quinta-feira, 12 de julho de 2012

ACTA: as maracutaias dos que “combatem a pirataria” - Por Cauê Seigner Ameni

ACTA: as maracutaias dos que “combatem a pirataria”
Derrotados no Parlamento Europeu e rejeitados pelas sociedades, defensores de restrições à liberdade na internet tentam impor medidas por baixo do pano 

Para tornar menos impopular a causa que defendem, as corporações, cartéis e grupos políticos interessados em restringir a livre circulação de conteúdos na internet adotam uma estratégia ardilosa. Eles alegam que é preciso controlar a rede, para evitar que grupos criminosos pratiquem atos inconfessáveis (pedofilia, roubos, extorsões e outros) por baixo do pano. No entanto, acabam de praticar, na Europa, algo que desmascara esta suposta luta pela honestidade. Tentaram empurrar, por baixo do pano, um acordo muito impopular entre sociedades e já rejeitado pelas próprias instituições.

Trata-se do ACTA, um dos acordos mais nocivos à liberdade na internet em debate nos últimos anos. Seu próprio nome – Acordo Internacional Anti-falsificação, em inglês – expressa a tentativa dos apoiadores, que querem passar por bons moços. Eles mesmos, porém, estão tentando falsificar…. a democracia! Depois de verem sua proposta rejeitada em 5 de julho, pelo Parlamento Europeu, por ampla margem (478 x 165), tentaram ressuscitá-la apenas três dias depois, disfarçada no texto de um acordo comercial que pode ser aprovado por governos, sem nenhum debate público. Quem levantou a lebre foi Micheal Geist, professor de Direitos Internacionais e ativista pela livre circulação do conhecimento, que teve acesso aos documentos.

Geist vazou documentos inéditos demonstrando que, para implementar os mesmos dispositivos que foram rejeitados pelo parlamento europeu semana passada,a União Europeia (UE) planeja usar o CETA (Canda-Europa Comprehensive Economic and Trade Agreement) – cujas negociações estão próximas da fase final.
A Comissão Europeia – órgão executivo da UE – mobilizou seu mais alto escalão, após a derrota do ACTA no Parlamente Europeu, relata o blogueiro ativista. O ACTA vem sendo replicado, letra por letra, no capitulo que trata sobre a propriedade intelectual no CETA. Na versão revelada por Geist, e datada em fevereiro último, tanto o Canada quanto a UE, concordaram em incorporar muitos dos aspectos do ACTA no novo acordo. A tabela com a comparação entre os  dois acordos mostra inúmeros parágrafos comuns e pode ser vista detalhadamente aqui.

Duas razões essenciais despertaram repúdio das sociedades ao ACTA. Primeiro, seu próprio conteúdo: segundo diversas análises, as restrições à liberdade na rede que ele estabelece são semelhantes às praticadas na China ou Irã. Segundo, o fato de a negociação ter sido feita, durante anos, a portas fechadas e às margens dos fóruns em que o conjunto dos países tratam dos assuntos de propriedade intelectual (como OMPI, OMC e OECD). No ano passado, a rejeição a estas características assumiu a forma de grandes manifestações, em diversas cidades europeias. E em 5/7, muitos dos parlamentares europeus que ajudaram a derrotar o projeto ergueram cartazes em que se lia: “Hello, democracy. Goodbye, ACTA”.

Ontem, aparemente surpresa com a descoberda de Geist, a Comissão Europeia recusou-se, num primeiro momento, a comentar o caso, alegando que não se pronunciaria sobre qualquer tipo vazamento. A existência de um tratado construído secretamente dá “razão para acreditar que o público terá acesso oficial apenas depois das negociações concluírem”, apontou Micheal Geist, levantando o risco de uma “versão final” aperecer subitamente, sem que haja uma discussão ou negociação justa entre a sociedade. O CETA é um acordo comercial amplo, que envolve muitos aspectos econômicos, o que significa maior pressão – e lobbys – sobre os legislativos.
Com o sentimento anti-ACTA crescendo na Europa e em outras regiões, os esforços para incorporar secretamente seus dispositivos no texto de novos acordos comerciais, é a única estrategia que parece restar aos partidários do controle da internet. 

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