[Canadá] A sacudida do rap conspirativo do “Test Their Logik”A dupla de hip hop anarquista foi impedida de conviver depois de ser presa no G20
Enviar rappers para a prisão por causa de um clipe parece ser um pouco demais – mas não além das possibilidades na era do G-20 de Toronto.
O grupo de hip hop anarquista Test Their Logik (Teste a Lógica Deles, em tradução livre) – de volta à turnê depois de combater acusações de conspiração que os impediram de terem contato um com o outro – dizem que isso aconteceu durante junho do ano passado.
Os MCs Testament e Illogik, cujos nomes reais são Darius Mirshahi e Chris Bowen, foram presos em flagrante e algemados em um domingo. Os “crimes”, até onde eles sabem, foi andarem com ativistas, planejarem protestos e fazerem um vídeo de rap convocando outras pessoas a fazerem o mesmo.
O musicalmente e liricamente intenso “Invada a Reunião” – que foi assistido mais de 50.000 vezes no You Tube – retrata tumultos e danos à propriedade, e mostra protestantes com faces cobertas. Mas planejar um protesto não é ilegal, e o vídeo deles não é o primeiro de hip hop a retratar atividades criminosas. Então qual é o limite?
Um dos maiores especialistas canadenses na cultura hip hop, Dalton Higgins, não tem conhecimento de nenhum caso em que letras de rap foram usadas como prova legal, mas disse que promotores americanos têm enfrentado dificuldades em fazê-lo por algumas razões.
“Na America, o ato de usar as letras como uma prova na corte foi considerada uma violação da Primeira Emenda”, ele disse à NOW. “Por exemplo, é muito difícil provar na corte o que os rappers em questão de fato escreveram algumas ou todas as letras da música ou do CD”.
Na manhã das prisões, Mirshahi foi rodeado por oficiais OPP (Ontario Provincial Police - Polícia Provincial de Ontário) depois de entrar no seu carro no West End, enquanto Bowen foi arrancado do protesto de solidariedade aos presos do lado de fora da prisão improvisada da Eastern Avenue. Eles foram levados para a mesma cela estilo gaiola e os oficiais os diziam repetidamente que a razão seria sua música e política radical.
“Todos os guardas sabiam que éramos rappers”, disse Mirshahi à NOW no domingo, por telefone, numa das paradas da turnê em Saskatoon (Canadá). “Um deles disse algo como ‘Vocês são os rappers – vocês são o ás de espadas dessa merda”.
“Por que eu sou o ás de espadas? Porque eu fiz uma música? Isso é ridículo”.
Eles acabaram por ser liberados, mas não antes de aproveitar a oportunidade de entreter seus companheiros de prisão com uma canção controversa (que o escritor Tommy Thompson, numa cela próxima, descreveu como um “momento brilhante para nós, no inferno da prisão”). Essa seria sua última apresentação juntos por cinco meses.
Os dois homens foram acusados de conspiração, apologia ao crime e uso de máscaras que sinalizavam intenção de cometer um crime – acusações que foram suspensas em novembro, antes que fossem sequer fornecidas provas contra eles. Até então, eles foram proibidos de relacionarem-se como condições de sua fiança – tornando impossível fazer novas músicas ou shows.
“Naquele momento, eu percebi que eu tinha gasto $4.000... Aquelas eram as minhas economias para um ano inteiro”, disse Bowen.
Um porta-voz da Polícia de Toronto disse que ela não tinha nenhuma informação que pudesse divulgar a respeito das prisões, enquanto a OPP disse que era contra a política dos serviços policiais falar sobre suspeitos cujas acusações tenham sido retiradas ou mantidas.
Em resposta quanto as acusações que foram mantidas, um porta-voz do Ministério da Procuradoria-Geral disse que “a Coroa tem um dever permanente para avaliar a força de um caso e determinar se há perspectiva razoável de condenação. Neste caso, a Coroa determinou que baseado nas evidências disponíveis, o caso não preenchia esses requisitos”.
O advogado de Mirshahi e Bowen, Russell Silverstein, disse que os seus clientes não foram as únicas pessoas a serem presas sem motivos razoáveis durante o G20.
“Houve muitas pessoas que foram acusadas antes mesmo de alguém parar para analisar se haveria provas suficientes para julgá-las”, ele disse à NOW na semana passada.
Enquanto acusações mantidas podem ser revividas dentro de um ano, quando foram julgados, os dois rappers acreditam estar fora da mira da justiça por agora e estão gratos por estarem fazendo música e seguindo com suas vidas.
“Foi uma bênção camuflada em alguns aspectos”, declarou Bowen. “Eu sabia que, a longo prazo, isso fortaleceria nossa mensagem”.
A mensagem – que fala contra autoritarismo, capitalismo e corporativização – está lado a lado com o hip hop, dub step e influencias de beats e house no novo álbum Test Their Logik, chamado “A”. Eles estão em turnê antes de seu lançamento, que será em 14 de maio, e têm um show marcado sábado em Toronto, como parte das atividades da Feira do Livro Anarquista.
Quando questionados sobre se têm algum receio de que algumas pessoas considerem suas inclinações políticas repugnantes, os dois prontamente defendem-se dizendo que o que eles vêem é uma ideologia baseada na igualdade e auto-determinação.
“Eu quero fazer um mundo com o mínimo de violência possível”, disse Bowen, que é também praticante de artes marciais e instrutor de yoga. “Mas se as pessoas ficam revoltadas com janelas quebradas, mas não com comunidades quebradas, eu realmente questiono seus valores”.
Por Saira Peesker
Fonte: NOW Magazine
Vídeo “Invada a Reunião”:
› http://www.youtube.com/watch?v=ninV5yx7FW4
Mais infos:
› http://www.testtheirlogik.com/
Tradução > MCarol Recôndita
agência de notícias anarquistas-ana
Como versos livres
– ao toque dos tico-ticos –
as flores que caem...
Teruko Oda
sexta-feira, 29 de abril de 2011
Vidas em perigo: Produção de cannabis é a nova ameaça para os gorilas africanos - por ANDA
Vidas em perigo: Produção de cannabis é a nova ameaça para os gorilas africanosFoto: Brent Stirton/Getty Images
No Parque Nacional de Virunga, refúgio dos Gorilas de Montanha, as zonas desflorestadas para produzir carvão ilegal estão sendo ocupadas por plantações de cannabis, para financiamento das milícias rebeldes.
Segundo informações da National Geographic, o comércio da marijuana está afetando, no Parque Nacional de Virunga, na República Democrática do Congo, o refúgio de alguns dos últimos Gorilas de Montanha selvagens. A produção ilegal de cannabis foi impulsionada pelos militares deste país africano. O Parque Nacional perdeu oito Guardas da Natureza nos últimos três meses, assassinados enquanto faziam as suas patrulhas e em resultado da situação de guerra e avanço das atividade ilícitas.
Os militares rebeldes da milícia FDLR juntam agora as plantações de cannabis à exploração ilegal de carvão, que tem destruído habitat crucial para a população de gorilas. Com o governo ausente da região, os Guardas da Natureza ficaram abandonados na defesa do Parque contra milícias, caçadores e bandidos, mas os militares dão cada vez menos tréguas.
O processo decorre essencialmente com a desmatamento e queima da lenha para a produção de carvão, ficando o terreno disponível para semear e produzir Guardas da Natureza.
Fonte: http://www.anda.jor.br/
No Parque Nacional de Virunga, refúgio dos Gorilas de Montanha, as zonas desflorestadas para produzir carvão ilegal estão sendo ocupadas por plantações de cannabis, para financiamento das milícias rebeldes.
Segundo informações da National Geographic, o comércio da marijuana está afetando, no Parque Nacional de Virunga, na República Democrática do Congo, o refúgio de alguns dos últimos Gorilas de Montanha selvagens. A produção ilegal de cannabis foi impulsionada pelos militares deste país africano. O Parque Nacional perdeu oito Guardas da Natureza nos últimos três meses, assassinados enquanto faziam as suas patrulhas e em resultado da situação de guerra e avanço das atividade ilícitas.
Os militares rebeldes da milícia FDLR juntam agora as plantações de cannabis à exploração ilegal de carvão, que tem destruído habitat crucial para a população de gorilas. Com o governo ausente da região, os Guardas da Natureza ficaram abandonados na defesa do Parque contra milícias, caçadores e bandidos, mas os militares dão cada vez menos tréguas.
O processo decorre essencialmente com a desmatamento e queima da lenha para a produção de carvão, ficando o terreno disponível para semear e produzir Guardas da Natureza.
Fonte: http://www.anda.jor.br/
O direito humano à guerra - por José Luís Fiori
O direito humano à guerra
A idéia de uma guerra em nome dos “direitos humanos” contém uma contradição conceitual, e é por isto que todas elas acabam se transformando, inevitavelmente, numa “guerra de conversão”, ou numa nova forma de Cruzada.
“Eu via no universo cristão uma leviandade com relação à guerra que teria deixado envergonhadas as próprias nações bárbaras. Por causas fúteis ou mesmo sem motivo se corria às armas e quando já com elas às mãos, não se observava mais respeito algum para com o direito divino nem para com o direito humano, como se pela força de um edito, o furor tivesse sido desencadeado sobre todos os crimes”.Hugo Grotius, “O Direito da Guerra e da Paz”, 1625
Hugo Grotius (1583-1645), pai do direito internacional moderno, foi herdeiro da tradição humanista e cosmopolita da filosofia estóica, que formulou, pela primeira vez, a idéia de uma sociedade internacional solidária e submetida à leis universais. Mesmo sendo cristão e teólogo, Grotius desenvolveu a tese que estas leis universais faziam parte de um “direito natural comum a todos os povos...tão imutável que não poderia ser mudado nem pelo próprio Deus”. Para o jurista holandês, o direito à segurança e à paz faziam parte destes direitos fundamentais dos homens e das nações.
Apesar disto, Grotius considerava que o recurso à guerra também era um direito natural dos povos que viviam dentro de um sistema internacional composto por múltiplos estados, desde que a guerra visasse “assegurar a conservação da vida e do corpo e a aquisição das coisas úteis à existência”. Mas apesar disto, Grotius não concebeu nem defendeu a possibilidade de uma guerra que se propusesse como objetivo a defesa ou promoção internacional dos próprios direitos humanos. Em parte, porque ele era católico, e conhecia a decisão do Concílio de Constança (1414-1418) que fixara a doutrina da ilegitimidade da “conversão forçada”, e de todo tipo de guerra visando a conversão de outros povos, como tinha sido o caso das Cruzadas, nos séculos anteriores.
Depois do Concílio de Constança, o conceito de “guerra justa” ficou restrito – para os católicos, e para quase todos os europeus - às guerras que respondessem à uma agressão, e que fossem caracterizadas como um ato jurídico, destinado a reconstituir o status quo ante. Grotius não desenvolveu o argumento, mas se pode deduzir, do seu ponto de vista, que os direitos humanos, como a fé religiosa, são uma luta e uma conquista de cada homem, e da cada povo em particular. Sobretudo, porque ele foi um dos primeiros a se dar conta que num sistema internacional formado por múltiplos estados, era inevitável que coexistissem várias “inocências subjetivas”, frente à uma mesma “justiça objetiva”. Não havendo forma de arbitrar - “objetivamente” – sobre a razão ou legitimidade de uma guerra declarada entre dois povos que reivindicassem uma interpretação diferente, dos mesmos direitos fundamentais, dos homens e das nações. Neste sentido, a própria idéia de uma guerra em nome dos “direitos humanos” contém uma contradição conceitual, e é por isto que todas elas acabam se transformando, inevitavelmente, numa “guerra de conversão”, ou numa nova forma de Cruzada.
Em última instância, este também é o motivo pelo qual a discussão sobre Direitos Humanos, no campo internacional, se transformou - depois do fim da Guerra Fria - num terreno cercado de boas intenções, mas minado pelo oportunismo e pela hipocrisia. Porque existe, de fato, uma fronteira muito tênue e imprecisa entre a defesa do princípio geral, como projeto e como utopia, e a arrogância de alguns estados e governos que se auto-atribuem o “direito natural” de arbitrar e difundir, pela força, a taboa ocidental dos direitos humanos.
Para compreender a complexidade e a fluidez desta fronteira, basta ler um outro grande filósofo iluminista e cosmopolita, o alemão Immanuel Kant, dividido entre a sua utopia de uma “paz perpétua”, e o seu desejo de converter o “gênero humano” à “ética internacional civilizada”. Para Kant, “no grau de cultura em que ainda se encontra o gênero humano, a guerra é um meio inevitável para estender a civilização, e só depois que a cultura tenha se desenvolvido (Deus sabe quando), será saudável e possível uma paz perpétua”. (“Começo verossímil da história humana”, 1796)
Para ver na prática, como se desenvolvem estas guerras kantianas, basta observar o caso mais recente da intervenção na Líbia , iniciada por um governo francês de direita e em estado de decomposição, seguido por um governo inglês conservador e absolutamente inexpressivo, e por um governo norte-americano ameaçado por graves dificuldades internas. Tudo começou sob o aplauso internacional de quase todos os defensores dos direitos humanos, de direita e de esquerda, que consideravam se tratar de um caso indiscutível de “guerra legítima”, feita em nome da defesa de uma população agredida e desarmada. Mas já agora, depois de algumas semanas de morticínio, de lado e lado, vai ficando cada vez mais claro que o que está em questão, não é o direito à vida e à liberdade dos líbios, nem tampouco, a promoção de uma democracia universal. Ao mesmo tempo e na medida mesmo em que a guerra da Líbia vai se transformando, de forma cada vez mais clara, num exercício militar experimental de implantação de uma cabeça-de-ponte, para uma intervenção futura, eventual e mais ampla, das forças da OTAN, na África.
Agora bem, olhando de outro ângulo, se pode observar uma recorrência e uma dificuldade análoga, no debate e nas iniciativas dos organismos internacionais, com relação à defesa e à promoção dos “direitos fundamentais”, ao redor do mundo. O que se tem assistido, nos últimos anos, é quase sempre o mesmo filme: de um lado, se posicionam e votam os “inocentes úteis’ e os defensores generosos do princípio, do projeto e da utopia; e do outro, se posicionam os países que se utilizam do seu apoio e da sua mesma retórica, para projetarem seu poder e sua estratégia geopolítica. Através de “guerras humanitárias”, promovidas ou lideradas, invariavelmente, pelos mesmos países que compõem o atual “diretório ético e militar do mundo”, ou seja: EUA, Grã Bretanha e França.
José Luís Fiori, cientista político, é professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Fonte: Carta Maior
A idéia de uma guerra em nome dos “direitos humanos” contém uma contradição conceitual, e é por isto que todas elas acabam se transformando, inevitavelmente, numa “guerra de conversão”, ou numa nova forma de Cruzada.
“Eu via no universo cristão uma leviandade com relação à guerra que teria deixado envergonhadas as próprias nações bárbaras. Por causas fúteis ou mesmo sem motivo se corria às armas e quando já com elas às mãos, não se observava mais respeito algum para com o direito divino nem para com o direito humano, como se pela força de um edito, o furor tivesse sido desencadeado sobre todos os crimes”.Hugo Grotius, “O Direito da Guerra e da Paz”, 1625
Hugo Grotius (1583-1645), pai do direito internacional moderno, foi herdeiro da tradição humanista e cosmopolita da filosofia estóica, que formulou, pela primeira vez, a idéia de uma sociedade internacional solidária e submetida à leis universais. Mesmo sendo cristão e teólogo, Grotius desenvolveu a tese que estas leis universais faziam parte de um “direito natural comum a todos os povos...tão imutável que não poderia ser mudado nem pelo próprio Deus”. Para o jurista holandês, o direito à segurança e à paz faziam parte destes direitos fundamentais dos homens e das nações.
Apesar disto, Grotius considerava que o recurso à guerra também era um direito natural dos povos que viviam dentro de um sistema internacional composto por múltiplos estados, desde que a guerra visasse “assegurar a conservação da vida e do corpo e a aquisição das coisas úteis à existência”. Mas apesar disto, Grotius não concebeu nem defendeu a possibilidade de uma guerra que se propusesse como objetivo a defesa ou promoção internacional dos próprios direitos humanos. Em parte, porque ele era católico, e conhecia a decisão do Concílio de Constança (1414-1418) que fixara a doutrina da ilegitimidade da “conversão forçada”, e de todo tipo de guerra visando a conversão de outros povos, como tinha sido o caso das Cruzadas, nos séculos anteriores.
Depois do Concílio de Constança, o conceito de “guerra justa” ficou restrito – para os católicos, e para quase todos os europeus - às guerras que respondessem à uma agressão, e que fossem caracterizadas como um ato jurídico, destinado a reconstituir o status quo ante. Grotius não desenvolveu o argumento, mas se pode deduzir, do seu ponto de vista, que os direitos humanos, como a fé religiosa, são uma luta e uma conquista de cada homem, e da cada povo em particular. Sobretudo, porque ele foi um dos primeiros a se dar conta que num sistema internacional formado por múltiplos estados, era inevitável que coexistissem várias “inocências subjetivas”, frente à uma mesma “justiça objetiva”. Não havendo forma de arbitrar - “objetivamente” – sobre a razão ou legitimidade de uma guerra declarada entre dois povos que reivindicassem uma interpretação diferente, dos mesmos direitos fundamentais, dos homens e das nações. Neste sentido, a própria idéia de uma guerra em nome dos “direitos humanos” contém uma contradição conceitual, e é por isto que todas elas acabam se transformando, inevitavelmente, numa “guerra de conversão”, ou numa nova forma de Cruzada.
Em última instância, este também é o motivo pelo qual a discussão sobre Direitos Humanos, no campo internacional, se transformou - depois do fim da Guerra Fria - num terreno cercado de boas intenções, mas minado pelo oportunismo e pela hipocrisia. Porque existe, de fato, uma fronteira muito tênue e imprecisa entre a defesa do princípio geral, como projeto e como utopia, e a arrogância de alguns estados e governos que se auto-atribuem o “direito natural” de arbitrar e difundir, pela força, a taboa ocidental dos direitos humanos.
Para compreender a complexidade e a fluidez desta fronteira, basta ler um outro grande filósofo iluminista e cosmopolita, o alemão Immanuel Kant, dividido entre a sua utopia de uma “paz perpétua”, e o seu desejo de converter o “gênero humano” à “ética internacional civilizada”. Para Kant, “no grau de cultura em que ainda se encontra o gênero humano, a guerra é um meio inevitável para estender a civilização, e só depois que a cultura tenha se desenvolvido (Deus sabe quando), será saudável e possível uma paz perpétua”. (“Começo verossímil da história humana”, 1796)
Para ver na prática, como se desenvolvem estas guerras kantianas, basta observar o caso mais recente da intervenção na Líbia , iniciada por um governo francês de direita e em estado de decomposição, seguido por um governo inglês conservador e absolutamente inexpressivo, e por um governo norte-americano ameaçado por graves dificuldades internas. Tudo começou sob o aplauso internacional de quase todos os defensores dos direitos humanos, de direita e de esquerda, que consideravam se tratar de um caso indiscutível de “guerra legítima”, feita em nome da defesa de uma população agredida e desarmada. Mas já agora, depois de algumas semanas de morticínio, de lado e lado, vai ficando cada vez mais claro que o que está em questão, não é o direito à vida e à liberdade dos líbios, nem tampouco, a promoção de uma democracia universal. Ao mesmo tempo e na medida mesmo em que a guerra da Líbia vai se transformando, de forma cada vez mais clara, num exercício militar experimental de implantação de uma cabeça-de-ponte, para uma intervenção futura, eventual e mais ampla, das forças da OTAN, na África.
Agora bem, olhando de outro ângulo, se pode observar uma recorrência e uma dificuldade análoga, no debate e nas iniciativas dos organismos internacionais, com relação à defesa e à promoção dos “direitos fundamentais”, ao redor do mundo. O que se tem assistido, nos últimos anos, é quase sempre o mesmo filme: de um lado, se posicionam e votam os “inocentes úteis’ e os defensores generosos do princípio, do projeto e da utopia; e do outro, se posicionam os países que se utilizam do seu apoio e da sua mesma retórica, para projetarem seu poder e sua estratégia geopolítica. Através de “guerras humanitárias”, promovidas ou lideradas, invariavelmente, pelos mesmos países que compõem o atual “diretório ético e militar do mundo”, ou seja: EUA, Grã Bretanha e França.
