quarta-feira, 15 de julho de 2020

Um Neoliberalismo antiglobalista e iliberal – por Pierre Dardot

Um Neoliberalismo antiglobalista e iliberal
Multiplicam-se as alianças da oligarquia financeira com os Trump, Bolsonaro e Orban. Desde a crise de 2008, sistema abandonou os anéis, para manter objetivo essencial: estender a racionalidade ultracapitalista a nossa vida e subjetividade
Imagem: James Ensor, The Man & the Mask (1891)

Introdução
O neoliberalismo encontra-se atravessado desde o início por tensões e divisões internas. Está, pois, caracterizado por sua pluralidade interna, sua plasticidade e sua capacidade de mutação. E este ponto é enfatizado fortemente por Wendy Brown: longe de se manter unificado, o neoliberalismo é caracterizado por “seu caráter irregular, sua falta de identidade própria, sua variabilidade espacial e temporal e, acima de tudo, sua propensão à reconfiguração”. Portanto, devemos falar aqui de um neoliberalismo “antigo” e de um “novo”, a fim de melhor destacar o caráter plural, multifacetado e plástico desse “novo neoliberalismo” que agora aparece em várias partes do mundo.

O termo “neoliberalismo” foi cunhado pelo industrial francês Louis Marlio durante a Conferência Walter Lippmann, em 1938, às vésperas da Segunda Guerra Mundial. Desde então, assumiu um significado tão frouxo que se tornou importante apreendê-lo de modo mais preciso. De fato, deve-se evitar que seja invocado o tempo todo, de maneira indiscriminada e indiferenciada, como um termo genérico – e não como um conceito. Também não pode ser reduzido a um registro puramente denunciador, que tem o efeito de “engolir todas as diferenças” na noite em que todas as vacas são pardas, como diria Hegel. Assim, tornamo-nos incapazes de determinar em cada situação o que consiste numa política neoliberal e o que escapa dela.

Pode acontecer que um governo que não seja neoliberal por sua ideologia ou sua inspiração intelectual, mas que implemente uma ou mais políticas neoliberais. Isso ocorre às vezes devido à grande restrição global que ele exerce enquanto um sistema atual de poder.

Há vários anos, vários governos da América Latina (Brasil, Venezuela, Chile, Bolívia, Equador) foram rotulados, de um modo tão enganoso quanto autopromocional, de “pós-neoliberalismo”; entretanto, ao mesmo tempo, eles estavam implementando políticas neoliberais. Hoje temos o caso do governo de Orban, campeão da “democracia iliberal”, que conseguiu aprovar uma lei de “trabalho escravo”; esta autoriza os líderes empresariais a impor aos seus funcionários 400 horas extras de trabalho mediante um pagamento que pode ser adiado por até três anos. Ora, esse governo é perfeitamente neoliberal em sua política e em seu espírito. Portanto, é extremamente importante entender a diversidade do neoliberalismo, bem como sua lógica subjacente.

Fratura interna à racionalidade neoliberal
A divisão que está surgindo no campo do neoliberalismo é de natureza diferente; eis que aparece agora uma divisão entre “liberais” e “nacionalistas”. Por um lado, têm-se Macron, Merkel e Junker, por outro, têm-se Orban, Trump e Salvini; ora, todos eles têm interesse em dramatizar as questões para fins eleitorais óbvios. De fato, os atuais neoliberais não repetem a divisão de 1957 entre “constitucionalistas” e “universalistas”: os primeiros, eram partidários de acordos regionais ou locais bilaterais, em vez de grandes acordos multilaterais; os segundos eram a favor da integração em grupos supranacionais e, por isso, tinham um projeto de uma constituição europeia.

Há algo novo na história política do neoliberalismo que não devemos procurar mitigar, reduzindo-o ao já visto ou conhecido. A hipótese que proponho é ver nele uma fratura interna da racionalidade neoliberal, uma fratura que provavelmente comprometerá alguns dos arranjos elaborados na década de 1990, particularmente no que diz respeito às regras comerciais globais. O desafio implícito nessa oposição interna ao neoliberalismo é a reorganização da economia mundial após a crise de 2008, em um contexto de ascensão de novas potências (como a China).

Mas o que exatamente se entende por “racionalidade”? Nem uma ideologia nem uma política, mas uma normatividade, isto é, uma lógica das práticas governamentais ordenadas por padrões, das quais a primeira e mais importante delas é a da concorrência. Com isso, entendemos que o neoliberalismo não pode ser reduzido à política de austeridade ou às políticas econômicas monetaristas, ou ainda à saturação da sociedade por meio de uma pletora de mercadorias ou mesmo pela ditadura dos mercados financeiros. Na realidade, consiste em uma extensão da lógica de valorização do capital além da esfera do mercado entendida em sentido econômico. Essa lógica passa a abranger também o próprio Estado e mesmo as pessoas; ela conforma assim as nossas vidas e as nossas subjetividades. Isso vai muito além de uma simples “economia” para chegar a ser a criação de uma forma de vida.

