quinta-feira, 31 de julho de 2014

2002, 2006, 2008, 2014: continua o genocídio sionista em Gaza – por Achille Lollo


2002, 2006, 2008, 2014: continua o genocídio sionista em Gaza
O objetivo do genocídio é a submissão total de um povo a outro; é uma decisão política para quebrar o espírito de resistência dos opositores
 
Pela sexta vez, em menos de oito anos, tive de escrever uma página do jor­nal para relatar o massacre dos palesti­nos em Gaza. Um genocídio politicamen­te autorizado pelo governo sionista de Benjamin Netanyahu. Um crime contra a humanidade planejado pelos generais do Tzahal e executado, cada vez mais cien­tificamente, por 74 mil soldados e cente­nas de pilotos.

Enfim, um massacre que 86% daque­le povo que se acha predileto e escolhido por Deus invoca, aplaudindo todos aque­les que o realizam, para depois linchar, física e verbalmente, quem denuncia e defende o direito dos palestinos em ter um Estado livre e independente.

Por outro lado, quem, minimamen­te critica ou questiona esse contexto só­cio-político é logo censurado, estigmati­zado, difamado e, sobretudo, acusado de ser um anti-semita.

E foi o que aconteceu com Gianni Vat­timo, filósofo e ex-deputado da esquerda no Parlamento Europeu, que em uma en­trevista condenou os sionistas pela forma bárbara com que perseguem os palesti­nos desde 1948, sublinhando que “o cer­co mortal que o exército de Israel está re­alizando em Gaza é a repetição histórica do que fizeram os nazistas”.

Logo, em toda a Europa insurgiu o lo­bby midiático sionista para varrer Gian­ni Vattimo com a infamante acusação de ser um anti-semita. Somente indivídu­os ignorantes, sectários e culturalmente pobres que nunca leram um livro desse filósofo puderam detrair, injustamente, Vattimo. Entretanto, no dia 27 de julho, o lobby sionista voltou a atuar contra a cantora israelense Noa, que devia reali­zar um show em Milão, no Teatro Man­zoni. Um cancelamento feito na última hora que, na realidade, foi decidido em Tel-Aviv e implementado em Milão pela “ADEI-WIZE-Mulheres Judaicas da Itá­lia”, com o explícito motivo de censurar e punir Noa, que – por ser uma celebri­dade em Israel e no mundo – havia “ou­sado” ir a Ramallah para se encontrar com o presidente da ANP, Abu Mazem e depois declarar aos repórteres: “Sim, encontrei o líder dos palestinos em Ra­mallah e creio que Abu Mazen quer mes­mo a paz , porém, não posso dizer o mes­mo do líder do meu país” – uma atitude que faz lembrar o “ame-o ou deixe-o” da ditadura brasileira.

Um massacre histórico
Obama e o Partido Democrata sabem muito bem que as imagens dos 1.296 civis palestinos, na maioria crianças, adolescentes e mulheres, assassinados em Gaza pelos jatos e tanques do exér­cito sionista, bem como os 7 mil feridos terão um peso determinante na esco­lha do próximo candidato à presidên­cia dos EUA.

Por isso, Obama virou um presiden­te bicéfalo. Quando está fechado na Ca­sa Branca, declara que Israel tem todo o direito a se defender, repassando-lhe 1,6 bilhão de dólares para comprar da indús­tria militar dos EUA jatos, navios, fogue­tes e bombas de todo tipo. Depois, quan­do se encontra com os jornalistas, fala como um marciano que, pela primeira vez, descobre que na terra há um conflito em um território chamado Gaza, onde é preciso uma trégua além de abrandar as operações para socorrer os civis.

O cinismo de Obama, mas também de François Hollande, Angela Merkel, Nick Cameron e do próprio presidente italia­no, Giorgio Napolitano, é tão seleto, tão bem dissimulado que muitos acreditam que os apelos para uma trégua humani­tária de 8 horas sejam verdadeiros ape­los para a paz.
Na realidade, todos eles querem que o exército do governo sionista seja me­nos açougueiro e mais cirurgião. Todos eles esperam que Israel consiga que­brar o Hamas, porque esse é o último sustentáculo da luta de resistência do povo palestino.

Se o Hamas for derrotado, com a con­sequente desmilitarização e monitora­mento internacional-sionista das ativi­dades políticas na Faixa de Gaza, todo o povo palestino ficará definitivamente desbaratado e vencido. Pois, nos últimos dez anos, o Estado de Israel conseguiu aprisionar o povo palestino limitando a representação política da chamada ANP (Autoridade Nacional Palestina) em ter­ritórios, praticamente separados e fecha­dos pelo Muro da Vergonha e por corre­dores rodoviários municiados pelo exér­cito sionista.

Acordos de Oslo
Por outro lado, os governos ociden­tais e também os árabes ficaram calados diante da contínua ocupação de terras palestinas para construir colônias e con­domínios judaicos – um projeto financia­do por transnacionais e bancos europeus e estadunidenses que, gradualmente, de­sarticulam e desintegram a única vitória de Yasser Arafat nos Acordos de Oslo, is­to é: a esperança de construir um Estado palestino independente.

Hoje, a esperança de poder, finalmen­te, realizar o projeto político “Dois Es­tados para Dois Povos”, com a criação do Estado da Palestina, livre e indepen­dente, ao lado do Estado de Israel pra­ticamente morreu com a operação mili­tar “Protective Edge”, na qual prevale­ceu a sistematização do massacre e a ló­gica do extermínio, nos moldes do que dizia Karl Von Clausewitz “A guerra na­da mais é que a continuação da política por outros meios”.

Porém, é preciso sublinhar que o go­verno sionista não foi o único responsá­vel desse crime histórico. Benjamin Ne­tanyahu e Shimon Peres, hoje, são ape­nas os coveiros de um processo histórico repleto de finalidades ambíguas e opor­tunistas, já que os Acordos de Oslo, em 1993, foram também a solução que a Ca­sa Branca encontrou para engavetar as reivindicações de Arafat e permitir a Tel Aviv controlar a primeira Intifada, que explodiu, em 1987, como um grande le­vante popular do povo palestino. Levan­te que tinha referências políticas especí­ficas ditadas pelas organizações revolu­cionárias (Al-Fatah, FPLP, FDLP) que, por isso, foram massivamente reprimi­das pelo exército sionista.
De fato, o aprisionamento da maior parte dos dirigentes e militantes dessas organizações foi também uma contribui­ção política da burguesia palestina que, em troca, ganhou o direito de enriquecer fazendo grandes negócios com a indús­tria israelense graças aos planos de ajuda internacional para a reconstrução das ci­dades da Cisjordânia.

Por exemplo, após o assassinato, por agentes sionistas do Mossad, do então secretário-geral da FPLP, Abu Ali Mus­tafá (que substituiu George Habash, um dos fundadores da FPLP), o governo sio­nista exigiu, em 2002, que a polícia da ANP prendesse em Gaza Ahmad Sa’adat, o novo secretário-geral da Frente Popu­lar pela Libertação da Palestina (FPLP). Ahmad Sa’adat foi preso e depois entre­gue aos tribunais israelenses que o con­denaram a 30 anos de isolamento, finali­zando, assim, o processo de decapitação política das organizações revolucionárias e marxistas palestinas.

O papel do Hamas
Se organizações como Al-Fatah, FPLP, FDLP, CG-FLP nasceram para derrotar o Estado de Israel, o Hamas vi­rou opositor de Israel por efeito da con­juntura política. De fato, o Hamas foi criado em 1987 pelos xeques Ahmed Yassim, Mohammad Taha e Abdel Aziz al-Rantissi, que representavam a ala palestina na Irmandade Muçulmana do Egito, oficialmente reconhecida em Is­rael. A Arábia Saudita financiou o pro­jeto dos três xeques para, inicialmente, desenvolver uma ampla assistência so­cial, a construção de mesquitas e uma intensa ação comunitária na Cisjordâ­nia e na Faixa de Gaza.

