quinta-feira, 15 de outubro de 2020

O legado militante de Malcolm X - Por Carlito Rovira

O legado militante de Malcolm X

Em 19 de maio de 1925, uma figura revolucionária admirável e decidida nasceu em Omaha, Nebraska. Essa figura, que alcançaria destaque na luta de libertação das massas afroamericanas, ficaria na história como Malcolm X.

Malcolm era um dos oito irmãos, filhos de Louise Norton e Earl Little. Earl era um ministro batista franco e seguidor do líder nacionalista negro Marcus Garvey. Seu personagem desafiador chamou a atenção de racistas brancos como Ku Klux Klan e a Legião Negra. Esses bandidos frequentemente assediavam a família de Malcolm e, uma noite, sua casa foi incendiada.

A década de 1920 foi uma década que os historiadores burgueses descrevem como os “loucos anos 20”. Esta é uma glorificação falsa e vã, considerando que este período de prosperidade capitalista significou algo totalmente diferente para os afroamericanos – que foram vítimas de linchamentos generalizados de turbas brancas e outras formas de terror racista.

Em 1929, a família de Malcolm mudou-se para Lansing, Michigan, em busca de uma vida melhor e segura. Mas a família não conseguiu escapar da violência racista. Earl Little foi assassinado, seu corpo mutilado e encontrado sob um bonde. Malcolm X sempre afirmou que seu pai foi vítima de um assassinato racista.

Este trágico evento teve um grande impacto na família de Malcolm. Incapaz de lidar com as consequências emocionais da morte do marido e as dificuldades financeiras envolvidas em criar os filhos sozinha, Louise Norton sofreu um colapso nervoso e foi internada em uma instituição para doentes mentais. O estado assumiu a custódia de todas as crianças e as colocou em ambientes separados de adoção.

Malcolm era uma criança estudiosa com ambições de se tornar advogado. Um dia, quando Malcolm expressou suas aspirações a um professor, foi-lhe dito que nunca se tornaria advogado porque era negro. Essa experiência com o racismo desiludiu Malcolm e o desencorajou de continuar os estudos.

Quando Malcolm era adolescente, ele foi para a cidade de Nova York. Ele trabalhou como garçom por um período no famoso Small’s Paradise Club no Harlem. Mas ele logo se tornou um intermediário para drogas, prostituição e outros tipos de atividades ilegais.

Em 1946, ele e seu amigo mais próximo Malcolm “Shorty” Jarvis se mudaram para Boston. Ambos foram presos e condenados por roubo logo depois. Malcolm foi condenado a 10 anos de prisão.

A Nação do Islã

Foi na prisão onde Malcolm começou a se tornar político. Ele conheceu a Nação do Islã, liderada por Elijah Muhammad. Malcolm foi atraído pela organização muçulmana porque ela abordou a situação do racismo e pediu o direito dos afroamericanos de ter seu próprio estado.

Malcolm se converteu ao Islã. Após sua libertação da prisão em 1952, ele se tornou um membro dedicado da Nação do Islã (NOI). Foi nesse ponto que ele optou por repudiar o sobrenome Little e, em vez disso, usar “X”. Ele considerou o uso de nomes europeus parte do legado da escravidão. Os negros receberam os nomes de seus senhores de escravos para estabelecer a propriedade.

Elijah Muhammad ficou muito impressionado com o talento oratório e o carisma de Malcolm X. Malcolm provou ser um trunfo importante para a organização muçulmana e se tornou um ministro graduado. A habilidade de Malcolm de chamar a atenção de muitos com sua persona magnífica convenceu a liderança a confiar a ele a tarefa de estabelecer mesquitas da NOI em outras cidades dos Estados Unidos.

Muitos viram sua personalidade cativante e o poder de suas imagens como superando a capacidade de persuasão de Elijah Muhammad. As pessoas foram atraídas para as manifestações precisamente para ouvir Malcolm X falar. Seus talentos contribuíram para o surpreendente aumento de membros da Nação do Islã de 500 em 1952 para 30.000 em 1963, de acordo com a curadoria do espólio de Malcolm X.

‘Nenhum homem deveria ter tanto poder’

Em um famoso incidente em 1957, antes de Malcolm X deixar a Nação do Islã, um membro da NOI foi espancado pela polícia no Harlem e não recebeu atendimento médico. Malcolm X demonstrou o poder de uma campanha popular disciplinada ao levar membros da NOI para a delegacia. Eles ficaram em formação em frente à delegacia.

Malcolm insistiu que o prisioneiro Black tinha direito a cuidados médicos. Temendo uma possível rebelião por parte do número crescente de residentes da comunidade encorajados pela liderança de Malcolm X, a chefia da polícia concordou em obter atendimento médico para o detido. Milhares de residentes do Harlem seguiram a ambulância da delegacia para o Hospital do Harlem.

A polícia então ordenou que a formação muçulmana se dispersasse. Malcolm com muita calma, mas com firmeza, explicou ao comandante da polícia responsável que a multidão em posição de sentido não reconhecia sua autoridade e não iria ouvir suas ordens.

Nesse ponto, depois de garantir que o homem espancado estava sendo tratado, Malcolm fez um sinal com a mão. Com disciplina militar, os muçulmanos deram meia-volta e marcharam para longe. O comandante da polícia foi ouvido dizendo aos seus subordinados: “nenhum homem deve ter tanto poder”.

Em 1963, após o assassinato do presidente John Kennedy, Elijah Muhammad instruiu seus seguidores a se absterem de fazer declarações públicas. Ele estava preocupado que qualquer declaração inflamada pudesse ser usada pelo governo racista dos EUA para reprimir a NOI. Mas Malcolm não resistiu a demonstrar sua disposição para com os governantes.

Sua avaliação contundente – “as galinhas voltaram para o poleiro” – era um sentimento generalizado nas comunidades mais oprimidas, que haviam sido excluídas das conquistas dos Estados Unidos capitalistas brancos. Kennedy foi morto pelos mesmos métodos violentos que a estrutura de poder perpetra sobre os conquistados e oprimidos.

Mas foi um choque para amplas camadas da população branca, desacostumada a uma avaliação tão calma e crítica da sociedade americana. A declaração foi usada por uma mídia histérica para preparar uma campanha de medo contra Malcolm e a Nação.

Política divergente

A declaração enfureceu a liderança da NOI. Elijah Muhammad proibiu Malcolm X de falar publicamente por 90 dias.

Junto com essas questões organizacionais, as diferenças políticas entre Malcolm X e Elijah Muhammad tornaram-se mais difíceis de reconciliar.

O programa de Elijah Muhammad foi baseado na noção conservadora de conciliação com o status quo. Ele procurou ganhar legitimidade – mas não com base na participação e liderança para o surgimento rebelde dos anos 1960. Ele procurou promover um conceito de capitalismo negro, onde a comunidade afroamericana usaria a riqueza gerada para enriquecer uma elite negra que poderia, em última instância, competir com o capitalismo racista dos EUA em seus próprios termos – mas não competiria com ele até que a elite fosse poderosa o suficiente.

Malcolm X, por outro lado, foi atraído pela militância do movimento pelos direitos civis. Sua abordagem foi caracterizada por nenhum compromisso com os opressores. Sua compreensão das profundezas do racismo nos Estados Unidos o levou a concluir que o sistema atual era inerentemente hostil aos interesses do povo afroamericano. A luta era necessária para enfrentar o desafio. Em todas as questões relacionadas com a situação das massas negras, ele nunca hesitou em ser crítico ao avaliar a crueldade da estrutura de poder existente.

