Estado Assassino: Por que Israel ataca novamente.
Fogo
destrói casa palestina atingida por míssil israelense. Em dois dias, 34 ataques
semelhantes foram feitos por Telaviv, que também ampliou sequestros e invasão
de organizações da sociedade civil
Garotos
mortos são pretexto infame. Onda de brutalidade visa sabotar unidade palestina
e mergulhar população judaica em redemoinho de ódio e vingança
Os corpos
de três colonos israelenses que desapareceram em 12 de junho foram encontrados
há dias, em uma cova rasa cavada às pressas em Halhul, norte de Hebron.
Desde que
os jovens desapareceram em Gush Etzion, colônia exclusiva de judeus na
Cisjordânia, Israel passou a perseguir os 4 milhões de palestinos que já vivem
sob seu domínio. Atacou cidades, saqueou casas e instituições civis, realizou
incursões noturnas nos refúgios de famílias, roubando propriedades, sequestrando,
ferindo e matando. Aviões de guerra passaram a bombardear Gaza, de novo e
repetidamente, destruindo mais casas e instituições, e cometeram-se execuções extrajudiciais. Até agora, mais de 570 palestinos foram sequestrados
e presos – o mais notável deles, Samer Issawi, o palestino que fez greve de
fome por 266 dias em protesto por prisão arbitrária anterior.
Ao menos 10
palestinos foram mortos, inclusive três crianças, uma mulher grávida e um homem
com problemas mentais. Centenas foram feridos, milhares aterrorizados.
Universidades e organismos de assistência social foram saqueados, fechados;
seus computadores e equipamentos destruídos ou roubados e documentos, tanto
públicos quanto privados, confiscados de instituições civis. Este banditismo é
a política oficial de Estado conduzida por militares e não inclui a violência
contra pessoas e propriedades perpetrada por colonos israelenses paramilitares,
cujos constantes ataques contra civis palestinos intensificaram-se nas últimas
semanas. E agora que foi confirmada a morte dos colonos, Israel jurou vingar-se
à altura. Naftali Bennet, ministro da Economia, disse: “Não há misericórdia
para assassinos de crianças. Esta é hora de ação, não de palavras.”
Embora
nenhuma organização palestina tenha assumido responsabilidade pelo sequestro e
– mais que isso – tenham negado qualquer envolvimento, o primeiro-ministro
israelense, Benjamin Netanyahu, está inflexível quanto à culpa do Hamas. A ONU
pediu que Israel forneça evidências que apoiem sua acusação. Nada foi
apresentado, o que lança dúvidas sobre as afirmações de Israel, particularmente
à luz de sua ira pública pela recente unificação das facções palestinas
e a aceitação da nova unidade palestina pelo presidente Obama.
Nos Estados
Unidos e Europa, os jornais estampam fotos dos três colonos israelenses
adolescentes e tratam os atos de terror de Israel à Palestina como simples
“caçada humana” e “varredura militar”. Fotos dos jovens israelenses inocentes
são estampadas nas bancas de revista e as vozes de seus parentes, no auge da
angústia, destacadas. Estados Unidos, União Europeia, Reino Unido, ONU, Canadá
e Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV) condenaram o sequestro e pediram
a libertação imediata e incondicional das vítimas. Após a descoberta dos
corpos, houve uma onda de condenação e condolências.
O
presidente Obama afirmou: “Como pai, não posso imaginar a dor indescritível que
os pais desses garotos adolescentes estão sentindo. Os Estados Unidos condenam
nos termos mais fortes possíveis esse ato de terror sem sentido contra jovens
inocentes.”
Menino no
meio dos escombros da casa explodida pelo exército israelense em Hebron, Foto:
Ahmad Gharabli/AFP
Embora
centenas de crianças palestinas sejam sequestradas, brutalizadas ou
assassinadas por Israel – várias, inclusive, nas duas últimas semanas –,
raramente, ou nunca, vê-se essa reação no Ocidente.
Pouco antes
do desaparecimento dos jovens colonos israelenses, o assassinato de dois
adolescentes palestinos foi flagrado por uma câmera de vigilância local. Amplas
evidências, incluindo as balas encontradas e uma câmera da CNN que filmou um atirador israelense puxando o gatilho no momento
preciso em que um dos rapazes foi baleado, indicaram que foram mortos a sangue
frio por soldados israelenses. Não houve condenação ou clamor por justiça para
esses adolescentes por parte de governantes ou instituições internacionais, nem
solidariedade com seus pais em luto – sem falar das mais de 250 crianças
palestinas sequestrados de suas casas ou a caminho da escola, que são mantidas
definhando em prisões israelenses sem acusação ou julgamento, torturadas física
e psicologicamente. Além do bárbaro cerco a Gaza, ou décadas de espoliação
contínua, remoções, confisco de terras, demolição de casas, sistema de acesso
codificado por cores, prisões arbitrárias, restrições à mobilidade,
checkpoints, execuções extrajudiciais, tortura e confinamento de palestinos em
guetos isolados.
Nada disso
parece importar.
Não importa
que ninguém saiba quem matou os adolescentes israelenses. Parece que o país
inteiro está clamando por sangue palestino, uma reminiscência das marchas por
linchamento dos sulistas norte-americanos, que perseguiam negros sempre que um
branco aparecia morto. Nem que esses jovens israelenses fossem colonos que
viviam em assentamentos ilegais exclusivos de judeus, construídos em terras
roubadas pelo Estado, a maioria de proprietários palestinos da aldeia de
Al-Khader. Grande parte dos colonos ali são norte-americanos, principalmente de
Nova York, como um dos adolescentes assassinados, enquanto os palestinos,
nativos, apodrecem em campos de refugiados, guetos ocupados ou exílio sem
fronteiras.