José Luís Fiori, cientista político, é professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Fonte: Carta Maior
quinta-feira, 28 de abril de 2011
ABC comemora Dia Mundial do Fanzine (Fanzinada dia 30/04/2011)
ABC comemora Dia Mundial do FanzinePara celebrar o Dia Mundial do Fanzine (29 de abril), zineiros do ABC organizaram a I FANZINADA que ocupará toda a tarde do sábado, dia 30, no Espaço Cultural Gambalaia em Santo André. É a primeira vez que a data será comemorada na região com um evento deste tipo, que reúne não só produtores locais, como também importantes nomes da cena alternativa de São Paulo.
Neste dia o Gambalaia estará tomado por diversas e variadas publicações alternativas feitas de forma independente, os chamados fanzines, que divulgam assuntos ligados à música, movimento punk e underground , poesia, história em quadrinhos, entre outros. Durante o evento, que tem início às 15h, será realizada uma oficina para a produção de um zine coletivo, feito por todos os participantes.
A I Fanzinada contará também com o lançamento do Anuário de Fanzines, idealizado pelo Coletivo Ugra Press (São Paulo) que reúne mais de 100 publicações espalhadas pelo Brasil; lançamento das novas edições dos zines Aviso Final (Renato Donisete); Spell Work (Tina Curtis); Vestindo Outubros (Letícia Mendonça e Fernanda Aragão), Zine Zero Quatro (Zhô Bertolini e Jurema Barreto de Souza) exposição dos grafiteiros Daniel Melim e Dedot e HQs do quadrinista Thiago Gomes; esquete teatral com o Ator Adilson Magno (Dill), e com a exibição do documentário Fanzineiros do Século Passado, dirigido por Marcio Sno. Após a exibição haverá um debate aberto sobre os rumos do fanzine na era digital.
Nos intervalos das oficinas será exibido o documentário "Punk S/A", de Thina Curtis.
O evento é gratuito e aberto à todos os interessados.
Texto: Olga Defavari
Serviço
Evento: I Fanzinada - Dia Internacional do Fanzine
Data: 30/04/11 - à partir das 15h
Local: Espaço Cultural Gambalaia
Endereço: Rua das Monções, 1018, Bairro Jardim - Santo André
Informações: 4316-1726
Neste dia o Gambalaia estará tomado por diversas e variadas publicações alternativas feitas de forma independente, os chamados fanzines, que divulgam assuntos ligados à música, movimento punk e underground , poesia, história em quadrinhos, entre outros. Durante o evento, que tem início às 15h, será realizada uma oficina para a produção de um zine coletivo, feito por todos os participantes.
A I Fanzinada contará também com o lançamento do Anuário de Fanzines, idealizado pelo Coletivo Ugra Press (São Paulo) que reúne mais de 100 publicações espalhadas pelo Brasil; lançamento das novas edições dos zines Aviso Final (Renato Donisete); Spell Work (Tina Curtis); Vestindo Outubros (Letícia Mendonça e Fernanda Aragão), Zine Zero Quatro (Zhô Bertolini e Jurema Barreto de Souza) exposição dos grafiteiros Daniel Melim e Dedot e HQs do quadrinista Thiago Gomes; esquete teatral com o Ator Adilson Magno (Dill), e com a exibição do documentário Fanzineiros do Século Passado, dirigido por Marcio Sno. Após a exibição haverá um debate aberto sobre os rumos do fanzine na era digital.
Nos intervalos das oficinas será exibido o documentário "Punk S/A", de Thina Curtis.
O evento é gratuito e aberto à todos os interessados.
Texto: Olga Defavari
Serviço
Evento: I Fanzinada - Dia Internacional do Fanzine
Data: 30/04/11 - à partir das 15h
Local: Espaço Cultural Gambalaia
Endereço: Rua das Monções, 1018, Bairro Jardim - Santo André
Informações: 4316-1726
quarta-feira, 27 de abril de 2011
EUA reexaminarão condenação à morte de Mumia Abu-Jamal - por ANA
EUA reexaminarão condenação à morte de Mumia Abu-JamalO tribunal federal de recurso do estado da Pennsylvania ordenou hoje (26 de abril) que seja reexaminada a sentença de morte contra Mumia Abu-Jamal, há 30 anos no corredor da morte, sem que a culpabilidade do ativista afro-americano seja posta em causa.
"O estado da Pennsylvania deverá organizar a realização de novas audiências nos próximos 180 dias", diz o decreto do tribunal de recurso citado pela agência Associated Press.
O reexame da condenação de Mumia Abu-Jamal, que se tornou o mais célebre condenado à morte em todo o mundo, decidirá se será mantida a pena capital ou se a sentença será comutada em prisão perpétua sem possibilidade de libertação.
Abu-Jamal, que tem hoje 58 anos (ele fez aniversário no último domingo), foi enviado para o corredor da morte em 1982 pelo homicídio de um policial branco, crime que nega ter cometido.
agência de notícias anarquistas-ana
raio em baixo
lua em cima
o sol foi pra China
Estrela Ruiz Leminski
"O estado da Pennsylvania deverá organizar a realização de novas audiências nos próximos 180 dias", diz o decreto do tribunal de recurso citado pela agência Associated Press.
O reexame da condenação de Mumia Abu-Jamal, que se tornou o mais célebre condenado à morte em todo o mundo, decidirá se será mantida a pena capital ou se a sentença será comutada em prisão perpétua sem possibilidade de libertação.
Abu-Jamal, que tem hoje 58 anos (ele fez aniversário no último domingo), foi enviado para o corredor da morte em 1982 pelo homicídio de um policial branco, crime que nega ter cometido.
agência de notícias anarquistas-ana
raio em baixo
lua em cima
o sol foi pra China
Estrela Ruiz Leminski
[Reino Unido] A batalha de Stokes Croft - por ANA
[Reino Unido] A batalha de Stokes CroftPela manhã da quinta-feira, 21 de abril, um grupo de pessoas entrou em confronto com a polícia depois de um ataque coordenado e violento de cerca de 200 agentes de segurança que arrombaram a porta do squatter “Telepathics Heights” e fecharam o bairro de Stokes Croft em Bristol.A população local revidou a ofensiva dos policiais tomadas por uma raiva que não se via há muito tempo na cidade. Aproximadamente 300 pessoas com garrafas de vidro, tijolos, erguendo e queimando barricadas lutaram contra a polícia por mais de cinco horas em resposta à ocupação policial do bairro.
Um estabelecimento Tesco (maior rede de supermercados do Reino Unido) foi saqueado e destruído, enquanto nenhuma das outras lojas de rua de proprietários independentes foi tocada pelos manifestantes nos distúrbios. Os protestantes também danificaram diversos carros policiais.Pelo menos nove pessoas foram presas, cinco da rua e quatro do “Telepathics Heights”, acusadas de posse e fabricação de coquetéis molotov. Outros detidos nessa noite também receberam cargos ou estão em liberdade sob fiança.
O "Telepathics Heights” está localizado na movimentada área cultural de Stokes Croft, onde há muitos bares, cafés, squaters, projetos comunitários, etc.
Mais infos:
› http://www.bristol.indymedia.org.uk/
› http://bristolaf.wordpress.com/
Vídeos:
› http://www.youtube.com/watch?v=M7qeY3tEeKk&feature=player_embedded
› http://www.youtube.com/watch?v=0cdScUCPIzI&feature=player_embedded
› http://www.youtube.com/watch?v=hkCvka1uwuo&feature=player_embedded
agência de notícias anarquistas-ana
Sonha o mendigo
Entre sacos de lixo
E flores de ipê
Edson Kenji Iura
Um estabelecimento Tesco (maior rede de supermercados do Reino Unido) foi saqueado e destruído, enquanto nenhuma das outras lojas de rua de proprietários independentes foi tocada pelos manifestantes nos distúrbios. Os protestantes também danificaram diversos carros policiais.Pelo menos nove pessoas foram presas, cinco da rua e quatro do “Telepathics Heights”, acusadas de posse e fabricação de coquetéis molotov. Outros detidos nessa noite também receberam cargos ou estão em liberdade sob fiança.
O "Telepathics Heights” está localizado na movimentada área cultural de Stokes Croft, onde há muitos bares, cafés, squaters, projetos comunitários, etc.
Mais infos:
› http://www.bristol.indymedia.org.uk/
› http://bristolaf.wordpress.com/
Vídeos:
› http://www.youtube.com/watch?v=M7qeY3tEeKk&feature=player_embedded
› http://www.youtube.com/watch?v=0cdScUCPIzI&feature=player_embedded
› http://www.youtube.com/watch?v=hkCvka1uwuo&feature=player_embedded
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Sonha o mendigo
Entre sacos de lixo
E flores de ipê
Edson Kenji Iura
terça-feira, 26 de abril de 2011
Vida saudável e ética: Adeptos do veganismo continuam crescendo - por Por Vanessa Perez
Vida saudável e ética: Adeptos do veganismo continuam crescendo
Por Vanessa Perez (da Redação)Foto: Reprodução/mid-day.com
A vida de um vegano significa viver sem produtos animais. As razões mais comuns para um estilo de vida vegan são convicções morais sobre os direitos animais ou bem-estar, bem como a saúde, impacto ambiental, convicções espirituais e preocupações éticas.
A visão antiquada sobre um vegano, muitas vezes, envolve uma pessoa que bebe suco de soja, usa sapatos e roupas sem couro, e alimenta seu cão com a polpa da batata.
No entanto, segundo informações do jornal Midday.com, a imagem do veganismo mudou consideravelmente nos últimos anos com os seus seguidores se tornando campeões da defesa do meio ambiente, saúde e bem-estar animal. Veganos procuram excluir a utilização de produtos animais em seu alimento, roupas ou qualquer outra finalidade “, e seus números estão crescendo.
Vegans compõem cerca de 1 por cento da população nos Estados Unidos, e o veganismo e o vegetarianismo estão aumentando em popularidade em todo o globo. “O veganismo é a questão top no momento”, diz Sebastian Zoesch, CEO da sociedade alemã vegetariana (VEBU).
A composição do VEBU, que representa os interesses de todos os vegetarianos da Alemanha, incluindo os ovo-lacto, aumentou de 2.700 para 3.500 no ano passado.
“Veganismo sofreu uma reforma em sua imagem principal,” diz Zoesch. “É provavelmente um pouco mais frio, porque é mais consistente.”
O restaurante La Mano Verde em Berlim, oferece refeições veganas com Courgette Rolls, bolonhesa ou tomate, nabo e ravioli de caju no menu.
Mesmo que todos os ingredientes utilizados no restaurante sejam vegans, a própria palavra é evitada: “Um monte de não vegetarianos não gostam da palavra vegan”, explica o restaurante do chef Christiane Radin.
A palavra ainda evoca imagens de pontos de vista radical em relação à nutrição, e como o restaurante não quer se afastar de qualquer comedor de carne ou vegetarianos, o termo alimento “vegetal” é usado.
O aumento na popularidade do veganismo pode estar relacionado com o crescimento do movimento da comida orgânica na última década. Uma dieta vegan foi oferecida para reduzir o risco de doenças cardíacas e obesidade, embora, como acontece com qualquer dieta, é importante garantir que ela seja bem equilibrada.
Recomenda-se que um mínimo de cinco porções de frutas e legumes devam ser consumidas a cada dia, enquanto o uso de grãos refinados deve ser limitado, porque a maior parte do conteúdo de nutrientes são perdidos.
As gorduras hidrogenadas devem ser evitadas, enquanto os veganos necessitam assegurar que recebam fontes de vitaminas B12 e de D2, assim como o ômega 3. A dieta é de particular importância para as mulheres grávidas e crianças.
Embora não existam números exatos sobre o número de naturalistas e vegetarianos no mundo, especialistas acreditam que o número de pessoas que não utilizam carne em sua dieta está aumentando.
“A ideia de que você pode ajudar a salvar o meio ambiente, abstendo-se de comer carne é relativamente nova”, diz Zoesch.
Mas as preocupações de antes, como a ética e saúde, também desempenham um papel na popularidade do veganismo. O best-seller Eating Animals (Comendo Animais) de Jonathan Safran Foer também levou a um aumento do número de vegetarianos no ano passado.
Foer visitou fazendas industriais no meio da noite, descreveu em detalhes como os animais são confinados e mortos e explorou muitas histórias para justificar atuais hábitos alimentares. O livro teve um impacto imediato entre pessoas que, desde então, anunciaram que não iriam mais comer carne.
Fonte: http://www.anda.jor.br/
Por Vanessa Perez (da Redação)Foto: Reprodução/mid-day.com
A vida de um vegano significa viver sem produtos animais. As razões mais comuns para um estilo de vida vegan são convicções morais sobre os direitos animais ou bem-estar, bem como a saúde, impacto ambiental, convicções espirituais e preocupações éticas.
A visão antiquada sobre um vegano, muitas vezes, envolve uma pessoa que bebe suco de soja, usa sapatos e roupas sem couro, e alimenta seu cão com a polpa da batata.
No entanto, segundo informações do jornal Midday.com, a imagem do veganismo mudou consideravelmente nos últimos anos com os seus seguidores se tornando campeões da defesa do meio ambiente, saúde e bem-estar animal. Veganos procuram excluir a utilização de produtos animais em seu alimento, roupas ou qualquer outra finalidade “, e seus números estão crescendo.
Vegans compõem cerca de 1 por cento da população nos Estados Unidos, e o veganismo e o vegetarianismo estão aumentando em popularidade em todo o globo. “O veganismo é a questão top no momento”, diz Sebastian Zoesch, CEO da sociedade alemã vegetariana (VEBU).
A composição do VEBU, que representa os interesses de todos os vegetarianos da Alemanha, incluindo os ovo-lacto, aumentou de 2.700 para 3.500 no ano passado.
“Veganismo sofreu uma reforma em sua imagem principal,” diz Zoesch. “É provavelmente um pouco mais frio, porque é mais consistente.”
O restaurante La Mano Verde em Berlim, oferece refeições veganas com Courgette Rolls, bolonhesa ou tomate, nabo e ravioli de caju no menu.
Mesmo que todos os ingredientes utilizados no restaurante sejam vegans, a própria palavra é evitada: “Um monte de não vegetarianos não gostam da palavra vegan”, explica o restaurante do chef Christiane Radin.
A palavra ainda evoca imagens de pontos de vista radical em relação à nutrição, e como o restaurante não quer se afastar de qualquer comedor de carne ou vegetarianos, o termo alimento “vegetal” é usado.
O aumento na popularidade do veganismo pode estar relacionado com o crescimento do movimento da comida orgânica na última década. Uma dieta vegan foi oferecida para reduzir o risco de doenças cardíacas e obesidade, embora, como acontece com qualquer dieta, é importante garantir que ela seja bem equilibrada.
Recomenda-se que um mínimo de cinco porções de frutas e legumes devam ser consumidas a cada dia, enquanto o uso de grãos refinados deve ser limitado, porque a maior parte do conteúdo de nutrientes são perdidos.
As gorduras hidrogenadas devem ser evitadas, enquanto os veganos necessitam assegurar que recebam fontes de vitaminas B12 e de D2, assim como o ômega 3. A dieta é de particular importância para as mulheres grávidas e crianças.
Embora não existam números exatos sobre o número de naturalistas e vegetarianos no mundo, especialistas acreditam que o número de pessoas que não utilizam carne em sua dieta está aumentando.
“A ideia de que você pode ajudar a salvar o meio ambiente, abstendo-se de comer carne é relativamente nova”, diz Zoesch.
Mas as preocupações de antes, como a ética e saúde, também desempenham um papel na popularidade do veganismo. O best-seller Eating Animals (Comendo Animais) de Jonathan Safran Foer também levou a um aumento do número de vegetarianos no ano passado.
Foer visitou fazendas industriais no meio da noite, descreveu em detalhes como os animais são confinados e mortos e explorou muitas histórias para justificar atuais hábitos alimentares. O livro teve um impacto imediato entre pessoas que, desde então, anunciaram que não iriam mais comer carne.
Fonte: http://www.anda.jor.br/
Como os socialistas construíram a América - por John Nichols
Como os socialistas construíram a América Os Estados Unidos não seriam o que são hoje se não tivessem tido a influência positiva de revolucionários, radicais, socialistas, socialdemocratas e seus companheiros de viagem. Abraham Lincoln, Teddy Roosevelt, Franklin Roosevelt, Dwitht Eisenhower e John Kennedy não eram socialistas. Mas a nação se beneficiou de seus empréstimos às ideias socialistas e social democratas. Ideias como seguridade social, financiamento público da moradia, investimento público, proteção legal para direitos trabalhistas e outros atributos do Estado de Bem Estar”.
(*) Excerto da obra The “S” Word: A Short History of an American Tradition… Socialism, publicado em março, pela Verso.Se há uma constante no discurso da elite [dos EUA] nacional nestes dias é a afirmação de que a América foi fundada como um país capitalista e que o socialismo é uma importação perigosa que, a despeito de nossa não autorizada fé no livre mercado, deve ser barrada na fronteira.
Essa “sabedoria” mais convencional – cada vez mais aceita ao menos até as recentes mobilizações de massa no Wisconsin, em Ohio, no Michigan e no Maine – tem defendido que tudo o que é público é inferior a tudo o que é privado, que as corporações são sempre boas e que os sindicatos sempre são ruins, que a tributação progressiva é intrinsecamente má e que o melhor modelo econômico é aquele que permite que os ricos fiquem cada vez mais ricos, assim como a República, que então distribuirá migalhas da sua riqueza para a imensa maioria dos estadunidenses. Rush Limbaugh informa-nos regularmente que as propostas de taxação de pessoas ricas como ele, com o objetivo de financiar assistência em saúde para crianças e empregos para os desempregados são “antiéticas” frente aos propósitos originais da nação e que as reformas de Barack Obama estão “destruindo o modo como este país foi fundado”.
Quando Obama apresentou sua tímida proposta de organização de um sistema de assistência médica privado mais humano, Sean Hannity, da Fox, denunciou que “a Constituição foi rasgada, injuriada, o estado de direito foi afastado”. Newt Gingrich disse que a administração Obama estava “preparada para fundamentalmente violar a Constituição” e estava governando para “30% do país [que] de fato é a favor de um sistema socialista secular de esquerda”.
Em 2009, Sarah Palin mostrou preocupações constitucionais parecidas, quanto à proposta de Obama de desenvolver uma “legislação universal de energia para construções verdes” com o objetivo de promover a eficiência energética. “Nosso país poderia vir a se tornar algo que sequer reconheceríamos, certamente que isso está muito distante do que os pais fundadores de nosso país tinham em mente para nós”; gravemente preocupada, informou Palin a Hannity, que respondeu com uma pergunta de uma palavra: “Socialismo?”. “Bem”, disse ela, “é para onde estão nos conduzindo”.
Na verdade, não é. Palin está errada quanto aos perigos da eficiência energética, e está errada a respeito de Obama. O presidente disse que não é um socialista, e os maiores porta-vozes socialistas do país concordam veementemente. De fato, as únicas pessoas que parecem acreditar que Obama apresenta uma tendência minimamente socialdemocrata são aqueles que imaginam que qualquer menção à palavra “socialismo” poderia inspirar uma reação como a do vampiro confrontado com a hóstia.
Infelizmente, Obama pode ser mais assustado pela letra "S" do que por Palin. Quando um repórter do New York Times perguntou ao presidente em março de 2009 se suas politicas internas sugeriam que ele fosse um socialista, um Obama relaxado respondeu: “A resposta seria não”. Ele disse que estava sendo criticado simplesmente porque estava “tendo de fazer algumas escolhas difíceis” quanto ao orçamento. Mas depois que conversou com seus assessores hiper cautelosos, ele começou a se preocupar. Então chamou o repórter de volta e disse: “para mim é difícil acreditar que você estava realmente falando sério quando fez a questão sobre o socialismo”.
Então, como se estivesse lendo as marcações de um discurso, Obama declarou: “Não foi sob o meu governo que se começou a comprar um bando de ações de bancos. E não foi sob o meu comando que se concedeu subvenção massiva, a receita da drogadição, sem fontes de recursos para arcar com isso. Temos na verdade operado de uma maneira que tem sido inteiramente consistente com os princípios do livre mercado”, disse Obama, que concluiu atacando: “alguns dos que andam me chamando por aí de ‘socialista’ não podem dizer o mesmo”.