O partido político do Hamas apare­ceu somente depois da primeira Intifa­da, para depois, em 2006, assumir uma dimensão nacional derrotando o Al-Fa­tah nas eleições para o Parlamento Pa­lestino, para o governo da Faixa de Ga­za e das cidades de Nablus e Qalqilyah. Em 2007, os combates para expulsar o Al-Fatah de Gaza determinaram a afir­mação do braço militar do Hamas, de­nominado Brigadas Izz ad-Din al-Qas­sam. Começava, então, para o Hamas uma nova perspectiva política e militar, virada para o enfrentamento direto com Estado sionista e para criar um Estado muçulmano palestino. Uma tese que, em 1988, era vagamente mencionada na Carta de Princípios do Hamas.

Para o governo sionista, a atividade be­neficente do Hamas continua sendo a fa­chada artificial de uma organização fun­damentalista, voltada para mobilizar e transformar os jovens palestinos em ter­roristas. Na realidade, a popularidade do Hamas é uma consequência dos erros do grupo político majoritário do Al-Fatah, ligado a Yasser Arafat, e da conduta cor­rupta da burguesia palestina, cujo candi­dato à sucessão de Arafat foi o inexpres­sivo Abu Mazen.

Por isso, nessas condições específicas e com o Estado de Israel que aumentava a repressão e o latrocínio das terras, o Ha­mas se tornou o símbolo da resistência para a maioria dos palestinos. Um sen­timento que, inevitavelmente, concreti­zou-se em pouco tempo, também, graças às ações violentas praticadas pelos co­lonos e, sobretudo, pelo exército sionis­ta nas inúmeras tentativas de subjugar e expulsar o Hamas de Gaza.

Podemos, portanto, dizer que em Ga­za se fechou o ciclo político do Al-Fatah, a partir do qual a luta do povo palestino assumiu uma nova dimensão, determi­nada por um novo ciclo que as três ver­tentes políticas do Hamas decidiram as­sumir diante da arrogância expansionis­ta do Estado sionista.

Responsabilidades da ONU
Quando em julho de 2001, em entre­vista a uma rádio, o falecido ministro do Turismo de Israel, Rehavam Ze’evi, líder da extrema-direita sionista, manifestou­-se publicamente a favor da limpeza ét­nica dos palestinos, afirmando: “Nós de­vemos nos livrar daqueles que não são cidadãos israelenses como quem se li­vra de um câncer”, a ONU, e em parti­cular o Conselho de Segurança, deveria ter tomado uma drástica posição, porque aquelas declarações, proferidas publica­mente por um membro do governo isra­elense, na realidade, revelavam como a política da impunidade havia transfigu­rado os ideais do sionismo.

No Conselho de Segurança daqueles anos, ninguém quis entender que as pa­lavras de Ze’evi não eram apenas slogans de um extremista direitista. Lamentavel­mente, a partir desse período, os concei­tos de limpeza étnica e de separação ter­ritorial começaram a ganhar o coração e as mentes da maioria dos cidadãos do Estado de Israel.

Mesmo assim e apesar do que tinha acontecido em Beirute e no sul do Líba­no, o Conselho de Segurança nunca cau­telou o povo palestino com uma resolu­ção efetiva e capaz de garantir com auto­ridade a paz e a convivência entre o po­vo judeu e o palestino. Um Conselho de Segurança que, também, nunca pensou que os palestinos tivessem direito a ter um próprio Estado, já que os interesses geoestratégicos dos Estados Unidos, da Grã-Bretanha e da França sempre jus­tificaram o veto político, enquanto as poucas resoluções que saíram em favor do povo palestino, na realidade, nunca foram implementadas.

Hoje, a patética aparição do secretário­-geral da ONU, Ban Ki-moon evidencia, ainda mais, a incapacidade estrutural das Nações Unidas de ser, efetivamente, a entidade mundial que tem uma reco­nhecida autoridade política e moral ap­ta a se colocar acima dos interesses dos governos. Por outro lado, a continuação de um massacre realizado por um exérci­to considerado um dos mais fortes e bem equipado do mundo demonstra quanto é inútil um Conselho de Segurança que é eficaz em defender, sobretudo, os in­teresses geoestratégicos das grandes po­tências imperiais, porém, incapaz de ga­rantir a paz, a convivência e a segurança a todo o mundo.


Fonte: http://www.brasildefato.com.br/

Após três semanas de ataques em Gaza, contabilidade macabra só aumenta!


Após três semanas de ataques em Gaza, contabilidade macabra só aumenta! 
Israel decidiu continuar a ofensiva e não há sinal de uma interrupção no conflito que já dura três semanas, matando dezenas de pessoas a cada dia.
 
Um bombardeio de Israel matou pelo menos 19 palestinos refugiados em uma escola administrada pela ONU (Organização das Nações Unidas) na quarta-feira (30). Outro ataque aconteceu na região de um mercado perto de Gaza, em que 17 palestinos morreram. Segundo a agência Reuters, 96 palestinos e três soldados israelenses morreram apenas na quarta-feira por conta da ofensiva de Israel.

Estima-se que muitos civis palestinos procurem abrigo nas escolas da ONU, especialmente em Jabalia, maior campo de refugiados palestinos existente, situado no norte da Faixa de Gaza, perto da fronteira israelense. O número de desalojados aumentou depois da advertência do Exército de Israel sobre a possibilidade de bombardeios em massa contra seus bairros. De acordo com a missão das Nações Unidas, só no norte da Faixa de Gaza, 70 mil civis deslocados estão abrigados em escolas.

No total, cerca de 180 mil habitantes do território palestino estão refugiados, em condições muito precárias, nas 83 escolas geridas pela UNRWA (Agência das Nações Unidas de Assistência aos Refugiados da Palestina). Depois do ataque, a agência da ONU acusou o Exército de Israel de “grave violação do direito internacional”.

“Ontem à noite, crianças foram mortas enquanto dormiam ao lado de seus pais no chão de uma sala de aula em um abrigo da ONU em Gaza. Crianças mortas enquanto dormiam; isso é uma afronta para todos nós, uma fonte de vergonha. Hoje o mundo está em desgraça”, afirmou Pierre Krähenbühl, comissário-geral da UNRWA.

O Exército israelense tentou negar a autoria do ataque na escola das Nações Unidas, argumentando que a região teria sido alvo de militantes armados.

Israel decidiu continuar a ofensiva e não há sinal de uma interrupção no conflito que já dura três semanas e deixou 1.346 mortos palestinos, 56 soldados e três civis mortos israelenses. Na terça-feira, o porta-voz do Ministério da Saúde de Gaza, Ashraf Al Qedra, explicou que os ataques por terra, mar e ar se intensificaram ao longo do dia e que dois terços das vítimas deles são civis, incluindo mulheres e crianças.

Segundo Ashraf Al Qedra, as forças armadas israelenses “atacaram casas, edifícios, centros de imprensa, desabrigados, mesquitas e áreas rurais”. Testemunhas e forças de segurança palestinas informaram que os piores bombardeios de ontem foram contra várias moradias do campo de refugiados de Al Bureij, na região central de Gaza, onde morreram 17 pessoas – entre elas, o prefeito local, Anis Abu Shamalah, além de vários menores e mulheres.

Em um dos ataques israelenses, foi atingida a casa do líder do Hamas na Faixa de Gaza, Ismail Haniya, que não estava no local. A casa dele, que foi primeiro-ministro em 2006, ficou completamente destruída, segundo informou a TV Al Aksa.