Em março de 1964, após muitas batalhas internas amargas, Malcolm X rompeu seu relacionamento com a Nação do Islã. Ele fundou a Mesquita Muçulmana, Inc. No mesmo ano, Malcolm viajou em peregrinação a Meca, na Arábia Saudita. Entrar em contato com muçulmanos de diferentes raças, inclusive brancos, foi uma experiência que mudou qualitativamente sua visão em relação às relações raciais e à luta de libertação nos Estados Unidos. Pela primeira vez, Malcolm viu um potencial para uma luta revolucionária com base em uma frente única neste país. Após seu retorno, ele mudou novamente seu nome, para El-Hajj Malik el-Shabazz.

Divisão de inflamação do governo

Malcolm X se tornou o alvo de uma série de tentativas de assassinato, incluindo o bombardeio de 14 de fevereiro de 1965 em sua casa onde vivia com sua família, Betty Shabazz e suas quatro filhas. Quando Malcolm revelou publicamente o motivo de sua saída da NOI, o relacionamento com seus ex-colegas tornou-se perigosamente antagônico.

A tremenda liderança e capacidade de Malcolm de projetar esperança para as massas negras oprimidas estavam, sem dúvida, sob vigilância cuidadosa pela polícia e agências de inteligência federais. Esse escrutínio teria estado a todo vapor depois que ele se encontrou com o líder revolucionário cubano Fidel Castro em 19 de setembro de 1960, no Hotel Theresa, no Harlem.

Malcolm suspeitou que o FBI e a polícia o mantiveram sob vigilância muito próxima, uma suspeita que se provou correta anos depois. Ele também suspeitou que o governo estava inflamando as diferenças entre a NOI e sua organização. Malcolm estava convencido de que estava sendo criado um cenário que levaria a um atentado contra sua vida.

Em 21 de fevereiro de 1965, no Audubon Ballroom de Nova York, três homens armados abordaram Malcolm enquanto ele falava no palco. Os assassinos dispararam repetidamente suas armas à queima-roupa, tirando a vida do amado e respeitado líder afroamericano.

Um exemplo de militância

Não há como dizer como as políticas e táticas de Malcolm teriam se desenvolvido se ele não tivesse sido assassinado. Mas uma coisa é certa: Malcolm X foi um revolucionário. Em toda a extensão de seu desenvolvimento político, ele demonstrou uma qualidade de ódio feroz contra o status quo do racismo e da opressão. Foi esse traço que o tornou um líder militante e exemplar.

Seu impacto foi sentido muito depois de sua morte. Mais notável, a linha política do Partido dos Panteras Negras foi fortemente influenciada pelo nacionalismo negro desafiador e revolucionário de Malcolm, bem como pelo marxismo-leninismo.

A luta que se seguiu dentro da Nação do Islã entre Malcolm X e seus seguidores, por um lado, e Elijah Muhammad e elementos conservadores mais burgueses, por outro, foi essencialmente uma luta entre forças que buscavam uma direção revolucionária e aqueles que desejavam acabar com a opressão imitando os opressores. Esse fenômeno sempre existiu nos movimentos de setores socialmente oprimidos.

Malcolm morreu quando tinha 39 anos. Embora tenha vivido uma vida curta, ele teve um impacto poderoso sobre os movimentos afro-americanos e outros movimentos revolucionários nos Estados Unidos.

Em particular, comunistas de todas as nacionalidades e outros que se esforçam para construir uma luta revolucionária unificada aprenderam com seu poderoso exemplo de desafio contra a dura realidade do racismo e da alienação. Eles aprenderam a necessidade de construir uma unidade baseada no respeito pelo potencial revolucionário das massas afroamericanas.

Liberaration News, traduzido por Vinicius Souza

Fonte: https://lavrapalavra.com/2020/10/12/o-legado-militante-de-malcolm-x/

Dia do professor e da professora, por @LatuffCartoons

Fonte: https://twitter.com/LatuffCartoons

quarta-feira, 14 de outubro de 2020

Ex-Pantera Negra, Jalil Muntaqim será solto após 49 anos de prisão nos EUA - OPERA MUNDI

Ex-Pantera Negra, Jalil Muntaqim será solto após 49 anos de prisão nos EUA

Ativista foi preso em 1971, aos 19 anos, acusado de matar policiais; diversas evidências apontam sua inocência

O ex-membro dos Panteras Negras Jalil Muntaqim, que está preso há 49 anos nos Estados Unidos, será solto até o dia 20 de outubro.

Foi o que determinou o Conselho de Condicionais do Estado de Nova York na última quarta-feira (23/09) após uma das muitas audiências que o ativista tem comparecido desde 1998, ano em que pôde começar a pedir liberdade condicional.

Segundo o jornal The Guardian, a justificativa dada pelas autoridades foi a de que Muntaqim expressou "remorso" pelo crimes cometidos e de que seu sentimento "era genuíno".

O ex-Pantera Negra, hoje com 68 anos de idade, foi preso em 1971, aos 19 anos, acusado de matar dois policiais durante um tiroteio no bairro do Harlem, em Nova York.

Apesar de diversas evidências surgidas ao longo dos anos apontarem sua inocência, Mustaqin ficou preso quase meio século e vinha tendo, até essa semana, todos os seus pedidos de liberdade condicional negados. 

À época da condenação, a principal testemunha, um outro membro dos Pantera Negras chamado Ruben Scott, chegou a reconhecer que incriminou Mustaqin e outros envolvidos na morte dos policiais após sessões de tortura, o que não impediu que seu depoimento fosse validado e o pedido de um novo julgamento pela defesa negado.

Além disso, um relatório balístico do FBI chegou a constatar que a arma em posse do ativista no momento de sua prisão não correspondia aos projéteis encontrados nos corpos dos policiais mortos. O parecer federal foi substituído pelo da polícia de Nova York, que oferecia uma conclusão oposta.

Albert “Nuh” Washington e Herman Bell foram outros dois militantes condenados no mesmo processo. Em 2000, Washington morreu de câncer na prisão. Bell, por sua vez, conseguiu sua liberdade condicional em 2018, aos 70 anos de idade.

Revolucionário

Nascido em Oakland, Califórnia, filho de negros admiradores do pacifismo de Martin Luther King, Mustaqin, que fora batizado como Anthony Bottom, mas adotou outro nome após conversão para o islamismo, decidiu ingressar no Partido dos Panteras Negras aos 17 anos de idade.

A organização revolucionária socialista, fundada no final dos anos 1960, era então uma das principais referências da nova geração de lutadores pelos direitos da população negra e trabalhadora dos EUA.

"Perdi qualquer esperança que os negros pudessem lutar sem apelar à autodefesa, sem responder à violência policial e dos grupos racistas. Ainda não tinha 17 anos, mas decidi me inscrever nos Panteras Negras, para desgosto de minha mãe", contou o ativista a Opera Mundi no ano de 2016.

Após sua filiação, aceitou participar do braço armado dos Panteras, mais tarde chamado de Exército Negro de Libertação (BLA, na sigla em inglês).

Durante a prisão, o ativista se formou em Psicologia e Sociologia, além de ter escrito romances e poemas. Mesmo encarcerado, Mustaqin não deixou a luta social e se tornou uma das principais figuras pela libertação dos presos políticos nos EUA.

Fonte: https://operamundi.uol.com.br/direitos-humanos/66871/ex-pantera-negra-jalil-muntaqim-sera-solto-apos-49-anos-de-prisao-nos-eua

Brecht, Walter Benjamin e o “novo ruim” - por Artur de Vargas Giorgi

Brecht, Walter Benjamin e o “novo ruim”.

Avanço do virtual, agora mais intenso, reforça a naturalização da vida: a ilusão de que o que ocorre é necessário e inevitável. Mas arte e técnica podem mostrar as entranhas da condição social e o mundo como construção precária e transformável

1. No ano de 1938, Walter Benjamin visita pela terceira vez o amigo Bertolt Brecht, que então vivia exilado em Svendborg, Dinamarca, um dos muitos lugares por onde o dramaturgo alemão passaria ao longo dos seus quinze anos de desterro, transitando entre a hospitalidade e a hostilidade.