Há mais do que um pingo de verdade nessa declaração. Obama de fato está evitando a adjetivação de socialista, ou mesmo de um social democrata médio, nas respostas aos problemas que o confrontam. Ele afastou a opção do pagador único no início do debate sobre a reforma da saúde, rejeitando o tratamento que em outros países promoveu assistência em saúde de qualidade aos cidadãos, a custos baixos. Sua resposta supostamente “socialista” ao colapso da indústria automobilística foi dar dezenas de bilhões de dólares no resgate dos fundos da GM e da Chrysler, que usaram o dinheiro para despedir milhares de trabalhadores e então realocar dúzias de plantas industriais no exterior – uma abordagem o mais distante possível que um país pode ter do modelo social democrata de aplicação dos investimentos e de políticas públicas na promoção de empregos e na dinamização econômica da sociedade.
Quando a plataforma em águas profundas da British Petroleum (BP) explodiu, ameaçando toda a costa do Golfo, em vez de dispor dos engenheiros das Forças Armadas e de outras agências do governo encarregadas de lidarem com crises, Obama deixou a gestão do problema a cargo da corporação que tinha mentido a respeito da extensão do vazamento de petróleo, que tomou decisões com base na sua disponibilidade de tempo, em detrimento das necessidades humanas e ambientais, e fracassou até nas tarefas mais básicas.
Então deveríamos levar o presidente ao pé da letra quando ele diz que age com base nos princípios do livre mercado. O problema, claro, é que a rigidez de Obama quanto a isso está conduzindo-o a rejeitar ideias mais seguras do que aquelas fixadas pelo setor privado. Emprestar ideias e abordagens de socialistas não tornaria Obama em nada mais socialista do que Abraham Lincoln, Teddy Roosevelt, Franklin Roosevelt ou Dwight Eisenhower. Todos esses presidentes anteriores misturaram ideias de traços marxistas ou emprestados das plataformas dos partidos socialistas com tanta frequência que o New York Times observou, num perfil publicado em 1954, a fé de um velho Norman Thomas de que “ele tinha dado uma grande contribuição no pioneirismo de ideias que hoje ganharam o apoio dos dois maiores partidos” – ideias como “seguridade social, financiamento público da moradia, investimento público, proteção legal para direitos trabalhistas e outros atributos do Estado de Bem Estar”. O fato é que muitos dos homens que ocuparam o Salão Oval antes de Obama souberam que a implementação de ideias de cunho socialista ou social democrata não os colocaria em conflito com a experiência estadunidense ou com a Constituição.
O ponto aqui não é defender o socialismo. O que deveríamos estar defendendo é a história – a história dos EUA, que tem tons ricos e vibrantes, e alguns do vermelho. O passado deveria ser consultado não somente para anedotas ou factóides, mas para fornecer uma perspectiva no presente. Essa perspectiva empodera os estadunidenses que buscam um debate robusto, que compreenda um amplo espetro ideológico – um empreendimento apropriado para um país em que Tom Paine imaginou cidadãos que “lançando seu olhar sobre um vasto campo, tomariam um caminho igualmente vasto, e então, aproximando-se cada vez mais do universo, sua atmosfera de pensamento se expanderia e sua liberalidade preencheria um espaço mais amplo”.
A América sempre sofreu com os idiotas que teriam feito definhar o debate ao nível de uma série de opiniões estreitas o suficiente para abarcar os editos de um potentado, uma prece ou um dono de plantation. Mas a história real da América nos diz que a única coisa a respeito da qual nossa situação presente corresponde é que temos padecido com os idiotas tão completamente que uma boa parte dos estadunidenses – não apenas os Tea Partisans ou os Limbaugh Dittoheads, mas cidadãos da grande classe média - na verdade levam Sarah Palin a sério quando ela vocifera que o socialismo, na forma do código de construção civil verde é antitético ao americanismo.
* * *
Palin não é a primeira deste tipo. Não há nada de novo na acusação de um presidente que está dirigindo um “grande governo” voltado a outros projetos que não a invasão de algum país distante é socialista. Na primavera de 2009, alguns meses após Obama e o novo congresso democrático tomarem posse, vinte e três membros da oposição reapresentaram um velho projeto, em que propõem que “nós, os membros do Comitê Nacional Republicano convocamos o Partido Democrata a ser verdadeiro e honesto com o povo americano, ao reconhecerem que eles evoluíram de um partido que apoiava a tributação e os gastos para um partido de tributação e nacionalização e que, portanto, deveriam concordar em se renomearem de Partido Socialista Democrático”.
As cabeças frias prevaleceram. Por sorte. Num encontro de emergência do comitê – cuja história remonta à primeira convenção republicana, em 1856, em que seguidores do socialista francês Charles Fourier, o editor de Karl Marx e seus camaradas abolicionistas iniciaram a mais radical reestruturação dos partidos políticos na história dos EUA – foi sugerido que a proposta de impor um novo nome para os democratas poderia fazer com que o “Partido Republicano parecesse vulgar e sectário”. O plano foi derrubado, mas uma resolução denunciando a “marcha para o socialismo” passou. Assim, os membros da RNC [Convenção Nacional Republicana, em sua sigla em inglês] agora oficialmente “reconhecem que o Partido Democrata é dedicado a reestruturar a sociedade americana junto aos ideais socialistas” e que os democratas têm como sua “clara e óbvia intenção... propor, aprovar e implementar programas socialistas por meio da legislação federal”.
O Partido Republicano está atualmente mais firme em sua acusação de que os democratas estão conduzindo a nação “para o socialismo” do que estava durante a Ameaça Vermelha de Joe McCarthy nos anos 50, quando o senador do Wisconsin acusou Harry Truman de abrigar células do Partido Comunista no governo. Truman reagiu ao ultraje conservador, argumentando que o governo tinha a autoridade para impor leis antilinchamento nos estados e propondo um plano nacional de saúde. Mas o que incomodava mesmo os republicanos era que Truman, que se esperava fosse perder a disputa em 1948, tinha não só acabado de vencer a eleição como restaurado o controle do Congresso. Para contraatacar essa tendência eleitoral afrontosa, os republicanos conservadores, liderados pelo senador do Ohio Robert Taft, anunciaram em 1950 que seu slogan daquelas eleições para o congresso seria “Liberdade contra o Socialismo”. Eles então produziram um adendo a sua plataforma nacional, cuja maior parte era devotada à histeria de McCarthy acusando o plano de reformas Fair Deal, de Truman, de ser “ditado por um pequeno, mas poderoso grupo de pessoas que acreditam no socialismo, que não tem um conceito da verdadeira fundação do progresso americano, e cujas propostas estão completamente em desacordo com os verdadeiros interesses e verdadeiros desejos dos trabalhadores, agricultores e homens de negócio”.
Truman reagiu, lembrando aos republicanos que suas políticas foram apresentadas na plataforma eleitoral de 1948, que tinha obtido vasta maioria dentre o eleitorado. “Se nosso programa foi ditado, como dizem os republicanos, foi ditado pela votação em novembro de 1948. Foi ditado por um “pequeno mas poderoso grupo de 24 milhões de eleitores”, disse o presidente, que acrescentou: “Eu penso que eles sabiam melhor que o Comitê Nacional Republicano quais os desejos verdadeiros dos trabalhadores, agricultores e homens de negócios”.
Truman não deu cabimento à menção da palavra “socialismo’, que naqueles dias era distinguida na mente da maioria dos estadunidenses como o stalinismo soviético, com o qual o presidente – um péssimo guerreiro da guerra fria - estava disputando. Nem vociferou Truman, que contava dentre seus aliados essenciais com sindicalistas como David Dubinsky, Jacob Potofsky e Walter Reuther, todos eles ligados a causas socialistas e em muitos casos ao partido socialista de Eugene V. Debs e Norman Thomas, contra os males da social democracia. Antes, debochou: “Fora o grande progresso deste país, fora os grandes avanços na conquista de uma vida melhor para todos, fora a ascensão para uma liderança mundial, os líderes republicanos não aprenderam nada. Confrontados pelo grande recorde deste país, e pela tremenda promessa de futuro que ele porta, tudo o que eles fazem é coaxar ‘socialismo’”.
Os republicanos mais espertos abandonaram a campanha. O retorno ao realismo foi liderado pela senadora do Maine, Margaret Chase Smith, que temia que o seu partido fosse prejudicado não só nos prospectos eleitorais, mas no país. No verão ela lançou a sua “Declaração de Consciência” – o primeiro desafio sério ao McCartismo a partir do GOP [Antigo Grande Partido, em sua sigla em inglês, como muitos republicanos chamam] – no qual ela rejeita a histeria anticomunista do momento:
“Aqueles de nós que gritam mais alto a respeito do americanismo, encenando características ferozes, também são os que mais frequentemente, em suas próprias palavras e atos, ignoram alguns dos princípios americanos básicos: o direito de criticar, o direito de defender crenças impopulares, o direito de protestar e o direito ao pensamento independente".
Os republicanos devem estar determinados a terminar com o controle democrata do congresso”, sugere Smith em sua declaração:
“Mas fazer isso com um regime republicano que abraça uma filosofia carente de integridade política ou de honestidade intelectual seria igualmente desastroso para esta nação. A nação precisa seriamente de uma vitória republicana. Mas eu não quero ver o Partido Republicano obter vitória política cavalgando sobre os Quatro Cavaleiros da Calúnia – Medo, Ignorância, Intolerância e Difamação. Eu tenho dúvidas se o partido republicano pode fazer isso – simplesmente porque eu não acredito que o povo americano apoie um partido político que ponha a exploração política acima do interesse nacional”.
A maioria dos republicanos não teve coragem para confrontar McCarthy tão diretamente. Mas a sabedoria de Smith prevaleceu entre os líderes do Comitê Nacional Republicano e dos velhos membros do GOP nas comissões do congresso, que largaram o slogan “liberdade contra o socialismo” e reduziram o número de palavras do manifesto de 1950 para um resumo com 99, que os repórteres do Washington [Post] explicaram que tinham sido remendados para “pegar leve” na coisa toda do “liberdade contra o socialismo”. O congressista James Fulton, que como muitos outros moderados do GOP da época na verdade sabiam e trabalhavam com membros do Partido Socialista e com radicais de várias colorações, foi o mais direto. O slogan barato, argumentou, tinha afastado o partido da questão fundamental do GOP na era do pós-guerra: “se voltamos a ser Matusalém ou oferecemos um programa alternativo para o progresso social no quadro de um orçamento equilibrado”.
Imagine se hoje um proeminente republicano iria dizer algo parecido. A ira de Limbaugh, Hannity, Palin e do movimento Tea Party iria cair sobre ele. O Clube para o Crescimento iria se organizar para derrotar “os republicanos só no nome”, e a limpeza ideológica do partido de Lincoln, Teddy Roosevelt, Eisenhower e Margaret Chase Smith aceleraria. Alguns dos meus amigos democratas estão bastante contentes com o prospecto; como hoje os republicanos estão beirando ao extremismo que evitaram, mesmo nos dias de McCarthy, sugerem esses democratas, as possibilidades de vitória ficarão claras para candidatos do tipo. Mas isso menospreza o dano causado à democracia quando o discurso degenera, quando a única luta real se dá entre a franja de um partido e outro que assume o caminho da vitória para se mover para a centro direita e então espera que os medos de uma direita totalitária manterão todo mundo à esquerda, votando na linha democrata.
* * *
Se legislações universais de construções verdes e proteções à saúde das crianças podem ser usados com sucesso por nossa mídia degenerada como um ataque aos valores americanos e ao estado de direito, então a direita já venceu, não importa qual o resultado no dia da eleição. E uma nação fundada na revolta contra o império, uma nação que alimentou a resposta republicana radical ao pecado da escravidão, uma nação que confrontou o colapso econômico e a injustiça com um New Deal e uma Guerra contra a Pobreza, uma nação que gerou um movimento pelos direitos civis e que ainda recita uma Prece da Aliança (escrita em 1892 pelo socialista cristão Francis Bellamy) ao ideal de uma América “com liberdade e justiça para todos” está desprovido do que sempre em nossa história tem sido o elemento essencial de nosso progresso.
Esse elemento – uma crítica social frequentemente combinada com um partido político socialista e mais recentemente ligado ao ativismo socialista independente no mundo do trabalho e na militância por direitos iguais entre homens e mulheres, pelas minorias étnicas, imigrantes, gays e lésbicas, e pessoas portadoras de necessidades especiais – tem desde os primeiros dias de nação sido parte de nossa vida política. Este país não seria o que é hoje – de fato, poderia inclusive não ser – não tivesse tido a influência positiva de revolucionários, radicais, socialistas, socialdemocratas e seus companheiros de viagem. O grande cientista político Terence Ball nos lembra que “no auge da guerra fria uma forma limitada de assistência em saúde – o Medicare – passou no Congresso ganhando das objeções da Associação Médica Americana e da indústria de seguros, e foi parar na mesa do presidente Johnson.”
Isso não aconteceu por acaso. Um jovem escritor reconheceu que era possível rejeitar o totalitarismo soviético, enquanto ainda se aprende com Marx e abraça a esquerda democrática socialista do movimento católico Dorothy’s Day para se juntar à Liga da Juventude Socialista. Michael Harrington queria mudar o rumo do debate sobre a pobreza na América, e talvez notável ou profeticamente, ele presumiu que se ligar ao outrora forte mas naquela altura aliado partido socialista era a maneira de fazer isso. Num artigo de 1959, para a então liberal Commentary Magazine, Harrington buscou, nas palavras do seu biógrafo, Maurice Isserman, “superar a sabedoria convencional de que o Estados Unidos tinha se tornado uma sociedade majoritariamente de classe média. Usando o critério da linha da pobreza da renda de 3 mil dólares anuais para uma família de 4 pessoas, ele demonstrou que quase um terço da população vivia ‘abaixo desse padrão que fomos ensinados a observar como o mínimo decente para comer, morar, vestir e ter saúde’”.
Harrington foi além dos seus sonhos mais radicais. O artigo levou a um livro, “A outra América: Pobreza nos Estados Unidos”, que se tornou leitura obrigatória para os políticos, vendendo 70 mil cópias no seu primeiro ano. “Dentre os leitores célebres do livro estavam John F. Kennedy, que no outono de 1963 começou a pensar em propor uma legislação antipobreza”, rememora Isserman. “Depois do assassinato de Kennedy, Lyndon Johnson tomou para si a tarefa, convocando em seu discurso à nação em 1964 uma “incondicional guerra contra a pobreza”. O sargento Shriver liderou a força tarefa responsável pelo projeto de legislação e convidou Harrington a Washington como consultor”. As propostas de Harrington de renovar os projetos de trabalhadores públicos do New Deal nunca foram plenamente abarcadas. Mas a defesa dele e de outros de que o governo deveria intervir por aqueles que não podiam cuidar de si mesmos ou de suas famílias contava com o que o autor descreveu como uma “Seguridade Social completa”, ao prover assistência em saúde para os idosos. Isso demandou da administração Johnson o projeto “Great Society”, incluindo o projeto de lei do Social Security Act de 1965 – ou Medicare. Johnson fez o seu combate, mas os estadunidenses concordaram com seu presidente quando ele argumentou que “o plano de assistência em saúde, pelo qual o presidente Kennedy tanto lutou para implementar, é o modo americano; é prático, é sensível, é igualitário e é justo”.
Poderia um plano descrito como “medicina socializada” pela Associação Médica Americana, porque era, de fato, verdadeiramente medicina socializada ser “o modo americano”? É claro. Durante o debate sobre o Medicare no começo dos anos 60, o senador do Texas e candidato George H.W.Bush condenou a proposta como “estranhamente socialista”. Ronald Reagan, então fazendo a transição de garoto propaganda na televisão para garoto propaganda televisivo do senador conservador Barry Goldwater, alertou os cidadãos de que se esse projeto fosse aprovado os estadunidenses poderiam ver a si mesmos “dizendo às nossas crianças e aos filhos de nossos filhos como foi um dia a América, quando os homens eram livres”. Mas Bush e Reagan administraram o programa quando de suas gestões na presidência, e os ativistas do Tea Party hoje, nos seus encontros nas salas de estar das cidades, ameaçam qualquer legislador que ouse mexer no seu amado Medicare.
Os estadunidenses não teriam tido o Medicare se Harrington e os socialistas que vieram antes dele – de candidatos presidenciais como Debs e Thomas a dirigentes como Mary Marcy e Margaret Sanger e como a militante do partido comunista Elizabeth Gurley Flynn – não tivessem por décadas pressionado os limites do debate sobre a assistência em saúde. Tampouco um ativista como o Senador Edward Kennedy teria declarado: “Eu vejo Michael Harrington como fazendo o Sermão da Montanha à América”. O mesmo foi verdade nos dias dos debates abolicionistas, quando os socialistas – inclusive amigos de Marx que imigraram para os Estados Unidos depois que as revoluções de 1848 foram esmagadas na Europa – energizaram o movimento contra a escravidão e ajudaram a dar-lhe expressão política na forma do Partido Republicano.
O mesmo foi verdade nos primórdios do século XX, quando editores do partido socialista, como Victor Berger combateu as tentativas de destruição das liberdades civis e definiu nosso moderno entendimento de liberdade de expressão, liberdade de imprensa e direito de reconversão processual. O mesmo foi verdade quando o longevo socialista A. Philip Randolph convocou em 1963 a Marcha em Washington por Empregos e Liberdade e convidou o jovem pregador Martin Luther King Jr., que tinha muitos conselheiros socialistas além do respeitável Randolph, para fazer o que viria a ser conhecido como o discurso “I Have a Dream” [Eu tenho um sonho].
* * *
Em cada momento crítico da nossa jornada nacional, os pensadores socialistas e os militantes, assim como candidatos e burocratas, empurraram o governo para uma direção progressista. Pode ser verdade, como sugere o historiador Patrick Allitt, que “milhões de estadunidenses, inclusive muitos desses críticos [da administração Obama], sejam defensores ardentes do socialismo, mesmo que eles não entendam isso ou sequer usem na verdade a palavra” para descrever os serviços públicos que são “organizados segundo linhas diretivas socialistas”, como escolas e autoestradas. De fato, socialistas contemporâneos e militantes do Tea Party podem na verdade encontrar um fundo comum (talvez desconfortável) na asserção de Allitt de que “o socialismo como um princípio organizacional está vivo e bem aqui, assim como o estava ao longo do mundo industrializado” – mesmo que eles não concordem que isso seja uma boa coisa. Programas “organizados segundo linhas diretivas socialistas” não tornam um país socialista. Mas a América sempre foi e deve continuar sendo informada pelos ideais socialistas e pela crítica socialista das políticas públicas.
Vivemos em tempos complexos, em que profundos desafios econômicos, sociais e ambientais exigem um conjunto de respostas. Os socialistas certamente não têm todas as respostas, mesmo que as pesquisas indiquem que mais americanos encontram apelo na palavra “socialismo”, do que em décadas. Mas sem ideias e sem militância socialista, não teremos uma contrabalança suficiente para o impulso anti-governo que tem menos a ver com libertarianismo do que manipulação do debate pelas todas poderosas corporações. Abraham Lincoln, Teddy Roosevelt, Franklin Roosevelt, Dwitht Eisenhower e John Kennedy não eram socialistas. Mas a nação se beneficiou de seus empréstimos às ideias socialistas e social democratas. Barack Obama certamente não é um socialista. Mas ele, e a nação que ele comanda, seriam bem servidos por um empréstimo similar ao povo que um dia imaginou o Social Security, o Medicare, o Medicaid e a Guerra contra a Pobreza.
(*) Jonh Nichols é correspondente em Washington do The Nation e editor associado do The Capital Times (http://host.madison.com/ct/), Wisconsin. Seu livro mais recente é “A Letra S: uma breve história na tradição americana ( The “S” Word: A Short History of an American Tradition). É co-fundador da organização pela reforma da liberdade de imprensa e co-autor, junto com Robert W. McChesney de A morte e a vida do jornalismo americano: a revolução midiática que dará origem ao mundo de novo ( The Death and Life of American Journalism: The Media Revolution that Will Begin the World Again) e de Tragédia e Farsa: Como a mídia americana vende a guerra, corrompe eleições e destrói a democracia( Tragedy & Farce: How the American Media Sell Wars, Spin Elections, and Destroy Democracy). Os outros livros de Nichols incluem: Dick: o homem que é presidente ( Dick: The Man Who is President ) e O gênio do Impeachment: os fundadores da cura para a monarquia (The Genius of Impeachment: The Founders' Cure for Royalism).
