segunda-feira, 30 de outubro de 2017

Em novembro acontece a VIII Feira Anarquista de São Paulo – por A.N.A.

Em novembro acontece a VIII Feira Anarquista de São Paulo
A Biblioteca Terra Livre organiza a VIII Feira Anarquista de São Paulo, dando continuidade ao já tradicional encontro anual de anarquistas e simpatizantes do mundo inteiro.

Na edição deste ano, assim como nas anteriores, acontecerá mostra editorial e venda de livros, jornais, revistas, fanzines e outros materiais libertários. A Feira Anarquista de São Paulo pretende reunir editoras libertárias do país e do exterior.

Paralelamente à mostra editorial haverá palestras e debates, assim como diversas atividades culturais, como exposições, apresentações teatrais, espaço para crianças, e outras atividades.

Todas e todos estão convidados!
Data: Domingo – 05 de novembro de 2017
Horário: das 10h às 20h
Local: Espaço Cultural Tendal da Lapa

Endereço: Rua Constança, 72 – Lapa, São Paulo/SP. Próximo à estação de trem e terminal de ônibus Lapa.
Entrada Gratuita.
Organização: Biblioteca Terra Livre

FB: https://www.facebook.com/events/113576179358627/

Conteúdo relacionado:
https://noticiasanarquistas.noblogs.org/post/2015/12/01/relato-e-fotos-da-vi-feira-anarquista-de-sao-paulo/

agência de notícias anarquistas-ana
a vida é lida
ou vira
casca de ferida


Jandira Mingarelli
 

#ObjetivoCataluña - por Latuff


Fonte: https://twitter.com/LatuffCartoons

quarta-feira, 25 de outubro de 2017

Sobre a temporada de caça a Jessé Souza

Sobre a temporada de caça a Jessé Souza

"A publicação do meu último livro “A elite do atraso: da escravidão à lava jato” (Leya, 2017) tem provocado reações intensas seja na direita seja na esquerda do espectro político. Dado o conteúdo explosivo do livro, desvelando os meandros da dominação simbólica que permite a rapina material da ínfima elite brasileira sobre a sociedade como um todo, a reação é mais do que esperada.

Da parte da direita, por meio como sempre dos grandes jornais, a tentativa reflete o <“modus operandi” da guerra ideológica á qual estamos submetidos. Do mesmo modo que nas guerras materiais mandam-se os mais jovens e mais afoitos ao campo de batalha como bucha de canhão, o mesmo procedimento vale para as guerras ideológicas. Os jovens, ansiosos pela glória militar rápida, se prestam a matar ou morrer e realizar o serviço sujo de quem comanda a investida dos bastidores.

Foi assim no recente golpe parlamentar onde o jovem procurador Deltan Dallagnol e o jovem juiz Sérgio Moro lideraram a infantaria que logrou destruir as bases do Estado de direito e suspender as garantias jurídicas no pais com apoio da coação seletiva da mídia aos seus inimigos de classe. A banalização da democracia que hoje vivemos é resultado direto dessa investida.

Do mesmo modo, o jornal “Folha de São Paulo” do último Domingo escala o jovem historiador Thiago Krause para se contrapor ao meu apertado resumo do livro apresentado duas semanas atrás no mesmo jornal. O afoito jovem sequer leu livro que deveria criticar e, ao modo das redes sociais de hoje em dia, formou posição a partir de um resumo de duas laudas. Se tivesse lido o livro não teria centrado seu argumento em uma disjuntiva entre desigualdade e corrupção que simplesmente não existe no livro.

