando integrantes do MPL se reuniam com blogueiros, jornalistas que militam fora da órbita da grande mídia, o empresário de comunicação Joaquim Palhares (da Carta Maior) e Sérgio Amadeu, o governador Geraldo Alckmin (PSDB) e o prefeito Fernando Haddad (PT) anunciaram a redução das tarifas de ônibus e metrô na capital. Quase que simultaneamente, o MPL tinha notícia da vitória do movimento também no Rio de Janeiro.

Na avaliação feita durante o encontro, o professor de História Lucas Oliveira, o Legume, definiu o MPL como um movimento social de esquerda, reafirmou as características apartidárias do movimento – que não se traduz em antipartidarismo, inclusive porque essa posição está em desacordo com a história do movimento, que sempre manteve ligações com partidos de esquerda.

A análise que integrantes do MPL e pessoas próximas ao movimento fizeram, nessa reunião, é que a massificação do movimento trouxe um contingente de jovens que não tinham história de participação política, à semelhança dos “cara-pintadas” do movimento pelo impeachment do presidente Fernando Collor, em 1991, e que não se sente representado por eles. Daí a reação à militância de partidos de esquerda que foram para as ruas e levaram suas bandeiras. Os jovens do movimento também constatam que atraíram a adesão de grupos mais violentos, que eram extremamente minoritários, mas cuja ação nas manifestações exigiria um trabalho de contenção que o MPL não estava aparelhado para fazer, até pelo exíguo número de integrantes. Registraram também a convicção de que atuaram, durante todo o movimento, agentes provocadores, provavelmente da polícia.

O que vem depois, todavia, é até mais complicado para o “coletivo” de São Paulo – que, segundo Oliveira, não tem uma articulação obrigatória com os movimentos que atuaram nas outras cidades do país nas últimas semanas. “Em algumas cidades nem existia Movimento Passe Livre”, contou.

Não existe uma articulação nacional do movimento; houve uma grande identificação dos jovens com o MPL, que não se transfere aos partidos de esquerda; e existe uma visível articulação de grupos de direita para tentar capitalizar o movimento, em especial nas redes sociais. Amadeu informou, durante o encontro, que na última semana os grupos anônimos de direita assumiram um enorme protagonismo nas redes sociais.

O MPL assume, como tarefa, manter a tarefa de “conversar” com esses jovens – e, embora seja deles cobrada a “politização” de suas bandeiras, existe uma convicção forte no grupo de que devem manter a agenda ligada ao transporte público e à questão da mobilidade urbana. Eles se articulam junto com o vereador Nabil Bonduki para apresentar um projeto instituindo o passe livre na cidade de São Paulo. Pensam também numa articulação nacional em torno da proposta de emenda constitucional de autoria da deputada Luiza Erundina, que define o transporte público como um direito de cidadania.

Leia, abaixo, a nota do Movimento Passe Livre, divulgada após a vitória em São Paulo:

“A cidade não esquecerá o que viveu nas últimas semanas. Aprendemos que só a luta dos de baixo pode derrotar os interesses impostos de cima. A intransigência dos governantes teve de ceder às ruas tomadas, às barricadas e à revolta da população.

Não foi o Movimento Passe Livre, nem nenhuma outra organização, que barrou o aumento. Foi o povo.

O povo constrói e faz a cidade funcionar a cada dia. Mas não tem direito de usufruir dela, porque o transporte custa caro. A derrubada do aumento é um passo importante para a retomada e a transformação dessa cidade pelos de baixo.

A caminhada do Movimento Passe Livre, que não começa nem termina hoje, continua rumo a um transporte público sem tarifa, onde as decisões são tomadas pelos usuários e não pelos políticos e pelos empresários. Se antes eles diziam que baixar a passagem era impossível, a revolta do povo provou que não é. Se agora eles dizem que a tarifa zero é impossível, nossa luta provará que eles estão errados.

Por uma vida sem catracas!