Na terça-feira, também atingida a única central elétrica da Faixa de Gaza, que está em chamas após receber ao menos um disparo de artilharia. O porta-voz Fathi Jalil disse à agência palestina Mann que um disparo caiu em um tanque de combustível e assim o incêndio começou. Grandes colunas de fumaça negra tomam as instalações enquanto tentam apagar o fogo. Outra granada alcançou uma turbina. Até agora, os bombeiros não conseguiram apagar o fogo.

Jalil falou de consequências “desastrosas” para a região, na qual grande parte dos 1,8 milhões de habitantes depende do funcionamento da central, e pediu ajuda internacional. A central fornece eletricidade a casas, empresas, hospitais e bombas de água na região.
JARBAS -(Recife, PE)
Fonte: http://www.cartamaior.com.br/

quarta-feira, 30 de julho de 2014

Israel e o nazijornalismo ocidental – por Fábio de Oliveira Ribeiro


Israel e o nazijornalismo ocidental
Durante sua devastadora campanha aérea contra a Sérvia, a OTAN e os EUA bombardearam estações de TV e de rádio que existiam no país. A justificativa dada para atacar alvos civis foi absoltamente singela: as empresas de comunicação ajudavam a sustentar o regime infame de Radovan Karadžić que estava movendo uma guerra de conquista territorial mediante limpeza étnica.

Gaza tem sido diariamente bombardeada por Israel. Mais de mil de civis foram mortos, centenas de crianças inocentes tiveram suas vidas ceifadas em virtude de terem cometido apenas um crime: nascer em Gaza de pais palestinos. A Reuters e outras fábricas de consenso que ajudam a formatar a opinião global sobre o conflito geralmente justificam o "ponto de vista" israelense.

Quando não minimizam as baixas entre civis palestinos dizendo que os mortos e mutilados são "danos colaterais", os jornalistas culpam o Hamas por ter atacado Israel autorizando o país a contra-atacar. Os dois lados são tratados como se fossem iguais, muito embora Israel tenha centenas de aviões e tanques de guerra e Gaza não tenha nem mesmo armamentos para repelir os sofisticados e devastadores ataques mecanizados israelenses.

Apenas para exemplificar o modo de operar dos jornalistas brasileiras em favor de Israel citarei o caso do Jornal da Gazeta. Hoje o telejornal informou que bombas de israelenses caíram numa usina de energia elétrica de Gaza deixando os palestinos sem eletricidade. Disse também que o Hamas disparou mísseis contra alvos em Israel. O foco da matéria em relação aos palestinos foi a intenção do Hamas (chamado de grupo terrorista) de atingir alvos israelenses, mas a intenção de Israel de deixar quase toda população de Gaza sem eletricidade é disfarçada pelo discurso jornalístico. Ao dizer que "bombas israelenses caíram" na usina de energia o Jornal da Gazeta sugeriu ao  respeitável público que isto pode ter ocorrido por acidente (o que evidentemente é um absurdo, pois Israel está usando armamentos precisos e sofisticados made in USA).

O jornalismo sérvio foi considerado culpado por ter ajudado Radovan Karadžić . Quem culpará o jornalismo ocidental por ajudar Israel a produzir um genocídio infantil em Gaza? Esta pergunta nem mesmo é feita. Nada do que os jornalistas ocidentais façam pode ser considerado crime. Eles ajudaram os EUA a invadir o Iraque repercutindo as mentiras contadas pelos habitantes da Casa Branca e do Pentágono sobre as "armas de destruição em massa" de Saddan Hussein. E não foram responsabilizados por terem tocado os tambores de guerra para justificar a injusta agressão militar norte-americana.

Fomos enganados, disseram alguns jornalistas depois que ficou provado que o Iraque havia desmantelado completamente seus programas de "armas de destruição em massa" 4 ou 5 anos antes da invasão comandada por George W. Bush Jr. e sua quadrilha de assessores igualmente mentirosos. Centenas de milhares de iraquianos foram mortos e mutilados desde 2003. A tortura se tornou uma realidade fotográfica compartilhada na internet pelos próprios torturadores. Os jornalistas norte-americanos fizeram um acanhado mea culpa e foram receber seus cheques gordos no final do mês como se não tivessem cometido qualquer crime.

Neste exato momento os jornalistas europeus, norte-americanos e alguns de seus colegas brasileiros estão ajudando Israel a transformar Gaza em um monte de entulhos e corpos despedaçados. Eles estão lavando as mãos, sim. Mas fazem isto em bacias cheias de sangue infantil. E nem sentem vergonha quando, nos telejornais diários, culpam os palestinos por serem vítimas de crimes de guerra. Os jornalistas sérvios fizeram o mesmo e pagaram caro. Antes deles, os jornalistas nazistas fizeram algo parecido e também foram impiedosamente bombardeados. O nazijornalismo ocidental, contudo, parece determinado a seguir em frente, fomentando guerras não autorizadas pelo Conselho de Segurança da ONU como se isto fosse algo bom, belo e justo.

Hoje a Reuters anunciou no seu Twitter uma reportagem especial sobre a origem das armas utilizadas pelos rebeldes russos na Ucrânia. Nada dirá sobre a origem das armas que Israel utiliza para despedaçar crianças em Gaza? Esta omissão me parece deliberada, pois os F-16 e as bombas e mísseis que eles despejam sobre civis palestinos são made in USA. Os tanques de guerra israelenses que disparam constantemente contra as casas dos palestinos em Gaza também não são fabricados na Rússia.

Quando não estão ajudando Israel a destruir Gaza, os nazijornalistas europeus, norte-americanos e brasileiros acusam a Rússia de ter derrubado um avião de passageiro na Ucrânia. Eles fazem isto para desviar a atenção do respeitável público do único fato relevante: eles mesmos estão com as mãos ensangüentadas porque ajudam os israelenses a cometer crimes de guerra. 

Fonte: http://jornalggn.com.br/blog/

A impunidade israelense – por Robert Fisk


A impunidade israelense
 
Qual é o limite de mortes palestinas antes de decretarmos um cessar-fogo? Oito mil? Poderíamos levar um marcador? Uma taxa de troca para as mortes?
Impunidade é a palavra que vem à mente. Mais de mil palestinos mortos. Isso é infinitamente mais do que dobro do total de vítimas mortais do voo MH17 na Ucrânia. E se nos referirmos somente aos mortos inocentes – ou seja, não combatentes do Hamas, nem jovens simpatizantes ou funcionários corruptos desse partido, com quem, em seu devido tempo, os israelenses terão que dialogar – mas sim a mulheres, crianças e idosos que foram massacrados em Gaza, os números estão muito acima do total de vítimas do voo.

E há algo muito estranho em nossas reações diante desse escandaloso número de mortos. Chamamos ao cessar-fogo em Gaza, mas os deixamos enterrar seus mortos em lixões queimados pelo sol, sequer fomos capazes de abrir uma rota humanitária para os feridos. Para os passageiros do MH17 exigimos – imediatamente – a sepultura apropriada e atenção a familiares. Criticamos os que deixaram os corpos atirados nos campos do leste da Ucrânia, entretanto, o mesmo número de corpos ficou esparramado – talvez por menos tempo, mas sob um sol igual igualmente escaldante – em Gaza.

Porque –e isto me incomoda há anos – os palestinos não nos importam muito, certo? Também não nos importa a culpa israelense, que é muito maior pelo grande número de civis que o Exército Israelense assassinou. Também não, neste caso, a capacidade do Hamas. Nem Deus quereria que as cifras fossem ao contrário. Se tivessem morrido mil israelenses e apenas 35 palestinos, acredito conhecer qual seria nossa reação.

Chamaríamos a situação – e com razão – de massacre, atrocidade, um crime cujos perpetradores deveriam ser convocados para prestar contas. Sim, é preciso também responsabilizar o Hamas.