Tradução: Katarina Peixoto
Fonte: Carta Maior
(*) Excerto da obra The “S” Word: A Short History of an American Tradition… Socialism, publicado em março, pela Verso.Se há uma constante no discurso da elite [dos EUA] nacional nestes dias é a afirmação de que a América foi fundada como um país capitalista e que o socialismo é uma importação perigosa que, a despeito de nossa não autorizada fé no livre mercado, deve ser barrada na fronteira.
Essa “sabedoria” mais convencional – cada vez mais aceita ao menos até as recentes mobilizações de massa no Wisconsin, em Ohio, no Michigan e no Maine – tem defendido que tudo o que é público é inferior a tudo o que é privado, que as corporações são sempre boas e que os sindicatos sempre são ruins, que a tributação progressiva é intrinsecamente má e que o melhor modelo econômico é aquele que permite que os ricos fiquem cada vez mais ricos, assim como a República, que então distribuirá migalhas da sua riqueza para a imensa maioria dos estadunidenses. Rush Limbaugh informa-nos regularmente que as propostas de taxação de pessoas ricas como ele, com o objetivo de financiar assistência em saúde para crianças e empregos para os desempregados são “antiéticas” frente aos propósitos originais da nação e que as reformas de Barack Obama estão “destruindo o modo como este país foi fundado”.
Quando Obama apresentou sua tímida proposta de organização de um sistema de assistência médica privado mais humano, Sean Hannity, da Fox, denunciou que “a Constituição foi rasgada, injuriada, o estado de direito foi afastado”. Newt Gingrich disse que a administração Obama estava “preparada para fundamentalmente violar a Constituição” e estava governando para “30% do país [que] de fato é a favor de um sistema socialista secular de esquerda”.
Em 2009, Sarah Palin mostrou preocupações constitucionais parecidas, quanto à proposta de Obama de desenvolver uma “legislação universal de energia para construções verdes” com o objetivo de promover a eficiência energética. “Nosso país poderia vir a se tornar algo que sequer reconheceríamos, certamente que isso está muito distante do que os pais fundadores de nosso país tinham em mente para nós”; gravemente preocupada, informou Palin a Hannity, que respondeu com uma pergunta de uma palavra: “Socialismo?”. “Bem”, disse ela, “é para onde estão nos conduzindo”.
Na verdade, não é. Palin está errada quanto aos perigos da eficiência energética, e está errada a respeito de Obama. O presidente disse que não é um socialista, e os maiores porta-vozes socialistas do país concordam veementemente. De fato, as únicas pessoas que parecem acreditar que Obama apresenta uma tendência minimamente socialdemocrata são aqueles que imaginam que qualquer menção à palavra “socialismo” poderia inspirar uma reação como a do vampiro confrontado com a hóstia.
Infelizmente, Obama pode ser mais assustado pela letra "S" do que por Palin. Quando um repórter do New York Times perguntou ao presidente em março de 2009 se suas politicas internas sugeriam que ele fosse um socialista, um Obama relaxado respondeu: “A resposta seria não”. Ele disse que estava sendo criticado simplesmente porque estava “tendo de fazer algumas escolhas difíceis” quanto ao orçamento. Mas depois que conversou com seus assessores hiper cautelosos, ele começou a se preocupar. Então chamou o repórter de volta e disse: “para mim é difícil acreditar que você estava realmente falando sério quando fez a questão sobre o socialismo”.
Então, como se estivesse lendo as marcações de um discurso, Obama declarou: “Não foi sob o meu governo que se começou a comprar um bando de ações de bancos. E não foi sob o meu comando que se concedeu subvenção massiva, a receita da drogadição, sem fontes de recursos para arcar com isso. Temos na verdade operado de uma maneira que tem sido inteiramente consistente com os princípios do livre mercado”, disse Obama, que concluiu atacando: “alguns dos que andam me chamando por aí de ‘socialista’ não podem dizer o mesmo”.
Há mais do que um pingo de verdade nessa declaração. Obama de fato está evitando a adjetivação de socialista, ou mesmo de um social democrata médio, nas respostas aos problemas que o confrontam. Ele afastou a opção do pagador único no início do debate sobre a reforma da saúde, rejeitando o tratamento que em outros países promoveu assistência em saúde de qualidade aos cidadãos, a custos baixos. Sua resposta supostamente “socialista” ao colapso da indústria automobilística foi dar dezenas de bilhões de dólares no resgate dos fundos da GM e da Chrysler, que usaram o dinheiro para despedir milhares de trabalhadores e então realocar dúzias de plantas industriais no exterior – uma abordagem o mais distante possível que um país pode ter do modelo social democrata de aplicação dos investimentos e de políticas públicas na promoção de empregos e na dinamização econômica da sociedade.
Quando a plataforma em águas profundas da British Petroleum (BP) explodiu, ameaçando toda a costa do Golfo, em vez de dispor dos engenheiros das Forças Armadas e de outras agências do governo encarregadas de lidarem com crises, Obama deixou a gestão do problema a cargo da corporação que tinha mentido a respeito da extensão do vazamento de petróleo, que tomou decisões com base na sua disponibilidade de tempo, em detrimento das necessidades humanas e ambientais, e fracassou até nas tarefas mais básicas.
Então deveríamos levar o presidente ao pé da letra quando ele diz que age com base nos princípios do livre mercado. O problema, claro, é que a rigidez de Obama quanto a isso está conduzindo-o a rejeitar ideias mais seguras do que aquelas fixadas pelo setor privado. Emprestar ideias e abordagens de socialistas não tornaria Obama em nada mais socialista do que Abraham Lincoln, Teddy Roosevelt, Franklin Roosevelt ou Dwight Eisenhower. Todos esses presidentes anteriores misturaram ideias de traços marxistas ou emprestados das plataformas dos partidos socialistas com tanta frequência que o New York Times observou, num perfil publicado em 1954, a fé de um velho Norman Thomas de que “ele tinha dado uma grande contribuição no pioneirismo de ideias que hoje ganharam o apoio dos dois maiores partidos” – ideias como “seguridade social, financiamento público da moradia, investimento público, proteção legal para direitos trabalhistas e outros atributos do Estado de Bem Estar”. O fato é que muitos dos homens que ocuparam o Salão Oval antes de Obama souberam que a implementação de ideias de cunho socialista ou social democrata não os colocaria em conflito com a experiência estadunidense ou com a Constituição.
O ponto aqui não é defender o socialismo. O que deveríamos estar defendendo é a história – a história dos EUA, que tem tons ricos e vibrantes, e alguns do vermelho. O passado deveria ser consultado não somente para anedotas ou factóides, mas para fornecer uma perspectiva no presente. Essa perspectiva empodera os estadunidenses que buscam um debate robusto, que compreenda um amplo espetro ideológico – um empreendimento apropriado para um país em que Tom Paine imaginou cidadãos que “lançando seu olhar sobre um vasto campo, tomariam um caminho igualmente vasto, e então, aproximando-se cada vez mais do universo, sua atmosfera de pensamento se expanderia e sua liberalidade preencheria um espaço mais amplo”.
A América sempre sofreu com os idiotas que teriam feito definhar o debate ao nível de uma série de opiniões estreitas o suficiente para abarcar os editos de um potentado, uma prece ou um dono de plantation. Mas a história real da América nos diz que a única coisa a respeito da qual nossa situação presente corresponde é que temos padecido com os idiotas tão completamente que uma boa parte dos estadunidenses – não apenas os Tea Partisans ou os Limbaugh Dittoheads, mas cidadãos da grande classe média - na verdade levam Sarah Palin a sério quando ela vocifera que o socialismo, na forma do código de construção civil verde é antitético ao americanismo.
* * *
Palin não é a primeira deste tipo. Não há nada de novo na acusação de um presidente que está dirigindo um “grande governo” voltado a outros projetos que não a invasão de algum país distante é socialista. Na primavera de 2009, alguns meses após Obama e o novo congresso democrático tomarem posse, vinte e três membros da oposição reapresentaram um velho projeto, em que propõem que “nós, os membros do Comitê Nacional Republicano convocamos o Partido Democrata a ser verdadeiro e honesto com o povo americano, ao reconhecerem que eles evoluíram de um partido que apoiava a tributação e os gastos para um partido de tributação e nacionalização e que, portanto, deveriam concordar em se renomearem de Partido Socialista Democrático”.
As cabeças frias prevaleceram. Por sorte. Num encontro de emergência do comitê – cuja história remonta à primeira convenção republicana, em 1856, em que seguidores do socialista francês Charles Fourier, o editor de Karl Marx e seus camaradas abolicionistas iniciaram a mais radical reestruturação dos partidos políticos na história dos EUA – foi sugerido que a proposta de impor um novo nome para os democratas poderia fazer com que o “Partido Republicano parecesse vulgar e sectário”. O plano foi derrubado, mas uma resolução denunciando a “marcha para o socialismo” passou. Assim, os membros da RNC [Convenção Nacional Republicana, em sua sigla em inglês] agora oficialmente “reconhecem que o Partido Democrata é dedicado a reestruturar a sociedade americana junto aos ideais socialistas” e que os democratas têm como sua “clara e óbvia intenção... propor, aprovar e implementar programas socialistas por meio da legislação federal”.
O Partido Republicano está atualmente mais firme em sua acusação de que os democratas estão conduzindo a nação “para o socialismo” do que estava durante a Ameaça Vermelha de Joe McCarthy nos anos 50, quando o senador do Wisconsin acusou Harry Truman de abrigar células do Partido Comunista no governo. Truman reagiu ao ultraje conservador, argumentando que o governo tinha a autoridade para impor leis antilinchamento nos estados e propondo um plano nacional de saúde. Mas o que incomodava mesmo os republicanos era que Truman, que se esperava fosse perder a disputa em 1948, tinha não só acabado de vencer a eleição como restaurado o controle do Congresso. Para contraatacar essa tendência eleitoral afrontosa, os republicanos conservadores, liderados pelo senador do Ohio Robert Taft, anunciaram em 1950 que seu slogan daquelas eleições para o congresso seria “Liberdade contra o Socialismo”. Eles então produziram um adendo a sua plataforma nacional, cuja maior parte era devotada à histeria de McCarthy acusando o plano de reformas Fair Deal, de Truman, de ser “ditado por um pequeno, mas poderoso grupo de pessoas que acreditam no socialismo, que não tem um conceito da verdadeira fundação do progresso americano, e cujas propostas estão completamente em desacordo com os verdadeiros interesses e verdadeiros desejos dos trabalhadores, agricultores e homens de negócio”.
Truman reagiu, lembrando aos republicanos que suas políticas foram apresentadas na plataforma eleitoral de 1948, que tinha obtido vasta maioria dentre o eleitorado. “Se nosso programa foi ditado, como dizem os republicanos, foi ditado pela votação em novembro de 1948. Foi ditado por um “pequeno mas poderoso grupo de 24 milhões de eleitores”, disse o presidente, que acrescentou: “Eu penso que eles sabiam melhor que o Comitê Nacional Republicano quais os desejos verdadeiros dos trabalhadores, agricultores e homens de negócios”.
Truman não deu cabimento à menção da palavra “socialismo’, que naqueles dias era distinguida na mente da maioria dos estadunidenses como o stalinismo soviético, com o qual o presidente – um péssimo guerreiro da guerra fria - estava disputando. Nem vociferou Truman, que contava dentre seus aliados essenciais com sindicalistas como David Dubinsky, Jacob Potofsky e Walter Reuther, todos eles ligados a causas socialistas e em muitos casos ao partido socialista de Eugene V. Debs e Norman Thomas, contra os males da social democracia. Antes, debochou: “Fora o grande progresso deste país, fora os grandes avanços na conquista de uma vida melhor para todos, fora a ascensão para uma liderança mundial, os líderes republicanos não aprenderam nada. Confrontados pelo grande recorde deste país, e pela tremenda promessa de futuro que ele porta, tudo o que eles fazem é coaxar ‘socialismo’”.
Os republicanos mais espertos abandonaram a campanha. O retorno ao realismo foi liderado pela senadora do Maine, Margaret Chase Smith, que temia que o seu partido fosse prejudicado não só nos prospectos eleitorais, mas no país. No verão ela lançou a sua “Declaração de Consciência” – o primeiro desafio sério ao McCartismo a partir do GOP [Antigo Grande Partido, em sua sigla em inglês, como muitos republicanos chamam] – no qual ela rejeita a histeria anticomunista do momento:
“Aqueles de nós que gritam mais alto a respeito do americanismo, encenando características ferozes, também são os que mais frequentemente, em suas próprias palavras e atos, ignoram alguns dos princípios americanos básicos: o direito de criticar, o direito de defender crenças impopulares, o direito de protestar e o direito ao pensamento independente".
Os republicanos devem estar determinados a terminar com o controle democrata do congresso”, sugere Smith em sua declaração:
“Mas fazer isso com um regime republicano que abraça uma filosofia carente de integridade política ou de honestidade intelectual seria igualmente desastroso para esta nação. A nação precisa seriamente de uma vitória republicana. Mas eu não quero ver o Partido Republicano obter vitória política cavalgando sobre os Quatro Cavaleiros da Calúnia – Medo, Ignorância, Intolerância e Difamação. Eu tenho dúvidas se o partido republicano pode fazer isso – simplesmente porque eu não acredito que o povo americano apoie um partido político que ponha a exploração política acima do interesse nacional”.
A maioria dos republicanos não teve coragem para confrontar McCarthy tão diretamente. Mas a sabedoria de Smith prevaleceu entre os líderes do Comitê Nacional Republicano e dos velhos membros do GOP nas comissões do congresso, que largaram o slogan “liberdade contra o socialismo” e reduziram o número de palavras do manifesto de 1950 para um resumo com 99, que os repórteres do Washington [Post] explicaram que tinham sido remendados para “pegar leve” na coisa toda do “liberdade contra o socialismo”. O congressista James Fulton, que como muitos outros moderados do GOP da época na verdade sabiam e trabalhavam com membros do Partido Socialista e com radicais de várias colorações, foi o mais direto. O slogan barato, argumentou, tinha afastado o partido da questão fundamental do GOP na era do pós-guerra: “se voltamos a ser Matusalém ou oferecemos um programa alternativo para o progresso social no quadro de um orçamento equilibrado”.
Imagine se hoje um proeminente republicano iria dizer algo parecido. A ira de Limbaugh, Hannity, Palin e do movimento Tea Party iria cair sobre ele. O Clube para o Crescimento iria se organizar para derrotar “os republicanos só no nome”, e a limpeza ideológica do partido de Lincoln, Teddy Roosevelt, Eisenhower e Margaret Chase Smith aceleraria. Alguns dos meus amigos democratas estão bastante contentes com o prospecto; como hoje os republicanos estão beirando ao extremismo que evitaram, mesmo nos dias de McCarthy, sugerem esses democratas, as possibilidades de vitória ficarão claras para candidatos do tipo. Mas isso menospreza o dano causado à democracia quando o discurso degenera, quando a única luta real se dá entre a franja de um partido e outro que assume o caminho da vitória para se mover para a centro direita e então espera que os medos de uma direita totalitária manterão todo mundo à esquerda, votando na linha democrata.
* * *
Se legislações universais de construções verdes e proteções à saúde das crianças podem ser usados com sucesso por nossa mídia degenerada como um ataque aos valores americanos e ao estado de direito, então a direita já venceu, não importa qual o resultado no dia da eleição. E uma nação fundada na revolta contra o império, uma nação que alimentou a resposta republicana radical ao pecado da escravidão, uma nação que confrontou o colapso econômico e a injustiça com um New Deal e uma Guerra contra a Pobreza, uma nação que gerou um movimento pelos direitos civis e que ainda recita uma Prece da Aliança (escrita em 1892 pelo socialista cristão Francis Bellamy) ao ideal de uma América “com liberdade e justiça para todos” está desprovido do que sempre em nossa história tem sido o elemento essencial de nosso progresso.
Esse elemento – uma crítica social frequentemente combinada com um partido político socialista e mais recentemente ligado ao ativismo socialista independente no mundo do trabalho e na militância por direitos iguais entre homens e mulheres, pelas minorias étnicas, imigrantes, gays e lésbicas, e pessoas portadoras de necessidades especiais – tem desde os primeiros dias de nação sido parte de nossa vida política. Este país não seria o que é hoje – de fato, poderia inclusive não ser – não tivesse tido a influência positiva de revolucionários, radicais, socialistas, socialdemocratas e seus companheiros de viagem. O grande cientista político Terence Ball nos lembra que “no auge da guerra fria uma forma limitada de assistência em saúde – o Medicare – passou no Congresso ganhando das objeções da Associação Médica Americana e da indústria de seguros, e foi parar na mesa do presidente Johnson.”
Isso não aconteceu por acaso. Um jovem escritor reconheceu que era possível rejeitar o totalitarismo soviético, enquanto ainda se aprende com Marx e abraça a esquerda democrática socialista do movimento católico Dorothy’s Day para se juntar à Liga da Juventude Socialista. Michael Harrington queria mudar o rumo do debate sobre a pobreza na América, e talvez notável ou profeticamente, ele presumiu que se ligar ao outrora forte mas naquela altura aliado partido socialista era a maneira de fazer isso. Num artigo de 1959, para a então liberal Commentary Magazine, Harrington buscou, nas palavras do seu biógrafo, Maurice Isserman, “superar a sabedoria convencional de que o Estados Unidos tinha se tornado uma sociedade majoritariamente de classe média. Usando o critério da linha da pobreza da renda de 3 mil dólares anuais para uma família de 4 pessoas, ele demonstrou que quase um terço da população vivia ‘abaixo desse padrão que fomos ensinados a observar como o mínimo decente para comer, morar, vestir e ter saúde’”.
Harrington foi além dos seus sonhos mais radicais. O artigo levou a um livro, “A outra América: Pobreza nos Estados Unidos”, que se tornou leitura obrigatória para os políticos, vendendo 70 mil cópias no seu primeiro ano. “Dentre os leitores célebres do livro estavam John F. Kennedy, que no outono de 1963 começou a pensar em propor uma legislação antipobreza”, rememora Isserman. “Depois do assassinato de Kennedy, Lyndon Johnson tomou para si a tarefa, convocando em seu discurso à nação em 1964 uma “incondicional guerra contra a pobreza”. O sargento Shriver liderou a força tarefa responsável pelo projeto de legislação e convidou Harrington a Washington como consultor”. As propostas de Harrington de renovar os projetos de trabalhadores públicos do New Deal nunca foram plenamente abarcadas. Mas a defesa dele e de outros de que o governo deveria intervir por aqueles que não podiam cuidar de si mesmos ou de suas famílias contava com o que o autor descreveu como uma “Seguridade Social completa”, ao prover assistência em saúde para os idosos. Isso demandou da administração Johnson o projeto “Great Society”, incluindo o projeto de lei do Social Security Act de 1965 – ou Medicare. Johnson fez o seu combate, mas os estadunidenses concordaram com seu presidente quando ele argumentou que “o plano de assistência em saúde, pelo qual o presidente Kennedy tanto lutou para implementar, é o modo americano; é prático, é sensível, é igualitário e é justo”.
Poderia um plano descrito como “medicina socializada” pela Associação Médica Americana, porque era, de fato, verdadeiramente medicina socializada ser “o modo americano”? É claro. Durante o debate sobre o Medicare no começo dos anos 60, o senador do Texas e candidato George H.W.Bush condenou a proposta como “estranhamente socialista”. Ronald Reagan, então fazendo a transição de garoto propaganda na televisão para garoto propaganda televisivo do senador conservador Barry Goldwater, alertou os cidadãos de que se esse projeto fosse aprovado os estadunidenses poderiam ver a si mesmos “dizendo às nossas crianças e aos filhos de nossos filhos como foi um dia a América, quando os homens eram livres”. Mas Bush e Reagan administraram o programa quando de suas gestões na presidência, e os ativistas do Tea Party hoje, nos seus encontros nas salas de estar das cidades, ameaçam qualquer legislador que ouse mexer no seu amado Medicare.
Os estadunidenses não teriam tido o Medicare se Harrington e os socialistas que vieram antes dele – de candidatos presidenciais como Debs e Thomas a dirigentes como Mary Marcy e Margaret Sanger e como a militante do partido comunista Elizabeth Gurley Flynn – não tivessem por décadas pressionado os limites do debate sobre a assistência em saúde. Tampouco um ativista como o Senador Edward Kennedy teria declarado: “Eu vejo Michael Harrington como fazendo o Sermão da Montanha à América”. O mesmo foi verdade nos dias dos debates abolicionistas, quando os socialistas – inclusive amigos de Marx que imigraram para os Estados Unidos depois que as revoluções de 1848 foram esmagadas na Europa – energizaram o movimento contra a escravidão e ajudaram a dar-lhe expressão política na forma do Partido Republicano.