Movimento Passe Livre São Paulo”
Fotos: Joaquim Ernesto Palhares

quarta-feira, 19 de junho de 2013

Os infiltrados no Movimento Passe Livre - por Latuff

Fonte: http://latuffcartoons.wordpress.com/

É hora de defender o Movimento Passe Livre - Por Lincoln Secco e Antonio David

É hora de defender o Movimento Passe Livre
Continuem na luta. Mas saibam mudar a tática e desarmar o adversário. Ele tem nome: os fascistas que o discurso de direita disfarçado de combate à corrupção despejou nas ruas
Em célebre imagem do Manifesto Comunista Karl Marx mostra um feiticeiro que perdeu o controle dos poderes subterrâneos que ele mesmo despertou. As manifestações de segunda-feira foram o ponto de virada do Movimento Passe Livre.
Quando o movimento se massificou, isto não aconteceu sob a bandeira do MPL, mas depois de uma convocação de parte da grande imprensa. Sendo assim, as justas demandas iniciais se juntaram a manifestações de direita. O que explica a metamorfose?
Em primeiro lugar, lembremos que este movimento atual é seguramente importante e de massas, mas muito menor do que outros passados. Basta pensar nas Diretas Já que colocavam milhões nas ruas numa era sem redes sociais. Mais fraco e sem uma direção tradicional, ele tem que aprender no calor da luta a recuar para avançar depois.
O segundo aspecto do momento atual reside no fato de que antes as pessoas comuns iam às ruas depois de ouvirem o chamado que passava pela palavra impressa e esta dependia de organizações previamente estabelecidas que podiam arcar com  custos de edição de revistas, jornais etc. As redes sociais permitem que indivíduos falem diretamente entre si sem a mediação de organizações, salvo o mercado virtual.
Pessoas assim podem partir para a ação e expor ingenuamente os seus preconceitos e sua “coragem” (sic) escondida no anonimato da rede.
O terceiro aspecto que merece consideração é que a grande imprensa televisionada continua muito importante e, ao mesmo tempo, totalmente fora de controle democrático. Na Venezuela, Chávez enfrentou manifestações e tentativas de golpe reduzindo o papel da televisão.
Organizações na forma de “rede” existem desde que Marx criou seu círculo de correspondência londrina ou antes. Decerto os meios atuais potencializam infinitamente uma teia assim. O que o MPL pode aprender com seu magnífico movimento inicial é que organizações horizontais não deixam de ter pessoas provisoriamente na  liderança. Mas os líderes devem obedecer às bases e podem ser trocados. E as bases não são as pessoas nas ruas simplesmente, mas aquelas que comprovam real participação nas tarefas decididas. O MPL tem sim o direito de vetar atos que os seus membros orgânicos não decidiram previamente.
Para os partidos está dado o recado: está havendo um ensaio de algo diferente que poderá suscitar organizações de tipo novo à direita e à esquerda, assim como existem partidos verticais de direita e de esquerda. A juventude deve invocar o tumulto. É seu direito. É seu dever. Depois, estudar, estudar e estudar. Só assim se aprende. Primeiro nas ruas, depois se reorganizando. Não tenham medo. Continuem na luta. Mas saibam mudar a tática e desarmar o adversário. Ele tem nome: os fascistas que o discurso de direita disfarçado de combate à corrupção despejou nas ruas.
É possível que passeatas atrás de carros de som e líderes rotativos do próprio MPL no comando sejam a solução imediata que sindicatos mais à esquerda podem emprestar ao movimento, pois as atuais manifestações carecem deste elemento básico: o direcionamento conferido por quem fala mais alto.
Mas a saída estratégica passa por São Paulo e pela prefeitura. O MPL não quer e nem poderia influenciar o quadro eleitoral que ainda está distante. Mas precisa de uma saída digna para eliminar a gordura indesejada do movimento. A saída é o prefeito quem deve oferecer: baixar a tarifa e abrir um diálogo permanente sobre mudanças estruturais nos transportes.
Lincoln Secco é Professor de História Contemporânea na USP; Antonio David é Pós Graduando em Filosofia na USP

Manifestações em SP: os INFILTRADOS! - por Latuff

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Do inferno ao céu: Grupo resgata mais de 80 cães em Santa Cruz do Arari (PA) - Por Fátima Chuecco