A tese do livro é exatamente contrária. A manutenção da desigualdade e do ódio ao pobre é funcional para que se desvie a atenção da corrupção real, realizada pela intermediação financeira e pelos oligopólios de comunicação, a qual é distorcida e invisibilizada pela conveniente manipulação midiática da corrupção dos tolos, apenas da política. Assim se mantêm as duas ilusões objetivas da dominação social moderna: a ilusão que a mídia distribui de modo neutro a informação, e a ilusão de que os bancos apenas distribuem dinheiro, quando, obviamente participam e lucram com todo esquema de corrupção. O incauto Krause diz insanidades sobre Sérgio Buarque, inverte o sentido de sua obra, assim como a esquerda brasileira faz há um século, e termina por legitimar a Lava Jato. A trama se fecha em um círculo perfeito.

Que a Folha de São Paulo e a grande mídia façam isso é compreensível. Ela existe para isso e lucra com isso. Mas venho recebendo ataques do mais baixo calão de professores da USP e afins por ter reconstruído os vínculos institucionais da dominação simbólica que mantém a sociedade brasileira, inclusive sua esquerda, colonizada e dominada pelo discurso de seu inimigo. Que a USP participou de modo constitutivo nessa trama e foi criada para isso acho que o livro não deixa lugar a dúvida. É um fato histórico. O que não significa que não existam hoje e tenham existido sempre pesquisadores respeitáveis e admiráveis em seus quadros.

Mas o que acho que provoca efetiva dor de cotovelo nos meus detratores é o fato de ter conseguido, com muito esforço, expor questões complexas de modo simples e compreensível para a maioria das pessoas. Foi a minha maior vitória como pesquisador ter me livrado de minha couraça escolástica, com tudo de ruim e nocivo que ela representa, e poder transmitir o produto de quase 40 anos de estudo e de pesquisa séria para quem realmente precisa e deseja.

A “escolástica”, ou seja, a pretensão que domina uma parte da academia de falar em linguagem hermética só compreensível para iniciados, com citações recíprocas do círculo de amigos para dar a ilusão de importância, é imitação do mais perverso elitismo. É o uso do conhecimento como enfeite e prazer onanista do mesmo modo que a elite financeira usa o dinheiro: como meio de distinção e gozo narcísico. O conhecimento é uma arma poderosa demais para ficar nestes limites restritos.

Eu não disse no “A elite do atraso”, nada que já não venha construindo desde a publicação do “A modernização seletiva” de 2000, passando pelo “A construção social a subcidadania” de 2003, e os trabalhos teórico-empíricos da “A ralé Brasileira” 2009, e os “batalhadores brasileiros” 2010, até o “A tolice da inteligência brasileira” de 2015. A diferença foi unicamente a linguagem mais escolástica desses trabalhos que alguns imbecilizados pelo debate superficial das redes sociais – que só leem entrevistas e comentários de cinquenta linhas - confundem com “rigor científico”. Nunca recebi uma crítica fundamentada até hoje de meus compatriotas a nenhum desses trabalhos. Ao contrário, fui sempre muito elogiado precisamente pelo meu “rigor científico”, seja nos trabalhos teóricos, seja nos trabalhos empíricos, até por quem, hoje, me critica da maneira mais vil e baixa. E observem que sempre fui argumentativamente muito duro com quase todos com quem polemizei – que foram muitos - embora jamais tenha sido desleal nem atacado pessoalmente ninguém.

Isso tudo me leva a crer que meu crime, agora, foi ter me transformado em um autor que toca nas questões essenciais, em um país saqueado e sem rumo, com uma linguagem que as pessoas comuns podem entender. Isso é intolerável para uma parte da academia – inclusive da esquerda ou que se imagina enquanto tal - que nunca se identificou com o estudo das questões reais do país e que usam seu capital cultural como outros usam o dinheiro. Pior ainda. Usei tudo que aprendi em décadas de estudos nas melhores universidades do mundo e com o estímulo de alguns dos melhores pensadores vivos para tornar o mundo social e suas fraudes compreensíveis para um porteiro e para uma enfermeira. Esse é meu verdadeiro crime para meus detratores.