Mas, por que os únicos criminosos que perseguimos são os homens que lançaram um míssil, talvez dois, em um avião de linha que voava sobre a Ucrânia? Se os mortos em Israel se igualassem em número o número de mortos palestinos – e repito – graças aos céus não é assim – suspeito que os norte-americanos estariam oferecendo todo o apoio militar a uma nação israelense ameaçada pelos terroristas apoiados pelo Irã. Estaríamos exigindo que o Hamas entregasse os monstros que dispararam foguetes em direção a Tel Aviv. Mas não estamos fazendo isso. Porque os mortos são, em sua maioria, palestinos.

Mais perguntas. Qual é o limite de mortes palestinas antes de decretarmos um cessar-fogo? Oito mil? Poderíamos levar um marcador? Uma taxa de troca para as mortes? Ou teremos simplesmente que esperar até que o sangue chegue a nosso pescoço e então dizer que basta, que até para a guerra de Israel já é o bastante.

Não é que nunca tenhamos passado por isso. Desde o êxodo palestinos pelo novo exército israelense em 1948, como registraram historiadores israelenses, até a matança de Sabra e Chatila, quando aliados libaneses de Israel assassinaram 1700 pessoas em 1982 enquanto soldados israelenses olhavam; desde o massacre de Qana de árabes libaneses na base da ONU – sim, de novo a ONU – em 1996, até outro terrível massacre, menor, novamente em Qana dez anos depois. E o assassinato em massa de civis na guerra de Gaza em 2008/2009. E não nos lembramos que peso foi dado - algo rápido, certamente - quando o juiz Richard Goldstone fez o que pode para desacreditar o conflito após, segundo meus amigos israelenses, se ver submetido a uma pressão intensa.

Trocando em miúdos, nós já estivemos ali. Essa afirmação de que somente os terroristas têm a culpa por aqueles que o Hamas mata e por aqueles que Israel mata (terroristas do Hamas, claro). E a afirmação constante, repetida uma e outra vez, de que Israel tem as normas mais rígidas que qualquer exército no mundo e que jamais agrediria civis. Lembro aqui os 17.500 mortos da invasão israelense no Líbano em 1982, a maioria dos quais era civil. Nós nos esquecemos de tudo isso?

Além da impunidade, outra palavra que vem à mente é a estupidez. Vou me esquecer aqui dos árabes corruptos e os assassinos do Estado de Israel e todos os assassinos em massa do Iraque e da Síria. Talvez sua indiferença em relação à Palestina seja de se esperar. Eles não dizem representar nossos valores. Mas, o que pensar de John Kerry, o secretário de Estado de Barack Obama, que nos disse na semana passada que é necessário atender os assuntos subjacentes do conflito árabe-israelense? Que diabos esteve fazendo todo o ano passado, quando afirmou que conseguiria a paz no Oriente Médio em doze meses? Não se dá conta do motivo por que os palestinos estão em Gaza?

A verdade é que muitas centenas de milhares de pessoas no mundo – quisera poder dizer milhões – querem colocar fim nesta impunidade, colocar fim a frases como baixas desproporcionais. Desproporcionais em relação a quê? Israelenses corajosos dizem o mesmo. Escrevem sobre isso. Longa vida ao Haaretz, jornal israelense. Entretanto, os árabes, o mundo muçulmano, é tomado pela ira. E pagaremos o preço.

(*) De The Independent, especial para o Página/12.
Tradução: Daniella Cambaúva
Fonte: http://www.cartamaior.com.br/

terça-feira, 29 de julho de 2014

A infalível lente de Obama - por Latuff

Fonte: http://latuffcartoons.wordpress.com/

Telaviv: assim se fabrica a guerra infinita – por Gideon Lewy


Telaviv: assim se fabrica a guerra infinita

“Checkpoint” entre a Cisjordânia palestina e territórios ocupados por Israel. “Na década passada, populações foram separadas. Únicos encontros se dão em situação de violência”, diz Lewy

Jornalista judeu analisa: no fundo, Israel não deseja paz. Por isso, ocupa territórios, segrega e alimenta fundamentalismo religioso baseado no desprezo ao outro

Israel não deseja a paz. Nunca quis tanto que estivesse errado o que escrevo. Mas as evidências se acumulam. Na verdade, pode-se dizer que Israel nunca desejou a paz – uma paz justa, ou seja, baseada num acordo justo para ambos os lados. É verdade que a saudação rotineira em hebreu é Shalom (paz) – shalom quando alguém se despede e shalom quando alguém chega. E quase todo israelense dirá sempre que deseja a paz, claro que sim. Mas ele não se refere ao tipo de paz que traz justiça, sem a qual não há paz e não haverá paz. Os israelenses desejam paz, não justiça; certamente nada que se baseie em valores universais. Nos últimos dez anos, aliás Israel afastou-se até mesmo da aspiração de construir a paz. Desistiu completamente dela. A paz desapareceu da agenda, seu lugar foi tomado por ansiedades coletivas, fabricadas sistematicamente, e por questões pessoais, privadas, que agora têm prioridade sobre todas as outras.

Os israelenses que ansiavam pela paz aparentemente morreram há cerca de uma década, depois do fracasso da reunião de Camp David em 2000, da disseminação da mentira de que não há um parceiro palestino para a paz e, claro, do terrível período da segunda intifada, encharcado de sangue. Mas a verdade é que, mesmo antes disso, Israel nunca desejou realmente a paz. Nunca, nem por um minuto, Israel tratou os palestinos como seres humanos com direitos iguais. Nunca viu seu sofrimento como um sofrimento humano e nacional compreensíveis.

Também o movimento israelense pela paz – se é que chegou a existir – morreu uma morte lenta, em meio às penosas cenas da segunda intifada e à mentira da falta de parceiros. Tudo o que restou foi um punhado de organizações tão empenhadas quanto ineficazes, face às campanhas de deslegitimação montadas contra elas. Logo, Israel foi deixada em sua postura isolacionista.
A evidência mais esmagadora da rejeição da paz por Israel é, claro, o projeto das colônias de ocupação da Palestina. Desde o início de sua existência, nunca houve um teste mais seguro ou mais preciso para as verdadeiras intenções de Israel do que esse empreendimento particular. Em linguagem clara: os construtores das colônias desejam consolidar a ocupação, e quem deseja consolidar a ocupação não deseja a paz. Esse é o resumo da ópera.
Colônia israelense, construída em território palestino e separada por muro. Para Lewy, “os construtores das colônias desejam consolidar a ocupação, e quem deseja consolidar a ocupação não deseja a paz”

Considerando que as decisões de Israel são racionais, é impossível aceitar que a construção nos territórios e a aspiração pela paz possam coexistir mutuamente. Cada ato de construção em colônias de ocupação, cada casa móvel e cada varanda transmitem rejeição. Se Israel quisesse alcançar a paz através dos Acordos de Oslo, teria ao menos parado, por iniciativa própria, de construir as colônias. O fato de que isso não aconteceu prova que Oslo foi uma fraude, ou, na melhor das hipóteses, a crônica de um fracasso anunciado. Se Israel desejava construir a paz em Taba, em Camp David, em Sharm el-Sheikh, em Washington ou em Jerusalém, seu primeiro passo teria sido acabar com toda ocupação nos territórios. Incondicionalmente. Sem exigir nada em troca. O fato de Israel não tê-lo feito é a prova de que não quer uma paz justa.