Do inferno ao céu: Grupo resgata mais de 80 cães em Santa Cruz do Arari (PA)
Imaginem uma ilha muito distante, muito pobre e com dezenas de cães esfomeados, já em estado de pele e osso, morrendo aos poucos. Agora imaginem uma equipe de protetores de São Paulo unindo-se a outros de Belém do Pará e salvando 82 animais em situação deplorável. Tem mais: eles conseguiram acomodar  todos os cães, de uma só vez, no recinto de um barco. Destino: uma chácara para serem vacinados e tratados. E o melhor de tudo: não é ficção. Esse resgate aconteceu mesmo entre os dias 11 e 16 de junho, na Ilha do Francês, em Santa Cruz do Arari (PA), onde cerca de 300 cães foram mortos por afogamento ou abandono.
A notícia da caça e extermínio dos cães foi amplamente noticiada e chocou o país. Como havia pagamento pela captura dos animais, não só cães de rua, mas também os que tinham lares foram roubados de suas casas para um dos mais cruéis destinos. A ação está sendo investigada pelo Ministério Público Estadual e o prefeito do município de Santa Cruz do Arari, Marcelo Pamplona (PT), pode responder pelo crime de improbidade administrativa, além de maus-tratos, por ter incitado servidores e moradores da cidade à caça aos cães em troca de dinheiro. Por motivos de segurança, o local para onde os cães sobreviventes foram levados permanece em segredo.
Mas o trabalho ainda não acabou. Segundo o organizador da operação Correa do Mel, fundador do grupo “Resgate sem Fronteiras”, ainda restam cerca de 40 animais na ilha e a equipe permanecerá em Santa Cruz do Arari até resgatar todos. “Foi um trabalho duro e comovente. O que mais vimos foi fome por toda parte. A população local é também carente e, embora tenha ajudado um ou outro animal, não pôde salvar todos. Os ribeirinhos contam que viram dezenas de cães boiando no rio e logo depois começaram a ver outros animais andando pela ilha”, conta Correa  que saiu de São Paulo na companhia de outros dois protetores de animais, Juka Sobreiro e Bruno Menegassi.
A operação consistiu em atravessar um rio por quase três horas de lancha e depois mais um trecho de água até a Ilha do Francês num barco menor. Feito isso, os cães andaram de barco em duas etapas no caminho de volta e então foram transferidos para um caminhão com destino ao abrigo. Uma operação cansativa e de risco: “Tínhamos receio de ser abordados no meio do rio por pessoas contrárias a nossa ação. Já com os 82 cães no barco maior, tivemos receio dele virar num trecho em que, devido à correnteza, a embarcação começou a balançar muito. Foi um sufoco de mais de uma hora. Poucos animais resistiram a nossa intervenção porque a maioria, em virtude da fraqueza, não conseguia nem ficar em pé. Posso dizer que foi uma viagem do Inferno ao Céu”, conta Correa.
Entre os cães resgatados havia uma cachorrinha que tinha dado à luz na mata e outra grávida. No barco, como era de se esperar, houve alguma confusão, mas que pôde ser rapidamente contornada: “Tivemos o cuidado de pedir aos ribeirinhos para, antes da nossa chegada, alimentar os cães com a ração doada. Assim, a maioria deles já tinha comido alguma coisa depois de vários dias passando fome. Também amarramos cada um deles dentro do barco para evitar que tentassem pular. Um ou outro ficou bravo, mas foram incidentes curtos e sem gravidade”.
Ajude a continuar esse trabalho
O mesmo processo deve continuar nos próximos dias para salvar os 40 cães que permanecem na ilha e o grupo pretende ainda fazer uma manifestação pelos animais nas ruas de Belém do Pará antes de voltar a São Paulo. Mas todas essas manobras para resgatar os sobreviventes de Arari envolvem muitos gastos com ração, medicamentos, gasolina e transporte de barco. Os voluntários pedem ajuda para continuar o trabalho. Todos deixaram seus afazeres em São Paulo para essa missão que exige muita coragem e determinação. As contribuições em dinheiro podem ser feitas nas contas abaixo:
Banco do Brasil
Agência: 6970 – 1
Cc: 17536 – 6
Benedito Rodrigues Correa (CPF: 067.999.688-50)
Bradesco
Agência: 593
Cc: 243547 – 0
Bruno B. Menegassi (CPF: 401.122.128-75)