O mesmo foi verdade nos primórdios do século XX, quando editores do partido socialista, como Victor Berger combateu as tentativas de destruição das liberdades civis e definiu nosso moderno entendimento de liberdade de expressão, liberdade de imprensa e direito de reconversão processual. O mesmo foi verdade quando o longevo socialista A. Philip Randolph convocou em 1963 a Marcha em Washington por Empregos e Liberdade e convidou o jovem pregador Martin Luther King Jr., que tinha muitos conselheiros socialistas além do respeitável Randolph, para fazer o que viria a ser conhecido como o discurso “I Have a Dream” [Eu tenho um sonho].
* * *
Em cada momento crítico da nossa jornada nacional, os pensadores socialistas e os militantes, assim como candidatos e burocratas, empurraram o governo para uma direção progressista. Pode ser verdade, como sugere o historiador Patrick Allitt, que “milhões de estadunidenses, inclusive muitos desses críticos [da administração Obama], sejam defensores ardentes do socialismo, mesmo que eles não entendam isso ou sequer usem na verdade a palavra” para descrever os serviços públicos que são “organizados segundo linhas diretivas socialistas”, como escolas e autoestradas. De fato, socialistas contemporâneos e militantes do Tea Party podem na verdade encontrar um fundo comum (talvez desconfortável) na asserção de Allitt de que “o socialismo como um princípio organizacional está vivo e bem aqui, assim como o estava ao longo do mundo industrializado” – mesmo que eles não concordem que isso seja uma boa coisa. Programas “organizados segundo linhas diretivas socialistas” não tornam um país socialista. Mas a América sempre foi e deve continuar sendo informada pelos ideais socialistas e pela crítica socialista das políticas públicas.
Vivemos em tempos complexos, em que profundos desafios econômicos, sociais e ambientais exigem um conjunto de respostas. Os socialistas certamente não têm todas as respostas, mesmo que as pesquisas indiquem que mais americanos encontram apelo na palavra “socialismo”, do que em décadas. Mas sem ideias e sem militância socialista, não teremos uma contrabalança suficiente para o impulso anti-governo que tem menos a ver com libertarianismo do que manipulação do debate pelas todas poderosas corporações. Abraham Lincoln, Teddy Roosevelt, Franklin Roosevelt, Dwitht Eisenhower e John Kennedy não eram socialistas. Mas a nação se beneficiou de seus empréstimos às ideias socialistas e social democratas. Barack Obama certamente não é um socialista. Mas ele, e a nação que ele comanda, seriam bem servidos por um empréstimo similar ao povo que um dia imaginou o Social Security, o Medicare, o Medicaid e a Guerra contra a Pobreza.
(*) Jonh Nichols é correspondente em Washington do The Nation e editor associado do The Capital Times (http://host.madison.com/ct/), Wisconsin. Seu livro mais recente é “A Letra S: uma breve história na tradição americana ( The “S” Word: A Short History of an American Tradition). É co-fundador da organização pela reforma da liberdade de imprensa e co-autor, junto com Robert W. McChesney de A morte e a vida do jornalismo americano: a revolução midiática que dará origem ao mundo de novo ( The Death and Life of American Journalism: The Media Revolution that Will Begin the World Again) e de Tragédia e Farsa: Como a mídia americana vende a guerra, corrompe eleições e destrói a democracia( Tragedy & Farce: How the American Media Sell Wars, Spin Elections, and Destroy Democracy). Os outros livros de Nichols incluem: Dick: o homem que é presidente ( Dick: The Man Who is President ) e O gênio do Impeachment: os fundadores da cura para a monarquia (The Genius of Impeachment: The Founders' Cure for Royalism).
Tradução: Katarina Peixoto
Fonte: Carta Maior
segunda-feira, 25 de abril de 2011
Para Julian Assange, Guantánamo é “monstruosidade” - Por Natalia Viana/Pública
Para Julian Assange, Guantánamo é “monstruosidade”“Os Arquivos de Guantánamo, que o WikiLeaks começou a publicar, jogam luz sobre essa monstruosidade da era Bush que a administração Obama decidiu continuar”, afirmou Julian Assange com exclusividade para a Pública nesta segunda-feira.
A declaração de Assange resume a importância do vazamento mais recente da organização, que começou a ser publicado ontem à noite. São milhares de fichas de prisioneiros ou ex-prisioneiros de Guantánamo, em Cuba, e outros documentos relacionados, emitidos pela JFT-GTM (Força-Tarefa de Guantánamo) e enviados na forma de memorandos ao US Southern Command (Comando Sul dos Estados Unidos).
As fichas relatam o estado de saúde dos atuais presos, refazem a teia investigativa que os levou à prisão e revelam que boa parte dos acusados foram incriminados com base em depoimentos de outros presos obtidos sob tortura dentro e fora de Guantánamo – nas prisões secretas da CIA. Uma revisão cuidadosa dso documentos revela que o mercado de recompensas promovido pelos Estados Unidos levou à detenção de inocentes por acusações formuladas por informantes interessados em prêmios em dinheiro.
Também revelam como são feitos os “pareceres”, que recomendam a permanência ou não dos presos em Guantánamo, não apenas pela força-tarefa mas também pelos responsáveis pela investigação criminal e psicólogos encarregados de avaliar a maneira que devem ser utilizadas as informações obtidas em outros interrogatórios.
“A publicação dessas informações é importante para o público, para os prisioneiros e ex-prisioneiros, e para os juízes que se ocupam desses casos. Muitos estão presos há anos sem acusação formal e com base em testemunhos falsos”, disse Assange.
“Está na hora de reacender a discussão pública sobre a prisão de Guantánamo, na esperança que finalmente se possa fazer alguma coisa para trazer justiça para esse estabelecimento”, afirmou o fundador do WikiLeaks, que qualificou Guantánamo de “estabelecimento de ‘lavagem de pessoas’.
A comparação com a lavagem de dinheiro, em que bancos internacionais “escondem” recursos suspeitos, é empregada por Assange pelo fato de Guantánamo esconder da sociedade a verdadeira história dessas prisões para justificar a política criminosa de prisão sem julgamento e os meios ilícitos empregados para prendê-los.
Publicação
Na conversa com a Pública, Assange fez questão de destacar que os veículos parceiros nesse lançamento são o Washington Post, dos EUA, o El Pais, da Espanha, o Telegraph, do Reino Unido, a revista Der Spiegel , da Alemanha, o francês Le Monde, da Franca, o Aftonbladet, da Suecia e o italiano La Repubblica.
Isso por que, apesar de não estarem entre os parceiros oficiais, os jornais New York Times, dos Estados Unidos, e Guardian, do Reino Unido, publicaram ontem reportagens baseadas nos mesmos documentos secretos, entregues por uma outra fonte, que preferiu permanecer anônima. Segundo a Pública apurou, por causa disso, o vazamento foi adiantado porque os dois jornais pretendiam “furar” o WikiLeaks.
É o capítulo mais recente da novela que envolve o WikiLeaks e esses dois jornais.
No início do ano passado, o Guardian contratou uma jornalista inglesa que obteve os documentos relativos às embaixadas americanas de um colaborador do WikiLeaks. Naquele momento, o jornal desistiu de publicá-los antes da organização, porque Assange ameaçou processá-lo com base em um contrato assinado pelas duas partes.
Depois disso, Julian rompeu com o Guardian, que publicou um livro sobre o Wikileaks considerado tendencioso pelo fundador da organização. Assange também se irritou com a publicação do processo contra ele movido na Suécia, incluindo detalhes sobre as relações que manteve com as mulheres que o acusam de delitos sexuais. “Transparência é para governos e não para pessoas”, disse ele na época.
Também com o New York Times, as relações têm sido conturbadas. Em janeiro, o editor Bill Keller escreveu um artigo em que chamava Julian de “arrogante, cabeça-dura, conspiracional e estranhamento crédulo”, alem de dizer que ele “cheirava mal”. Não foi o primeiro problema: depois da publicação dos documentos das embaixadas americanas, Keller passou a chamar Assange e o WikiLeaks de “fonte” em vez de uma organização jornalística. A diferenciação tem consequências legais, pois os jornalistas são protegidos pela quarta emenda constitucional americana.
No início de abril, durante um congresso de jornalismo na Universidade de Berkeley, na California, Keller e Assange – este por skype já que está sob prisão domiciliar – , participaram de um debate em que o fundador do WikiLeaks acusou o jornal de trabalhar a favor do governo americano. “O papel da imprensa é obrigar as organizações poderosas a prestar contas, e não encobrir seus erros”, disse.
Keller continuou chamando o WikiLeaks de “fonte” durante todo o debate. Mas brincou: “A grande vingança de Julian e que eu terei que passar anos da minha vida participando de debates sobre o WikiLeaks”.
Fonte: http://apublica.org/
A declaração de Assange resume a importância do vazamento mais recente da organização, que começou a ser publicado ontem à noite. São milhares de fichas de prisioneiros ou ex-prisioneiros de Guantánamo, em Cuba, e outros documentos relacionados, emitidos pela JFT-GTM (Força-Tarefa de Guantánamo) e enviados na forma de memorandos ao US Southern Command (Comando Sul dos Estados Unidos).
As fichas relatam o estado de saúde dos atuais presos, refazem a teia investigativa que os levou à prisão e revelam que boa parte dos acusados foram incriminados com base em depoimentos de outros presos obtidos sob tortura dentro e fora de Guantánamo – nas prisões secretas da CIA. Uma revisão cuidadosa dso documentos revela que o mercado de recompensas promovido pelos Estados Unidos levou à detenção de inocentes por acusações formuladas por informantes interessados em prêmios em dinheiro.
Também revelam como são feitos os “pareceres”, que recomendam a permanência ou não dos presos em Guantánamo, não apenas pela força-tarefa mas também pelos responsáveis pela investigação criminal e psicólogos encarregados de avaliar a maneira que devem ser utilizadas as informações obtidas em outros interrogatórios.
“A publicação dessas informações é importante para o público, para os prisioneiros e ex-prisioneiros, e para os juízes que se ocupam desses casos. Muitos estão presos há anos sem acusação formal e com base em testemunhos falsos”, disse Assange.
“Está na hora de reacender a discussão pública sobre a prisão de Guantánamo, na esperança que finalmente se possa fazer alguma coisa para trazer justiça para esse estabelecimento”, afirmou o fundador do WikiLeaks, que qualificou Guantánamo de “estabelecimento de ‘lavagem de pessoas’.
A comparação com a lavagem de dinheiro, em que bancos internacionais “escondem” recursos suspeitos, é empregada por Assange pelo fato de Guantánamo esconder da sociedade a verdadeira história dessas prisões para justificar a política criminosa de prisão sem julgamento e os meios ilícitos empregados para prendê-los.
Publicação
Na conversa com a Pública, Assange fez questão de destacar que os veículos parceiros nesse lançamento são o Washington Post, dos EUA, o El Pais, da Espanha, o Telegraph, do Reino Unido, a revista Der Spiegel , da Alemanha, o francês Le Monde, da Franca, o Aftonbladet, da Suecia e o italiano La Repubblica.
Isso por que, apesar de não estarem entre os parceiros oficiais, os jornais New York Times, dos Estados Unidos, e Guardian, do Reino Unido, publicaram ontem reportagens baseadas nos mesmos documentos secretos, entregues por uma outra fonte, que preferiu permanecer anônima. Segundo a Pública apurou, por causa disso, o vazamento foi adiantado porque os dois jornais pretendiam “furar” o WikiLeaks.
É o capítulo mais recente da novela que envolve o WikiLeaks e esses dois jornais.
No início do ano passado, o Guardian contratou uma jornalista inglesa que obteve os documentos relativos às embaixadas americanas de um colaborador do WikiLeaks. Naquele momento, o jornal desistiu de publicá-los antes da organização, porque Assange ameaçou processá-lo com base em um contrato assinado pelas duas partes.
Depois disso, Julian rompeu com o Guardian, que publicou um livro sobre o Wikileaks considerado tendencioso pelo fundador da organização. Assange também se irritou com a publicação do processo contra ele movido na Suécia, incluindo detalhes sobre as relações que manteve com as mulheres que o acusam de delitos sexuais. “Transparência é para governos e não para pessoas”, disse ele na época.
Também com o New York Times, as relações têm sido conturbadas. Em janeiro, o editor Bill Keller escreveu um artigo em que chamava Julian de “arrogante, cabeça-dura, conspiracional e estranhamento crédulo”, alem de dizer que ele “cheirava mal”. Não foi o primeiro problema: depois da publicação dos documentos das embaixadas americanas, Keller passou a chamar Assange e o WikiLeaks de “fonte” em vez de uma organização jornalística. A diferenciação tem consequências legais, pois os jornalistas são protegidos pela quarta emenda constitucional americana.
No início de abril, durante um congresso de jornalismo na Universidade de Berkeley, na California, Keller e Assange – este por skype já que está sob prisão domiciliar – , participaram de um debate em que o fundador do WikiLeaks acusou o jornal de trabalhar a favor do governo americano. “O papel da imprensa é obrigar as organizações poderosas a prestar contas, e não encobrir seus erros”, disse.
Keller continuou chamando o WikiLeaks de “fonte” durante todo o debate. Mas brincou: “A grande vingança de Julian e que eu terei que passar anos da minha vida participando de debates sobre o WikiLeaks”.
Fonte: http://apublica.org/
Ignacio Ramonet descreve explosão do jornalismo
Ignacio Ramonet descreve explosão do jornalismoSurgiu novo sinal de que a comunicação compartilhada tem futuro e enorme potência transformador. O jornalista francês Ignacio Ramonet – um dos estudiosos mais profundos, refinados e críticos da mídia convencional – acaba de lançar A Explosão do Jornalismo (disponível por enquanto, apenas em francês). A grande novidade na obra é a esperança militante que o autor deposita na blogosfera, nas redes sociais e num novo jornalismo que se associe a elas.
Ao longo dos últimos quinze anos, Ramonet foi, talvez, o analista mais destacado da mercantilização e pasteurização da imprensa. Diretor (entre 1990 e 2008) da edição francesa do Le Monde Diplomatique, ele abriu as páginas do jornal a textos agudos sobre a involução por que passaram os jornais, o rádio e a TV, no período. Apontou, sempre com muita riqueza de dados. a associação crescente entre imprensa e grande empresa. Associou este processo ao papel domesticador que a mídia passou a desempenhar no período – totalmente oposto à conceito de “contra-poder”, reivindicado pelos defensores de uma democracia de alta intensidade. Cunhou, num editorial escrito em janeiro de 1995, o termo “pensamento único”, para denunciar o apagamento da diversidade. Lembrou que, nas novas condições, a imprensa passava a desempenhar, para as sociedades capitalistas, papel similar ao que o “partido único” exercera nos países alinhados à extinta União Soviética.
Tal combate deu-lhe relevância e prestígio: político, teórico e acadêmico. Mas nos últimos anos – precisamente quando amplos setores sociais reagiram ao pensamento único apropriando-se da internet e criando um novo jornalismo horizontal e cidadão – Ramonet parecia descrente. Seus textos continuaram apontando, ácidos, a degenerescência da imprensa-empresa. Mas ele mostrava-se pouco sensível à grande novidade. Numa entrevista concedida em São Paulo em 2008, durante o I Encontro do Jornalista Escritor, enxergou uma internet prestes a ser colonizada pelas grandes corporações da indústria da comunicação.
A Explosão do Jornalismo reverte este ceticismo. E Ramonet redefine sua posição aportando densidade teórica e imaginativa à luta para construir a nova mídia. No novo livro, ele busca, por exemplo, caminhos para associar a blogosfera a publicações que funcionem como nós na rede – pontos de convergência, debate e colaboração permanente entre blogueiros e outros comunicadores. Também especula sobre as maneiras de oferecer, aos novos meios e seus “neojornalistas”, condições de sustentabilidade material em bases pós-mercantis.
No final da semana passada, Ramonet concedeu, ao jornal francês L’Humanité, ampla entrevista sobre seu novo livro. É um prazer traduzi-la e oferecê-la aos leitores de Outras Palavras (A.M.)
Entrevista a Frédéric Durand, no L’Humanité | Tradução: Antonio Martins
Você afirma, em seu livro, que “o jornalismo tradicional desintegra-se completamente”
Ignacio Ramonet: Sim, inclusive porque ele está sendo atacado de todos os lados. Primeiro, há o impacto da internet. Parece claro que, ao criar um continente mediático inédito, ela produz um jornalismo novo (blogs,redes sociais, leaks), em concorrência direta com o jornalismo tradicional. Além disso, há o que poderíamos chamar de “crise habitual” do jornalismo. Ela é anterior à situação atual. Desdobra-se em perda de credibilidade, diretamente ligada à consanguinidade entre muitos jornalistas e o poder econômico e político, que suscita uma desconfiança geral do público. Por fim, há a crise econômica, que provoca uma queda muito forte da publicidade, principal fonte de financiamento das mídias privadas e desencadeia pesadas dificuldades de funcionamento para as redações.
A que se deve a perda de credibilidade?
Ignacio Ramonet: Ela acentuou-se nas duas últimas décadas, essencialmente como consequência do desenvolvimento do negócio midiático. A imprensa nunca foi perfeita, fazer bom jornalismo foi sempre um combate. Mas a partir da metade dos anos 1980, vivemos duas substituições. Primeiro, a informação contínua na TV, mais rápida, tomou o lugar da informação oferecida pela impressa escrita. Isso conduziu a uma concorrência mais viva entre mídias uma corrida de velocidade em que resta cada vez menos tempo para verificar as informações. Em seguida, a partir da metade dos anos 1990, com o desenvolvimento da internet. Particularmente há alguns anos, com a emergência dos “neojornalistas”, estas testemunhas-observadoras dos acontecimentos (sejam sociais, políticos, culturais, meteorológicos ou amenidades). Eles tornaram-se uma fonte de informações extremamente solicitada pelas próprias mídias tradicionais.
O público parece justificar sua desconfiança em relação à imprensa pela promiscuidade entre o poder e os jornalistas
Ignacio Ramonet: Para a maioria dos cidadãos, o jornalismo resume-se a alguns jornalistas: estes que se vê em toda parte. Duas dezenas de personalidades conhecidas, que vivem um pouco “fora da terra”, que passam muito tempo “integrados” com os políticos, e que, em toda o mundo, conciliam bastante com eles. Constitui-se assim uma espécie de nobreza política, líderes políticos e jornalistas célebres que vivem (e às vezes se casam) entre si mesmos, uma nova aristocracia. Mas esta não é a realidade do jornalismo. A característica principal desta profissão é, hoje, a precarização. A maior parte dos jovens jornalistas é explorada, muito mal paga. Trabalham por tarefa, muitas vezes em condições pré-industriais. Mais de 80% dos jornalistas recebem baixos salários. Toda a profissão vive sob ameaça constante de desemprego. Portanto, as duas dezenas de jornalistas célebres não são nem um pouco representativas, e mascaram a miséria social do jornalismo – na França e em mutos outros países. Isso não mudou com a internet – talvez, tenha se agravado. Nos sites de informação em tempo real criados pela maior parte da velha mídia, as condições de trabalho são ainda piores. Surgem novos tipos de jornalistas explorados e superexplorados. O que pode consolá-los é saber que, talvez, seu futuro lhes pertença.
Nestas condições, o jornalismo pode ainda assumir o título de “quarto poder”, que age como um contra-poder?
