segunda-feira, 26 de novembro de 2012

Caça aos abutres - Por Mike Elkin

Caça aos abutres

Um novo site do Quênia, Mavulture.com, que significa “muitos abutres” em swahili, reúne, condensa e publica irregularidades cometidas por dirigentes políticos quenianos

Criado no dia 13, o site é o mais recente projeto do ativista Boniface Mwangi, conhecido por seus grafites e murais políticos em toda Nairóbi, bem como por suas exposições fotográficas sobre a violência desatada neste país depois das eleições presidenciais de 2007. Depois do anúncio dos polêmicos resultados das eleições de dezembro daquele ano, ocorreram enfrentamentos tribais em todo o país, deixando cerca de 1.200 mortos e o deslocamento de 600 mil pessoas.

Fotógrafo independente, Mwangi, 29 anos, recebeu em 2008 e 2010 o Prêmio Fotográfico Mohamed Amin, concedido pela rede de televisão CNN, por sua cobertura da violência pós-eleitoral. “Já visitaram o Mavulture.com?”, perguntou em sua conta no Twitter a revista queniana de entretenimento Blink. “Creio que devem visitá-la antes de votarem no próximo ano”, ressaltou. Os quenianos voltarão às urnas em março de 2013 para escolher um novo presidente.

O ativista político Boniface Mwangi é conhecido por seus grafites e murais em Nairóbi (Mike Elkin/IPS).

O site apresenta até agora os perfis de 17 políticos, incluindo Uhuru Kenyatta, filho do primeiro presidente do Quênia, atual candidato presidencial e um dos homens investigados pelo Tribunal Penal Internacional por crimes contra a humanidade durante a violência de 2007. Lavagem de dinheiro, apropriação de terras, tráfico de drogas e assassinato são algumas das acusações que constam no Mavulture.com. Além dos artigos, o site inclui vídeos e infográficos sobre cada político, bem como cartazes de “Procurado”, ao estilo do Velho Oeste, que podem ser baixados pelos internautas. O site é financiado por doadores anônimos.

Mwangi disse à IPS, em entrevista em seu escritório em Nairóbi, que o objetivo da página é informar os quenianos sobre o histórico de suas autoridades. “Vamos publicar os registros de cada pessoa do governo, cada caso de corrupção em que se envolvem e cada acusação contra eles”, afirmou. “Desta forma, na hora de votar, as pessoas poderão contar com esta plataforma para ter uma perspectiva informada. Temos corrupção em grande escala neste país, e os mesmos tipos envolvidos nos últimos 49 anos”, detalhou.

“Desta forma será possível comparar. Quando dizem que estamos todos unidos, nós vemos que não é bem assim. Nossas crianças não vão a escolas estrangeiras e não têm casas na Grã-Bretanha”, ressaltou Mwangi. O índice de percepção de corrupção de 2011, elaborado pela organização Transparência Internacional, coloca o Quênia com 2,2 pontos em dez, no posto 154 na lista de 183 países relacionados. Segundo a organização, a corrupção custa ao Quênia mais de US$ 357 milhões por ano.

Mwangi contou que se dedicou ao ativismo político após sentir frustração e raiva pela violência pós-eleitoral. Em 2009, criou a exposição fotográfica itinerante Picha Mtaani, com imagens dos assassinatos, para recordar aos quenianos o ocorrido. Depois organizou um grupo de artistas para pintar controvertidos murais por toda Nairóbi, ilustrando os políticos do país como abutres e criticando a população por sempre votar neles.

Em junho deste ano, liderou uma mobilização que colocou 49 ataúdes negros na porta do parlamento enquanto este estava em sessão. Os caixões representavam cada um dos anos que os políticos gozaram de impunidade desde a independência em 1963, e neles estava escrito: “Enterrem os abutres com seu voto”. Cada um também estava identificado com um escândalo político.

As autoridades pintaram por cima de muitos murais na capital, mas uma das imagens mais marcantes de Mwangi permanece intacta, perto do mercado da cidade. Nela, um homem com cabeça de abutre está sentado em um trono mostrando um malicioso sorriso. Em uma das mãos segura uma xícara de chá e a outra está algemada a uma maleta. O homem-abutre está pensando: “Eles saqueiam, violam, queimam e matam em minha defesa. Eu roubo seus impostos e me aproprio de terras, mas os idiotas ainda votam em mim”.

“Você sabe o que faz um abutre?”, pergunta o taxista Kimani Jong Kimani Nganga enquanto olha o mural. “Come carne. Temos políticos que desde as eleições estão nos comendo. Devemos mudar isso”, respondeu. Mwangi explicou que desejava provocar uma resposta entre os quenianos, pois sua indiferença diante de claros abusos políticos e econômicos apenas fortalece os que se aproveitam do sistema.

“Há pouco tempo, professores e médicos fizeram uma greve em protesto por seus baixos salários. Ao mesmo tempo, os legisladores se reuniram no parlamento e em 30 minutos concederam aumento a eles mesmos”, recordou Mwnagi. “Não houve nenhum alvoroço por isso. Duzentos legisladores podem fazer isto em um país de 40 milhões de habitantes e ninguém ir às ruas protestar. Como se chama isso? É ilógico que as pessoas possam ser escravas de um sistema e nunca denunciá-lo. Veem a injustiça diariamente e apenas ficam olhando”, afirmou de forma veemente.

Uma das principais razões do silêncio é o temor de sofrer represálias, reconheceu Mwangi. Por isso ele planeja um protesto em que todos os manifestantes usem máscaras. “Este país é muito pequeno. A maioria das empresas é propriedade de políticos e abutres. Por isso algumas pessoas temem sofrer represálias ou serem demitidas”, enfatizou. O ativista também comentou a ironia de que “com máscaras as pessoas possam mostrar seu verdadeiro rosto”.

Com a colaboração de Lucas Laursen.

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