O que pensam os manifestantes que sacodem o Brasil? - por Latuff

Fonte: http://latuffcartoons.wordpress.com/

terça-feira, 18 de junho de 2013

5º Ato: Hora de começar a pensar sobre maior manifestação dos últimos tempos - por Passa Palavra

5º Ato: Hora de começar a pensar sobre maior manifestação dos últimos tempos
A cidade esteve na mão do povo, a polícia entregou a chave. Deixando de lado a questão da polícia e centrando-se no povo, isso seria bom ou ruim? Por Passa Palavra
Difícil, e seria em vão, tentar descrever tudo o que se passou na segunda-feira (17 de junho) em São Paulo — e no Brasil — com o 5º Grande Ato Contra o Aumento das tarifas. Qualquer leitura política que se faça será certamente parcial e imprecisa, apenas os desdobramentos dos fatos poderão fornecer elementos que ajudem a desnudar o sentido político da grande ebulição que está em curso.
Nesta segunda-feira, o ato — enorme — partiu do Largo da Batata (e todas as adjacências), na região de Pinheiros, e pouco depois dividiu-se (até onde temos conhecimento) em três grandes colunas: uma que desceu o final da avenida Rebouças e acessou a Marginal Pinheiros, caminhou longamente e tomou a ponte Estaiada, no bairro do Brooklin; outra que seguiu pela avenida Faria Lima, tomou a Juscelino Kubistech, a avenida Berrini e se encontrou com a primeira também na ponte Estaiada; e outros milhares que seguiram para a Avenida Paulista. E depois seguiu para o Palácio dos Bandeirantes, sede do governo do estado, e depois teve bloco que tomou a 23 de Maio e foi para a Assembleia Legislativa, e outro que desceu a Consolação, e depois um que foi para a frente da Prefeitura, e depois… e depois… e depois… Até o momento em que escrevemos, milhares e milhares estão por aí.
Alguns institutos de pesquisas chegaram a falar em 65 mil pessoas nas ruas. Talvez tenha sido isso, mas talvez fosse melhor dizer 90, 100, 110 mil ou mais — tanto faz. A partir desse momento passamos a contabilizar numa escala em que essa quantificação se torna indiferente ou, pelo menos, secundária.
Hoje é possível dizer que a cidade esteve na mão do povo, a polícia entregou a chave. Deixando de lado a questão da polícia e centrando-se no povo, isso seria bom ou ruim?
Bom, porque o Movimento Passe Livre (MPL) conseguiu cravar no coração da cidade o debate sobre o transporte público e o projeto da tarifa zero de forma indiscutível. Bom, porque apesar de todas as manobras operadas tanto pela direita quanto pela esquerda do espectro político institucional — enxertando um sem-número de pautas na mobilização, de forma a canalizar a sua energia contra este ou aquele adversário político e esvaecer a reivindicação única e clara do movimento — está cada vez mais difícil e vexatório para Haddad e Alckimin sustentarem o reajuste da passagem.
Mas também ruim — e, acrescentamos, perigoso — porque o povo de que falamos aqui não é aquele eufemismo ou simplificação que usamos quando queremos genericamente nos referir à classe trabalhadora ou a uma composição favorável a ela. Povo aqui diz respeito àquela massa social sem forma definida. Se há algo que marca a manifestação de segunda-feira, sem dúvida esta marca é a polifonia.
A sensação é que vivemos um grandioso momento, decisivo, algo inédito. Uma dada leitura de conjuntura altera-se em pouquíssimas horas. Algo nos diz que estamos perto de uma vitória pontual — 20 centavos — mas extremamente significante, porque pode devolver às organizações de esquerda a percepção de que o caminho da luta aberta, na rua, é possível. É, como se diz, uma real possibilidade de alcançarmos um acúmulo de força. E mais: aprendermos lições sobre formas de mobilização, sobre a necessidade de ser ousado, de fazer enfrentamentos. Porém, é preciso dizer que esta sensação é incompleta, carrega também o seu quê de angústia. Sensações que variavam conforme fossem as faixa, os cartazes ou as palavras de ordem que iam sendo chamadas durante a noite desta segunda-feira. À parte algumas pautas que poderiam e devem ser articuladas à pauta específica da mobilização — destacam-se aqui a indignação com a Copa do Mundo, a situação da saúde, da habitação e, sobretudo, o rechaço pesado contra a Polícia Militar — tiveram lugar também manifestações nacionalistas, moralistas, espíritos cívicos que enauseariam qualquer militante anticapitalista. E é claro que isso não ocorreu espontaneamente. Como já dito, resultou de intervenções políticas sistematicamente operadas dos setores mais conservadores da sociedade como também do chamado campo progressista democrático-popular. A grande imprensa — outra que, apesar do xingamento que sofria pela maior parte dos manifestantes, pode sair fortalecida por este processo — não poupou esforços para retratar e induzir o acontecimento a uma verdadeira panaceia cara-pintada.
Considerando os acontecimentos em outras 11 capitais brasileiras, presenciamos nesta segunda-feira um dos maiores eventos políticos do último período, isto é certo. A jornada de lutas contra o aumento avançou enormemente, disso não restam dúvidas. E abre caminhos para coisas até há uma semana inimagináveis no campo da luta de classes. No entanto, o que marchou nesta segunda-feira por toda a cidade foi um espectro político cujo conteúdo, para além da luta contra o aumento, está em ferrenho processo de disputa. Isso coloca um seríssimo desafio para as forças de esquerda, em São Paulo e no Brasil: não deixar que a energia social que esta luta ajudou a liberar, e que agora começa a transbordar da engenharia política de pacificação e cooptação armada pela era petista, redunde num mar de pautas etéreas, ou pior, descambe para um projeto de moralização da política de matiz populista, nacionalista, ou pior… como já aconteceu em outros momentos da história. Para já, no caso de São Paulo, isso significa intervir em conjunto e com habilidade e bolar táticas de depuração política que nos permitam gritar a uma só voz, sem desvios: pela revogação do aumento da tarifa!