Ignacio Ramonet: Vivemos uma concentração extraordinária das mídias. Quem examina a estrutura de propriedade da imprensa francesa, por exemplo, constata que ela está em mãos de um número reduzidíssimo de grupos. Um punhado de oligarcas – Lagardère, Pinault, Arnault, Dassault – tornou-se proprietário dos grandes meios. Estes expressam uma pluralidade cada vez menor e se supõem que defendam os interesses dos grandes grupos financeiros e industriais a que pertencem. Isso provoca a crise do “quarto poder”. Sua missão histórica, que consiste em criar uma opinião pública com senso crítico e capaz de participar ativamente do debate democrático, já não pode ser garantido. A mídia procura, ao contrário, domesticar a sociedade e evitar qualquer questionamento ao sistema dominante. Os grandes meios criaram um consenso em torno de certas idéias (a globalização e o livre-comércio, por exemplo), consideradas “boas para todos” e incontestáveis. Quem as renega deixa aquilo que Alain Minc chamou de “círculo da razão”. Entra, portanto, em desrazão…
Você refere-se às vezes à necessidade de um “quinto poder”
Ignacio Ramonet: Sim. Se constatamos que o “quarto poder” não funciona, isso representa um grave problema para a democracia. Não se pode conceber uma democracia sem o autêntico contra-poder da opinião pública. Uma das especificidades dos sistemas democráticos está, aliás, nesta tensão permanente entre poder e no respectivo contra-poder. É o que faz a versatilidade e capacidade de adaptação deste sistema. O governo tem, como contrapeso a seu poder, uma oposição, os patrões, os sindicatos. Mas a mídia não tem – e não quer ter! – um contra-poder.
Ora, há uma demanda social forte e crescente de informações sobre a informação. Diversas associações tem se constituído (na França, a Acrimed) para aferir a veracidade e o funcionamento da mídia. Para que a sociedade possa defender-se melhor. É assim que as sociedades constroem, pouco a pouco, um “quinto poder”. Sendo que o mais difícil é fazer com que a mídia dominante aceite este “quinto poder” e lhe dê a palavra…
Em seu livro, você afirma que o futuro dos jornais escritos é tornar-se imprensa de opinião. Por que?
Ignacio Ramonet: Os jornais mais ameaçados são, em minha opinião, os que reproduzem todas as informações gerais e cuja linha editorial dilui-se totalmente. Embora seja importante, para os cidadãos, que todas as opiniões se exprimam, isso não quer dizer que cada mídia deva reproduzir, em si mesma, todas estas opiniões. Neste sentido, a imprensa de opinião é necessária. Não se trata de uma imprensa ideológica, ligada ou identificada com uma organização política – mas de um jornalismo capaz de defender uma linha editorial definida por sua redação.
Na medida em que, para tentar enfrentar a crise da imprensa, os jornais decidiram abrir espaço, em suas colunas, a todas as teses políticas, da extrema esquerda à extrema direita, sob pretexto de que vale tudo, muitos leitores deixaram de comprar estas publicações. Porque uma das funções de um jornal, além de fornecer informações, é conferir uma “identidade política” a seu leitor. Porém, agora, o jornal não expressa mais o que são seus leitores. Estes, ao contrário, confundem as identidades dos jornais e se desconcertam. Eles compram, digamos, Libération, e leêm uma entrevista com Marine Le Pen. Aliás, por que não? Mas os leitores podem descobrir, por exemplo, que têm talvez algumas ideias em comum com o Front National. E ninguém lhes dá referências a respeito, o que provoca inquietação. Tal desarranjo confunde muitos leitores. Hoje, o fluxo de informações que transita na internet permite que cada um forme sua própria opinião. Em plena crise dos jornais, o sucesso do semanário alemão Die Ziet é significativo. Ele escolheu contestar as ideias e informações dominantes, com artigos de fundo – longos e às vezes árduos. As vendas crescem. No momento em que toda a imprensa faz o mesmo – artigos cada vez mais curtos, com um vocabulário de 200 palavras, Die Ziet escolheu uma linha editorial clara e distinta. Além disso, seus textos permitem lembrar de que o jornalismo é um gênero literário…
Ao mencionar a superabundância de informações, na internet e em suas redes sociais, você refere-se a sabedoria coletiva e a embrutecimento coletivo. Por que?
Ignacio Ramonet: Nunca na histórias das mídias os cidadãos contribuíram tanto à informação. Hoje, quando um jornalista publica um texto online, ele pode ser contestado, completado, debatido por um enxame de internautas que serão, sobre muitos temas, tão ou mais qualificados que o autor. Assistimos, portanto, a um enriquecimento da informação graças aos “neojornalistas”, que eu chamo de “amadores-profissionais”. Lembremos que estamos numa sociedade em que formação superior tornou-se acessível como nunca antes. O jornalismo dirige-se, portanto, a um público muito bem formado – ainda que esta formação seja segmentada.
Além disso, as ditaduras que procuram controlar a informação não conseguem fazê-lo mais, como vimos na Tunísia, Egito e em outras partes. Lembremos que a aparição da imprensa, em 1440, não transformou apenas a história do livro. Ela sacudiu a história e o funcionamento das sociedades. Da mesma forma, o desenvolvimento da internet não é apenas uma ruptura no campo midiático. Ele modifica as relações sociais. Cria um novo ecossistema, que produz paralelamente a extinção maciça de certas mídias, em particular a imprensa escrita paga. Nos Estados Unidos, cerca de 120 jornais já desapareceram.
Significa que a imprensa escrita desaparecerá? A resposta é não. A história mostra que as mídias se reentrelaçam e reorganizam, ao invés de desaparecer. No entanto, poucos jornais vão sobreviver. Sobreviverão aqueles que tiverem uma linha clara, proponham análises amparadas em pesquisa, sérias, originais, bem escritas.
Mas o contexto da hiper-abundância de informações também desorienta o cidadão. Ele não chega a distinguir o que é importante e o que não é. Que informações são verdadeiras? Quais são falsas? Ele vive num sentimento permanente de insegurança informativa. Cada vez mais, as pessoas irão se propor a pesquisar informações de referência.
Como assegurar um futuro à informação e aos que a fazem, agora que ele é acessível gratuitamente?
Ignacio Ramonet: Embora seja incontestável que a imprensa online é a que dominará a informação nos anos futuros, é evidentemente necessário encontrar um modelo econômico viável. No momento, a cultura dominante na internet é a da gratuidade. Mas estamos, precisamente agora, entre dois modelos, e nenhum deles funciona. A informação tradicional (rádio, TV, imprensa escrita) é cada vez menos rentável. E o modelo de informação online não o é ainda, com raríssimas exceções.
Os novos espaços midiáticos podem modificar as relações de dominação que prevalecem hoje no seio da própria sociedade?
Ignacio Ramonet: Dediquei um capítulo inteiro de meu livro ao WikiLeaks. É o terreno da transparência. Em nossas sociedades contemporâneas, democráticas e abertas será cada vez mais difícil, para o poder, manter dupla política: uma para fora e outra, mais opaca e secreta, para uso interno, onde há o direito e risco de transgredir as leis.
O Wikileaks demonstrou que as mídias tradicionais já não funcionavam nem assumiam seu papel. Foi no nicho destas carências que o Wikileaks pôde introduzir-se e se desenvolver. O site também revelou que a maior parte dos Estados tinham uma lado obscuro, oculto. Mas o grande escândalo é que, depois das revelações do Wikileaks, nada ocorreu! Por exemplo: revelou-se que, na época da guerra do Iraque, um certo grupo de dirigentes do Partido Socialista francês dirigiu-se à embaixada dos Estados Unidos para explicar que, se estivessem no poder, teriam envolvida a França na guerra. E este fato – próximo da alta traição – não provocou reações.
Esta evolução para mais transparência pode provocar efeitos concretos?
Ignacio Ramonet: Ela vai necessariamente atingir os privilégios das elites e as relações de dominação. Se as mídias podem, até agora, dissecar o poder político, é porque a política perdeu muito de seu poder, abocanhado pelas esferas financeiras. Sem dúvidas, é à sombra das finanças, dos traders, dos fundos de pensão, que se localiza hoje o verdadeiro poder.
Tal poder permanece preservado porque é opaco. É significativo que a próxima revelação anunciada pelo Wikileaks diga respeito, precisamente, ao sigilo bancário. Graças aos novos sistemas midiáticos, tornou-se possível atacar estes espaços ocultos. Este poder é como o dos vampiros: a luz os dissolve, os reduz a poeira. Podemos esperar, que graças aos novos meios digitais, breve chegará a hora de desvendar o poder econômico e financeiro.
Fonte: http://www.outraspalavras.net/
Ao longo dos últimos quinze anos, Ramonet foi, talvez, o analista mais destacado da mercantilização e pasteurização da imprensa. Diretor (entre 1990 e 2008) da edição francesa do Le Monde Diplomatique, ele abriu as páginas do jornal a textos agudos sobre a involução por que passaram os jornais, o rádio e a TV, no período. Apontou, sempre com muita riqueza de dados. a associação crescente entre imprensa e grande empresa. Associou este processo ao papel domesticador que a mídia passou a desempenhar no período – totalmente oposto à conceito de “contra-poder”, reivindicado pelos defensores de uma democracia de alta intensidade. Cunhou, num editorial escrito em janeiro de 1995, o termo “pensamento único”, para denunciar o apagamento da diversidade. Lembrou que, nas novas condições, a imprensa passava a desempenhar, para as sociedades capitalistas, papel similar ao que o “partido único” exercera nos países alinhados à extinta União Soviética.
Tal combate deu-lhe relevância e prestígio: político, teórico e acadêmico. Mas nos últimos anos – precisamente quando amplos setores sociais reagiram ao pensamento único apropriando-se da internet e criando um novo jornalismo horizontal e cidadão – Ramonet parecia descrente. Seus textos continuaram apontando, ácidos, a degenerescência da imprensa-empresa. Mas ele mostrava-se pouco sensível à grande novidade. Numa entrevista concedida em São Paulo em 2008, durante o I Encontro do Jornalista Escritor, enxergou uma internet prestes a ser colonizada pelas grandes corporações da indústria da comunicação.
A Explosão do Jornalismo reverte este ceticismo. E Ramonet redefine sua posição aportando densidade teórica e imaginativa à luta para construir a nova mídia. No novo livro, ele busca, por exemplo, caminhos para associar a blogosfera a publicações que funcionem como nós na rede – pontos de convergência, debate e colaboração permanente entre blogueiros e outros comunicadores. Também especula sobre as maneiras de oferecer, aos novos meios e seus “neojornalistas”, condições de sustentabilidade material em bases pós-mercantis.
No final da semana passada, Ramonet concedeu, ao jornal francês L’Humanité, ampla entrevista sobre seu novo livro. É um prazer traduzi-la e oferecê-la aos leitores de Outras Palavras (A.M.)
Entrevista a Frédéric Durand, no L’Humanité | Tradução: Antonio Martins
Você afirma, em seu livro, que “o jornalismo tradicional desintegra-se completamente”
Ignacio Ramonet: Sim, inclusive porque ele está sendo atacado de todos os lados. Primeiro, há o impacto da internet. Parece claro que, ao criar um continente mediático inédito, ela produz um jornalismo novo (blogs,redes sociais, leaks), em concorrência direta com o jornalismo tradicional. Além disso, há o que poderíamos chamar de “crise habitual” do jornalismo. Ela é anterior à situação atual. Desdobra-se em perda de credibilidade, diretamente ligada à consanguinidade entre muitos jornalistas e o poder econômico e político, que suscita uma desconfiança geral do público. Por fim, há a crise econômica, que provoca uma queda muito forte da publicidade, principal fonte de financiamento das mídias privadas e desencadeia pesadas dificuldades de funcionamento para as redações.
A que se deve a perda de credibilidade?
Ignacio Ramonet: Ela acentuou-se nas duas últimas décadas, essencialmente como consequência do desenvolvimento do negócio midiático. A imprensa nunca foi perfeita, fazer bom jornalismo foi sempre um combate. Mas a partir da metade dos anos 1980, vivemos duas substituições. Primeiro, a informação contínua na TV, mais rápida, tomou o lugar da informação oferecida pela impressa escrita. Isso conduziu a uma concorrência mais viva entre mídias uma corrida de velocidade em que resta cada vez menos tempo para verificar as informações. Em seguida, a partir da metade dos anos 1990, com o desenvolvimento da internet. Particularmente há alguns anos, com a emergência dos “neojornalistas”, estas testemunhas-observadoras dos acontecimentos (sejam sociais, políticos, culturais, meteorológicos ou amenidades). Eles tornaram-se uma fonte de informações extremamente solicitada pelas próprias mídias tradicionais.
O público parece justificar sua desconfiança em relação à imprensa pela promiscuidade entre o poder e os jornalistas
Ignacio Ramonet: Para a maioria dos cidadãos, o jornalismo resume-se a alguns jornalistas: estes que se vê em toda parte. Duas dezenas de personalidades conhecidas, que vivem um pouco “fora da terra”, que passam muito tempo “integrados” com os políticos, e que, em toda o mundo, conciliam bastante com eles. Constitui-se assim uma espécie de nobreza política, líderes políticos e jornalistas célebres que vivem (e às vezes se casam) entre si mesmos, uma nova aristocracia. Mas esta não é a realidade do jornalismo. A característica principal desta profissão é, hoje, a precarização. A maior parte dos jovens jornalistas é explorada, muito mal paga. Trabalham por tarefa, muitas vezes em condições pré-industriais. Mais de 80% dos jornalistas recebem baixos salários. Toda a profissão vive sob ameaça constante de desemprego. Portanto, as duas dezenas de jornalistas célebres não são nem um pouco representativas, e mascaram a miséria social do jornalismo – na França e em mutos outros países. Isso não mudou com a internet – talvez, tenha se agravado. Nos sites de informação em tempo real criados pela maior parte da velha mídia, as condições de trabalho são ainda piores. Surgem novos tipos de jornalistas explorados e superexplorados. O que pode consolá-los é saber que, talvez, seu futuro lhes pertença.
Nestas condições, o jornalismo pode ainda assumir o título de “quarto poder”, que age como um contra-poder?
Ignacio Ramonet: Vivemos uma concentração extraordinária das mídias. Quem examina a estrutura de propriedade da imprensa francesa, por exemplo, constata que ela está em mãos de um número reduzidíssimo de grupos. Um punhado de oligarcas – Lagardère, Pinault, Arnault, Dassault – tornou-se proprietário dos grandes meios. Estes expressam uma pluralidade cada vez menor e se supõem que defendam os interesses dos grandes grupos financeiros e industriais a que pertencem. Isso provoca a crise do “quarto poder”. Sua missão histórica, que consiste em criar uma opinião pública com senso crítico e capaz de participar ativamente do debate democrático, já não pode ser garantido. A mídia procura, ao contrário, domesticar a sociedade e evitar qualquer questionamento ao sistema dominante. Os grandes meios criaram um consenso em torno de certas idéias (a globalização e o livre-comércio, por exemplo), consideradas “boas para todos” e incontestáveis. Quem as renega deixa aquilo que Alain Minc chamou de “círculo da razão”. Entra, portanto, em desrazão…
Você refere-se às vezes à necessidade de um “quinto poder”
Ignacio Ramonet: Sim. Se constatamos que o “quarto poder” não funciona, isso representa um grave problema para a democracia. Não se pode conceber uma democracia sem o autêntico contra-poder da opinião pública. Uma das especificidades dos sistemas democráticos está, aliás, nesta tensão permanente entre poder e no respectivo contra-poder. É o que faz a versatilidade e capacidade de adaptação deste sistema. O governo tem, como contrapeso a seu poder, uma oposição, os patrões, os sindicatos. Mas a mídia não tem – e não quer ter! – um contra-poder.
Ora, há uma demanda social forte e crescente de informações sobre a informação. Diversas associações tem se constituído (na França, a Acrimed) para aferir a veracidade e o funcionamento da mídia. Para que a sociedade possa defender-se melhor. É assim que as sociedades constroem, pouco a pouco, um “quinto poder”. Sendo que o mais difícil é fazer com que a mídia dominante aceite este “quinto poder” e lhe dê a palavra…
Em seu livro, você afirma que o futuro dos jornais escritos é tornar-se imprensa de opinião. Por que?
Ignacio Ramonet: Os jornais mais ameaçados são, em minha opinião, os que reproduzem todas as informações gerais e cuja linha editorial dilui-se totalmente. Embora seja importante, para os cidadãos, que todas as opiniões se exprimam, isso não quer dizer que cada mídia deva reproduzir, em si mesma, todas estas opiniões. Neste sentido, a imprensa de opinião é necessária. Não se trata de uma imprensa ideológica, ligada ou identificada com uma organização política – mas de um jornalismo capaz de defender uma linha editorial definida por sua redação.
Na medida em que, para tentar enfrentar a crise da imprensa, os jornais decidiram abrir espaço, em suas colunas, a todas as teses políticas, da extrema esquerda à extrema direita, sob pretexto de que vale tudo, muitos leitores deixaram de comprar estas publicações. Porque uma das funções de um jornal, além de fornecer informações, é conferir uma “identidade política” a seu leitor. Porém, agora, o jornal não expressa mais o que são seus leitores. Estes, ao contrário, confundem as identidades dos jornais e se desconcertam. Eles compram, digamos, Libération, e leêm uma entrevista com Marine Le Pen. Aliás, por que não? Mas os leitores podem descobrir, por exemplo, que têm talvez algumas ideias em comum com o Front National. E ninguém lhes dá referências a respeito, o que provoca inquietação. Tal desarranjo confunde muitos leitores. Hoje, o fluxo de informações que transita na internet permite que cada um forme sua própria opinião. Em plena crise dos jornais, o sucesso do semanário alemão Die Ziet é significativo. Ele escolheu contestar as ideias e informações dominantes, com artigos de fundo – longos e às vezes árduos. As vendas crescem. No momento em que toda a imprensa faz o mesmo – artigos cada vez mais curtos, com um vocabulário de 200 palavras, Die Ziet escolheu uma linha editorial clara e distinta. Além disso, seus textos permitem lembrar de que o jornalismo é um gênero literário…
Ao mencionar a superabundância de informações, na internet e em suas redes sociais, você refere-se a sabedoria coletiva e a embrutecimento coletivo. Por que?
Ignacio Ramonet: Nunca na histórias das mídias os cidadãos contribuíram tanto à informação. Hoje, quando um jornalista publica um texto online, ele pode ser contestado, completado, debatido por um enxame de internautas que serão, sobre muitos temas, tão ou mais qualificados que o autor. Assistimos, portanto, a um enriquecimento da informação graças aos “neojornalistas”, que eu chamo de “amadores-profissionais”. Lembremos que estamos numa sociedade em que formação superior tornou-se acessível como nunca antes. O jornalismo dirige-se, portanto, a um público muito bem formado – ainda que esta formação seja segmentada.
Além disso, as ditaduras que procuram controlar a informação não conseguem fazê-lo mais, como vimos na Tunísia, Egito e em outras partes. Lembremos que a aparição da imprensa, em 1440, não transformou apenas a história do livro. Ela sacudiu a história e o funcionamento das sociedades. Da mesma forma, o desenvolvimento da internet não é apenas uma ruptura no campo midiático. Ele modifica as relações sociais. Cria um novo ecossistema, que produz paralelamente a extinção maciça de certas mídias, em particular a imprensa escrita paga. Nos Estados Unidos, cerca de 120 jornais já desapareceram.
Significa que a imprensa escrita desaparecerá? A resposta é não. A história mostra que as mídias se reentrelaçam e reorganizam, ao invés de desaparecer. No entanto, poucos jornais vão sobreviver. Sobreviverão aqueles que tiverem uma linha clara, proponham análises amparadas em pesquisa, sérias, originais, bem escritas.
Mas o contexto da hiper-abundância de informações também desorienta o cidadão. Ele não chega a distinguir o que é importante e o que não é. Que informações são verdadeiras? Quais são falsas? Ele vive num sentimento permanente de insegurança informativa. Cada vez mais, as pessoas irão se propor a pesquisar informações de referência.
Como assegurar um futuro à informação e aos que a fazem, agora que ele é acessível gratuitamente?
Ignacio Ramonet: Embora seja incontestável que a imprensa online é a que dominará a informação nos anos futuros, é evidentemente necessário encontrar um modelo econômico viável. No momento, a cultura dominante na internet é a da gratuidade. Mas estamos, precisamente agora, entre dois modelos, e nenhum deles funciona. A informação tradicional (rádio, TV, imprensa escrita) é cada vez menos rentável. E o modelo de informação online não o é ainda, com raríssimas exceções.
Os novos espaços midiáticos podem modificar as relações de dominação que prevalecem hoje no seio da própria sociedade?
Ignacio Ramonet: Dediquei um capítulo inteiro de meu livro ao WikiLeaks. É o terreno da transparência. Em nossas sociedades contemporâneas, democráticas e abertas será cada vez mais difícil, para o poder, manter dupla política: uma para fora e outra, mais opaca e secreta, para uso interno, onde há o direito e risco de transgredir as leis.