Benjamin em breve seria, como sabemos, o autor das teses “Sobre o conceito de história”, últimos e incontornáveis escritos antes da sua opção pelo suicídio, em 1940, como forma de escapar da violência da Gestapo hitlerista. Não obstante, naquele ano de 1938, mais precisamente em 25 de agosto, o que o filósofo anota em seu diário íntimo é algo muito conciso, em certo sentido, algo mínimo.

Nessas páginas, onde Benjamin registra os debates, os confrontos, as partidas de xadrez que, ao longo dos dias, mantém com Brecht, encontramos lapidada, com efeito, em pouquíssimas palavras, “uma máxima brechtiana”; máxima que propõe o seguinte: “não partir do antigo bom, mas do novo ruim” (em Ensaios sobre Brecht).

Em tamanha concisão, hoje nada seria mais preciso e urgente. É como se fôssemos tomados por um eco do passado dirigido às emergências do nosso presente. Quer dizer, somos interpelados por uma exigência cifrada há mais de 80 anos, sob a ameaça do nazifascismo, exigência que permanece neste nosso presente destemperado e pungente, ameaçado pelas formas contemporâneas do autoritarismo.

2. O novo ruim: eis de onde devemos partir, para que não seja normalizada, sem mais, a catástrofe do “novo normal”. Esta seria a posição crítica a ser adotada nestes tempos que, imagino, teriam colocado Benjamin diante de impasses inauditos a respeito da amplitude assumida pela reprodutibilidade técnica; tempos que, nesse sentido, ainda, parecem pedir o reforço não só de nossas capacidades de compreensão das técnicas, mas, sobretudo, de um gesto caro a seu amigo e parceiro de xadrez: um gesto que muitas vezes é chamado de distanciamento, ou estranhamento.

Sabemos que Benjamin não recuava perante as mais avançadas tecnologias do seu tempo. Além de postular que um posicionamento político e estético antifascista deveria ser alcançado não com o rechaço, mas sim, justamente, por meio das técnicas modernas de reprodução (principalmente o cinema), Benjamin foi, ele mesmo, entre o final dos anos 1920 e o início da década de 1930, um speaker em rádios alemãs, falando a crianças e jovens sobre assuntos nada distantes dos seus ensaios mais exigentes.

Brecht não destoava dessa posição em seu pensamento crítico sobre o teatro. Palavras de Benjamin: “As formas do teatro épico correspondem às novas formas técnicas, o cinema e o rádio. Ele está situado no ponto mais alto da técnica”.

Com efeito, o dramaturgo propunha que a superação da identidade emocional entre o público e as ações encenadas, ou ainda, que a interrupção das prescrições miméticas e catárticas do teatro clássico “naturalista” deveria ser alcançada não fora ou para além do teatro, mas pela mobilização radical dos seus próprios recursos e artifícios. Assim, o teatro deveria interpelar o público ao expor o mundo humano como uma construção contingente, portanto passível de transformação, ao mesmo tempo em que deveria se expor, ele mesmo, como construto, como técnica de exposição.

3. O título de um poema de Brecht sintetiza bem essa operação – “O mostrar tem que ser mostrado” – e seus versos dão contorno ao programa do teatro épico:

[…]
Eis o exercício: antes de mostrarem como
Alguém comete traição, ou é tomado pelo ciúme
Ou conclui um negócio, lancem um olhar
À plateia, como se quisessem dizer:
Agora prestem atenção, agora ele trai, e o faz deste modo.
Assim ele fica quando o ciúme o toma, assim ele age
Quando faz negócio. Desta maneira
O seu mostrar conservará a atitude de mostrar
De pôr a nu o já disposto, de concluir
De sempre prosseguir. […]

Assim como Benjamin, Brecht sabia que na modernidade o problema da arte confina com o problema da política porque, para ambas, a exposição mediada pelas técnicas é decisiva. Obras de arte, artistas, públicos e políticos – todos compartilham, desde então, os mesmos espaços de exposição; todos se medem, cada vez mais, com as técnicas de reprodução, isto é, com as mediações que montam e desmontam, que modulam, compõem e recompõem o mundo que eles compartilham e disputam.

E se, a priori, o teatro pareceria escapar a esse destino, pelo fato de se valer de atores que confrontam o público diretamente e de cenas – por assim dizer – sempre originárias, desempenhadas sem edição, o que o teatro épico de Brecht propõe se aproxima, sim, da transformação causada pelo cinema na exposição de atores e políticos, igualmente. Pois vale para o teatro épico o que Benjamin escreveu a respeito da técnica cinematográfica: “Seu objetivo é tornar ‘mostráveis’, sob certas condições sociais, determinadas ações de modo que todos possam controlá-las e compreendê-las”.

Ao romper com o ilusionismo da cena, com seu andamento supostamente natural, Brecht faz intervir o teatral, vale dizer, o caráter artificial, não só do teatro, mas também das condições sociais, dessa nossa “realidade”, que tantas vezes é vista como necessária e inegociável. E com isso seu teatro afirma que, na arte como na política – nos modos da representação e nos meios da representatividade –, se o objetivo é a transformação da vida em comum, é preciso, então, não apenas mostrar; na mesma medida é necessário mostrar que se mostra, mostrar-se. Expor as formas de exposição: o que está em jogo com esse gesto é, não a reprodução do que já é vivido, mas a produção de formas de vida ainda possíveis.

4. As fundamentais medidas de preservação da vida – de toda vida – deveriam ser, estas sim, absolutamente inegociáveis. Mas, para muito além dessa conduta de fato ética, o chamado “novo normal”, entre outros aspectos muito problemáticos, apresenta-se, notadamente, como normalização da vida virtual. E se tampouco em nossos dias as respostas devem ser buscadas na recusa das técnicas mais avançadas, essa normalização definitivamente é algo que deveria ser submetido a uma crítica severa e constante.

Respostas políticas e estéticas afirmativas de uma vida comunitária somente serão possíveis com a exposição e o exame da realidade produzida pelas técnicas. Nesse sentido, é preciso mostrar que, em geral, a atual naturalização da virtualidade parece não reforçar a compreensão da contingência do mundo humano, ou seja, da possibilidade de transformá-lo. Ao contrário, parece cristalizar uma suposta certeza, sem dúvida arrogante: a certeza de que tudo que se dá é necessário, obrigatório, inevitável. Trata-se de uma lógica conservadora que, não raro, é perversamente associada ao discurso do progresso, do avanço, da evolução etc.

Afinal, conhecemos bem o elogio dos fluxos desimpedidos; o elogio da comunidade global sem hierarquias; da revolução dos conteúdos, dos afetos e das identidades; o elogio das novas formas de intimidade; do acesso e da autonomia usuária a qualquer hora e da entrega em casa just in time. Conhecemos, em suma, essa forma de apropriação que capitaliza a energia transformadora do mundo e limita nossas ações à escolha entre produtos e serviços (zoom, meet, facebook, instagram…), evitando assim as questões mais urgentes, que na verdade são as mais básicas.

O mundo virtual não reforça formas de exclusão? Que tipo de trabalho o sustenta? Quem gerencia as informações das plataformas e redes sociais? O que fazem com esses dados? A vida nos espaços públicos se intensifica? As demandas coletivas se reforçam? Essa estranha intimidade distanciada e exposta produz novos sujeitos? Em que medida essas formas de subjetivação nos interessam? É um problema a exposição da intimidade de muitos gerar lucro para pouquíssimos? E, para além da exposição, a virtualidade de fato intervém nas partilhas do mundo? Ela favorece, efetivamente, a produção de novas condições sociais, de realidades alternativas mais igualitárias?

