Quem cala… consente?
Pouco importa as nossas opiniões, as nossas idéias políticas e religiosas, pois a verdade é que o sistema social e econômico em que vivemos se assenta numa espécie de contrato social que nos ultrapassa, e que supostamente, os seus destinatários (todos nós) aceitam.
Mas será mesmo assim?
Será que estamos conscientes das regras do sistema em que vivemos, e que nos são impostas, supostamente com o nosso “consentimento” silencioso?
- Tenho eu consciência que a concorrência e a competição estão na base do nosso sistema social e econômico, e que advêm daí a maior parte dos desesperos e das frustrações para a imensa maioria dos perdedores?
- Tenho eu consciência que sou eu que estou a remunerar os bancos para que eles possam investir os meus salários neles depositados segundo as suas próprias conveniências, e que, por isso, não recebo dividendo algum pelos seus enormes lucros?
- Tenho eu consciência que os bancos me exigem uma pesada taxa de juros ao concederem-me empréstimos, dinheiro esse que, no entanto, pertence aos outros clientes que tinham feito os seus depósitos nesse banco?
- Tenho eu consciência que se usurpa, ou então que se destrói, toneladas de alimentos para que os preços não baixem, em vez de os oferecer às pessoas carentes, ajudando a combater a fome de milhares de indivíduos?
- Tenho eu consciência que é proibida a eutanásia, mas que ao mesmo tempo é admissível a morte lenta das pessoas através da inalação ou ingestão de substâncias tóxicas autorizadas pelos Estados?
- Tenho eu consciência que atualmente no nosso planeta faz-se a guerra para fazer reinar a paz?
- Tenho eu consciência que em nome da paz, os Estados gastam bilhões em armamentos, constituindo, em muitos deles, as despesas do orçamento militar a maior fatia da despesa pública?
- Tenho eu consciência que há conflitos que são artificialmente criados a fim de escoar mais facilmente os stocks de armas e de armamento para assim manter em funcionamento as empresas do complexo militar-industrial?
- Tenho eu consciência da hegemonia do petróleo e do nuclear nas nossas economias contemporâneas, apesar de serem energias extremamente poluidoras?
- Tenho eu consciência de que se divide artificialmente a opinião pública por meio da ilusão de que a luta entre os partidos de direita, do centro e de esquerda é indispensável para o funcionamento do sistema social e econômico em que vivemos?
- Tenho eu consciência que o poder de moldar e formatar a opinião pública, outrora nas mãos das religiões, encontra-se agora entregue aos homens de negócios, não eleitos democraticamente, e predispostos a controlar o poder do Estado em seu benefício?
- Tenho eu consciência que a idéia de felicidade se resume às mensagens que são por toda a parte e constantemente debitadas pela publicidade nos nossos cérebros?
- Tenho eu consciência que nas nossas sociedades atuais, em que vivemos, o valor de uma pessoa se mede pelo tamanho da sua conta bancária, bem assim a sua utilidade estar em função da produtividade que revelar, em vez das suas qualidades pessoais?
- Tenho eu consciência que se paga prodigiosamente aos jogadores de futebol, aos atores, e comparativamente muito menos a outros profissionais que, no entanto, exercem as suas atividades em profissões sociais fundamentais, como sejam, os professores, os educadores sociais, etc?
- Tenho eu consciência que se marginaliza e se lança para a sombra inúmeras pessoas de idade cuja experiência poderia ser, todavia, bem útil para todos?
- Tenho eu consciência que me são apresentadas diariamente notícias negativas e aterradoras de forma a poder apreciar melhor até que ponto a minha situação é vantajosa, e de quanto eu tenho a ganhar só pelo fato de viver numa sociedade ocidental?
- Tenho eu consciência que os banqueiros, os industriais, os militares e os políticos se reúnem amiúde para tomar decisões que têm importantes implicações para o planeta e para todos nós?
- Tenho eu consciência de consumir produtos tratados com hormônios sem que me seja facultada informação a esse respeito?
- Tenho eu consciência que os cultivos de produtos transgênicos se expandem pelo mundo a fora, permitindo que os grandes grupos econômicos registrem como sua propriedade as características dos seres vivos, apoderando-se quer da atividades produtivas quer mesmo das condições em que vivemos?
- Tenho eu consciência que as empresas multinacionais se abstêm de aplicar os progressos técnicos e sociais próprios dos países ocidentais nos países periféricos, ditos subdesenvolvidos?
- Tenho eu consciência que numerosas empresas farmacêuticas e indústrias do sector agro-alimentar vendem para os países ditos subdesenvolvidos bens e produtos impróprios, ou seja, em condições e com substâncias proibidas nos países capitalistas desenvolvidos?
- Tenho eu consciência que a Natureza tenha demorado milhões de anos para criar um ser humano, e que hoje os indivíduos se entreguem a passatempos destruidores do planeta?
- Tenho eu consciência da destruição de numerosas florestas e da rápida extinção de espécies de peixes nos oceanos?
- Tenho eu consciência do aumento da poluição industrial, da dispersão de peixes contendo elementos químicos e radioativos na natureza?
- Tenho eu consciência da utilização de toda a espécie de aditivos químicos na alimentação?
- Tenho eu consciência que na maior parte das vezes não levanto nenhuma questão, que fecho os olhos para tudo isso, e que não penso sequer em nenhuma solução concreta para qualquer um destes problemas?
- Tenho eu consciência da viseira e das ilusões que colocam à minha frente para me impedirem de ver a simples realidade do mundo?
- Tenho eu finalmente consciência que o mundo se constrói à minha imagem e semelhança, e que ao tratar de mim, eu estou, por via das minhas opções, a agir automaticamente sobre o mundo e a sociedade?
Se, de fato, eu tiver consciência de tudo isso, e não fizer nada para mudar o atual estado de coisas, então é sinal que não sou mais que um pateta inconsciente numa sociedade em clara derrapagem…
Moésio Rebouças 27 de setembro de 2008
moesioreboucas@yahoo.com.br
sexta-feira, 3 de outubro de 2008
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