sexta-feira, 14 de junho de 2013

4º grande ato: Haddad não revoga, MP não suspende, Alckmin solta a polícia nos manifestantes - por Passa Palavra

4º grande ato: Haddad não revoga, MP não suspende, Alckmin solta a polícia nos manifestantes
Forte repressão policial marcou o ato desta quinta-feira; ainda na saída do metrô manifestantes eram detidos por “porte de vinagre”. Por Passa Palavra
Ainda no início da tarde desta quinta-feira (13 de junho) chegaram os primeiro boatos, depois confirmados, de que a Polícia Militar em São Paulo havia evacuado o Teatro Municipal para usá-lo como base. Pouco depois das cinco horas da tarde, estações de metrô comumente lotadas nos horários de pico, como a Anhangabaú, ao lado do Teatro, foram sumariamente fechadas. “Devido ao excesso de pessoas nessa plataforma, a estação será fechada”, uma voz avisava. Nas saídas, policiais revistavam as pessoas, e manifestantes passaram a ser detidos por “porte de vinagre”, produto essencial para aliviar o efeito do gás lacrimogêneo. A concentração do ato começava e já havia cerca de 30 detidos. Havia ainda uma expectativa no ar, do Ministério Público suspender o aumento por 45 dias, o que não ocorreu.
Apesar de todo clima e da operação de terror instaurados pela polícia, cerca de 20.000 manifestantes se concentraram em frente ao Teatro Municipal para dar início ao quarto grande ato contra o aumento da tarifa. A manifestação começou com um clima bastante contagiante e animado. A enorme concentração de pessoas dava mostras de que, mesmo com todo aparato bélico e midiático montado para sufocar a mobilização, a repressão pura tem resultado na multiplicação do número de protestantes.
Como nos outros atos, a pontualidade foi mantida e a concentração, que estava marcada para as cinco da tarde, começou a seguir em direção à rua da Consolação pouco antes das seis horas. Na manifestação, ficou ainda mais evidente que está sendo tática da polícia provocar o confronto com os manifestantes, gerando dispersão e correria desordenada, o que facilita inclusive os atos de depredação. Desta vez, a marcha de milhares de pessoas saiu tranquilamente do entorno da Praça da República e começou a subir a rua da Consolação. Havia entre os organizadores do ato a completa disposição em negociar o trajeto do protesto, desviar-se da avenida Paulista e evitar um confronto a qualquer custo. No entanto, na esquina da rua Maria Antônia com a rua Consolação, um destaque da tropa decidiu atirar à queima-roupa e lançar bombas sobre os manifestantes. Grande parte se encurralou num posto de gasolina e, mesmo com todo o risco que isso representava, a polícia continuou a atirar. Alguns manifestantes gritavam “sem violência” e outros tentaram levantar os braços, mas não conseguiram impedir a ofensiva policial.
Daí para a frente, o que se seguiu foi um teatro em que a Secretaria de Segurança Pública desfilou seu aparato repressivo: cavalaria, ônibus do choque, motoqueiros e centenas de policiais da tropa de choque. Os manifestantes receberam chuva de balas de borracha e bombas na Praça Roosevelt, encurralando-se para entrar nas ruas que a ligam à Avenida Paulista, na região de Cerqueira Cesar. A manifestação então se dividiu pelas ruas Augusta, Frei Caneca e paralelas, ainda que na Consolação havia focos de repressão. Em todas elas a polícia, agora com a cavalaria, bloqueava o acesso à Paulista, mas deixava os manifestantes sem a possibilidade de evacuar, mesmo se quisessem. Nem mesmo os carros eram poupados pela ação policial; quem estava parado no transito recebia as bombas do mesmo jeito. Ainda há relatos de bombas de gás lacrimogêneo sendo atiradas pela Polícia nas universidades PUC, Mackenzie e Cásper Libero.