As respostas devem ser matizadas: às vezes sim, às vezes não, em outras vezes, parcialmente. Seja como for, são perguntas como essas que, a meu ver, devem orientar, por exemplo, o debate sobre o uso na educação – e sobretudo na educação pública – de plataformas privadas ligadas ao mercado do chamado big data, assim como devem orientar a discussão sobre o fato de, hoje, cada usuário online ser “automaticamente” um produtor e, ao mesmo tempo, um consumidor de conteúdos.

Esse trabalho imaterial, segundo Peter Pál Pelbart, é uma das definições do mundo virtual. E responder criticamente a ele não é uma tarefa simples, já que através desses fluxos virtuais formatamos nossos gostos, condutas, sonhos, opiniões – nossos afetos. Como escreveu o autor em A vertigem por um fio, produzimos e consumimos “cada vez mais maneiras de ver e de sentir, de pensar e de perceber, de morar e de vestir, ou seja, formas de vida”. Daí a complexidade da situação.

5. Apesar das diferenças sobre os modos do posicionamento político-partidário (bem sinalizadas em Quando as imagens tomam posição, de Georges Didi-Huberman), Benjamin e Brecht demarcaram em torno das técnicas de reprodução e exposição o ponto da crise, da crítica e da criação.

No teatro épico, o público deixa de ser um espectador: ele é chamado a atuar, pois deve avaliar e tomar decisões sobre o que é mostrado. O homem e a sociedade são confrontados pela investigação que os afasta do conhecido, do que seria “natural”. Nada mais próximo de Benjamin, que afirmava que através do cinema a realidade podia ser vista como uma segunda natureza: produzida como uma flor azul no jardim da técnica.

Claro, somos desde o início criaturas prometeicas, ou seja, fomos e somos algo como deuses, mas com próteses, como sugeriu Freud em O mal-estar na civilização. Por isso, diante desse nosso mal-estar, diante do novo ruim, talvez a estratégia seja reforçar a exposição da nossa natureza de segunda ordem: nossa natureza técnica.

O mundo virtual não deixa de ser um imenso palco, uma cena montada, produtora de inúmeros efeitos reais. Não podemos naturalizar essa condição. Se não conseguirmos expor os artifícios que criamos e que também nos criam, não conseguiremos criticá-los, compreendê-los e controlá-los.

Benjamin escreveu que, no teatro de Brecht, o palco ainda ocupa uma posição elevada. Mas com uma diferença fundamental: em sua elevação, o palco já não tem nada de sublime, mágico ou extático. O que nele se desempenha é o estranhamento do mundo que até agora construímos. Quem sabe desse estranhamento resulte uma tomada de posição que coincida com a interrupção dos acontecimentos e com a sua leitura a contrapelo. Afinal, esse mundo estranho é o mundo ordinário, o nosso mundo humano de todos os dias. Um mundo de próteses e técnicas, artes e artifícios que é, sim, contingente. Modificar esse mundo profundamente é o papel dos atores de hoje.

ARTUR DE VARGAS GIORGI : É doutor em Literatura pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e professor de Teoria Literária da mesma instituição.

Fonte: https://outraspalavras.net/crise-civilizatoria/brecht-walter-benjamin-e-o-novo-ruim/

O fim da corrupção - por Latuff


 Fonte: https://www.brasildefato.com.br/artes/2020/10/09/o-fim-da-corrupcao

terça-feira, 13 de outubro de 2020

O contrato de vassalagem e a cegueira estratégica dos militares - por José Luis Fiori

O contrato de vassalagem e a cegueira estratégica dos militares

Na verdade, é a insegurança generalizada e crescente em que se debate, agoniada a humanidade de hoje, o ópio venenoso que cria e alimenta estas hórridas visões, capazes, entretanto, de se tornarem uma realidade monstruosa.

Golbery do Couto e Silva, Conjuntura, Política Nacional, o Poder Executivo & Geopolítica do Brasil. Rio de Janeiro: José Olympio Editora, 2ª ed. 1981, p. 9.


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Nunca houve consenso ideológico dentro das Forças Armadas brasileiras, e sempre existiram militares que foram democratas, nacionalistas e comunistas. O mais famoso talvez tenha sido o capitão Luiz Carlos Prestes, que participou do “movimento tenentista” dos anos 20 e da “Revolta dos 18 do Forte” de Copacabana, e depois liderou – ao lado do Major Miguel Costa – a famosa Coluna que marchou pelo Brasil, durante 2 anos e 5 meses, antes de ser derrotada, defendendo a justiça social, a universalização do ensino gratuito e a adoção do voto secreto nas eleições brasileiras. E mesmo depois da Segunda Guerra Mundial, houve muitos que se opuseram aos golpes de Estado de 1954, 55, 61 e 64, e que tiveram participação importante na luta pelo monopólio estatal do petróleo e pela criação da Petrobras. Mais do que isto, sempre houve militares que defenderam a centralidade do Estado no desenvolvimento econômico e la luta contra a desigualdade social do Brasil.

Mesmo assim, não há dúvida de que a grande maioria dos oficiais brasileiros, sobretudo depois da Segunda Guerra Mundial, foi sempre conservadora e de direita, golpista e partidária da submissão militar do Brasil aos Estados Unidos. E foi essa tendência majoritária e conservadora que sempre venceu e se impôs, dentro e fora das FFAA, em todos os momentos cruciais da história política brasileira dos últimos 80 anos. E agora de novo, foram eles que venceram com o golpe de Estado de 2016 e a instalação do atual governo; e foram eles que reestabeleceram a vassalagem militar do Brasil com relação às Forças Armadas e à política externa dos Estados Unidos. Por isso cabe perguntar-se: em que consiste exatamente a “vassalagem moderna” entre Estados nacionais soberanos? Qual é a aposta ou expectativa dos militares brasileiros, depositada neste tipo de relacionamento com os Estados Unidos, e mais recentemente, também com relação a Israel? E sobretudo, quais as consequências de curto e longo prazo, desta relação de vassalagem, para o Estado e a sociedade brasileira?

Do ponto de vista estritamente contratual, os acordos modernos de vassalagem militar garantem ao “Estado-vassalo” a venda de armas e munições mais sofisticadas, e de algumas “tecnologias de ponta” controladas pelo “estado-suserano”, em troca de recursos e minerais estratégicos do país vassalo, e da cessão de suas tropas para as guerras da potência dominante. E emm muitos casos, esse contrato também envolve – como na Colômbia – a cessão de território para instalação de soldados e bases militares norte-americanas. No período da Guerra-Fria, essas armas foram entregues ao Exército brasileiro para combater os “países comunistas”. Mas hoje não está claro quem seja o inimigo brasileiro, e o que pretendem fazer suas Forças Armadas com este armamento mais sofisticado e destrutivo que receberão dos Estados Unidos. Contra quem pretendem utilizá-las? Se for contra as Grandes Potências, serão inúteis porque elas dispõem do poder atômico que o Brasil não tem, mas se for contra seus vizinhos sul-americanos, isto acabará provocando uma corrida armamentista no continente, uma vez que não se pode supor que os outros não façam o mesmo que no Brasil. E quem pode sair ganhando com a transformação da América do Sul num grande comprador de armas? E qual o custo dessa loucura para um continente que já é pobre e que sairá ainda mais pobre da atual pandemia do coronavírus? Neste sentido, cabe perguntar aos militares brasileiros se eles já fizeram este cálculo, e se eles têm clara a herança que deixarão para seus filhos e netos, e sobretudo para a grande maioria dos brasileiros que não são militares e que não têm nada a ver com essas armas que lhes serão financiadas e favorecidas em troca de sua vassalagem?