Como isso implica também – muita - venda de livros e reconhecimento social pelo trabalho realizado, a dor de cotovelo é compreensível. O fato de meu maior reconhecimento ter se dado em São Paulo - cidade que me acolheu como nenhuma outra e onde encontrei os melhores amigos de minha vida – sendo um nordestino, complica mais ainda a situação de alguns. Alguns me confundiram com mineiro e me mandaram voltar a Minas Gerais. O preconceito regional se alonga no de classe. Não tenho nem quero ter a “politesse” de classe de grande parte da elite intelectual a mesma que sempre se uniu aos interesses dos poderosos. Minhas palavras são duras e secas, porque acredito, com Graciliano Ramos, que é a verdade também é dura e seca. De resto, como aprendi com minha mãe, retirante nordestina, a me tornar mais obstinado quanto maior for a reação, isso não me tira o sono. É uma reação natural a toda ideia verdadeiramente inovadora e forte, como diria Nietzsche.

Aproveito a ocasião para convidar, de público, o Prof. Ruy Braga da USP para um debate público na PUC no dia 21 de Novembro de 2017. Que sua sanha seja usada para o bem, um possível aprendizado mútuo e certamente produtivo para o público que é o principal."

Por Jessé Souza

Arrendamento: mais uma armação dos ruralistas pra cima dos indígenas! - por Latuff

Fonte: https://twitter.com/LatuffCartoons

segunda-feira, 9 de outubro de 2017

[EUA] Ajoelhar-se pela justiça: O ato de Kaepernick, por Mumia Abu-Jamal – A.N.A.

[EUA] Ajoelhar-se pela justiça: O ato de Kaepernick, por Mumia Abu-Jamal
Um ato do ex 49ers do San Francisco Colin Kaepernick tocou um ponto sensível em todo o país. Há vários meses [na pré-temporada de 2016 da NFL] o talentoso quarterback tomou a decisão de manter-se de joelhos durante o hino nacional para chamar a atenção para o terrorismo policial contra pessoas negras.

Está pagando um preço muito alto por seu ativismo baseado em princípios – um preço que os não-atletas apenas podem compreender.

Os atletas profissionais não são simplesmente homens e mulheres que praticam um esporte para divertir-se. Os atletas de elite, especialmente a nível profissional, passaram uma grande parte de suas vidas no fisioculturismo para ganhar maior tônus muscular e aperfeiçoar seu ofício; alguns começaram na escola secundária ou preparatória. Sua firme devoção a um esporte produz uma capacidade de centrar-se que poucas pessoas jamais conseguem.

O fato de que Kaepernick [atualmente sem time] está sacrificando sua carreira profissional ante a hostilidade da NFL [principal liga de futebol americano dos Estados Unidos], fala bem do homem.

Seu protesto sustentado nos faz pensar nos esforços anti-guerra do falecido Muhammad Ali. A decisão de tirar sua licença para boxear lhe negou o êxito quando estava no topo de sua carreira. A perda não só foi sua, senão de todos seus fãs.

Da mesma maneira, os atletas John Carlos e Tommie Smith viveram muitos anos de repressão e discriminação por haver alçado o punho em saudação ao Poder Negro durante a entrega das medalhas nos Jogos Olímpicos de 1968 no México.

Colin Kaepernick segue nesta orgulhosa e honrada tradição, porque ao ajoelhar-se, ele se levanta por justiça para milhões de pessoas cujas vozes foram sufocadas.

Desde a nação encarcerada, sou Mumia Abu-Jamal.

Domingo, 24 de setembro de 2017
N. da T.: Centenas de jogadores seguiram o exemplo de Kaepernick e ainda mais nas recentes partidas da NFL após Donald Trump criticar os protestos e insultar os jogadores de futebol americano que protestam de tal forma, chamando-lhes “filhos da puta”. “Se os fãs da NFL se recusassem a ir às partidas até que os jogadores deixassem de faltar com o respeito à nossa bandeira e ao nosso país, veríamos uma mudança rápida. Que sejam demitidos ou suspensos“, afirmou o presidente no Twitter.