Mas as colônias são apenas um dos indicadores das intenções de Israel. Seu isolamento está entranhado bem mais fundo – em seu DNA, sua corrente sanguínea, suas crenças mais primordiais. Lá, no nível mais profundo, está o conceito de que esta terra está destinada apenas aos judeus. Lá, no nível mais profundo, está entrincheirado o valor de “am sgula” — os escolhidos por Deus.
Na prática, isso se traduz na noção de que, nesta terra, os judeus estão autorizados a fazer o que aos outros é proibido. Esse é o ponto de partida, e não há como chegar a uma paz justa a partir daí. Não há nenhuma maneira de alcançar uma paz justa quando o nome do jogo é desumanização dos palestinos. Não há forma de conseguir alcançar a paz quando sua demonização é martelada na cabeça das pessoas dia após dia. Quem está convencido de que cada palestino é um suspeito e quer “jogar os judeus no mar” nunca vai construir a paz com os palestinos. A maioria dos israelenses estão convencidos de ambas as afirmações.
Soldado israelense intimida e ameaça palestinos num checkpoint. “O único encontro entre os dois povos é entre os ocupantes, que são armados e violentos, e os ocupados, que são desesperados e também se voltam para a violência”

Na década passada, as duas populações foram separadas uma da outra. O jovem israelense médio nunca se encontrará com seu par palestino, a não ser durante seu serviço militar (e, mesmo assim, apenas se servir nos territórios ocupados). Nem o jovem palestino médio encontrará um israelense da sua idade, a não ser o soldado que o hostiliza no checkpoint, ou invade sua casa no meio da noite, ou o colono que usurpa sua terra ou queima seus bosques.

Em consequência, o único encontro entre os dois povos é entre os ocupantes, que são armados e violentos, e os ocupados, que são desesperados e também se voltam para a violência. Foram-se os tempos em que palestinos trabalhavam em Israel e israelenses iam fazer compras na Palestina. Foi-se o período de relações meio-normais e um-quarto-iguais, que existiram por poucas décadas entre dois povos que dividiam o mesmo pedaço de território. É muito fácil, nesse estado de coisas, incitar e inflamar um contra o outro, espalhar medos e instigar novos ódios sobre os já existentes. Essa é, também, uma receita certa de não-paz.

Foi assim que um novo anseio israelense surgiu: o desejo de separação: “Eles ficam lá e nós ficamos aqui (e lá também)”. Num momento em que a maioria dos palestinos – avaliação que me permito fazer, após décadas de cobertura nos territórios – ainda quer coexistência, mesmo que cada vez menos, a maioria dos israelenses quer não-envolvimento e separação, mas sem pagar o preço. A visão de dois estados ganhou adesão generalizada, mas sem qualquer intenção de implementá-la na prática. A maioria dos israelenses é a favor, mas não agora e talvez nem mesmo aqui. Eles foram treinados a acreditar que não há parceiro para a paz – isto é, um parceiro palestino – mas há um parceiro israelense.

Infelizmente, a verdade é quase o oposto. Os palestinos não-parceiros não têm mais nenhuma chance de provar que são parceiros; os não-parceiros israelenses estão convencidos de que são interlocutores. Começou então um processo em que as condições, obstáculos e dificuldades impostas por Telaviv se amontoaram, mais um marco no isolamento israelense. Primeiro, veio a exigência de acabar com o terrorismo; em seguida, a demanda pela troca da liderança (Yasser Arafat visto como uma pedra no caminho); e depois disso o Hamas tornou-se o obstáculo. Agora é a recusa dos palestinos em reconhecer Israel como um Estado judeu. Israel considera legítimo cada passo que dá – de prisões políticas em massa à construção nos territórios –, enquanto todo movimento palestino é considerado “unilateral”.
Palestinos num curral, em checkpoint. Apartheid baseia-se na manipulação do conceito religioso de “am sgula” — segundo o qual judeus são povo escolhido por Deus

O único país sem fronteiras do planeta não quis, até aqui, delimitar sequer as fronteiras que estaria pronto a aceitar num acordo. Israel não internalizou o fato de que, para os palestinos, as fronteiras de 1967 são a mãe de todos os acordos, a linha vermelha da justiça (ou justiça relativa). Para os israelenses, elas são “fronteiras suicidas”. Essa é a razão pela qual a preservação do status quo tornou-se o verdadeiro alvo, o objetivo primordial da política de Israel, quase seu tudo ou nada. O problema é que a situação existente não pode durar para sempre. Historicamente, poucas nações aceitaram viver sob ocupação sem resistência. E também a comunidade internacional estará apta, um dia, a proferir um pronunciamento firme, acompanhado de medidas punitivas, sobre este estado de coisas. Segue-se que o objetivo de Israel é irrealista.

Desconectada da realidade, a maioria dos israelenses mantém seu estilo de vida normal. A seus olhos, o mundo está sempre contra eles, e as áreas de ocupação à sua porta estão fora de sua esfera de interesse. Quem ousa criticar a política de ocupação é rotulado de anti-semita, cada ato de resistência é percebido como uma ameaça existencial. Toda a oposição internacional à ocupação é lida como “deslegitimização” de Israel e como um desafio para a própria existência do país. Os sete bilhões de pessoas do mundo – a maioria das quais contra a ocupação – estão erradas, e seis milhões de judeus israelenses – a maioria dos quais apóia a ocupação – estão certos. Essa é a realidade na visão do israelense médio.

Some a isso a repressão, a ocultação e a dissimulação, e você tem uma outra justificativa para o isolamento. Por que alguém deveria lutar pela paz, desde que a vida em Israel seja boa, a calma prevaleça e a realidade se mantenha oculta? A única maneira de a Faixa de Gaza, sitiada, lembrar as pessoas de sua existência é atirando foguetes, e, atualmente, a Cisjordânia só entra na agenda quando há sangue derramado por lá. Da mesma forma, o ponto de vista da comunidade internacional só é levado em conta quando tenta impor boicotes e sanções, que por sua vez geram imediatamente campanhas de autovitimização cravejadas de contundentes – e, às vezes, também impertinentes – acusações históricas.

Este é, pois, o quadro sombrio. Não contém um raio de esperança. A mudança não vai acontecer por si mesma, a partir do interior da sociedade israelense, caso continue a se comportar como se comporta. Os palestinos cometeram mais do que um erro, mas seus erros são marginais. A justiça de base está do seu lado, e o isolamento de base é o limite dos israelenses. Eles querem ocupação, não paz.

Tenho a esperança de estar errado.

Tradução: Inês Castilho

segunda-feira, 28 de julho de 2014

A 'Guernica' de Picasso versus 'Gaza', de Netanyahu - por Latuff

Fonte: http://latuffcartoons.wordpress.com/

Gaza: Quando Golias é judeu – por Gianni Carta


Gaza: Quando Golias é judeu 

A invasão ofende os Direitos Humanos diante da indiferença cúmplice das potências ocidentais 

Marco Longari/AFP
Na luta desigual, de um lado morrem os civis, e muitas crianças, do outro sobretudo os soldados

Cidade de Gaza, quinta-feira 24. Ruas cobertas de cadáveres. Casas sem fachada, esburacadas ou destruídas. Mães, pais, crianças e idosos aos prantos e gritos. Alguns seguram nos braços crianças mortas, por vezes decapitadas. Tanques de guerra. O incessante barulho ensurdecedor das metralhadoras dos soldados do Tsahal, ou IDF, o exército israelense, ou de bombas lançadas de caças F-18. Ou pelos navios de guerra no Mediterrâneo. A toda essa tragédia se mescla o assobio de mísseis, vindo de todas as partes, inclusive dos teleguiados, a marcar presença no céu. “Eles atiram nas pessoas, nas vacas, em qualquer coisa que se mova”, grita uma septuagenária. Nos seus olhos, como nos de seus conterrâneos, estampam-se o medo, o desespero, o horror. Motivos não escasseiam.