Deste ponto de vista, a figura de Trump é exemplar: ele personifica até mesmo em suas práticas de governar o Estado empreendedor e constantemente aproveita sua experiência como empresário como líder do Estado. Certamente se opõe à globalização comercial, mas é muito favorável à globalização financeira. Foi isso que escapou a alguns, como Ignacio Ramonet, que diagnosticou na vitória eleitoral de Trump uma ruptura com o neoliberalismo. Eis que confundiu uma ruptura com a “ideologia globalista” e uma ruptura com a racionalidade neoliberal.

Ao distinguir entre “ideologia” e “racionalidade” é preciso ter muito cuidado. A própria Wendy Brown corrigiu recentemente a distinção que havia feito entre neoconservadorismo e neoliberalismo, identificando o primeiro com a defesa dos valores familiares tradicionais e supondo que se tratava de uma ideologia estranha à racionalidade neoliberal. Na realidade, o neoliberalismo combinou desde o início a defesa da moralidade tradicional e a extensão da lógica de mercado. À medida que seu sucesso avançou, passou a dar um novo papel à família, qual seja ele, encarregar-se da assistência social em vez do Estado, juntamente com educação, creche e assistência aos idosos. Este caráter regressivo agora está se tornando manifesto.

Devemos, portanto, evitar confundir essa apreciação da família e dos princípios morais tradicionais, constitutivos da racionalidade neoliberal, com esta ou aquela “ideologia” no sentido de um sistema de crenças e representações, tal como, por exemplo, esta ou aquela religião (o Islã sunita para a Turquia de Erdogan, a Igreja Ortodoxa para a Hungria de Orban ou alguma variedade de protestantismo nos EUA). Isso não impede que o conteúdo dessas ideologias contribua mais ou menos diretamente para o fortalecimento da lógica neoliberal. Se considerarmos o caso do Brasil de Bolsonaro, estamos lidando também com uma forma de religiosidade, a das igrejas evangélicas que defendem a “teologia da prosperidade”.

A razão normativa e governamental do neoliberalismo foi estabelecida no final dos anos 1980 e início dos anos 90. Não surgiu subitamente, mas foi preparada por vários experimentos. Havia, portanto, elementos de governamentalidade, mas que ainda não formavam realmente um sistema. Se olharmos mais de perto o caso do Chile de Pinochet, podemos ver que a ditadura desde muito cedo pôs em prática tais elementos. De fato, uma das medidas mais significativas da “terapia de choque” após o 11 de setembro de 1975 foi a privatização das universidades: com ela foi criada uma estrutura legal e institucional conformadora da conduta dos indivíduos, a qual se tornou duradoura e profundamente voltada na direção de uma adesão à norma da competição generalizada. Os efeitos dessa transformação não serão total e abertamente implantados até depois dos anos 90, mas eles continuam sendo sentidos atualmente.

Entretanto, falar de uma racionalidade neoliberal de maneira alguma implica em assimilá-la à ação de um rolo compressor indiferente à diversidade de situações, contextos culturais e tradições nacionais. A razão neoliberal pode ser uma razão global, no duplo sentido de “transversal” e “global”, mas não é uma razão unitária que exerceria uma homogeneização em escala mundial. Essa visão de que há uma identidade homogênea se alimenta da vulgata anti-neoliberal do fundamentalismo de mercado e, em particular, da metáfora da tabula rasa que Naomi Klein usa extensivamente. Por outro lado, é preciso estar atento à modulação diferenciada dessa normatividade de acordo com países e situações nacionais.

O governo de Salvini e Di Maio, na Itália, ofereceu um bom exemplo dessa plasticidade e dessa hibridização interna ao neoliberalismo. Existiu uma situação complexa em que uma coalizão eleitoral entre um partido neofascista tradicional (Lega) e uma nova formação (Cinque Stelle) foi montada para formar um governo. De fato, o que se deu foi que o Lega Nord, um partido étnico e regionalista que participou de várias coalizões de direita nos anos 1990 e 2000, antes de retornar ao poder, aliou-se ao movimento Cinque Stelle, o qual é bastante típico do que chamamos de “novo neoliberalismo”. Juntando uma política de identidade nacional voltada contra a imigração e uma política de segurança igualmente violenta, o partido de Salvini pode adotar uma postura ao mesmo tempo nacionalista e neoliberal.

Por seu lado nacionalista, o Lega ficou contra a União Monetária, o euro e o livre comércio generalizado; segundo os seus líderes, o “europeísmo” e o “globalismo” estão prejudicando a economia do país e, assim, o povo italiano. Por seu lado neoliberal, o Lega ataca qualquer lógica de redistribuição de impostos e de gastos públicos. Como base na tese de um imposto igualmente distribuído, pretende apoiar sobretudo as pequenas e médias empresas, reduzindo os seus custos e os padrões que regem a produção e o mercado de trabalho.

Tal como Trump, trata-se de reafirmar a soberania comercial e, especialmente, monetária, enquanto liberaliza o mercado interno para o benefício de empresários erigidos como heróis nacionais. Mas o que, no contexto italiano específico, talvez melhor caracterize o Lega é sua estratégia de reorganização interna do Estado italiano a longo prazo: trata-se de fortalecer a autonomia das regiões, aumentando as suas capacidades e os seus recursos fiscais, contra qualquer desejo de igualdade dos cidadãos perante os serviços públicos mais básicos.