Tradução > Sol de Abril
Conteúdo relacionado:
https://noticiasanarquistas.noblogs.org/post/2016/08/24/eua-atletas-e-herois/

agência de notícias anarquistas-ana
Suave crepúsculo
Sol emoldurando o ocaso
O pássaro sonha


Tânia Souza
Fonte: https://noticiasanarquistas.noblogs.org/

O grupo da mão invisível – por Bruno Abbud

O grupo da mão invisível
Dois meses de conversas no WhatsApp do MBL

Na última terça-feira de julho, uma mensagem apitou no celular de Kim Kataguiri, principal líder do Movimento Brasil Livre. Conhecido nacionalmente como a face pública do MBL, ele acabara de ser incluído em um grupo de WhatsApp chamado “MBL – Mercado”. A cúpula do grupo – que ganhou notoriedade nas redes sociais clamando pelo impeachment de Dilma Rousseff – também estava lá: os irmãos Renan e Alexandre Santos, o vereador democrata de São Paulo Fernando Holiday, o youtuber oficial do movimento e dono do canal “Mamãe Falei”, Arthur do Val, e Pedro Augusto Ferreira Deiro, também conhecido como o funkeiro Pedro D’Eyrot. O grupo, criado por um entusiasta do MBL, serviria como interface entre o movimento e executivos de médio e alto escalão do mercado financeiro – pelo menos 158 funcionários de instituições como Banco Safra, XP Investimentos e Merrill Lynch. Objetivos iniciais: levantar dinheiro para financiar o MBL e levar as pautas dos executivos às discussões públicas e aos encontros a portas fechadas que os membros do MBL teriam com políticos e lideranças nacionais. Contudo, muito mais seria dito.
A piauí teve acesso ao histórico de conversas do dia 25 de julho (13h49) até a última quarta-feira, 27 de setembro (20h25). As trocas de mensagens durante esses dois meses renderam 685 páginas de bate-papo que tratam de temas como saúde, segurança pública e educação. Os debates acalorados aconteciam, no entanto, quando o grupo falava de seu principal assunto no momento: o PSDB. Em meio a uma guerra fria entre o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, e o prefeito paulistano, João Doria – que disputam nas coxias o cargo de candidato à Presidência da República no próximo ano –, o partido é tratado como um território a ser pilhado pelo MBL. O movimento quer drenar parte das jovens lideranças tucanas – as quais chamam de “cabeças pretas” –, deixando os decanos do partido – os “cabeças brancas” – à deriva.
“A ideia é deixar todo esse povo podre afundando com o psdb e trazer a galera mais Jovem e liberal pro mbl”, respondeu Kim Kataguiri em 22 de agosto a um participante temeroso de que o grupo se juntasse ao tucanato. Outro líder do movimento, Alexandre Santos, emendou: “Mas não estamos nos juntando ao PSDB. Muito menos ao Aecio, Beto Richa e Alckmin.” Ao serem questionados se o MBL teria “algum preconceito com pessoal mais velho”, referindo-se aos tucanos mais antigos, Kataguiri teclou: “Com os do PSDB temos preconceito, conceito e pós-conceito. São pilantras.” No dia seguinte, Renan reforçou, em um áudio enviado ao grupo: “Não bastava a gente tirar o PT do poder, estamos destruindo o PSDB ali, essa ala de esquerda tá desesperada, estamos pegando os melhores nomes deles e, ou eles vão sair, ou eles acabam fortalecendo e tomam partido e tiram essa esquerda aí. Mas a esquerda do PSDB tá desesperada, e não para de vir novas lideranças do PSDB pro time. Doideira. Bom dia, aí.”
Os alvos principais no partido são os senadores Aécio Neves e José Serra, e também o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin.