Na quinta-feira 24, quando este artigo seria impresso, o número de baixas era de 700 palestinos, dos quais 150 crianças, e mais milhares de feridos. Segundo as autoridades israelenses, 32 soldados tinham perdido a vida, e mais três civis israelenses. Em Gaza falta água potável. As pessoas comem quando há comida, praticamente dia sim, dia não. Hospitais não têm condições de tratar todos os feridos. Ambulâncias, inclusive aquelas dos Médicins Sans Frontières, não circulam na probabilidade de ser atingidas. Ambas as fronteiras para escapar para o mundo, Erez, em Israel, e Rafah, no Egito, permanecem fechadas para os palestinos, mesmo para aqueles mais ameaçados. Apagões são frequentes, de resto como sempre. Porém, agora, mais amiúde.

Indago a Hussam, meu fixer em várias viagens a Gaza, aquele que traduz em perfeito inglês e me guia para evitar confrontos nessa minúscula Gaza em guerra, se posso falar com minhas ex-fontes do Hamas. Claro, as autoridades dos EUA e da União Europeia não tratam com “terroristas”, mas por que lidaram com o Exército Republicano Irlandês, entre outros? Gostaria de entrevistar novamente, como em 2013, digo a Hussam, Mahmoud al-Zahar, ex-ministro do Exterior e um dos fundadores do Hamas. Diga-se que Al-Zahar, de 69 anos, é o líder do Hamas, mas por questões de segurança contra ataques israelenses, ele faria parte apenas do conselho do Hamas. No entanto, esse médico, que já sofreu atentados e perdeu um filho quando um caça F-15 lançou uma bomba contra sua casa, está escondido em algum bunker, diz Hussam. O outro filho foi morto há anos em um confronto armado. Poucos meses atrás, aqui mesmo, indaguei a Al-Zahar se a única solução contra Israel é a luta armada. “Começamos a negociar em 1991, em Madri, mas nunca houve um processo de paz, e sim um apoio à ocupação israelense”, dizia então Al-Zahar. Fez uma pausa, e acrescentou: “A única solução é a luta armada”.

Com seu 1,8 milhão de habitantes espalhados por apenas 40 quilômetros de extensão e 10 de largura, a Faixa de Gaza, separada do mundo por um bloqueio imposto por Israel depois da vitória em escrutínio democrático da legenda islamita Hamas, em 2006, vive-se a enésima Nakba (catástrofe). Esse enredo de violência começa com a expulsão dos árabes palestinos quando Israel venceu sua luta de independência em 1948. Após a Guerra de Seis Dias, em 1967, mais alguns milhões de árabes palestinos foram expulsos pelo Oriente Médio.

A chamada Operação Margem Protetora, a atual, foi acionada pelo premier israelense Benjamin Netanyahu em 8 de julho com os ataques ditos “cirúrgicos” de caças F-18. Parecem tão cirúrgicos, que até o secretário de Estado dos EUA, John Kerry, os questionou durante uma emissão da tevê estadunidense Fox News. Ao acreditar que os microfones estivessem desligados, comentou ironicamente: “Como são cirúrgicos os ataques dos israelenses”. Trata-se, porém, de um diplomata e logo corrigiu o “erro”.

Os motivos de Bibi, como é popularmente chamado Netanyahu, foram dois, ambos apoiados pela chamada “comunidade internacional”, isto é, por, entre outros, Barack Obama, Angela Merkel, François Hollande e Matteo Renzi. Primeiro, o sequestro e mortes de três adolescentes na Cisjordânia, a outra parte da Palestina sem contingência com Gaza, manobra das autoridades israelenses para dividir e conquistar o vizinho árabe. Segundo motivo: os inúmeros foguetes Qassam lançados pelo Hamas contra o território israelense. Mas a questão é mais complexa do que pensam, ou fingem pensar, os aliados de Netanyahu. Tudo indicaria que os adolescentes não foram assassinados com a autorização do Hamas. E os foguetes seriam lançados de Gaza por grupos radicais envolvidos na disputa do poder no território.

Magid Shihade, professor de Relações Internacionais da Universidade de Birzeit, na Cisjordânia, me diz: “Comunidade internacional, você concorda comigo, é um jargão inconcebível. Eles (Obama, Merkel, Hollande etc.) não alcunharão o que Netanyahu está a provocar em Gaza porque não pega bem para a dita comunidade internacional. Shihade emenda: “O sionismo é uma ideologia racista e colonial. Baseia-se na desapropriação, na deslocação e na separação das pessoas, na supremacia dos judeus sobre os árabes palestinos nativos”.

Em 17 de julho, uma incursão terrestre das Forças de Defesa Israelense elevou a dimensão da carnificina. O motivo da intervenção terrestre foram os incessantes foguetes oriundos de Gaza. Embora de forma proporcionalmente muito inferior àquela dos palestinos, o Tsahal sofreu com a incursão, em meados de julho, várias baixas, especialmente, parece, a do sargento Shaul Aaron. O Hamas diz que o capturou, mas Tel-Aviv sustenta que ele poder ter sido morto. Se, porém, foi capturado, algo que não estava ainda claro na quinta-feira da semana passada, o conflito poderia se ampliar. E da mesma forma como o bloqueio de Gaza teve início com a captura do soldado Gilad Shalit, a situação poderia piorar rapidamente. A prisão de um israelense pelos palestinos é algo passível de elevar brutalmente a tensão.

Para quem está em Gaza, a postura da diplomacia ocidental é de um cinismo abissal. Mesmo porque existe um evidente conluio entre o lobby judeu e a diplomacia internacional. Durante nove meses, o secretário de Estado Kerry cuidou de mostrar empenho a favor da paz, enquanto Israel continuava impunemente a colonizar a Cisjordânia. Kerry dizia ser possível para Mahmoud Abbas, presidente da Autoridade Palestina, ir adiante no plano de criação de um Estado palestino apesar dos assentamentos. Palavras ao vento em que tremulam as gravatas amarelas e laranja do secretário de Estado. Não é por acaso que ele não goza de credibilidade alguma nas terras em conflito, mesmo porque suas propostas carecem de qualquer substância. Gianni Vattimo, o filósofo italiano, disse que gostaria de “comprar mais foguetes para o Hamas”. Vattimo, que já entrevistei, disse: “Os europeus deveriam formar uma brigada internacional para lutar com o Hamas, assim como voluntários lutaram contra Franco durante a Guerra Civil Espanhola”.

O que faremos por esse povo?  Hussam, meu fixer, tem 45 anos. Nunca deixou Gaza. Aprendeu inglês, perfeito, na universidade. Vive em Camp Beach, na cidade. Tem mulher e seis filhos, durmo com estes em uma grande sala, todos vestidos. Hussam e a mulher recolhem-se em um quarto separado. Ele anuncia quando podemos tomar banho. À noite, coloca mesas de plástico no chão, visto que não há mobília, e deposita pratos de comida. No ano passado, havia certa fartura. Agora, é apenas pão sírio amanhecido e tabule.

Às 4 horas, a mesquita ao lado lança o apelo, “Alá, o maior”, e todos se levantam, colocam uma esteira no chão e rezam. Uma luz ilumina o nosso quarto. Sinto-me seguro, devo confessar. Depois durmo. E muito bem.  O Tsahal, contudo, atingiu um minarete da mesquita. Hussam lamenta. Indago: “Você faria parte do Hamas?” Responde: “Não, existem limites”.

Os Acordos de Oslo de 1993 estabeleceram que a Autoridade Palestina governaria Gaza e a Cisjordânia.  Não foi o que se deu. Em 2012, a Assembleia-Geral da ONU elevou a Palestina ao status de “Estado não integrante”. Vitorioso em 2006 em Gaza, o Hamas expulsou o Fatah em 2007. Sete anos mais tarde, Fatah e Hamas fizeram as pazes e se reuniram em abril de 2014. E eis o problema. Netanyahu não aceita a união. Dividir é o que se pretende. Divide et impera, diziam os imperadores romanos.