Quanto à “renda da cidadania” adotada pela coalizão, foi uma tentativa de agradar ao eleitorado de Cinque Stelle, que defende um “neoliberalismo paternalista”: bem longe de promover a participação ativa da cidadania, ela vem acompanhada por restrições drásticas (a renda é creditada pelas agências de emprego temporário e não beneficia os estrangeiros – exceto os residentes no país há 5 ou 10 anos). Envolve um controle do uso do dinheiro que visa impedir despesas “imorais” etc. que o conformam como um instrumento para moralizar os pobres e disciplinar a força de trabalho em benefício das empresas.

Portanto, temos nacionalismo identitário, anti-UE e anti-migrante na relação externa combinado com um enfraquecimento em sentido quase federalista da estrutura do Estado italiano, renovando assim as dificuldades históricas ligadas à unificação da Itália. Diferentemente da posição adotada na França pelo Front Nacional, o nacionalismo identitário não implica, portanto, a promoção de um Estado unitário centralizado, o que de forma alguma impede que uma lógica hiper autoritária se afirme na ação do governo que esteve na cabeça do Estado.

Outro exemplo é o da AfD na Alemanha. Esse partido foi formado a partir de uma plataforma ordoliberal centrada na demanda por estabilidade monetária e na recusa de qualquer solidariedade com os países do sul da UE. Ela joga com a imaginação da “economia social de mercado”, característica do ordoliberalismo desde a década de 1950. Novamente, esse nacionalismo é, antes de tudo, anti-imigrante e anti-UE, sem que o Estado fortemente defendido implique numa centralização às custas da estrutura federal.

O que é surpreendente é que, apesar da diversidade de caminhos adotados, seja legalização ou modificações constitucionais, o neoliberalismo atual não sente a necessidade de recorrer ao arsenal do “estado de exceção” teorizado por Agamben no início dos anos 2000. Assim, no Brasil, após as modificações constitucionais iniciadas por Temer para impor um teto aos gastos públicos, a reforma previdenciária planejada pelo governo Bolsonaro modificou a Constituição sem a necessidade de revoga-la ou suspendê-la.

Como explica Tatiana Roque em “Democracia no Brasil: uma crise em três atos”, é essa constitucionalização da política econômica que possibilita entender melhor o papel desempenhado por Paulo Guedes no governo de Bolsonaro. É errôneo pensar que esse economista, um Chicago-boy, fornece a esse governo um vago tom neoliberal na forma de uma ideologia. O fato da guerra contra a democracia ser travada pelo recurso cada vez mais sistemático à constitucionalização, ao Judiciário e à legalidade não impede, no entanto, que seja uma guerra real, obedecendo a uma lógica implacável que justifica a perseguição de minorias, a prática de assassinatos e a imposição de uma ordem moral.

Conclusão
A história do neoliberalismo mostra uma diversidade interna que muitas vezes se aproxima de divisões ou cisões, tal como a oposição entre “universalistas” e “constitucionalistas” no que se refere à Europa. Isso não é novidade. O que há de novo no “novo neoliberalismo” não é o fato da divisão do campo neoliberal em correntes opostas. O novo é que essa divisão opera na questão de como ampliar essa racionalidade do capital no contexto da crise pós-2008. Ou continuando e intensificando a constitucionalização das regras do direito privado em escala global ou de blocos regionais tal como a União Europeia (os “globalistas”); ou exacerbando a competição entre Estados por um nacionalismo que não é apenas econômico, mas também e talvez até acima de tudo, identitário (os “nacionalistas”). Mas, qualquer que seja o caminho escolhido, o que não se pode duvidar, é que esse novo neoliberalismo, com todas as correntes nele incluídos, globalistas ou nacionalistas, esteja trazendo ao seu clímax a antidemocracia inerente ao antigo neoliberalismo.

1 Autor, junto com Christian Laval, de A nova razão do mundo – ensaio sobre a sociedade neoliberal e Comum – Ensaio sobre a revolução no século XXI, Boitempo, 2016 e 2017.

Tradução: Eleutério Prado

Coxão e Coxinha - por Jota Camelo

Fonte: https://twitter.com/ojotacamelo

Uma breve história do antifascismo – por James Stout – A.N.A.

Uma breve história do antifascismo
Enquanto a ideologia ameaçar as comunidades marginalizadas, grupos de esquerda reagem com força

Eluard Luchell McDaniels atravessou o Atlântico em 1937 para enfrentar fascistas na Guerra Civil Espanhola, onde ficou conhecido como “El Fantastico” por conta de sua habilidade com uma granada. Como sargento de pelotão junto ao Batalhão Mackenzie-Papineau das Brigadas Internacionais, o afro-americano de 25 anos, oriundo do Mississippi, comandou tropas brancas e as liderou numa batalha contra as forças do General Franco, homens que o viam como menos que humano. Pode parecer estranho para um negro ir a tais limites pela chance de lutar numa guerra de homem branco, tão longe de casa – já não havia bastante racismo para confrontar nos Estados Unidos? – mas McDaniels estava convencido de que antifascismo e antirracismo eram uma coisa só. “Vi que os invasores da Espanha eram as mesmas pessoas contra as quais lutei em toda minha vida”, disse McDaniels, em citação reproduzida pelo historiador Peter Carroll. “Vi linchamento e fome, e eu conheço os inimigos de meu povo”.