Mas além disto, a expectativa de todo “Estado vassalo” é obter também vantagens econômicas de sua vassalagem, sob a forma do livre acesso aos mercados e investimentos da “potência-suserana”. Foi assim que de fato, durante a Guerra Fria, em particular entre 1950 e 1980, a vassalagem brasileira foi compensada pelo apoio norte-americano ao projeto desenvolvimentista dos militares brasileiros daquela época. E neste sentido se pode dizer, inclusive, que o chamado “milagre econômico” da ditadura militar” foi uma espécie de réplica latina do “desenvolvimento a convite” da Coreia, de Taiwan, do Japão ou mesmo da Alemanha, e de quase toda a Europa que foi favorecida pelo Plano Marshall. Essa situação, no entanto, não se repetiu em lugar nenhum do mundo depois da década de 80, quando os Estados Unidos abandonaram sua estratégia econômica internacional do pós-Segunda Guerra inaugurada pelos acordos de Bretton Woods, de 1944, e adotaram sua nova estratégia de desregulação e liberalização selvagem dos seus mercados periféricos, que foi experimentada depois do golpe militar chileno de 1973, mas que só chegou ao Brasio na década de 90. E agora, mais recentemente, a expectativa de que os Estados Unidos possam ajudar o desenvolvimento econômico de seus “vassalos”, já na terceira década do século XXI, não tem pé nem cabeça. Neste momento, a economia americana está sendo atropelada pela “crise epidêmica”, mas mesmo antes disto, o governo de Donald Trump já havia adotado uma política econômica “de tipo nacionalista”, com a proteção de seu mercado interno e de sua indústria, e com a defesa intransigente de seus produtores de grãos e alimentos, que concorrem diretamente com o agro-business brasileiro.

Assim mesmo, é impossível imaginar um governo que seja mais subserviente e lambe-botas de Donald Trump que o atual governo brasileiro. No entanto, nos últimos dois anos, o Brasil não logrou nenhum acordo comercial significativo com os Estados Unidos e não obteve nenhuma vantagem ou favorecimento especial do governo norte-americano. Pelo contrário, o Brasil já foi objeto de várias retaliações e humilhações econômicas do governo Trump, sem que tenha dito uma só palavra de protesto ou defesa de seus próprios interesses nacionais. E para além dos Estados Unidos, o Parlamento Europeu rejeitou recentemente o acordo comercial que havia começado a tramitar, entre a União Europeia e o Mercosul, como forma de retaliação explícita contra o o governo do Sr, Bolsonaro. E para culminar, nos últimos 12 meses, a fuga dos investidores privados estrangeiros do Brasil mais que dobrou, não havendo nenhuma expectativa de reversão dessa tendência que, pelo contrário, deve piorar ainda mais. Por tanto, até agora, a nova vassalagem militar do Brasil não trouxe nenhuma vantagem econômica, nem de mercados abertos nem de investimentos

Os bufões do atual governo não entendem nada de economia, nem sabem o que seja o capitalismo. Mas o mais grave é que seus militares não também não consigam entender que seus novos aliados econômicos – diferentemente do período da Guerra Fria – são financistas; e que, no capitalismo contemporâneo, os financistas não necessitam do crescimento econômico do PIB, para aumentar seus lucros e acumular sua riqueza privada. Basta dizer que nos últimos cinco meses em que a pandemia do coronavírus destroçou a economia mundial, a riqueza financeira do mundo cresceu 25%, para mais de US$10 trilhões, e o patrimônio dos 42 maiores bilionários brasileiros, quase todos financistas, cresceu US$34 bilhões. E enquanto os militares do governo não entenderem este aparente paradoxo capitalista, nem conseguirem perceber que sua vassalagem contemporânea não lhes trará vantagens econômicas, eles seguirão se debatendo para controlar este governo” que ajudaram a criar, que consegue ter, ao mesmo tempo, um chanceler que ataca a China e a globalização econômica, enquanto seu ministro de economia aposta todas as suas fichas exatamente na China e na globalização.

Por último, a “relação de vassalagem” moderna envolve também compromissos e consequências estratégicas que não aparecem explicitados nos acordos militares. Por exemplo, depois da Segunda Guerra Mundial, as FFAA brasileiras não precisaram mais escolher seu “inimigo externo”, que passou a ser definido diretamente pelos Estados Unidos. E durante toda a Guerra Fria, esse “inimigo” foi a União Soviética, que não tinha o menor interesse nem a menor possibilidade de atacar o Brasil, um país que estava inteiramente fora do “jogo” das grandes potência”. Além disso, esta estranha condição de “inimigo do inimigo dos outros” criou uma distorção permanente no comportamento do Exército brasileiro, que se transformou numa polícia especializada no combate aos “traidores internos”, ou seja, para começar, todos aqueles que divergissem da posição norte-americana e da vassalagem militar brasileira. Foi assim que nasceu a figura do “inimigo interno”, criada pela Doutrina de Segurança Nacional formulada na década de pela Escola Superior de Guerra, imediatamente depois da assinatura do Acordo Militar Brasil-Estados Unidos, de 1952. E foi graças a essa verdadeira “cambalhota funcional” que as FFAA passaram a espionar seu próprio povo, na busca constante e obsessiva do “ópio venenoso” e das “hórridas visões” que estariam ameaçando a paz interna da sociedade e do estado brasileiro, segundo as palavras do General Golbery do Couto e Silva, citadas na epígrafe deste texto. E foi assim que nasceu e se consolidou historicamente a relação direta entre a “vassalagem internacional” do Brasil e o “autoritarismo nacional” das suas Forças Armadas, que passaram a denunciar como “inimigos” do Estado todos aqueles que discordassem das suas próprias posições ideológicas, e da sua cegueira estratégica.

Esta distorção das Forças Armadas explica porque depois da Guerra Fria, e durante o período da uni-polaridade americana, os militares brasileiros perderam sua bússola e ficaram sem inimigos claros durante quase vinte anos. E quando tentaram definir um “inimigo externo” por sua própria conta, escolheram a França[1], o que é pouco menos que ridículo, uma vez que ela é hoje apenas uma potência intermediária declinante, que mal consegue exercer alguma influência no norte da África e que, ainda por cima, é adversária do governo venezuelano que os militares brasileiros tanto odeiam. E como consequência, para recriar o seu o “boneco de pancada” ou “inimigo interno”, tiveram que recorrer a uma invenção esdrúxula da ultradireita norte-americana: um tal de “marxismo cultural”, que eu ninguém sabe o que seja, mas que serviu para os militares brasileiros demonizarem todos os “movimentos identitários”’ e “politicamente corretos”, e em particular, a um ex-presidente da República, seu partido e seus militantes, apesar deles serem uma peça essencial de todo e qualquer jogo democrático.

Esta confusão se mantem até hoje, mas o quadro alterou-se radicalmente no momento em que o presidente Donald Trump elegeu o novo inimigo externo dos Estados Unidos, em 2019, ao declarar sua guerra comercial e tecnológica contra a China, e ao tentar polarizar o mundo em torno de seu contencioso com os chineses. O problema, entretanto, é que no momento em que Donald Trump mudou sua política externa, o Brasil já tinha se transformado numa economia primário-exportadora dependente dos mercados e investimentos chineses, e está cada vez mais difícil de transformar em inimigo estratégico do Brasil, o país que é precisamente o seu principal parceiro econômico. Além disso, como os chineses são pragmáticos e não se propõem a converter ninguém, fica ainda mais difícil transformar os admiradores da China em “inimigos internos” do estado brasileiro, como aconteceu com os comunistas durante a Guerra Fria.

No meio dessa “barafunda” ideológica e política, e do caos econômico que se acentua a cada momento que passa, o homem comum se pergunta o que afinal tem a dizer e propor os militares brasileiros com relação aos milhões de brasileiros que hoje vegetam na miséria e na fome dos campos e das grandes cidades do país, e que reclamam e protestam porque têm fome, mas não são “inimigos” do Estado brasileiro, nem muito meos de suas Forças Armadas ?