Fonte: http://www.cartacapital.com.br/

Poderio militar israelense “made in USA” esmaga palestinos - por Thalif Deen


Poderio militar israelense “made in USA” esmaga palestinos.
Israel receberá um total de US$ 30 bilhões em ajuda militar de Washington nos dez anos transcorridos entre 2009 e 2018

O esmagador poder de fogo israelense despejado sobre o movimento armado palestino Hamas no conflito atual em Gaza recorda a guerra da independência da Argélia (1954-1962), quando a França, a potência colonizadora, utilizou sua superioridade militar para atacar a insurgência. Enquanto a força área francesa lançava napalm sobre a população civil no campo, os argelinos recorriam a bombas artesanais escondidas nas bolsas das mulheres que eram deixadas em cafés, restaurantes e lugares públicos frequentados pelos franceses.

Em uma das cenas memoráveis do clássico filme de 1967, A Batalha de Argel, o líder da Frente de Libertação Nacional, Ben M’Hidi, é interrogado por um grupo de jornalistas franceses extremamente parciais. “Não considera que é um pouco covarde usar bolsas e cestas de mulheres para levar os artefatos explosivos que matam tanta gente inocente?”, perguntavam ao líder argelino algemado. “E não lhe parece ainda mais covarde jogar bombas de napalm sobre gente indefesa, que causam mil vezes mais vítimas inocentes?”, respondeu M’Hidi, acrescentando: “Naturalmente, se tivéssemos seus aviões de combate seria muito mais fácil para nós. Nos deem seus bombardeiros e fiquem com nossas bolsas e cestas”.

No atual conflito em Gaza, uma inversão de papéis encontraria o movimento islâmico Hamas armado com aviões de combate, mísseis ar-ar e tanques, enquanto Israel responderia apenas com foguetes de fabricação caseira. Mas, na realidade, o Hamas está totalmente superado em sua luta contra um dos poderes militares mais formidáveis e sofisticados do mundo, cujos equipamentos de última geração chegam gratuitamente dos Estados Unidos, mediante o chamado financiamento militar estrangeiro (FMF).

Segundo os últimos dados, o conflito que começou no dia 8 custou a vida de mais de 620 palestinos, em sua maioria civis, entre eles pelo menos 230 mulheres e crianças, e deixou mais de 3.700 feridos. Do lado israelense houve 27 soldados e dois civis mortos.

“É impossível imaginar a desproporção absoluta de poderes neste conflito, salvo para quem esteve na rua diante das tropas israelenses em Gaza, ou tenha dormido no chão sob um ataque aéreo, como fiz várias vezes, enquanto entregava ajuda em 1989, 2000 e 2009”, afirmou James E. Jennings, presidente da Consciência Internacional e diretor da organização Acadêmicos dos Estados Unidos pela Paz.

“Vi jovens que simplesmente fugiam baleados pelas costas por soldados israelenses equipados com subfuzis Uzi e uniformes blindados, e em 2009 e 2012 fui testemunha em Rafha da superioridade tecnológica de Israel na coordenação de sofisticados computadores, aviões não tripulados e caças F-15”, acrescentou Jennings. Os reiterados bombardeios apontam para os jovens que utilizam túneis para levar alimentos e remédios à população presa pelo embargo em Gaza, mas também atacam civis indefesos que fogem das hostilidades, destacou.

“Em meu trabalho visitei mulheres e crianças feridas nos hospitais de Rafah e na cidade de Gaza e ajudei a transportar cadáveres para seu enterro”, acrescentou Jennings. “É como atirar em peixes em um barril”, prosseguiu, em uma analogia para esta situação de capacidades militares tão assimétricas.

Os dados estatísticos evidenciam a ineficácia dos foguetes Qassam de fabricação caseira que o Hamas dispara, já que após mais de dois mil lançamentos apenas dois civis morreram do lado israelense. “É muito menos do que os oito norte-americanos mortos acidentalmente em 2013 vítimas de fogos de artifício nas comemorações do 4 de julho”, dia da independência dos Estados Unidos, destacou Jennings.

As armas norte-americanas no valor de milhares de milhões de dólares em poder de Israel foram adquiridas com subvenções não reintegráveis do FMF, segundo especialistas em defesa. Israel receberá um total de US$ 30 bilhões em ajuda militar de Washington nos dez anos transcorridos entre 2009 e 2018. O Serviço de Investigação do Congresso norte-americano indica que Israel é o maior receptor da FMF dos Estados Unidos, já que em 2015 receberá 55% do desembolso total dos subsídios de Washington no mundo. Essa quantia representa entre 23% e 25% do orçamento militar anual israelense.

Nicole Auger, analista militar que cobre Oriente Médio e África para a Forecast International, consultoria em assuntos de defesa, apontou à IPS que Israel importa quase todo seu arsenal dos Estados Unidos. Segundo ela, a prioridade de Israel é manter a superioridade aérea diante dos vizinhos da região, acima do poderio terrestre. Israel fez um pedido adicional de caças F-15I que se somarão aos 25 F-15ls (Ra’ams) de longo alcance que a Força Aérea Israelense já possui, junto com 102 F-16I (Soufas) de combate polivalente, acrescentou a especialista.

O arsenal militar de Israel também inclui dezenas de helicópteros de ataque, como o Sikorsky CH-53, recentemente equipado com o sistema de proteção IAI Elta Systems EL/M-2160, que detecta mísseis com radar e ativa medidas para desviá-los. Também atualizou sua frota de helicópteros de ataque Cobra AH-1E/F/G/S da Bell e Apache AH-64A da Boeing. Para sua defesa conta com a última versão do sistema antimísseis Patriot, PAC 3, e também possui bombas guiadas por laser Paveway, bombas de penetração BLU-109 e munições antibunquer GBU-28.

Jennings explicou à IPS os fatos que os meios de comunicação não costumam recordar ao cobrir a guerra entre Israel e Gaza. O direito à legítima defesa, defendido por Israel e seus aliados em Washington, nunca é mencionado com relação ao ocorrido em 1948, quando centenas de milhares de palestinos foram expulsos de suas casas e de seu território para serem trancados na maior prisão do mundo que é Gaza.

Em segundo lugar, o mundo mantém silêncio enquanto Israel, com a cumplicidade dos Estados Unidos e do Egito, sufoca os 1,7 milhão de habitantes de Gaza com um cordão sanitário brutalmente efetivo, o embargo quase total de bens e serviços, que em grande parte limita a existência de alimentos e medicamentos. “Estes são crimes de guerra, violações contínuas do direito internacional humanitário perpetuado durante os últimos sete anos, enquanto o mundo desvia o olhar”, enfatizou Jennings.

Fonte: http://www.revistaforum.com.br/blog

Gaza: a Ave de Rapina é sempre mais rápida! - por Latuff

Fonte: http://latuffcartoons.wordpress.com/

O Santander e a lobotomia de uma Nação - por Saul Leblon


O Santander e a lobotomia de uma Nação

Os bancos são os grandes provedores de conteúdo da rede Brasil aos cacos. Eles dão a corda, o jornalismo econômico dá o nó, o país entra com o pescoço.

O banco Santander, informa a ‘Folha’,  anexou aos extratos enviados a sua clientela de elite, o segmento ‘Select’, uma avaliação de natureza político eleitoral.

Caso Dilma se consolide na dianteira das intenções de voto, adverte  o maior banco estrangeiro em operação no país,  ações devem cair, os juros vão subir , o chão se esfarelar...

Em linguagem cifrada, ‘não deixe que isso aconteça: vote Aécio’.

Transformar extratos bancários em palanque da guerra das expectativas deve ser inclusive ilegal. O Ministério Público Eleitoral poderá dizê-lo.