McDaniels não estava sozinho ao ver o antifascismo e o antirracismo como intrinsecamente conectados; os antifascistas de hoje são herdeiros de quase um século de luta contra o racismo. Embora os métodos do Antifa tenham se tornado objeto de muito discurso político acalorado, as ideologias do grupo, particularmente sua insistência na ação física direta para evitar a opressão violenta, são muito melhor compreendidas quando vistas no quadro de uma luta iniciada há quase um século contra a discriminação violenta e a perseguição.

Em Anatomy of Fascism [edição em português: “A Anatomia do Fascismo”] – um dos trabalhos definitivos sobre o tema – o historiador Robert Paxton expõe as paixões motivacionais do fascismo, que incluem “o direito de um grupo escolhido dominar os outros, sem restrição de qualquer lei humana ou divina”. Em sua essência, o fascismo busca estabelecer como premissa as necessidades de um grupo – frequentemente definido pela raça ou etnicidade – sobre o resto da humanidade; antifascistas sempre se opuseram a isso.

O antifascismo começou onde o fascismo começou, na Itália. O grupo Arditi del Popolo – “Os Corajosos do Povo” – foi fundado em 1921, sendo assim chamado em homenagem às tropas de choque do exército italiano na Primeira Guerra que nadavam através do Rio Piave com punhais nos dentes. Eles se comprometeram a lutar contra a facção cada vez mais violenta dos camisas-pretas, forças encorajadas por Benito Mussolini, que estava prestes a se tornar ditador fascista na Itália. Os Arditi del Popolo reuniram sindicalistas, anarquistas, socialistas, republicanos e ex-oficiais do exército. Desde o início, os antifascistas começaram a construir pontes onde os grupos políticos tradicionais enxergavam muros.

Essas pontes se estenderiam rapidamente às raças perseguidas pelos fascistas.

Uma vez no governo, Mussolini deu início a uma política de “italianização” que levou ao genocídio cultural de eslovenos e croatas que viviam na parte nordeste do país. Mussolini baniu seus idiomas, fechou suas escolas e até os fez mudarem seus nomes para que soassem mais italianos. Como resultado, eslovenos e croatas foram forçados a se organizar fora do Estado para se protegerem da italianização, e se aliaram às forças antifascistas em 1927. O Estado respondeu formando uma polícia secreta, a Organizzazione per la Vigilanza e la Repressione dell’Antifascismo (OVRA), que vigiou cidadãos italianos, atacou organizações oposicionistas, assassinou suspeitos de antifascismo e até mesmo espionou e chantageou a Igreja Católica. Os antifascistas enfrentariam a OVRA por 18 anos, até que um militante antifascista, que usava o codinome Colonnello Valerio, fuzilou Mussolini e sua amante com uma submetralhadora em 1945.

Dinâmicas semelhantes se apresentaram quando o fascismo se espalhava pela Europa do pré-Guerra.
Os esquerdistas da Roter Frontkämpferbund (RFB) da Alemanha usaram pela primeira vez a famosa saudação do punho cerrado como símbolo de sua luta contra a intolerância; quando, em 1932, eles se tornaram Antifaschistische Aktion – ou “antifa”, por abreviação – eles combateram o antissemitismo e a homofobia nazistas sob bandeiras com o logotipo vermelho-e-preto, como o fazem os grupos antifa da atualidade. Aquele punho foi erguido pela primeira vez por trabalhadores alemães, mas continuaria a ser levantado pelos Panteras Negras; pelos velocistas estadunidenses Tommy Smith e John Carlos nas Olimpíadas de 1968; por Nelson Mandela, entre muitos outros.

Na Espanha, as táticas antifascistas e a solidariedade foram testadas em 1936, quando um golpe militar pôs à prova a solidariedade entre trabalhadores e grupos de classe média, que se organizaram como um conselho baseado numa frente popular contra o fascismo. Os antifascistas se mantiveram fortes e se tornaram um exemplo do poder do povo unido contra a opressão. Nos primeiros dias da Guerra Civil Espanhola, a milícia popular republicana foi organizada de modo muito semelhante aos modernos grupos antifa: eles votavam sobre decisões importantes, permitiam que mulheres lutassem ao lado dos homens e ficaram ombro a ombro com adversários políticos para enfrentar um inimigo comum.