O Wikileaks demonstrou que as mídias tradicionais já não funcionavam nem assumiam seu papel. Foi no nicho destas carências que o Wikileaks pôde introduzir-se e se desenvolver. O site também revelou que a maior parte dos Estados tinham uma lado obscuro, oculto. Mas o grande escândalo é que, depois das revelações do Wikileaks, nada ocorreu! Por exemplo: revelou-se que, na época da guerra do Iraque, um certo grupo de dirigentes do Partido Socialista francês dirigiu-se à embaixada dos Estados Unidos para explicar que, se estivessem no poder, teriam envolvida a França na guerra. E este fato – próximo da alta traição – não provocou reações.
Esta evolução para mais transparência pode provocar efeitos concretos?
Ignacio Ramonet: Ela vai necessariamente atingir os privilégios das elites e as relações de dominação. Se as mídias podem, até agora, dissecar o poder político, é porque a política perdeu muito de seu poder, abocanhado pelas esferas financeiras. Sem dúvidas, é à sombra das finanças, dos traders, dos fundos de pensão, que se localiza hoje o verdadeiro poder.
Tal poder permanece preservado porque é opaco. É significativo que a próxima revelação anunciada pelo Wikileaks diga respeito, precisamente, ao sigilo bancário. Graças aos novos sistemas midiáticos, tornou-se possível atacar estes espaços ocultos. Este poder é como o dos vampiros: a luz os dissolve, os reduz a poeira. Podemos esperar, que graças aos novos meios digitais, breve chegará a hora de desvendar o poder econômico e financeiro.
Fonte: http://www.outraspalavras.net/
Danos colaterais e terror - por Reginaldo Nasser
Danos colaterais e terror
No inicio do século XX, 5% das vítimas de guerra eram civis, na Primeira Guerra Mundial, 15%; na Segunda Guerra Mundial o valor saltou para uma taxa de mortalidade de 65%; na década de noventa, 75% das mortes da guerra eram civis. Hoje, a cifra atinge os 90% sendo que a maioria é composta por mulheres e crianças. Quando um Estado realiza um ataque em outro país e, previsivelmente, mata não combatentes pode ser isento de culpabilidade simplesmente porque não manifestou a intenção de matar inocentes?
Aumenta a cada dia o número de civis que morrem nas guerras sobre a rubrica "danos colaterais". No inicio do século XX, 5% das vítimas de guerra eram civis, na Primeira Guerra Mundial, 15%; na Segunda Guerra Mundial o valor saltou para uma taxa de mortalidade de 65%; na década de noventa, 75% das mortes da guerra eram civis. Hoje, a cifra atinge os 90% sendo que a maioria é composta por mulheres e crianças.
Quando um Estado realiza um ataque em outro país e, previsivelmente, mata não combatentes pode ser isento de culpabilidade simplesmente porque não manifestou a intenção de matar inocentes? O jurista Richard Goldstone que presidiu uma comissão nomeada pelo Conselho de Direitos Humanos da ONU para apurar violações aos direitos humanos em decorrência dos ataques de Israel à Faixa de Gaza, em 2009, escreveu em seu relatório que tanto as forças militares israelenses, como o grupo Hamas, eram culpados de crimes de guerra no conflito. Por volta de 1.400 palestinos (900 civis) e 13 israelenses (10 soldados e 3 civis) morreram no mesmo período. Recentemente, Goldstone escreveu, em uma coluna do Washington Post (01/04/2011) que: "sabemos atualmente muito mais sobre o que aconteceu em Gaza do que no momento quando fizemos o relatório ... Se eu soubesse o que sei agora, o Relatório teria sido diferente". Pois, a comissão de inquérito, de acordo com Goldstone, não tem provas para explicar as circunstâncias em que os civis em Gaza foram alvo, o que, provavelmente, teria influenciado a avaliação sobre a “intencionalidade dos crimes de guerra”.
Um ponto-chave no artigo e no amplo debate desencadeado pelo relatório Goldstone é a questão da intenção criminosa. Nos julgamentos de crimes de guerra, a acusação deve provar não só que o argüido cometeu um delito, mas também que manifestou a intenção, ou estava plenamente ciente das conseqüências do que poderia resultar. Essas ações são tradicionalmente avaliadas em duas categorias: ação intencional contra civis por parte de militares, o que caracterizaria como “crimes de guerra"; ou morte não intencional de civis no decurso de operações militares que é muitas vezes referida como "danos colaterais". São os danos colaterais, e não os crimes de guerra, que constituem, atualmente, a maioria das mortes de civis nas guerras.
A proporção de vítimas de danos colaterais aumentou dramaticamente desde o fim da Guerra Fria (cerca de 59%). Num primeiro momento podemos saudar como uma boa notícia uma diminuição nos ataques direto aos civis ao longo do tempo. Mas o que é mais importante notar é que o aumento em termos absolutos dos “danos colaterais” ocorre num contexto de diminuição do número de guerras interestatais e no momento em que a modernização tecnológica e a utilização de armas de grande precisão deveriam reduzir a probabilidade de danos colaterais.
Apesar dos ataques realizados se justificarem como legíitima defesa quando as tropas estão sob ataque ou quando estão na iminência de serem atacadas as perguntas quanto ao uso de força excessiva e os danos colaterais em termos de vítimas civis permanecem. Nesses casos, os ataques exigem um vasto trabalho de inteligência para a identificação do alvo e da sua constante vigilância. Assim, em muitos casos não houve tempo para elaborar um plano para o ataque, bem como planejar uma operação especial para atingir o alvo. Essa avaliação, por sua vez, deve sustentar o critério da proporcionalidade, pesando vantagem militar antecipada contra mortes de civis, bem como o princípio da necessidade e da distinção.
Como se sabe cada vez mais, as chamadas armas de precisão têm um raio de destruição muito grande. Os ataques aéreos sempre têm um alto custo em vidas humanas. Relatos recentes revelam que, para cada indivíduo alvo, há em torno de 50 vítimas colaterais (sem falar de outras conseqüências como o alto de número de feridos, destruição de propriedades e etc).
Um documento elaborado por uma comissão de especialistas sob os auspícios da secretaria geral da ONU apresentou a seguinte definição de terrorismo: “qualquer ato, ademais dos atos já especificados nas convenções vigentes sobre determinados aspectos do terrorismo... destinado a causar a morte ou lesões corporais graves a um civil ou a um não combatente, quando o propósito de tal ato, por sua natureza ou contexto, seja intimidar uma população ou obrigar a um governo ou a uma organização internacional a realizar um ato ou a abster-se de fazê-lo”.
Embora essa definição reconheça que os Estados possam ser responsabilizados, a questão relativa ao propósito do ato é essencial, deixando sempre amplas possibilidades aos Estados alegarem que sua intenção nunca é causar danos a civis. Quando isso acontece há um conceito - “danos colaterais” - esperando para ser usado, encobrindo a trágica conseqüência dos verdadeiros motivos da ação. Por que essas ações que ocasionam a morte de civis não poderiam ser qualificadas como terrorismo?
No Afeganistão e Iraque, os EUA utilizam deliberadamente métodos que se sabe, de antemão, que irão causar a morte de um grande número de não combatentes, dado o alto poder destrutivo das armas, porém a justificativa é que não se trata de terrorismo já que não há a intenção manifesta de matar civis. É preciso desvincular a questão da ocorrência de danos colaterais dos problemas de tecnologia, de erro humano, ou de inteligência militar e entender que, se trata de uma questão ideológica. Nunca se viu na história das guerras e do direito internacional a quantidade e variedade de eufemismos humanistas empregados atualmente, justamente para encobrir verdadeiros assassinatos.
(*) Professor de Relações Internacionais da PUC (SP) e do Programa de Pós-Graduação San Tiago Dantas (Unesp, Unicamp e PUC-SP).
Fonte: Carta Capital
No inicio do século XX, 5% das vítimas de guerra eram civis, na Primeira Guerra Mundial, 15%; na Segunda Guerra Mundial o valor saltou para uma taxa de mortalidade de 65%; na década de noventa, 75% das mortes da guerra eram civis. Hoje, a cifra atinge os 90% sendo que a maioria é composta por mulheres e crianças. Quando um Estado realiza um ataque em outro país e, previsivelmente, mata não combatentes pode ser isento de culpabilidade simplesmente porque não manifestou a intenção de matar inocentes?
Aumenta a cada dia o número de civis que morrem nas guerras sobre a rubrica "danos colaterais". No inicio do século XX, 5% das vítimas de guerra eram civis, na Primeira Guerra Mundial, 15%; na Segunda Guerra Mundial o valor saltou para uma taxa de mortalidade de 65%; na década de noventa, 75% das mortes da guerra eram civis. Hoje, a cifra atinge os 90% sendo que a maioria é composta por mulheres e crianças.
Quando um Estado realiza um ataque em outro país e, previsivelmente, mata não combatentes pode ser isento de culpabilidade simplesmente porque não manifestou a intenção de matar inocentes? O jurista Richard Goldstone que presidiu uma comissão nomeada pelo Conselho de Direitos Humanos da ONU para apurar violações aos direitos humanos em decorrência dos ataques de Israel à Faixa de Gaza, em 2009, escreveu em seu relatório que tanto as forças militares israelenses, como o grupo Hamas, eram culpados de crimes de guerra no conflito. Por volta de 1.400 palestinos (900 civis) e 13 israelenses (10 soldados e 3 civis) morreram no mesmo período. Recentemente, Goldstone escreveu, em uma coluna do Washington Post (01/04/2011) que: "sabemos atualmente muito mais sobre o que aconteceu em Gaza do que no momento quando fizemos o relatório ... Se eu soubesse o que sei agora, o Relatório teria sido diferente". Pois, a comissão de inquérito, de acordo com Goldstone, não tem provas para explicar as circunstâncias em que os civis em Gaza foram alvo, o que, provavelmente, teria influenciado a avaliação sobre a “intencionalidade dos crimes de guerra”.
Um ponto-chave no artigo e no amplo debate desencadeado pelo relatório Goldstone é a questão da intenção criminosa. Nos julgamentos de crimes de guerra, a acusação deve provar não só que o argüido cometeu um delito, mas também que manifestou a intenção, ou estava plenamente ciente das conseqüências do que poderia resultar. Essas ações são tradicionalmente avaliadas em duas categorias: ação intencional contra civis por parte de militares, o que caracterizaria como “crimes de guerra"; ou morte não intencional de civis no decurso de operações militares que é muitas vezes referida como "danos colaterais". São os danos colaterais, e não os crimes de guerra, que constituem, atualmente, a maioria das mortes de civis nas guerras.
A proporção de vítimas de danos colaterais aumentou dramaticamente desde o fim da Guerra Fria (cerca de 59%). Num primeiro momento podemos saudar como uma boa notícia uma diminuição nos ataques direto aos civis ao longo do tempo. Mas o que é mais importante notar é que o aumento em termos absolutos dos “danos colaterais” ocorre num contexto de diminuição do número de guerras interestatais e no momento em que a modernização tecnológica e a utilização de armas de grande precisão deveriam reduzir a probabilidade de danos colaterais.
Apesar dos ataques realizados se justificarem como legíitima defesa quando as tropas estão sob ataque ou quando estão na iminência de serem atacadas as perguntas quanto ao uso de força excessiva e os danos colaterais em termos de vítimas civis permanecem. Nesses casos, os ataques exigem um vasto trabalho de inteligência para a identificação do alvo e da sua constante vigilância. Assim, em muitos casos não houve tempo para elaborar um plano para o ataque, bem como planejar uma operação especial para atingir o alvo. Essa avaliação, por sua vez, deve sustentar o critério da proporcionalidade, pesando vantagem militar antecipada contra mortes de civis, bem como o princípio da necessidade e da distinção.
Como se sabe cada vez mais, as chamadas armas de precisão têm um raio de destruição muito grande. Os ataques aéreos sempre têm um alto custo em vidas humanas. Relatos recentes revelam que, para cada indivíduo alvo, há em torno de 50 vítimas colaterais (sem falar de outras conseqüências como o alto de número de feridos, destruição de propriedades e etc).
Um documento elaborado por uma comissão de especialistas sob os auspícios da secretaria geral da ONU apresentou a seguinte definição de terrorismo: “qualquer ato, ademais dos atos já especificados nas convenções vigentes sobre determinados aspectos do terrorismo... destinado a causar a morte ou lesões corporais graves a um civil ou a um não combatente, quando o propósito de tal ato, por sua natureza ou contexto, seja intimidar uma população ou obrigar a um governo ou a uma organização internacional a realizar um ato ou a abster-se de fazê-lo”.
Embora essa definição reconheça que os Estados possam ser responsabilizados, a questão relativa ao propósito do ato é essencial, deixando sempre amplas possibilidades aos Estados alegarem que sua intenção nunca é causar danos a civis. Quando isso acontece há um conceito - “danos colaterais” - esperando para ser usado, encobrindo a trágica conseqüência dos verdadeiros motivos da ação. Por que essas ações que ocasionam a morte de civis não poderiam ser qualificadas como terrorismo?
No Afeganistão e Iraque, os EUA utilizam deliberadamente métodos que se sabe, de antemão, que irão causar a morte de um grande número de não combatentes, dado o alto poder destrutivo das armas, porém a justificativa é que não se trata de terrorismo já que não há a intenção manifesta de matar civis. É preciso desvincular a questão da ocorrência de danos colaterais dos problemas de tecnologia, de erro humano, ou de inteligência militar e entender que, se trata de uma questão ideológica. Nunca se viu na história das guerras e do direito internacional a quantidade e variedade de eufemismos humanistas empregados atualmente, justamente para encobrir verdadeiros assassinatos.
(*) Professor de Relações Internacionais da PUC (SP) e do Programa de Pós-Graduação San Tiago Dantas (Unesp, Unicamp e PUC-SP).
Fonte: Carta Capital
Ética: Defesa animal demonstra cidadania e respeito pela vida
Ética: Defesa animal demonstra cidadania e respeito pela vida
A violência contra os animais demonstra a intolerância existente dentro de cada pessoa. O desejo de sentir-se poderoso, subjugando quem não pode se defender demonstra a covardia dentro dos agressores, que podem evoluir e propagar a violência.
Um comportamento crescente na sociedade é o de ter um animal em casa quando é pequeno por que ele é bonitinho, lembra um bichinho de pelúcia, mas quando o animal cresce ele é abandonado.
Esta prática é crescente em vários países, enquanto alguns tutores se empenham ao máximo para cuidar de seus animalzinhos, outros fazem o contrário: maltratam, abandonam.
Organizações de defesa animal lutam contra esta situação degradante e se mobilizam pelo mundo na luta contra a humilhação e exploração dos animais.
Muitas celebridades levantam a bandeira da defesa dos direitos animais, mas a atitude tem que ir além de “tirar as roupas” ou simplesmente deixar de comer carne.
Quando se fala em criação de legislações punitivas aos que maltratam animais e que a legislação em defesa animal é necessária, lembro com clareza das palavras proferidas pelo mestre Marcelo Bennachio em uma aula de Direito Civil “Quando se pensa em legislações para a defesa animal, muitos se equivocam pensando que é apenas para defender o animal em si, porque não existe o instituto da personalidade jurídica do animal. Mas quando se pensa em legislações que defendem os animais, na realidade estamos pensando em defender o ser humano, pois é indigno se aceitar a crueldade contra seres vivos. E a dignidade humana esta ligada a defesa animal, como uma forma de boa convivência social. Pois quem tem a capacidade de maltratar um animal, tem a mesma capacidade de cometer crimes e mutilar pessoas.”
A defesa dos direitos animais vai além da proteção animal. Demonstra defesa ao ser humano também. Pois se você consegue defender o direito de um ser vivo, que não possui personalidade nem capacidade jurídica, você demonstra ser um cidadão completo.
Defesa dos direitos animais é mais que proteger a dignidade animal. Demonstra cidadania e respeito à vida.
Com informações de Morango ácido news
Fonte: http://www.anda.jor.br/
A violência contra os animais demonstra a intolerância existente dentro de cada pessoa. O desejo de sentir-se poderoso, subjugando quem não pode se defender demonstra a covardia dentro dos agressores, que podem evoluir e propagar a violência.
Um comportamento crescente na sociedade é o de ter um animal em casa quando é pequeno por que ele é bonitinho, lembra um bichinho de pelúcia, mas quando o animal cresce ele é abandonado.
Esta prática é crescente em vários países, enquanto alguns tutores se empenham ao máximo para cuidar de seus animalzinhos, outros fazem o contrário: maltratam, abandonam.
Organizações de defesa animal lutam contra esta situação degradante e se mobilizam pelo mundo na luta contra a humilhação e exploração dos animais.
Muitas celebridades levantam a bandeira da defesa dos direitos animais, mas a atitude tem que ir além de “tirar as roupas” ou simplesmente deixar de comer carne.
Quando se fala em criação de legislações punitivas aos que maltratam animais e que a legislação em defesa animal é necessária, lembro com clareza das palavras proferidas pelo mestre Marcelo Bennachio em uma aula de Direito Civil “Quando se pensa em legislações para a defesa animal, muitos se equivocam pensando que é apenas para defender o animal em si, porque não existe o instituto da personalidade jurídica do animal. Mas quando se pensa em legislações que defendem os animais, na realidade estamos pensando em defender o ser humano, pois é indigno se aceitar a crueldade contra seres vivos. E a dignidade humana esta ligada a defesa animal, como uma forma de boa convivência social. Pois quem tem a capacidade de maltratar um animal, tem a mesma capacidade de cometer crimes e mutilar pessoas.”
A defesa dos direitos animais vai além da proteção animal. Demonstra defesa ao ser humano também. Pois se você consegue defender o direito de um ser vivo, que não possui personalidade nem capacidade jurídica, você demonstra ser um cidadão completo.
Defesa dos direitos animais é mais que proteger a dignidade animal. Demonstra cidadania e respeito à vida.
Com informações de Morango ácido news
Fonte: http://www.anda.jor.br/
No Estadão, colunistas disputam o troféu "Almirante Pena Boto" - por Saul Leblon
No Estadão, colunistas disputam o troféu "Almirante Pena Boto"
Em nome do mesmo anticomunismo cego, Pena Boto denunciava ao "Globo", em 5 de outubro de 55, que um embrião de soviet germinaria no Brasil se a eleição de Juscelino Kubitschek fosse consumada: 'É indispensável impedir que Juscelino e Goulart tomem posse dos cargos para que foram indevidamente eleitos", convocava o almirante golpista. Baluarte dos valores 'liberais', que apoiou todos os golpes de Estado no país e na América Latina, com destaque para as campanhas 'jornalísticas' pela derrubada de Getúlio, em 54, de Goulart, em 64 e de Allende, no Chile, em 1973, o Estadão exibe dois talentos frescos engalfinhados numa disputa até o pescoço pelo troféu "Almirante Pena Boto".
Trava-se nas páginas do Estadão uma disputa surda, que avança cabeça a cabeça para definir quem receberá o troféu "Almirante Pena Boto", inspirado no militar que presidiu a 'Cruzada Brasileira Anticomunista' nos anos 50/60.
Baluarte dos valores 'liberais', que apoiou todos os golpes de Estado no país e na América Latina, com destaque para as campanhas 'jornalísticas' pela derrubada de Getúlio, em 54, de Goulart, em 64 e de Allende, no Chile, em 1973, o jornal exibe dois talentos frescos engalfinhados numa disputa até o pescoço.
Um sociólogo/geógrafo e um comunicólogo da ECA colecionam credenciais ao panteão do udenismo lacerdista. No futuro, possivelmente, um deles será "o" editorialista do jornal. Um sucessor de Oliveiros S. Ferreira.
O duelo de titãs enseja versões alternadas de anti-petismo típico dos egressos da esquerda, como é o caso, engajados na expiação pública de um passado convertido em moeda de troca de carreira e bajulação.
No ano passado, na abertura do 8.º Congresso Brasileiro de Jornais, por exemplo, o sociólogo/geógrafo do Estadão (e também do GLOBO) denunciou a emergência de "democracias plebiscitárias" na América Latina. No seu entender, elas subtrairiam da imprensa o papel de mediador, para estigmatizá-la como um partido político, "um jogador da política", como qualquer outro.
"O projeto da tirania plebiscitária", advertiu, "exige a eliminação do mediador, que é, no fundo, a eliminação da opinião pública". Um exemplo dessa ofensiva, segundo o colunista sociólogo, "para eliminar a imprensa e fazer com que o Estado converse diretamente com os cidadãos", seria o Blog da Petrobrás.