O descabido, porém, não constitui anomalia no cenário brasileiro.

Os bancos são os grandes provedores de conteúdo da rede  ’Brasil aos cacos’.

Eles dão a corda, o jornalismo econômico dá o nó, o país entra com o pescoço.

Gente treinada e bem remunerada, quadros de elite --não raro egressos do Banco Central no governo do PSDB,  encontram-se  disponíveis  para somar forças com o bravo jornalismo  de economia na missão de esgoelar o Brasil.

Um bunker tucano, como o Itaú, hoje uma espécie de Banco Central paralelo, figura como um dos grandes provedores de conteúdo do noticiário econômico.
O recado é sempre o mesmo: não há futuro para o Brasil se a urna sancionar um segundo ciclo do  ‘intervencionismo’.

Quando as estatísticas teimam  –como agora que a inflação desaba, o apagão se esvai, os juros futuros recuam e o pleno emprego resiste— recorre-se ao talento do jornalismo adversativo.

O varejo, por exemplo,  quando cai é  uma  ‘tendência preocupante’; se sobe, ‘recuperou, mas é pontual’ .

Resultado bom ‘surpreende o mercado’. O inverso ‘veio em linha com as expectativas de deterioração do quadro econômico’.

É infernal.

A experiência brasileira  sugere que não há ingrediente mais precioso na luta pelo desenvolvimento  do que abrir espaço ao discernimento crítico da sociedade  contra o monólogo da desinformação.

Sem isso, prevalecem  interesses que se beneficiam do incentivo à amnésia  histórica.

Um exemplo?

A origem da tão propalada crise de confiança atribuída ao ‘intervencionismo estatal’.

Aqui e em todo o planeta sua principal fonte, na verdade, foi a intermitente eclosão de colapsos financeiros, a partir dos anos 70, quando a mobilidade dos capitais ficou livre do controle estatal que a banca ainda acha excessivo no Brasil.

Uma a uma, foram desativadas  as comportas erguidas a partir de 1929  para disciplinar  a natureza intrinsecamente autofágica e desestabilizadora do capitalismo financeiro.

Bill Clinton, em 1999, consumou o arrombamento iniciado por Tatcher e Reagan nos anos 80.

Ao revogar a lei Glass Steagall, o democrata  eliminou a distinção entre bancos comerciais e de investimento  --estes últimos só podiam arriscar com capital próprio lastreado em reservas.

Isso acabou.

Rompida a barreira, as águas se misturaram  –e o risco se diluiu.

O dinheiro  fácil, barato, mas de curto prazo,  jorrou no vertedouro da especulação engordando-a , ao mesmo tempo em que encurtava seus ciclos.

Como num cassino, o fastígio das primeiras rodadas parecia  eterno.

Dessa crença brotaram os créditos ‘ninja’, concedidos a  tomadores sem renda, sem emprego e sem garantias.

O chute no escuro empurrou todos os jogadores  ao buraco negro das subprimes, em 2008.

O Santander foi, na Espanha, um dos titãs da ciranda que legou ao país o maior encalhe de imóveis do mundo e um desemprego só inferior ao grego.

Em 2011, atolado em hipotecas micadas,   jogou a toalha: anunciou uma moratória de três anos sobre o principal,  em troca de receber pelo menos o juro dos mutuários espanhóis empobrecidos.

Em 2012, quando a corda apertava seu pescoço na Europa, o presidente do banco, Emilio Botín, aterrissou  no Brasil.

Disse que o país era a sua ‘maior prioridade no mundo’: daqui saíam 30% do lucro global do grupo.

Em setembro de 2013, estava de volta.

Depois de reunir-se com a  Presidenta Dilma Rousseff, anunciou: ‘Queremos participar ativamente do milionário Plano de Aceleração do Crescimento e financiar uns US$ 10 bilhões em projetos de infraestrutura . O Brasil tem se consolidado como uma grande potencia regional e global, com instituições sólidas e um sistema financeiro muito consolidado’ (EL País; 13/09/2013).

Dez meses depois resolveu lançar  extratos bancários consorciados a panfletos eleitorais contra  o ‘risco Dilma’.

A memória curta do Santander em relação ao país está em linha com a memória curta da mídia conservadora em relação à origem ‘da crise de confiança’  cujo fato gerador não apenas persiste , como ensaia um novo pico explosivo.

Fatos.

Dos mais de US$ 25 trilhões despejados no sistema financeiro dos EUA desde 2009, para mitigar o caixa rentista, apenas 1% ou 2%, no máximo, chegaram aos lares assalariados, na forma de crédito e financiamento.

 O que avulta, ao contrário,  é uma explosão irracional dos preços da papelaria financeira sem lastro na riqueza real --a mesma doença pré-2008:

 Na zona do euro, onde o Santander é a maior instituição bancária, a desproporção  entre a valorização dos ativos (títulos, ações etc)  e a curva do emprego e do consumo, replica a dança na boca do vulcão.

Estima-se que nos EUA grandes corporações tenham uns US$ 7 trilhões queimando em caixa. Liquidez ociosa à procura de fatias da riqueza real  para uma transfusão de lastro.

Com a economia internacional  flertando com a estagnação há seis anos, novas bolhas especulativas engordam no caldeirão.

A Facebook, por exemplo,  acaba de pagar US$ 19 bilhões (8% de seu próprio valor) por uma startup, a WhatsApp.

Para que o negócio justifique o preço terá que duplicar sua base de usuários para 1 bilhão.

Com o dinheiro barato irrigado  pelo Fed,  grandes corporações  norte-americanas tomam recursos a juro negativo para recomprar as próprias ações.

O artifício permite bombar balanços sem incrementar a  produção.

Estima-se que mais de US$ 750 bilhões de dólares foram utilizados nessas operações  em 2013.

Outra evidência da fuga para frente do capital fictício é a súbita procura por bônus de economias  reconhecidamente cambaleantes.

Casos da Grécia, Espanha e Portugal, por exemplo.

Os lanterninhas do euro  lançaram emissões no mercado financeiro este ano e conseguiram captar bilhões a juros baixíssimos.

Rincões cada vez mais  improváveis faíscam aos olhos da sofreguidão especulativa.

A última ‘descoberta’, a África, vê pousar fundos primos dos  abutres que acossam a Argentina. Tão aventureiros quanto,  compram emissões de Estados acuados por guerras e conflitos étnicos.

A ideia é receber pelo menos uma parte da remuneração indexada a  juros cinco a seis vezes acima do custo de captação nos EUA; depois cair fora.
 É nesse ambiente camarada que o Santander resolveu reforçar a lobotomia em curso no imaginário brasileiro.

Fomentar a crise de confiança é a pedra basilar de um mutirão eleitoral para escancarar as comportas que permitam ao capital ocioso avançar por aqui, como se o país fosse um banco de sangue complacente à  transfusão requerida pela especulação global.

Estamos falando de um alvo de cobiça com população equivalente a dos EUA nos anos 70. E uma renda pouco superior a 1/3 daquela dos norte-americanos nos anos 30.

Com uma distinção não negligenciável: a distribuição no caso brasileiro é melhor que a dos EUA então, atropelado por  uma taxa de desemprego que chegou a 27% em 1937.

O Brasil vive perto do pleno emprego;  tem população predominante em idade produtiva; um potencial de demanda ainda não atendida e recursos estratégicos abundantes, a exemplo do pré-sal.

Nada sugere que estamos diante dos ingredientes de um fracasso, como aquele vaticinado dia e noite pela rede ‘Brasil aos cacos’.

A curetagem conservadora, porém, pode anular a alma de uma nação -- se  conseguir convencê-la a rastejar por debaixo de suas possibilidades históricas.

Fonte: http://www.cartamaior.com.br/