Negros norte-americanos como McDaniels, ainda excluídos de um tratamento igualitário no exército dos EUA, serviram como oficiais nas brigadas estadunidenses que chegaram à Espanha, prontas para lutar contra fascistas. No total, 40 mil voluntários da Europa, África, Américas e China ficaram lado a lado como camaradas antifascistas contra o golpe de Franco na Espanha. Em 1936 não havia pilotos de caça negros nos Estados Unidos; contudo, três pilotos negros – James Peck, Patrick Roosevelt e Paul Williams – apresentaram-se como voluntários para enfrentar os fascistas nos céus da Espanha. Em seu país, a segregação os impedira de alcançar seus objetivos no combate aéreo, mas na Espanha eles encontraram igualdade nas fileiras antifascistas. Canute Frankson, um negro americano voluntário que serviu como mecânico-chefe na Garagem Internacional em Albacete, onde ele trabalhou, resumiu suas razões para lutar numa carta para casa:

Nós não somos mais um grupo minoritário isolado, lutando sem esperança contra um gigante imenso. Porque, minha querida, nos juntamos e nos tornamos parte ativa de uma grande força progressista, em cujos ombros repousa a responsabilidade de salvar a civilização humana da destruição planejada por um pequeno grupo de degenerados, enlouquecidos por seu desejo de poder. Porque se nós esmagarmos o fascismo aqui, salvaremos nosso povo na América e em outras partes do mundo da perseguição cruel, do aprisionamento em massa e do genocídio que o povo judeu sofreu e está sofrendo sob os calcanhares fascistas de Hitler.

No Reino Unido, os antifascistas se tornaram um importante movimento na medida em que o antissemitismo emergia como uma força de destaque. Em outubro de 1936, Oswald Mosley e a British Union of Fascists tentaram marchar pelos bairros judeus de Londres. Os 3 mil fascistas de Mosley e os 6 mil policiais que os acompanharam viram-se superados numericamente pelos antifascistas londrinos, que conseguiram detê-los. Estimativas sobre a multidão variam de 20 mil a 100 mil pessoas. Crianças locais foram recrutadas para jogar suas bolinhas de gude sob os cascos dos cavalos da polícia, enquanto que estivadores irlandeses, judeus da Europa Oriental e trabalhadores de esquerda ficaram lado a lado para bloquear o avanço da marcha. Eles ergueram seus punhos – assim como os antifascistas alemães – e entoaram “No pasarán” (slogan da milícia espanhola), e cantaram em italiano, alemão e polonês. Eles tiveram sucesso: os fascistas não passaram e a Cable Street se tornou um símbolo de uma ampla aliança antifascista calando a boca do discurso de ódio fascista nas ruas.

Durante a Segunda Guerra Mundial, o antifascismo passou para o segundo estágio, saindo das ruas para ficar ao lado dos que estavam nos lugares de poder. Winston Churchill e outros imperialistas se colocaram contra o fascismo, mesmo enquanto mantinham o colonialismo que deixava o povo indiano passar fome para apoiar seu esforço de guerra. Uma aliança entre antifascistas comprometidos e antinazistas de ocasião foi formada. Tornou-se um tipo de meme de rede social que aqueles que lutaram na Segunda Guerra Mundial eram antifascistas, mas há tensões no cerne da crença antifascista. As Forças Armadas dos EUA que derrotaram os nazis ao lado dos Aliados eram segregadas, tropas de negros eram relegadas a papéis de segunda classe e não podiam servir ao lado de tropas brancas na mesma unidade. O antifascismo se opôs à primazia de qualquer grupo; soldados antifascistas na Espanha estiveram ao lado de camaradas negros como iguais, mas isso não aconteceu nas tropas americanas da Segunda Guerra.

Depois da guerra, o antifascismo saiu dos corredores do poder e retornou às ruas. Os britânicos confrontaram o fascismo, mas jamais exorcizaram seu ódio interno e rapidamente libertaram os simpatizantes fascistas detidos depois da guerra. Ex-militares judeus britânicos, que combateram o fascismo nos campos de batalha da Europa, retornaram para casa e viram homens como Mosley continuando a despejar nos espaços públicos uma retórica antissemita e anti-imigrante. Por meio de novas organizações que fundaram, eles se infiltrariam nos discursos de Mosley e, literalmente, o jogariam para fora do palco.

A mesma lógica anti-imigrante que sustentava o fascismo de Mosley no Reino Unido apareceu mais tarde na Alemanha, nos anos 1980, e novamente os antifascistas se reinventaram para enfrentar o ódio e o racismo encarnados pelos nazis skinheads, que estavam começando a se infiltrar na cena punk. Esta chamada terceira onda de antifascismo incorporou táticas como a das ocupações, ao mesmo tempo em que reviviam o punho erguido e os logos em preto-e-vermelho usados por seus avôs nos anos 1930.

Os mais radicais e numerosos squats foram fundados em Hamburgo, onde diversos grupos de jovens ocupavam prédios vazios como parte de uma contracultura urbana que rejeitava tanto a Guerra Fria quanto o legado do fascismo. Quando o clube alemão de futebol FC St Pauli mudou seu estádio para as proximidades, a cultura antirracista e antifascista dos squats tornou-se o princípio orientador do time. Mesmo com o retorno do entusiasmo anti-imigrante na política alemã dos anos 80, e com a cultura dos fãs de futebol se tornando racista e violenta, alguns alemães apreciadores do esporte – notadamente aqueles do clube St. Pauli – puseram-se de pé contra o racismo. Essa cultura de fã tornou-se lendária entre a esquerda global e o próprio clube adotou isso: hoje, o estádio do St. Pauli é pintado com slogans como “sem futebol para fascistas”, “futebol não tem gênero” e “nenhum ser humano é ilegal”. Eles até formaram uma equipe para refugiados.