E aliás, quem deu a estes senhores o direito, e de onde vem sua arrogância de querer julgar e decidir quem são os bons, e quem são os maus brasileiros ?

13 de outubro de 2020
***

José Luis Fiori é Professor permanente de Economia Política Internacional do PEPI/UFRJ.

*Este artigo complementa nosso último texto sobre “A lenta construção de um ‘Estado vassalo’ e o papel dos militares brasileiros”, publicado em Carta Maior em 30 de setembro de 2020.

[1] “Elite militar brasileira vê França como inimiga nos próximosm20 anos”, Folha de São Paulo, 10/02/2020

Fonte: https://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Politica/O-contrato-de-vassalagem-e-a-cegueira-estrategica-dos-militares/4/48988

Memória combativa: A Batalha da Praça da Sé – por A.N.A.

Memória combativa: A Batalha da Praça da Sé

07/10/1934

Na época, o fascismo estava em ascensão/ Sete de outubro, um domingo então/ Em uma praça, milhares de integralistas/ Jurariam fidelidade ao líder fascista/ Em nome da vida e da liberdade/ Armas na mão e cabeças erguidas/ Membros da frente antifascista/ Resolveram que o evento seria impedido/ Fascistas e policiais, começaram a atirar/ Tentando debandar os manifestantes/ Mas veio dos prédios à volta do lugar/ A resposta que os fascistas não estavam a esperar/ Fuzis e espingardas começaram a atirar/ Integralistas a correr por todo lugar/ Sangue nacionalista espalhado pelo chão/ A luta antifascista uma vitória então./

Música & Letra Execradores.  

Na defesa da Vida e da Liberdade

Viche! Na defesa da liberdade muita luta, mas muita luta já rolou e tá rolando nesta guerra social! É com grande esforço que se logra pequenos respiros de liberdade que afinal nem de longe possuem do brilho da LIBERDADE. Rodeados de propriedades, deveres, leis, instituições que cobiçam dominar a sociedade, tiranos de todas as cores, a luta se põe como a vida é, feroz.

Nos vendavais e mudanças de tempo que estamos envoltos dentro da Guerra Social, desenham-se, dentro das infinitas possibilidades, situações duras com horizontes sombrios. As ascensões de movimentos fascistas e reacionários assim são sentidas por todos os seres que mantém um firme apego pelo valor da liberdade, pela beleza da diversidade da vida em suas expressões e sente a constante necessidade em defendê-la.

Os anarquistas e suas experiências têm marcado suas trajetórias com sua firme ação de combate contra toda forma de poder, de autoridade, de dominação. São por sua natureza, provocadores de práticas de auto organização dos rumos da vida assim todo o governo, máfias e instituições que o sustentam, o estado em si, se impõe como tirano e é um inimigo. Nestas trajetórias dentro da constante luta social contra as opressões lá estavam anarquistas e suas iniciativas declarando “Paz entre nós guerra aos senhores”; não lhes parecendo oportuno trocar um senhor por outro, assim, constantemente na busca pela anarquia, as forças anarquistas, além de lutarem contra os opressores de plantão e seus lacaios, se opuseram a todos os grupos que na guerra social lutavam contra o poder pelo poder, mesmo alegando querer transformá-lo radicalmente.

Pequenos e grandes tiranos

E quantos são os que querem dominar? Tantos! Quantos são os que impõe sua verdade? Caramba! Os ricos e seu modo de vida, as religiões, facções políticas (partidos), criminosas, milícias, são destaque neste elenco junto aos falsos críticos do sistema. Os anarquistas posicionam-se contra todos tiranos e seus bajuladores.

Assim Bolsonaro como Lula são tiranos, distintos, mas tiranos! Plínio Salgado como Luís Carlos Prestes[1] foram durante suas vidas pequenos tiranos, que sonharam em “ser um grande tirano”, foram distintos, mas pequenos tiranos!

Nos anos 30 surgiu no Brasil um movimento fascista organizado transformando-se em um partido, a Ação Integralista Brasileira (AIB), nacionalistas com uma doutrina própria, o Integralismo, que foi a encarnação de valores de dominação e submissão que toma distintas faces ao longo dos tempos. Com seu explícito valor autoritário onde se declaram saberem o que é bom para a vida de todos esforçam-se em se impor como “o” caminho para a vida coletiva com seus valores de deus pátria família. Um pesadelo para diversidade humana. Como não poderia ser diferente movimentos que são compostos por gente que não pensa e se articula por sua própria cabeça, guiados por ordens, necessitam de um líder. Elemento fundamental das expressões do fascismo o culto a uma personalidade[2] como a Mussoline, Salazar ou Franco, os integralistas cultuavam uma, Plínio Salgado, fundador da doutrina e do partido.

A AIB se espalhou rapidamente por todo Brasil formando grandes agrupamentos integralistas organizados de forma hierárquica e paramilitar. Promoviam desfiles nas ruas com estandartes com a letra grega do sigma, todos uniformizados com uma fantasia verde de estilo militar. Nas regiões de colonização italiana e alemã ao sul do Brasil tiveram forte penetração.  Nas páginas de jornais inimigos do fascismo os integralistas se tratavam de “bandos de assassinos pastoreados por Plínio Salgado”, “gente fantasiada de verde”.

Por estas épocas, década de 30, o estancieiro de São Borja Getúlio Vargas havia tomado o poder do governo federal canalizando o fervor de intensas e reprimidas tensões por transformações sociais bradadas nos anos 20. Tornando-se assim chefe de um governo provisório que se espichou por quatro anos através da política (trapaças e manobras), da guerra[3], da repressão[4], da institucionalização dos sindicatos perseguindo quem animava as organizações autônomas dos trabalhadores. Peça importante de seu sucesso foi a criação do ministério do trabalho com o discurso da conciliação de classes para o bem do Brasil, foi esta a tese fundamental do trabalhismo, o qual se manifesta na política parlamentar até hoje pelo engodo aplicado pelo PTB, PDT, Avante, Podemos, PRTB[5] , PTC, Solidariedade.

Getúlio Vargas simpático aos movimentos fascistas no mundo e no Brasil manteve seu próprio estilo autoritário e populista, sendo proclamado como o “pai dos pobres”. Antes de lançar o Brasil na segunda guerra mundial contra as forças nazi-fascistas manteve aproximação com Mussolini, Hitler, e até 1937 com Plínio Salgado, ilegalizando totalmente os seguidores de Plínio com a frustrada tentativa integralista de ataque ao palácio presidencial.

Porém em 1934 a interação entre as forças integralistas e o governo de Getúlio Vargas era explícita deixando toda a extensa órbita de antifascistas em alerta. Com a aprovação do uso de seus uniformes pelo Ministério da Guerra os integralistas passam a realizar grandes desfiles nas ruas de cidades como Rio de Janeiro, Niterói, Salvador, Recife, Belo Horizonte. Getúlio acariciava os integralistas talvez os quisessem como tropa de choque contra a população papel o qual não tiveram força para assumir.

Pelo mundo a crise da burguesia capitalista internacional em 1929 reverberava sua ressaca sobre os povos da Terra. Na Rússia uma revolução social ocorrida em 1917 transforma-se em ditadura de um partido com filiais por toda terra (PC’s). Muitos países viviam a ascensão de movimentos pró-fascistas. É quando as perspectivas da vida social se deterioram de forma acentuada que parte da manada humana, domesticada pelo chicote da dominação, entende ser hora de apertar ainda mais o reduzido espaço de liberdade, afunilando as liberdades conquistadas a sangue buscando impor regimes severos de maior controle e violação da vida.