Algum tempo depois, os conflitos provocados pela polícia se espalharam por toda a região. Houve focos de confronto na própria rua da Consolação, na Avenida Paulista, na Augusta, na Nove de Julho, na Brigadeiro Luis Antônio, na avenida Angélica e em ruas próximas ao estádio do Pacaembú. Hoje, sem ironia, é possível dizer que foi a polícia quem parou a cidade para desfilar sem critério e responsabilidade todo o seu potencial repressivo. Mesmo muitos repórteres e fotógrafos da grande imprensa sofreram com o desfile policial; sobraram bombas, gás e prisões por porte de vinagre para muitos deles. Dois jornalistas da Folha de São Paulo, inclusive, foram atingidos com tiro de bala de borracha, um no rosto e outra no olho, sendo levados às pressas ao hospital.
Até à madrugada, calculava-se que 192 pessoas tivessem sido detidas. Durante o protesto era facilmente visível a grande quantidade de policiais infiltrados na manifestação, portando câmeras e filmadoras. E após a dispersão, a polícia militar invadiu restaurantes, bares e a estação Paulista do metrô para revistar manifestantes.
Há muitas notícias de manifestantes feridos ou que sofreram agressões gratuitas e em grande medida foram socorridos pelo posto médico montado por apoiadores no centro e, posteriormente, na Paulista. Dessa vez, muitos moradores da região não puderam deixar de ver bombas sendo explodidas em ruas vazias a troco de nada. Além disso, há depoimentos de moradores que viram policiais incendiando lixo em ruas paralelas e também o vídeo de um policial quebrando o vidro de uma viatura.
Prefeitura não quer diálogo
O tempo passa, a mobilização cresce, São Paulo para e o prefeito Fernando Haddad, que se arvorou como um homem de diálogo, nega-se a estabelecer qualquer tipo de negociação. O prefeito recusou-se a discutir mesmo após sinalização de diálogo realizada pelo Movimento, quando ignorou a proposta conciliatória do Ministério Público de suspender o aumento da tarifa por 45 dias. E lança mão do discurso fajuto de que o aumento foi feito abaixo do índice de inflação, escondendo que, se fosse este um critério a ser adotado seriamente, o preço da passagem não deveria ultrapassar os R$2,16, conforme os dados do IPCA (Índice de Preços ao Consumidor).
Seguir lutando
O próximo grande ato está marcado para dia 17, segunda-feira, no Largo da Batata, em Pinheiros. As manifestações não dão sinais de que vão cessar ou esvaziar, pelo contrário, a mobilização tem aumentado a cada ato,. Os custos políticos da não revogação do aumento podem condenar não só o futuro de uma disputa eleitoral para o governo em 2014, mas, principalmente, o rompimento definitivo de um período histórico da ligação do PT com os movimentos sociais. Esses poderão ser os 20 centavos mais caros da vida de Haddad e do próprio PT.