O time, com seu logotipo de caveira e ossos cruzados – tomados de empréstimo do herói pirata antiautoritário Niolaus Stoertebeker, da Hamburgo do século 14 – talvez represente o antifascismo mais bacana visto até hoje. Vi seus adesivos nos banheiros imundos de shows punk em três continentes e identifiquei aquela bandeira de caveira e ossos cruzados num comício do Black Lives Matter esta semana.

Mas o antifascismo hoje não se trata de agitar bandeiras em partidas de futebol; trata-se de enfrentar, por meio da ação direta, racistas e genocidas onde quer que eles possam ser encontrados. Voluntários antifascistas, inspirados na experiência de seus predecessores na Espanha, têm silenciosamente deslizado pelos cordões internacionais até o nordeste da Síria, desde 2015, para lutar contra o Isis [Estado Islâmico] e recrutas turcos. Na região da Síria conhecida como Rojava, exatamente como na Espanha Republicana, homens e mulheres lutam lado a lado, levantam seus punhos para fotografias e orgulhosamente exibem a bandeira com o logo preto-e-vermelho enquanto defendem o povo curdo abandonado pelo mundo.

Quando o voluntário italiano Lorenzo Orzetti foi morto pelo Isis em 2019, os homens e mulheres de Rojava cantaram “Bella Ciao”, uma cantiga antifascista da Itália dos anos 1920. A canção se tornou popular nas montanhas da Síria quase 90 anos depois, e hoje há dezenas de gravações curdas disponíveis. Assim como o antifascismo protegeu eslovenos e croatas perseguidos, ele levanta as armas hoje para defender a autonomia curda. De volta à Alemanha, o St. Pauli acompanha as notícias de seus confederados na Síria e seus torcedores frequentemente seguram cartões coloridos para formar a bandeira de Rojava nos jogos.

E, claro, o antifascismo ressurgiu nos Estados Unidos. Em 1988 foi formada a Anti-Racist Action, com base no fato de que antirracismo e antifascismo são a mesma coisa, e que o nome ARR pode ser mais óbvio às pessoas nos EUA. Na Califórnia, Portland, Pensilvânia, Filadélfia, Nova Iorque e por todo o país, grupos autônomos surgem para lutar contra a ascensão do discurso de ódio, apoiar pessoas LGBTQIA e BIPOC [Black, Indigenous, and People of Color] e combater crimes de ódio. Em Virgínia, o clero local confiou no Antifa para manter as pessoas em segurança durante a manifestação “Untie the Right”, em 2017. Usando o logo antifa alemão dos anos 1930, o punho erguido do RFB e o slogan ‘No pasarán’, estes grupos têm se colocado à frente de racistas e fascistas em Los Angeles, Milwaukee e Nova Iorque – assim como seus predecessores fizeram na Cable Street. Embora acusações tenham sido levantadas contra o Antifa, por tornar violentos os recentes protestos, há poucas evidências de que os partidários da causa antifascista estivessem por trás de qualquer violência.

O antifascismo mudou muito desde 1921. Os ativistas antifascistas da atualidade investem seu tempo tanto usando inteligência de código-aberto para expor supremacistas brancos na internet quanto construindo barricadas nas ruas. Da mesma forma que seus antecessores na Europa, os antifascistas usam violência para combater violência. Isso lhes rendeu a fama de “bandidos de rua” em algumas partes da mídia, exatamente como foi no caso da Cable Street. O Daily Mail publicou a manchete “Vermelhos atacam os camisas-pretas, garotas entre os feridos” no dia depois da batalha, que agora é amplamente vista como um símbolo de identidade interseccional compartilhada entre a classe trabalhadora de Londres.

Quando Eluard McDaniels retornou da Espanha, ele foi barrado de seu emprego de marinheiro mercante, e seus colegas foram rotulados como “antifascistas prematuros” pelo FBI, mesmo que os Estados Unidos acabassem lutando contra os mesmos pilotos nazistas apenas três anos depois. O último americano voluntário da Guerra Civil Espanhola, um judeu branco chamado Delmer Berg, morreu em 2016, aos 100 anos. Berg, que foi perseguido pelo FBI e posto na lista negra durante a Era McCarthy, foi vice-presidente da filial da NAACP [National Association for the Advancement of Colored People] em seu condado, organizado com a United Farm Workers e Mexican-American Political Association, e considerou seu ativismo interseccional como a chave para sua longevidade.

Por ocasião da morte de Berg, o senador John McCain escreveu um artigo saudando esse bravo “comunista inveterado”. Politicamente, Mccain e Berg teriam concordado muito pouco, e McCain claramente evitou falar sobre a perseguição sofrida por Berg e seus camaradas quando eles retornaram à América; mas Mccain citou um poema de John Donne – o mesmo poema que deu título ao romance de Hemingway sobre a Guerra Civil Espanhola [1]. Ao citar Donne, McCain sugere que o antifascismo é um impulso humano básico; e o poema de Donne captura a ampla visão humanitária que motivaria os antifascistas 300 anos depois:

Each man’s death diminishes me,
For I am involved in mankind.
Therefore, send not to know
For whom the bell tolls,
It tolls for thee. [2]

Notas do tradutor:
[1] “For Whom the Bell Tolls” (“Por Quem os Sinos Dobram”), publicado em 1940.
[2] “…a morte de um único homem me diminui, porque Eu pertenço à Humanidade. Portanto, nunca procures saber por quem os sinos dobram. Eles dobram por ti.” (assim traduzido na edição da Betrand Brasil de “Por quem os sinos dobram”, 2013).
Tradução > Erico Liberatti

agência de notícias anarquistas-ana

depois de horas
nenhum instante
como agora

Alexandre Brito

quinta-feira, 2 de julho de 2020

Leonard Peltier, 75 anos, 44 na prisão. A vida indígena importa? – por A.N.A.