Anarquistas

Os anarquistas, duramente perseguidos no fim dos anos 20 com deportações, prisões, anulação de jornais e companheiros mortos na Colônia Penal de Clevelândia do Norte fruto da mão governamental e seus aparatos repressivos frente às revoltas de 1924 em hostilidade contra o governo de Arthur Bernardes, as agitações contra a lei celerada e a lei de imprensa que fechou A Plebe e muitos outros jornais em 1927, e ainda os massivos protestos pela libertação de Sacco e Vanzetti Os anarquistas buscavam articular-se diante dos novos horizontes da realidade do dia-a-dia.

É importante recordar também a destemida campanha antifascista desenvolvida pela anarquista Maria Lacerda de Moura desde o fim dos anos 20 provocando com seus artigos nos jornais uma repulsa contra o fascismo tão grande que a sede do jornal fascista de São Paulo Il Piccolo fosse apedrejada, destruída e incendiada por uma multidão enfurecida com sua propaganda de louvação ao fascismo. Maria Lacerda de Moura não descansa, dá conferências ao longo dos anos no Rio de Janeiro, Santos, Campinas, Sorocaba, Buenos Aires, escreve artigos em jornais e inúmeros livros de combate ao fascismo.

Em São Paulo retoma-se a publicação do jornal A Plebe, em 1932, tornando-se como antes em expressiva voz anarquista impressa em jornal. É especialmente pelas folhas de A Plebe[6] que percebemos a vida ativa dos anarquistas e suas iniciativas. É também em São Paulo em 1933 que anarquistas abrem o Centro de Cultura Social (CCS) com intuito de ter um espaço coletivo de portas abertas, ponto de encontro, local de conferências e apresentações teatrais. Destacando-se como reduto anarquista, antifascista, hostil aos camisas verdes e demais uniformizados.

Muitas e concorridas foram as apresentações teatrais e conferências sobre variados temas ocorridas no CCS e foi após atividades destas quando quem concorria nelas e saia as ruas em grupos que se desenrolavam enfrentamentos com fascistas e policiais. Num enfrentamento destes, após uma conferência antifascista o anarquista Agostino Farina foi ferido a bala na perna em uma situação cheia de versões que parece ter sido uma emboscada da polícia e dos integralistas, sendo preso junto a mais uma dezena de companheiros pelas forças da ordem. Farina no momento portava uma garrucha, farta munição e um punhal.

Outro reduto anarquista foi a Federação Operária de São Paulo (FOSP) composta por sindicatos que se mantinham firme em sua posição autônoma, pela ação direta, desatrelada a partidos políticos e a luta parlamentar mantendo-se em pé de guerra contra as forças que visavam dominar e orientar o rumo do movimento organizativo dos trabalhadores. Destacava-se seu rechaço ao Ministério do Trabalho, negavam-se ao uso da carteira de trabalho declarando ser ela uma forma de controle sobre quem trabalha.

São os anarquistas próximos destas iniciativas que animam e protagonizam os acontecimentos da Batalha da Praça da Sé, muitos anonimamente, outros recordados nas memórias, nas páginas de jornais ou autos policiais que o tempo deixou escritas. E lá estavam: João Perez, Natalino Rodrigues, Pedro Catalo, Manoel Marques Bastos, Simon Radowitsky, Edgar Leuenroth, Antonio Martinez, Rodolfo Felipe, Gusmão Soler, Herminio Marcos Hernandez e tantos mas tantos anônimos.

Os anarquistas são antifascistas na mesma medida que são contra toda e qualquer forma de governo e exploração, como a democracia combinada a ditadura do capital ou uma ditadura de um partido como o fez o partido comunista e governos nazi-fascistas em algumas partes do mundo, monarquias e toda forma de subjugação da vida. Assim como os anarquistas vão se unir com os pretensos senhores para lutar contra outros pretensos senhores que desfilaram na praça. Só a luta decide.

Um mês antes da Batalha da Praça da Sé, Plínio Salgado parte em excursão pras bandas do sul, passando pelo Paraná, Santa Catarina e em Porto Alegre no dia 11 de setembro realiza “estrondoso” comício no Cinema Navegantes.  Os anarquistas se fizeram presentes e “lançaram bombas de parede”, “inofensivas e barulhentas”,  “corre-corre  e apagar luzes”, quando acenderam as luzes após as explosões Plínio Salgado estava escondido de baixo da mesa da presidência da conferência[7].

A Batalha da Praça da Sé

Os integralistas chamaram para um grande desfile de juramento e fidelidade ao seu líder comemorando dois anos de seu movimento. Já haviam feito um chamado semelhante mas cancelaram pois viram que os que desprezam seus valores totalitários estavam a postos e haviam marcado um ato para o mesmo local e hora. Porém desta vez no dia 7 de outubro de 1934 não cancelaram seu desfile mesmo com a demonstração imediata de firme oposição. Foram varridos a bala, fugiram descamisados da praça pública.

O dia 7 de outubro contou com um enxame de gente antifascista de todas as tendências. A marcha dos integralistas era um grande insulto e também uma provocação, uma ameaça a todos que tem um mínimo apego pela liberdade. Os aferrados em organizações, muito antes desta batalha, trataram de formar uma frente única contra o fascismo. A sugestão da frente única surgiu por parte daqueles que almejam dirigir as “massas” se sentem iluminados e a frente intelectualmente dos outros, são a vanguarda . Os anarquistas não aderiram às formalizações da frente única, somente no campo de batalha no alvo de seu rechaço. Na memória de um comunista que lá estava foi no campo de batalha, na Praça da Sé, que os anarquistas na luta se cobriram de glória, se batiam como leões.

Manuel Marques Bastos, anarquista então veterano, declara em 1969 em entrevista a Edgar Rodrigues: “Fazia parte de nosso plano atacar a parada com um bonde dinamitado que seria empurrado na direção das tropas integralistas quando em sua marcha atingissem um determinado ponto, destroçando assim os 10 mil homens e pondo-os para correr.” Declara ainda que caguetes do PCB informaram a polícia sobre as intenções dos anarquistas .

Antonio Martinez, anarquista, esteve lá, e compartilhou suas memórias com jovens anarquistas relatando belas passagens deste confronto. Estas memórias nos dizem que a polícia armou metralhadoras em tripé entrincheiradas, foi então que o anarquista João Perez e Simon Radowitsky num momento de descuido pularam pra cima das forças da ordem tomaram uma metralhadora e começaram a disparar, foi o início do confronto, que durou horas de tiroteio. Os integralistas fugiram em debandada vergonhosa, eram aproximadamente 10 mil seguidores de Plínio Salgado, fantasiados de verde, abandonando suas camisas, deixando bandeiras ao chão, a marcha fascista e o juramento de fidelidade ao seu líder não aconteceram.

Muitos foram os feridos, três policiais reconhecidos perseguidores de “extremistas” foram mortos durante o confronto, também o estudante de direito antifascista Décio Pinto de Oliveira e três integralistas[11]. Os jornais se ocuparam por dias de “noticiar” os acontecimentos. Não havia como esconder, os fascistas foram expulsos da rua.

Segundo o informe reservado do DOPS do infiltrado Guarany no ambiente anarquista: “Agora fala-se muito nas proezas de Natalino Rodrigues no dia 7. Este elemento é tido como um dos principais envolvidos nas lutuosas ocorrências”[12].