Serra surge nas conversas no dia 22 de agosto, quando se alinhou ao senador petista Lindbergh Farias pela suspensão das discussões sobre a nova taxa de juros do BNDES, mais alta que a atual, desejada pelo governo Temer e encampado pelo MBL. Farias e Serra tentaram protelar a votação da Tarifa de Longo Prazo (TLP) até que ela caducasse sem ser apreciada. Em áudio, Renan Santos comentou: “E ontem o Serra, por exemplo, que é dessa ala de esquerda, tava com o Lindbergh Farias indo contra o TLP, imagina? Vagabundo.” Logo recebeu apoio: “Vagabundo mesmo Renan”, disse um membro. “PSDB e Serra ontem morreram para mim. Carga total no Novo/MBL/VPR e Doria”, disse outro. A TLP seria aprovada dias depois.
Aécio Neves aparece no dia 5 de setembro, quando um participante postou a seguinte mensagem em relação à operação que flagrou o senador mineiro, em grampo, pedindo 2 milhões de reais ao empresário Joesley Batista, da JBS: “E o Aecio… dispensa comentários… Que termine o mandato e seja encarcerado na sequência…” Renan Santos respondeu: “Tb acho”, disse. Mas justificou o que prenunciaria uma mão leve nas críticas públicas feitas pelo MBL ao senador: “Só não vamos alterar a configuração atual das forças políticas nem fornecer uma narrativa que favoreça o ressurgimento da esquerda enquanto isso. Essa é a tônica do que defendemos.”
Alckmin é citado quando um membro comenta a notícia, veiculada em 27 de setembro, de que o ex-ministro dos governos Lula e Dilma e ex-deputado federal Aldo Rebelo seria o vice do governador de São Paulo em uma eventual disputa pela Presidência da República. Os irmãos Santos trocaram mensagens. Alexandre escreveu: “Aldo Rabelo é fim de linha. O bom é isso sepulta de vez o xuxu.” Renan respondeu: “Po. vamos torcer.”
As críticas ao PSDB deixam os inimigos tradicionais do MBL como coadjuvantes no ringue. Não faltam, é claro, porretadas em Dilma, em Lula, no PT, no PSOL, em Marina Silva e na Rede. Mas outros possíveis adversários aparecem com mais destaque: Jair Bolsonaro (“tosco”, “ignorante”, “sem noção”, “inadmissível”) e Luciano Huck – que, caso saia candidato, poderia “diluir o voto da direita”, enfraquecendo Doria. “Ele é piada”, disse Renan Santos. Quinze minutos depois, completou: “Huck é lixo. Politicamente correto, desarmamentista, ambientalista de boutique, intervencionista.”
O esvaziamento do PSDB engendrado pelo MBL no grupo de WhatsApp parece ter como objetivo final tirar o prefeito de São Paulo, João Doria, do partido. O apoio à candidatura de Doria dá o tom em várias conversas durante os dois meses de debates. No dia 5 de agosto, o movimento produziu um vídeo e postou nas redes sociais, compartilhando no grupo fechado logo em seguida. O título: “Que coisa feia, prefeito… Kim Kataguiri detona racismo e xenofobia de João Doria.” Sem assistir ao vídeo, alguns membros se mostraram preocupados com o título polêmico que parecia uma crítica ao prefeito. Alguém tratou de jogar panos quentes: o título era, na verdade, irônico – seu conteúdo era amplamente favorável a Doria.
Não convencidos, participantes questionaram se aquele tipo de ação não causaria mal-entendidos nas redes sociais (“Aposto que tem gente de esquerda compartilhando o video sem ver, achando que a crítica é realmente ao Doria…”, alertou um). O líder Renan Santos respondeu, com duas mensagens: “Esse tipo de chamada em video e noticias, como um clickbait, funciona legal. Seria uma estratégia babaca se o vídeo não fosse bem humorado, mas a ideia justamente era fazer algo leve. O Doria adorou kkk.”