Crianças
palestinas são agredidas ou assassinadas todos os dias sem registro quase
nenhum de suas vidas na imprensa ocidental. Enquanto as mães palestinas são
frequentemente culpabilizadas por Israel matar seus filhos, acusadas de
mandá-los para a morte ou de não mantê-los em casa, longe de franco-atiradores
israelenses, ninguém questiona Rachel Frankel, mãe de um dos colonos assassinados. Ninguém questiona por que ela
mudou-se com a família, deixando os Estados Unidos para viver numa colônia
segregada, marcada pelo sentimento de superioridade, estabelecida em terra
confiscada de proprietários nativos não-judeus. Certamente, ninguém ousa
acusá-la de expor seus filhos a situações perigosas.
Nenhuma mãe
deveria viver o assassinado de um filho. Nenhuma mãe ou pai. Isso não deveria
ser um privilégios de pais judeus. As vidas de nossos filhos não não menos
preciosas, e sua perda não é menos dilacerante, ou desconcertante. Mas há uma
disparidade terrível no valor das vidas, aos olhos do Estado e do mundo. As
vidas palestinas são baratas e descartáveis; as judaicas, sacrossantas.
A crença no
excepcionalismo e supremacia da vida judaica é uma base fundamental do Estado
de Israel. Ela permeia cada lei e regra e só é igualada pelo aparente desprezo
à vida palestina. Por meio de leis que privilegiam judeus nas ofertas de
trabalho e oportunidades educacionais; de outras, que impedem não-judeus de comprar
ou alugar de judeus; de ordens militares sem fim, que limitam os movimentos, o
consumo de água, o acesso à comida, à educação, possibilidades de casamento e
de independência econômica. A vida dos não-judeus, em última instância, está
subordinada ao decreto religioso emitido por Dov Lior, rabino-chefe de Hebron e
Kiryat Arba. O texto afirma que “mil vidas não-judaicas não valem a unha de um
judeu”.
Muhammad
al-Fasih e Usama al-Hassumi, mortos por drones israelenses em junho
A violência
de Israel nas últimas semanas é geralmente aceita e esperada. E o terror que,
sabemos, será desencadeado sobre a população, é disfarçado pela legitimidade
dos uniformes e das máquinas tecnológicas de guerra. A violência israelense,
não importa quão vulgar ela seja, é inevitavelmente amortecida como se fosse
heroica – violência que a mídia ocidental caracteriza de “resposta”, como se a
resistência palestina não fosse, ela mesma, uma resposta à opressão israelense.
Quando se pediu ao Comitê da Cruz Vermelha que emitisse um apelo semelhante,
pela libertação imediata e incondicional de centenas de crianças palestinas
confinadas em prisões israelenses (em completo desrespeitos às leis
humanitárias internacionais), o órgão recusou-se, sustentando que haveria uma diferença entre o
sequestro isolado de garotos israelenses e o sequestro, tortura, encarceramento
e isolamento rotineiros de crianças palestinas.
Quando
nossos meninos atiram pedras em tanques israelenses fortemente armados, e em
jipes que invadem nossas ruas, somos pais descuidados, que deveriam arcar com a
responsabilidade do assassinato de seus filhos, atingidos pelos tiros dos
soldados ou colonos de Israel. Quando nos recusamos à completa capitulação, é
que não somos “parceiros para a paz”, e merecemos que novas terras sejam
confiscadas para uso exclusivo de judeus. Quando alguns reagem e sequestram um
soldado, são extremistas do terror, os únicos culpados por Israel adotar
punição coletiva contra a população palestina. Quando nos lançamos a protestos pacíficos,
somos amotinados que merecemos ser alvo de balas. Quando debatemos, escrevemos
e boicotamos, somos anti-semitas que precisam ser silenciados, deportados,
marginalizados, perseguidos.
Que
deveríamos fazer. A Palestina está sendo apagada do mapa quase literalmnte, por
um Estado que sustenta, abertamente, a supremacia e o privilégio judaicos. A
população continua a ter suas casas e heranças roubadas, a ser empurrada à
margem da humanidade e culpabilizada por sua sorte miserável. Somos uma
sociedade traumatizada, majoritariamente desarmada, que está sendo destruída por um dos exércitos mais poderosos do mundo.
Rachel
Frankel, a mãe de um dos garotos sequestrados, foi à ONU pedir apoio, dizendo
que “é errado usar meninos e meninas inocentes como instrumentos de qualquer
luta. É cruel… Toda criança não tem o direito de voltar a salvo da escola?” Mas
estes sentimentos não valeriam, também, para as crianças palestinas? Aqui, aqui, aqui, aqui, aqui e aqui há vídeos registrando o sequestro de crianças
palestinas, levadas à noite de suas casas ou no caminho para a escola.
Nada disso
importa. Apenas, que três garotos israelenses foram mortos. E não interessa
quem os matou, ou em quais circunstâncias. Toda a população palestina será
obrigada a sofrer – mais do que já sofre, normalmente, sob ocupação.
The Hindu | Tradução Inês Castilho
Fonte: http://outraspalavras.net/
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