Arrojado? Sem dúvida.
Justiça seja feita, porém, esta semana o comunicólogo e professor da ECA atropelou o sociólogo no derby dos novos vulgarizadores do conservadorismo nativo.
Seu artigo neste 21 de abril não surpreende pela direção. Trata-se de uma variação na constante de manifestações recentes, mas condensa em uma única cápsula todos os cacoetes, chistes e coágulos tradicionalmente injetados no metabolismo do alvo intolerável da direita: Cuba. Nisso torna-se uma peça superlativa da vulgarização anticomunista.
O socialismo em Cuba é um produto histórico, uma carpintaria política erigida sob relações de forças brutalmente adversas. Como tal enseja críticas, comporta avanços e desafia a rupturas renovadoras e desassombradas. O VI Congresso, gancho do artigo do comunicólogo, revelou-se uma porta aberta a essa saudável e urgente renovação histórica. Mas não é isso que avulta nas linhas em questão. O que emana ali é a férrea determinação em proclamar o fracasso irreversível da sociedade que ousou afrontar o império para se construir de forma diversa e solidária, a 145 quilômetros de Miami.
Ignora-se olimpicamente o colapso estrutural decorrente do cerco iniciado em 19 de outubro de 1960, quando a administração Eisenhower impôs um embargo econômico aniquilador contra Cuba, até hoje mantido.
O articulista prefere elidir esses incômodos. Aliviado da carga histórica, pode patinar o gelo fino do cinismo e carimbar a resistencia anti-imperialista cubana como 'a religião' do regime que nisso se ombrearia -rodopia nosso Baryshnikov dos salões liberais - à demonização norte-americana promovida pelo Estado iraniano.
Nada como matar dois coelhos a serviço do mesmo minueto conservador. Mas a prioridade é clara.
No momento em que Cuba abre um ciclo de renovação política, trata-se de subtrair ao povo cubano --à esquerda em geral, sejamos francos, esse é o ponto-- a capacidade histórica de se reinventar no socialismo. É nisso que o artigo se credencia como um libelo de anti-comunismo visceral.
Em nome do mesmo anticomunismo cego, Pena Boto denunciava ao "Globo", em 5 de outubro de 55, que um embrião de soviet germinaria no Brasil se a eleição de Juscelino Kubitschek fosse consumada: 'É indispensável impedir que Juscelino e Goulart tomem posse dos cargos para que foram indevidamente eleitos", convocava o almirante golpista.
A profilaxia anticomunista fracassou; Boto escafedeu-se; seu parceiro de armas, Carlos Lacerda, exilou-se na embaixada de Cuba, onde teve imediata acolhida do ditador Fulgêncio Batista. A ilha então era um campo indiviso de bordel e miséria, povoado de gente barata integralmente disponível ao repasto dos magnatas norte-americanos. Não por acaso, esse passado de fastígio 'democrático' e relações carnais com o império merece silêncio obsequioso do comunicólogo da ECA que, pelo visto, não rompeu apenas com a esquerda, mas também com a honestidade histórica.
Fonte: http://www.cartamaior.com.br/
Em nome do mesmo anticomunismo cego, Pena Boto denunciava ao "Globo", em 5 de outubro de 55, que um embrião de soviet germinaria no Brasil se a eleição de Juscelino Kubitschek fosse consumada: 'É indispensável impedir que Juscelino e Goulart tomem posse dos cargos para que foram indevidamente eleitos", convocava o almirante golpista. Baluarte dos valores 'liberais', que apoiou todos os golpes de Estado no país e na América Latina, com destaque para as campanhas 'jornalísticas' pela derrubada de Getúlio, em 54, de Goulart, em 64 e de Allende, no Chile, em 1973, o Estadão exibe dois talentos frescos engalfinhados numa disputa até o pescoço pelo troféu "Almirante Pena Boto".
Trava-se nas páginas do Estadão uma disputa surda, que avança cabeça a cabeça para definir quem receberá o troféu "Almirante Pena Boto", inspirado no militar que presidiu a 'Cruzada Brasileira Anticomunista' nos anos 50/60.
Baluarte dos valores 'liberais', que apoiou todos os golpes de Estado no país e na América Latina, com destaque para as campanhas 'jornalísticas' pela derrubada de Getúlio, em 54, de Goulart, em 64 e de Allende, no Chile, em 1973, o jornal exibe dois talentos frescos engalfinhados numa disputa até o pescoço.
Um sociólogo/geógrafo e um comunicólogo da ECA colecionam credenciais ao panteão do udenismo lacerdista. No futuro, possivelmente, um deles será "o" editorialista do jornal. Um sucessor de Oliveiros S. Ferreira.
O duelo de titãs enseja versões alternadas de anti-petismo típico dos egressos da esquerda, como é o caso, engajados na expiação pública de um passado convertido em moeda de troca de carreira e bajulação.
No ano passado, na abertura do 8.º Congresso Brasileiro de Jornais, por exemplo, o sociólogo/geógrafo do Estadão (e também do GLOBO) denunciou a emergência de "democracias plebiscitárias" na América Latina. No seu entender, elas subtrairiam da imprensa o papel de mediador, para estigmatizá-la como um partido político, "um jogador da política", como qualquer outro.
"O projeto da tirania plebiscitária", advertiu, "exige a eliminação do mediador, que é, no fundo, a eliminação da opinião pública". Um exemplo dessa ofensiva, segundo o colunista sociólogo, "para eliminar a imprensa e fazer com que o Estado converse diretamente com os cidadãos", seria o Blog da Petrobrás.
Arrojado? Sem dúvida.
Justiça seja feita, porém, esta semana o comunicólogo e professor da ECA atropelou o sociólogo no derby dos novos vulgarizadores do conservadorismo nativo.
Seu artigo neste 21 de abril não surpreende pela direção. Trata-se de uma variação na constante de manifestações recentes, mas condensa em uma única cápsula todos os cacoetes, chistes e coágulos tradicionalmente injetados no metabolismo do alvo intolerável da direita: Cuba. Nisso torna-se uma peça superlativa da vulgarização anticomunista.
O socialismo em Cuba é um produto histórico, uma carpintaria política erigida sob relações de forças brutalmente adversas. Como tal enseja críticas, comporta avanços e desafia a rupturas renovadoras e desassombradas. O VI Congresso, gancho do artigo do comunicólogo, revelou-se uma porta aberta a essa saudável e urgente renovação histórica. Mas não é isso que avulta nas linhas em questão. O que emana ali é a férrea determinação em proclamar o fracasso irreversível da sociedade que ousou afrontar o império para se construir de forma diversa e solidária, a 145 quilômetros de Miami.
Ignora-se olimpicamente o colapso estrutural decorrente do cerco iniciado em 19 de outubro de 1960, quando a administração Eisenhower impôs um embargo econômico aniquilador contra Cuba, até hoje mantido.
O articulista prefere elidir esses incômodos. Aliviado da carga histórica, pode patinar o gelo fino do cinismo e carimbar a resistencia anti-imperialista cubana como 'a religião' do regime que nisso se ombrearia -rodopia nosso Baryshnikov dos salões liberais - à demonização norte-americana promovida pelo Estado iraniano.
Nada como matar dois coelhos a serviço do mesmo minueto conservador. Mas a prioridade é clara.
No momento em que Cuba abre um ciclo de renovação política, trata-se de subtrair ao povo cubano --à esquerda em geral, sejamos francos, esse é o ponto-- a capacidade histórica de se reinventar no socialismo. É nisso que o artigo se credencia como um libelo de anti-comunismo visceral.
Em nome do mesmo anticomunismo cego, Pena Boto denunciava ao "Globo", em 5 de outubro de 55, que um embrião de soviet germinaria no Brasil se a eleição de Juscelino Kubitschek fosse consumada: 'É indispensável impedir que Juscelino e Goulart tomem posse dos cargos para que foram indevidamente eleitos", convocava o almirante golpista.
A profilaxia anticomunista fracassou; Boto escafedeu-se; seu parceiro de armas, Carlos Lacerda, exilou-se na embaixada de Cuba, onde teve imediata acolhida do ditador Fulgêncio Batista. A ilha então era um campo indiviso de bordel e miséria, povoado de gente barata integralmente disponível ao repasto dos magnatas norte-americanos. Não por acaso, esse passado de fastígio 'democrático' e relações carnais com o império merece silêncio obsequioso do comunicólogo da ECA que, pelo visto, não rompeu apenas com a esquerda, mas também com a honestidade histórica.
Fonte: http://www.cartamaior.com.br/
quarta-feira, 20 de abril de 2011
Oriente Médio: retrato do Império em apuros - Por Immanuel Wallerstein
Oriente Médio: retrato do Império em apuros
A medida do declínio dos Estados Unidos é o grau em que os aliados próximos de antes estão prontos para defender seus desejos e manifestar isso publicamente.
Nos últimos cinquenta anos, a política dos Estados Unidos no Oriente Médio tem sido construída em torno de relações muito próximas com três países: Israel, Arábia Saudita e Paquistão. Em 2011, porém, Washington está em desacordo com os três, e de maneira fundamental. Também é público a divergência com Reino Unido, França, Alemanha, Rússia, China e Brasil sobre as políticas na região. Parece que quase ninguém concorda com os Estados Unidos ou segue sua liderança. Pode-se ouvir a frustração agonizante do presidente, do Departamento de Estado, do Pentágono e da CIA – todos vêem a situação saindo do seu controle.
O motivo de os Estados Unidos terem criado uma aliança tão forte com Israel é ponto para muito debate. Mas é claro que, por muitos anos, o relacionamento tem ficado cada vez mais sólido, e segue cada vez mais os termos de Israel. O país tem contado com apoio financeiro e militar dos EUA, e a certeza do veto infalível no Conselho de Segurança da ONU.
O que ocorreu agora é que tanto as políticas israelenses quanto suas bases de apoio nos EUA têm se movido rapidamente para a direita. Israel aferra-se a duas coisas: o adiamento eterno de negociações sérias com a Palestina e a esperança de que alguém irá bombardear o Irã. Obama tem se movido em direção contrária, ao menos tanto quanto a política interna dos Estados Unidos lhe permite. As tensões são fortes e o primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu está rezando – se é que ele reza – para uma vitória dos republicanos na eleição presidencial em 2012. O desfecho da crise pode, porém, vir antes, quando a Assembleia Geral da ONU votar para reconhecer a Palestina como um Estado-membro. Os Estados Unidos irão se encontrar na posição perdedora de lutar contra isso.
A Arábia Saudita manteve um relacionamento confortável com Washington desde que o presidente Franklin Roosevelt encontrou-se com o rei Abdul Aziz em 1943. Juntos, tinham a capacidade de controlar a política de petróleo em todo o mundo. Colaboraram em assuntos militares e os Estados Unidos contaram com a ajuda do aliado próximo para apoiar outros regimes árabes em cheque. Porém, hoje o regime saudita sente-se muito ameaçado pela segunda revolta árabe. Também ficou totalmente desconcertado com decisão dos Estados Unidos de reconhecer o destronamento de Mubarak pelo seu Exército; e pela crítica de Washington à intervenção saudita no Bahrain, por mais que a crítica tenha sido leve. As prioridades dos dois países são bastante diferentes agora.
Durante a Guerra Fria, quando os Estados Unidos consideravam a Índia próxima demais da União Soviética, o Paquistão obtinha total apoio norte-americano (e da China), qualquer que fosse o seu regime. Os dois países trabalharam conjuntamente para auxiliar os mujahidin no Afeganistão e forçaram a retirada das tropas soviéticas. Eles provavelmente trabalharam juntos para conter o crescimento da al-Qaeda. Duas coisas mudaram. No período pós-Guerra Fria, os Estados Unidos desenvolveram relações mais próximas com a Índia, para a frustração do Paquistão. E o Paquistão e os Estados Unidos encontram-se em extremo desacordo sobre como lidar com a força crescente da al-Qaeda e do Talibã no Paquistão e Afeganistão.
Um dos principais objetivos da política externa dos EUA, desde o colapso da União Soviética, tem sido evitar que os países da Europa Ocidental desenvolvam políticas autônomas. Mas hoje, os três países principais – Reino Unido, França e Alemanha – estão fazendo isso. Nem a linha dura de George W. Bush, nem a diplomacia suave de Barack Obama parecem ter retardado isso. O fato de a França e a Grã-Bretanha pedirem que os Estados Unidos assumam uma liderança mais ativa na luta contra Gaddafi, enquanto Alemanha diz praticamente o oposto é menos importante que os três expressarem essas opiniões muito alto e fortemente.
Rússia, China e Brasil estão usando suas cartas cuidadosamente no que diz respeito às relações com Washington. Os três se opõem às posições dos EUA em quase tudo atualmente. Eles podem não ir até o fim (deixando de usar o veto no Conselho de Segurança) porque os Estados Unidos ainda têm garras que podem usar. Mas eles certamente não estão cooperando. O fiasco da recente viagem de Obama ao Brasil, onde ele pensou que conseguiria obter uma nova abordagem da presidente Dilma Rousseff – mas não conseguiu – mostra quão pouca influência os Estados Unidos têm no presente.
Finalmente, a política interna mudou. A política externa bipartidária caiu na memória histórica. Agora, quando os Estados Unidos entram em guerra, como na Líbia, a opinião pública mostra apenas cerca de 50% de apoio. E políticos dos dois partidos atacam Obama – ou por ser muito belicoso, ou por ser muito pacifista. Estão todos esperando para lançar-se sobre ele, diante de qualquer insucesso grave. O resultado disso pode ser forçá-lo a intensificar o envolvimento dos EUA em todos os lugares e desse modo agravar a reação negativa de todos os aliados.
Madeleine Albright chamou os Estados Unidos de “nação indispensável”. O país ainda é o gigante na cena mundial. Mas é um gigante desajeitado, incerto sobre onde e como quer chegar. A medida do declínio dos Estados Unidos é o grau em que os aliados próximos de antes estão prontos para defender seus desejos e manifestar isso publicamente. A medida do declínio dos Estados Unidos é a incapacidade do país em declarar publicamente o que está fazendo, ou a insistência em dizer que tudo está realmente sob controle. Os Estados Unidos efetivamente tiveram que desembolsar uma quantia muito grande de dinheiro para liberar da prisão um simples agente da CIA no Paquistão.
A consequência disso tudo? Muito mais anarquia no mundo. Quem vai lucrar com isso tudo? No momento, é uma questão que está em aberto.
Publicado por Outras Palavras.
Fonte:http://www.revistaforum.com.br/
A medida do declínio dos Estados Unidos é o grau em que os aliados próximos de antes estão prontos para defender seus desejos e manifestar isso publicamente.
Nos últimos cinquenta anos, a política dos Estados Unidos no Oriente Médio tem sido construída em torno de relações muito próximas com três países: Israel, Arábia Saudita e Paquistão. Em 2011, porém, Washington está em desacordo com os três, e de maneira fundamental. Também é público a divergência com Reino Unido, França, Alemanha, Rússia, China e Brasil sobre as políticas na região. Parece que quase ninguém concorda com os Estados Unidos ou segue sua liderança. Pode-se ouvir a frustração agonizante do presidente, do Departamento de Estado, do Pentágono e da CIA – todos vêem a situação saindo do seu controle.
O motivo de os Estados Unidos terem criado uma aliança tão forte com Israel é ponto para muito debate. Mas é claro que, por muitos anos, o relacionamento tem ficado cada vez mais sólido, e segue cada vez mais os termos de Israel. O país tem contado com apoio financeiro e militar dos EUA, e a certeza do veto infalível no Conselho de Segurança da ONU.
O que ocorreu agora é que tanto as políticas israelenses quanto suas bases de apoio nos EUA têm se movido rapidamente para a direita. Israel aferra-se a duas coisas: o adiamento eterno de negociações sérias com a Palestina e a esperança de que alguém irá bombardear o Irã. Obama tem se movido em direção contrária, ao menos tanto quanto a política interna dos Estados Unidos lhe permite. As tensões são fortes e o primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu está rezando – se é que ele reza – para uma vitória dos republicanos na eleição presidencial em 2012. O desfecho da crise pode, porém, vir antes, quando a Assembleia Geral da ONU votar para reconhecer a Palestina como um Estado-membro. Os Estados Unidos irão se encontrar na posição perdedora de lutar contra isso.
A Arábia Saudita manteve um relacionamento confortável com Washington desde que o presidente Franklin Roosevelt encontrou-se com o rei Abdul Aziz em 1943. Juntos, tinham a capacidade de controlar a política de petróleo em todo o mundo. Colaboraram em assuntos militares e os Estados Unidos contaram com a ajuda do aliado próximo para apoiar outros regimes árabes em cheque. Porém, hoje o regime saudita sente-se muito ameaçado pela segunda revolta árabe. Também ficou totalmente desconcertado com decisão dos Estados Unidos de reconhecer o destronamento de Mubarak pelo seu Exército; e pela crítica de Washington à intervenção saudita no Bahrain, por mais que a crítica tenha sido leve. As prioridades dos dois países são bastante diferentes agora.
Durante a Guerra Fria, quando os Estados Unidos consideravam a Índia próxima demais da União Soviética, o Paquistão obtinha total apoio norte-americano (e da China), qualquer que fosse o seu regime. Os dois países trabalharam conjuntamente para auxiliar os mujahidin no Afeganistão e forçaram a retirada das tropas soviéticas. Eles provavelmente trabalharam juntos para conter o crescimento da al-Qaeda. Duas coisas mudaram. No período pós-Guerra Fria, os Estados Unidos desenvolveram relações mais próximas com a Índia, para a frustração do Paquistão. E o Paquistão e os Estados Unidos encontram-se em extremo desacordo sobre como lidar com a força crescente da al-Qaeda e do Talibã no Paquistão e Afeganistão.
Um dos principais objetivos da política externa dos EUA, desde o colapso da União Soviética, tem sido evitar que os países da Europa Ocidental desenvolvam políticas autônomas. Mas hoje, os três países principais – Reino Unido, França e Alemanha – estão fazendo isso. Nem a linha dura de George W. Bush, nem a diplomacia suave de Barack Obama parecem ter retardado isso. O fato de a França e a Grã-Bretanha pedirem que os Estados Unidos assumam uma liderança mais ativa na luta contra Gaddafi, enquanto Alemanha diz praticamente o oposto é menos importante que os três expressarem essas opiniões muito alto e fortemente.
Rússia, China e Brasil estão usando suas cartas cuidadosamente no que diz respeito às relações com Washington. Os três se opõem às posições dos EUA em quase tudo atualmente. Eles podem não ir até o fim (deixando de usar o veto no Conselho de Segurança) porque os Estados Unidos ainda têm garras que podem usar. Mas eles certamente não estão cooperando. O fiasco da recente viagem de Obama ao Brasil, onde ele pensou que conseguiria obter uma nova abordagem da presidente Dilma Rousseff – mas não conseguiu – mostra quão pouca influência os Estados Unidos têm no presente.
Finalmente, a política interna mudou. A política externa bipartidária caiu na memória histórica. Agora, quando os Estados Unidos entram em guerra, como na Líbia, a opinião pública mostra apenas cerca de 50% de apoio. E políticos dos dois partidos atacam Obama – ou por ser muito belicoso, ou por ser muito pacifista. Estão todos esperando para lançar-se sobre ele, diante de qualquer insucesso grave. O resultado disso pode ser forçá-lo a intensificar o envolvimento dos EUA em todos os lugares e desse modo agravar a reação negativa de todos os aliados.
Madeleine Albright chamou os Estados Unidos de “nação indispensável”. O país ainda é o gigante na cena mundial. Mas é um gigante desajeitado, incerto sobre onde e como quer chegar. A medida do declínio dos Estados Unidos é o grau em que os aliados próximos de antes estão prontos para defender seus desejos e manifestar isso publicamente. A medida do declínio dos Estados Unidos é a incapacidade do país em declarar publicamente o que está fazendo, ou a insistência em dizer que tudo está realmente sob controle. Os Estados Unidos efetivamente tiveram que desembolsar uma quantia muito grande de dinheiro para liberar da prisão um simples agente da CIA no Paquistão.
A consequência disso tudo? Muito mais anarquia no mundo. Quem vai lucrar com isso tudo? No momento, é uma questão que está em aberto.
Publicado por Outras Palavras.
Fonte:http://www.revistaforum.com.br/
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