No dia 16 de agosto, quando comentavam sobre a possível trucagem engendrada pela Rússia nas eleições dos Estados Unidos, um participante teclou sobre a consultoria política Cambridge Analytica, que teria usado bases de dados disponíveis na internet para influenciar a eleição de Trump e a saída do Reino Unido da União Europeia. Mesmo diante da postura cética de alguns membros, o participante enfatizou: “Isso é muito sério, gente. E podem ter certeza que vai ser usado aqui em 2018. Só espero que o Doria ja tenha fechado contrato de exclusividade com a Cambridge analytica. Rss.”
Três dias depois, quando o prefeito de São Paulo disse publicamente que aceitaria se candidatar à Presidência pelo PSDB, outro participante comemorou: “Go Dória.”
No fim da tarde do último domingo de agosto, Renan Santos mandou uma mensagem em tom definitivo para o grupo que ansiava por uma decisão do prefeito paulistano: “Jd será candidato”, teclou, referindo-se a João Doria, sem, no entanto, citar a fonte da informação. Alguém respondeu: “Dória e ACM Neto é o gabarito.” Em outras três mensagens, Santos continuou: “Com ou sem psdb. A aliança q pode lhe eleger está no pmdb dem evangélicos agro e mbl. Nosso trabalho será o de unir essa turma num projeto comum.” E completou, menos de meia hora mais tarde: “Espero, de coração, q a tese q a gente defende (aliança entre setores modernos da economia + agro + evangelicos) seja aplicada. É a melhor forma de termos um pacto politico de centro-direita, q dialoga com o campo e com a classe C.”
Se no grupo fechado o MBL garantia que estava trabalhando para roer o PSDB por dentro, publicamente a postura do grupo era diversa. Em fins de setembro, o movimento disparou no Twitter: “Tem ninguém aqui querendo rachar a direita”, dizia a mensagem, para seus 91,5 mil seguidores. E completava: “Uma pena que tenha gente querendo destruir o MBL com facada nas costas.”
As conversas ajudam a elucidar, mesmo que parcialmente, um dos maiores mistérios que cercam o MBL: como o grupo se financia. “O MBL não está exatamente nadando em dinheiro. Os caras precisam ir pra Brasília de ônibus”, disse o criador do grupo de WhatsApp e entusiasta do movimento em 27 de julho, dois dias depois de iniciada a troca de mensagens. A partir daí contribuições se tornaram assunto recorrente.
Uma planilha foi criada para que os integrantes do “MBL – Mercado” registrassem seus dados e o valor das doações. No início da tarde de 9 de agosto, uma quarta-feira, um deles anunciou: “já mandei 15 mil e vou mandar mais”. “Opa! Foi hoje?”, respondeu Alexandre Santos, no mesmo minuto. “Hoje não mandei, vou mandar mais tarde. Os 15k mandei faz um mês.” Com a ajuda de integrantes que atuam como arrecadadores (enviaram 12 vezes o link com a planilha), a tática de convencimento pessoa a pessoa ficou aparente.
De tempos em tempos, a evolução dos aportes foi sendo informada pelos participantes. E as mensagens serviam como uma espécie de livro-caixa do MBL naquele grupo: em duas semanas, foram arrecadados mais de 50 mil reais, reforçados, aparentemente, por um evento presencial. Além das contribuições esporádicas, os integrantes descreveram uma receita fixa mensal que, no período das conversas, só cresceu. Também na quarta-feira, 9 de agosto, um balanço da planilha feito pelos integrantes indicava que um punhado de apoiadores já doavam, somados, 2 380 reais todo mês. No dia seguinte, já eram 5 780 reais fixos por mês na soma de todos os apoiadores.
A tabela de Excel que fazia as vezes de livro-caixa passou dias sem registrar novos doadores, o que incomodou um dos participantes. No dia 17 de agosto, logo cedo pela manhã, ele decidiu pressionar os demais. Escreveu: “Agora, sem querer dar uma de moderador chato, tem um pessoal que ta cagando pra preencher essa xls. tudo em branco ainda. xls ja ta aqui faz quase tres semanas. das duas, uma: ou quem nao preencheu nao lê esse grupo faz semanas e nao viu o pedido pra preencher, ou simplesmente ta cagando mesmo pro mbl rs. em ambas as hipóteses, acho que a pessoa nao deveria estar aqui. right?”