Ainda no dia 7 de outubro após a Batalha da Praça da Sé a sede da FOSP é invadida pela polícia política. Lá os agentes da ordem relatam terem encontrado um revólver em cima de um armário. Prendem reconhecidos animadores da FOSP dentre eles, o “anarquista destemido” João Perez[13] e Natalino Rodrigues[14], acusando este de ter matado a tiros durante os confrontos na Praça da Sé dois agentes da ordem. A FOSP, o CCS, A Plebe protestam contra as prisões. Não muito tempo depois vários anarquistas de outras nacionalidades são expulsos do Brasil sumariamente pela recém nascida Lei de Segurança Nacional. Rodolfo Felipe principal responsável por A Plebe é preso. Walfrido Guimarães[15] é delatado para o DOPS por participar de atividades anarquistas e de atirar da janela de seu escritório contra integralistas em marcha na rua.

Logo do confronto nas páginas de seu jornal A Offensiva Plínio Salgado chora: “Fomos agora atacados, dentro de São Paulo, por uma horda de assassinos, manobrados por intelectuais covardes e judeus. Lituanos, polacos, russos, todos semitas, estão contra nós”.

Três anos após a batalha da Praça da Sé em uma eleição que por fim não ocorreu o líder integralista ao lançar sua candidatura a presidência durante um comício é varejado a bala na sacada do prédio onde discursa no centro de São Paulo e se escapa por pouco. Lá estavam os anarquistas!

Armando Guerra

Crônica Subversiva n° 4, Outono – Inverno 2019

Notas:

[1] Liderança do partido comunista brasileiro por aproximadamente 50 anos.

[2] O culto a uma personalidade mais que a uma idéia ou princípio fica evidente em expressões como Marxismo, Leninismo, Trotskismo, Stalinismo.

[3] Guerra Constitucionalista de 1932, financiada pelas elites paulistas buscando garantias constitucionais do futuro dos rumos da vida política. As forças de Getúlio Vargas vencem e a nova constituição é escrita.

[4] Com o Presídio do Paraíso, o Presídio Maria Zélia, ambos em SP, a Colônia Penal de Dois Rios em Ilha Grande RJ, ainda a penitenciária chamada Casa de Correção junto ao Gasômetro em Porto Alegre e tantos outros tristes locais de suplício. Vale recordar que data desta época o inicio do uso de gás lacrimogêneo contra quem protesta nas rua.

[5] Partido do vice presidente Mourão.

[6] São também destes anos os jornais anarquistas O Rebelde Órgão do Comitê de Relações dos Grupos Anarquistas de São Paulo, A Lanterna expressão anticlerical difundido largamente por todo Brasil, O Trabalhador, O Trabalhador da Light, O Trabalho, jornais de agitação operária com princípios anarquistas, Alba Rosa, Guerra Social ambos em italiano.

[7] Edgar Rodrigues, O Anarquismo no Banco dos Réus. Rio de Janeiro, VJR 1993. Pág. 144

[8] Fúlvio Abramo. A Revoada dos Galinhas Verdes. São Paulo, Veneta, 2014.

[9] Eduardo Maffei. A Batalha da Praça da Sé. Rio de Janeiro, Philobiblion, 1984.

[10] Edgar Rodrigues. O Anarquismo no Banco dos Réus. Rio de Janeiro, VJR, 1993. Pág.146

[11] Nildo Avelino. Anarquistas Ética e Antologia de Existências. Rio de Janeiro, Achiamé, 2004. Pág.79

[12] Marcos Tarcísio Florindo. O Serviço reservado da Delegacia de Ordem Política e Social de São Paulo na era Vargas. São Paulo, UNESP, 2006. Pág. 56

[13] Edgar Rodrigues. Os Companheiros 3. Florianópolis, Insular, 1997. Pág 23

[14] Raquel de Azevedo. A Resistência Anarquista (1927-1937). São Paulo, Imprensa Oficial do Estado, 2002. Pág. 268 e também Lúcia Silva Parra Combates pela Liberdade O movimento anarquista sob a vigilância do DEOPS-SP (1924-1945). São Paulo, Imprensa Oficial do Estado, 2003. Pág 133. Relatório 19 outubro de 1934 Pront.716 FOSP vol3 DEOPS/SP, DAESP.

[15] Silva Parra. Combates pela Liberdade O movimento anarquista sob a vigilância do DEOPS-SP (1924-1945). São Paulo, Imprensa Oficial do Estado, 2003. Pág 182

agência de notícias anarquistas-ana

nenhum pio
depois do trovão
apenas uma fragrância

Alonso Alvarez

Fonte: https://noticiasanarquistas.noblogs.org/post/2020/10/01/memoria-combativa-a-batalha-da-praca-da-se/

Fuga dos marrecos - por Jota Camelo


 Fonte: https://twitter.com/ojotacamelo

Estamos a viver o período mais perigoso na história humana, alerta Chomsky – Esquerda Net

Estamos a viver o período mais perigoso na história humana, alerta Chomsky

A convergência da crise climática, ameaça nuclear e avanço do autoritarismo tornam o atual momento histórico mais perigoso do que o dos anos 1930, alerta o intelectual norte-americano em entrevista à New Statesman.

Aos 91 anos, Noam Chomsky continua ativo na intervenção cívica e política, este fim de semana ao lado de Bernie Sanders, Naomi Klein e Yanis Varoufakis no encontro online da “Internacional Progressista”. Entrevistado pela New Statesman(link is external) Chomsky alertou que o mundo está perante uma “impressionante confluência de crises muito graves”, cuja dimensão ficou patente no último acerto do famoso “Relógio do Juízo Final”. “Tem sido ajustado todos os anos desde o bombardeamento atómico, o ponteiro dos minutos tem avançado e recuado. Mas em Janeiro passado, abandonaram os minutos e passaram aos segundos para a meia-noite, o que significa a extinção. E isso foi antes da escalada da pandemia”, recorda.

Para o linguista norte-americano, a ameaça de guerra nuclear nos dias de hoje “é provavelmente mais grave do que era no tempo da Guerra Fria”. Por outro lado, há as ameaças da catástrofe climática e da deterioração da democracia, “que à primeira vista parece que nada tem a ver com as outras, mas na verdade tem muito, porque a única esperança de lidarmos com as outras duas crises existenciais, que são mesmo uma ameaça de extinção, é através de uma democracia vibrante, com cidadãos informados e empenhados que participem na construção de respostas a essas crises”.

Chomsky sublinha o papel de Donald Trump no agravar destas três crises, ao destruir os mecanismos de controlo do armamento e investir em novas armas mais perigosas, ao maximizar o uso de combustíveis fósseis e enfraquecer a regulação ambiental e ao afastar todas as vozes dissidentes no executivo, formando na prática uma “internacional reacionária” ao lado de figuras como o brasileiro Bolsonaro, o egípcio al-Sisi, o indiano Modi ou o húngaro Orbán.

“Ele já disse e repetiu que se não gostar do resultado das eleições não sairá do lugar”, lembra Chomsky, afirmando que nesse caso existe um dever dos militares, nomeadamente da 82ª Divisão Aerotransportada, de o remover à força. O facto de este tema estar em cima da mesa não só não tem precedentes no regime norte-americano, como pode ter consequências graves. No plano de transição presidencial, altos responsáveis democratas e republicanos têm colocado a questão de o que pode acontecer se Trump se recusar a sair e “todos os cenários que eles levantaram conduzem à guerra civil. Isto não é uma piada”, avisa Chomsky.

A mensagem de Chomsky para a esquerda dos EUA é que faça o que “deve fazer sempre: reconhecer que a política verdadeira é o ativismo constante”. O que no caso de uma eleição num sistema bipartidário significa ter de votar no candidato que se opõe a Trump. “Mas logo depois o que há a fazer é desafiá-lo, manter a pressão para o empurrar em direção de propostas mais progressistas”, acrescenta o intelectual que se define como anarquista, “tal como o é toda a gente se parar um pouco para pensar, tirando as pessoas que são patológicas”.

Fonte: https://www.esquerda.net/artigo/estamos-viver-o-periodo-mais-perigoso-na-historia-humana-alerta-chomsky/70276