Leonard Peltier, 75 anos, 44 na prisão. A vida indígena importa?
Estados Unidos, uma reserva de nativos americanos no sul de Dacota, em Oglala.

É um período de enorme tensão nessa área, se produziram frequentes ataques às comunidades indígenas por parte de grupos armados, os GOONS, formados em parte por nativos. Estes são homens comprados pelo governo dos Estados Unidos para reprimir as lutas do Movimento Indígena Americano (AIM) que durante alguns anos esteve reclamando uma vez mais os direitos dos nativos estadunidenses.

Esse dia chegou um automóvel de surpresa a esta pequena e empobrecida reserva, sem sinais de identificação, com dois homens dentro, se detêm a uma distância segura, se produz um tiroteio. Em retrospectiva, se descobrirá que os dois homens eram dois agentes do FBI que buscavam um índio acusado de roubar um par de botas. Vocês acreditam?

Provavelmente fosse uma armadilha preparada pelo próprio FBI, já que centenas de agentes chegaram em questão de minutos e o tiroteio foi uma loucura. Os dois brancos que chegaram primeiro e um nativo morrem. Dos nativos, quanto às centenas que morreram nesses anos, assassinados sabe-se lá por quem, ninguém investigou, mas por essas duas mortes de agentes alguém teria que pagar e caro.

Leonard Peltier, tinha 31 anos, era um ativista do AIM, esteve presente esse dia, e isto foi suficiente para converter-se no bode expiatório, foi preso no Canadá em 6 de fevereiro seguinte, a extradição se obteve com evidência tão falsa que posteriormente o governo canadense protestou formalmente pela forma como se obteve. O FBI se vingou: através de um julgamento manipulado, Leonard Peltier foi sentenciado a duas prisões perpétuas.

Se desejas saber mais, explora os numerosos artigos na Internet que acompanharam às numerosas campanhas para a liberdade de Leonard Peltier.

2020: digamos que é o momento adequado para recordar que os Estados Unidos (como os demais países do continente americano) se formaram sobre a base do maior massacre da história. 80 milhões de indígenas. Um exemplo que o próprio Hitler apreciava.

Ao contrário, só hoje as palavras destes povos, destas culturas, podem ser fundamentais dado o grande risco que corre a humanidade neste planeta.

Que Leonard Peltier finalmente saia do cárcere, possa reunir-se com sua gente, é este o símbolo de um povo resistente que ocupa o lugar, AO VIVO, das estátuas que são demolidas.

Liberdade para Leonard Peltier, assim como para Mumia Abu-Jamal, irmão de luta e resistência, também um símbolo, desta vez do povo negro da América.

Se a polícia estadunidense os mata com armas e com o peso de seus corpos nas ruas, morrem ainda mais lentamente nos cárceres estadunidenses, onde todas as “minorias” se convertem em “maiorias”.

Liberdade para Leonard Peltier, para Mumia Abu Jamal e para todos os presos políticos do mundo.

Divulgue esta história, um homem confinado em prisões de máxima segurança durante 16.195 dias e noites, te agradecerá.

No espírito de Crazy Horse (“Cavalo Louco”).

A. / Junho 2020

Fonte: https://cslpbarcelona.wordpress.com/peltier/leonard-peltier-la-vida-indigena-importa/

Tradução > Sol de Abril

Conteúdo relacionado:

https://noticiasanarquistas.noblogs.org/post/2019/12/04/eua-mensagem-de-leonard-peltier-no-dia-de-acao-de-gracas-2019-caminhando-sobre-terra-roubada/

agência de notícias anarquistas-ana

não tenho país
nem casa nem riqueza
e como me sinto bem!

Rogério Martins

Fonte: https://noticiasanarquistas.noblogs.org/post/2020/06/30/espanha-leonard-peltier-a-vida-indigena-importa/

Mateus 4:8 - por Jota Camelo

Fonte: https://twitter.com/ojotacamelo

Batalha da Praça da Sé – Aversão dos anarquistas sobre a “revoadas dos galinhas verdes” e o movimento antifascista em São Paulo – por A.N.A.

Batalha da Praça da Sé – Aversão dos anarquistas sobre a “revoadas dos galinhas verdes” e o movimento antifascista em São Paulo
Em 7 de outubro de 1934 os antifascistas de São Paulo infligiram uma grande derrota para os integralistas, naquela que ficou conhecida como a “batalha da praça da Sé” ou “revoada dos galinhas verdes”. Nesta data os integralistas haviam dito que fariam uma grande manifestação, a “marcha sobre São Paulo”, parafraseando Mussolini. Sete pessoas morreram e mais de trinta ficaram gravemente feridas.