E voltou à carga, 15 minutos depois: “Acho que temos graus de afinidades diferentes no grupo, nem por isso penso em excluir os que ainda não se sentem 100% prontos para contribuir de forma efetiva. Se não conseguirmos mostrar o valor dessa parceria entre nós que estamos alinhdos, sinal que estamos fracos contra os reais adversários, e gosto da ideia de ter o contraponto “razoável” aqui dentro… mas claro, alguma hora, cada um tem que tomar a decisão: avaliou, discutiu, pensou… entao ou se engaja mais ou abre espaço pra outro.”
A pressão funcionou. No dia seguinte, as doações de 37 integrantes já somavam 8 510 reais mensais.
Para formar uma espécie de distinção entre seus membros, o MBL criou nomes que seriam dados conforme os valores depositados mensalmente. A maioria dos participantes optou pelo plano “Mão Invisível”, de 250 reais por mês, o que garante ao doador a participação em jantares e reuniões. Outros planos receberam nomes como “Agentes da CIA” (30 reais por mês), “Exterminador de Pelegos” (500 reais mensais) e “Privatiza Tudo” (5 mil reais todo mês). Esses, pagos via PayPal.
As trocas de mensagens renderam também outro tipo de auxílio nas despesas do movimento: a transferência de milhas aéreas não usadas pelos executivos, para utilização em viagens dos integrantes do MBL. Outra planilha também foi criada para o controle. “Era legal você ter acesso a isso”, disse Alexandre Santos a Kim Kataguiri. Em menos de um dia, 400 mil milhas foram doadas e, em um mês, dezessete pessoas haviam doado 959 mil milhas, segundo a troca de mensagens – ou, mais de 20 mil reais, pelas contas de um dos integrantes, com base em passagens aéreas de São Paulo a Brasília. “Muito obrigado pelas milhas, pessoal! Vou sentir saudade das garrafinhas de água e dos biscoitos cream cracker do busão”, escreveu Kataguiri.
O presidente Michel Temer é citado 76 vezes no grupo. Pelas conversas, o MBL – que foi uma das maiores forças para derrubar Dilma – tem uma relação utilitarista com o político: não o defende abertamente, mas se utiliza do poder de pressão para aprovar a agenda política, cultural e econômica do movimento.
No dia 2 de agosto, um membro postou uma notícia informando que o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, já tinha quórum para votar a denúncia feita pela Procuradoria-Geral da República, que acusava Temer de corrupção passiva. Nenhum líder do MBL respondeu. Duas semanas depois, um participante comentou em três mensagens distintas: “Reunião com Deputado federal do DEM agora. Disse que governo Temer precisa focar em reforma da previdência na divulgação nas redes sociais. Precisam de ajuda na comunicação para população entender.” Um minuto depois, Renan Santos, do MBL, se prontificou: “Já estamos, soltamos dois videos.”
No dia 21 pela manhã, uma segunda-feira, um participante perguntou: “O MBL vai participar do protesto este domingo?”, referindo-se a uma marcha contra a corrupção convocada por movimentos sociais e sites ligados à direita, que aconteceria no dia 27. Quinze minutos depois, Kim Kataguiri respondeu: “Não vamos. Achamos que é um tiro no pé, não há clima para mobilização, qualquer que seja a pauta.” Um mês depois, durante uma discussão sobre reformas, Renan Santos disparou, possivelmente referindo-se a Temer: “E é o seguinte: vamos tentar botar pra frente essa previdência. Ainda da tempo. O zumbizão ta lá pra isso kkk.”