Com a debandada dos “camisas verdes” e o sucesso da contramanifestação entretanto, surgiram e continuam a serem reproduzidas versões polêmicas. Este artigo busca, através de documentos da época e registros de depoimentos posteriores, resgatar a versão dos anarquistas sobre os fatos.

Precedentes:

A imigração italiana para o Brasil era massiva no final do século XIX e início do XX, sendo a Itália o país de origem que mais imigrantes trouxera naquelas décadas. O próprio movimento anarquista e o sindicalismo eram muito marcados pela presença de italianos, além de outros imigrantes e de brasileiros. Apesar do problema secular do racismo no Brasil, o fenômeno internacional do fascismo, propriamente dito, corporificando-se inicialmente na Itália e na Alemanha, naturalmente teve no operário imigrante suas primeiras repercussões.

A partir de 1922, Mussolini já havia assassinado muitos opositores, ninguém lembrava seus discursos socialistas e havia criado uma poderosa aviação – a grande propaganda fascista.

O fascismo se volta para o Brasil onde muitas entidades italianas são cooptadas para a propaganda. Um discurso do cônsul italiano Mazzolini, chefe dos “camisas pretas” diz: “A pátria tem aqui sua décima legião, o regime tem aqui sua velha guarda, a nação fascista tem aqui uma parte de si mesma”. O estribilho é Deus, Pátria e Família, é de data antiga.

(…) A cartilha fazia a cabeça das pessoas e crianças, dizendo que os caboclos, mestiços, índios, gaúchos etc… eram de raça inferior. Comícios, passeatas, manifestações eram feitas quase que diariamente. (CUBEROS, Jaime, 2015. p. 204)

Mussolini enviou à São Paulo o deputado Luigi Freddi, que assumiu a direção do jornal Il Piccolo. O jornal era do empresário fascista Rodolfo Crespi, fundador do colégio Dante Alighieri. Poucos conhecem o desconcertante passado do tradicional colégio paulista, de mesmo nome, conhecido pelo seu caráter rígido. Neste colégio era muito presente a saudação típica da mão estendida e professores italianos foram enviados e subsidiados pelo governo de Mussolini. (MALIN, Mauro. 2011)

Em 1928 dois aviadores fascistas atravessaram o Atlântico e um evento foi organizado em sua homenagem. Alcoolizado e empolgado, um aviador morreu ao resolver voar novamente e derrubar o seu avião no mar. Seu colega sobreviveu sem muitos ferimentos. Um artigo de Maria Lacerda de Moura no jornal O Combate viria a enfurecer os fascistas de São Paulo, o Il Piccolo e outro jornal chamado Fanfulla. A educadora e escritora anarquista escreveu “um artigo corajoso, honesto, irreverente, comparando o delírio aviatório-militarista de um Del Prete alcoolizado ao humanismo e à ciência de um Amundsen” (CUBERO, Jaime. 2015, p.204)

Os debates nos jornais durariam dias e levariam as vias de fato quando Il Piccolo faz ameaças a libertária. Estudantes revoltados saíram às ruas em protesto contra o fascismo e se dirigiram a sede do jornal. Apesar dos tiros de revólver, vindos do segundo andar, quebraram a fachada do edifício, os móveis e as instalações, mas a polícia conseguiu agir a tempo de proteger as oficinas.

Em seguida a multidão fez um comício de protesto na Praça Patriarca, onde foi aumentando de número. Durante esse comício, a polícia se concentrou junto ao Fanfulla. A multidão voltou, em seguida, ao Il Piccolo onde, vencendo a proteção da polícia, destruíram tudo, jogando as máquinas e arquivos na rua e incendiando também o edifício. “O grupo enchia a Praça dos Correios, o viaduto Santa Ifigênia e o parque do Anhangabaú, assistindo ao incêndio.” (CUBERO, Jaime. 2015, p.206)

Uma grande estátua em homenagem aos aviadores, enviada por Mussolini e inaugurada em 1929 pela Sociedade Dante Alighieri, ostenta até hoje símbolos fascistas na cidade de São Paulo. A escultura “Heróis da travessia do Atlântico” ficou entre 1987 a 2009 na praça Nossa Senhora do Brasil, no lado oposto ao da paróquia, no cruzamento entre a Av. Brasil e a Av. Europa. Em 2009 a estátua voltou ao seu local original, junto a represa Guarapiranga. A estátua possui dois grandes fascios, machados romanos que deram origem ao nome e ao símbolo do fascismo.

>> Para ler o texto na íntegra, clique aqui:

https://novohorizonteanarquista.noblogs.org/batalhadapracadaseanarquista/

agência de notícias anarquistas-ana

Na palma da mão,
Um vaga-lume —
Sua luz é fria!

Shiki

Fonte: https://noticiasanarquistas.noblogs.org/post/2020/06/30/batalha-da-praca-da-se-a-versao-dos-anarquistas-sobre-a-revoadas-dos-galinhas-verdes-e-o-movimento-antifascista-em-sao-paulo/