O intelectual ataca a incapacidade da classe
política liberal de seu país em se conectar com a classe trabalhadora
Um
governante habilidoso e demagógico, que soube se conectar com os “medos
legítimos” de parte da sociedade, “como Hitler e Mussolini fizeram antes”.
Assim Noam Chomsky,
o intelectual vivo da esquerda clássica mais importante de seu país, desenhou Donald Trump na
quarta-feira, em uma breve entrevista coletiva na Cidade do México.
“Trump
é um fenômeno que reflete o momento em que o país se encontra depois de décadas
de políticas que concentraram o poder político e econômico em alguns poucos, e
que deformaram a capacidade das instituições para servir seus cidadãos”,
acrescentou o professor emérito do Massachusetts
Institute of Technology (MIT), convidado pela universidade mais emblemática
do México, a UNAM, para o
ciclo de conferências Los
Acosos a la Civilización. De Muro
a Muro, organizado em parceria com a Universidade do Estado do
Arizona.
A
ascensão do magnata republicano é - para o linguista de 88 anos, que começou
seu ativismo político contra a Guerra do Vietnã -
resultado do vazio, do desamparo e até da humilhação sentida pela classe
trabalhadora branca diante do establishment
político norte-americano. “Especialmente o Partido
Democrata, que se esqueceu de abordar as questões materiais e às vezes
tratou essas camadas da sociedade como estúpidas”.
“Trump
conseguiu fazê-los sentir que ele é o único político que lhes dá voz, que
defende suas tradições e sua cultura, que sentem ameaçadas. Além disso, construiu
um inimigo externo: os mexicanos, os asiáticos, os migrantes. É a mesma lógica
que Hitler usou com
os judeus, embora, obviamente, nem os judeus iriam destruir a Alemanha nem os
migrantes farão isso com os EUA”.
Sobre
a renegociação do Tratado de Livre Comércio da América do Norte (TLC), o
filósofo interpretou a posição intransigente dos EUA como uma oportunidade para
os outros dois parceiros: “México e Canadá deveriam aproveitar para introduzir
elementos que favoreçam seus cidadãos, como direitos sindicais”, além de
enfatizar que “a origem do problema da droga no México é os Estados Unidos”,
lembrando que do vizinho do Norte vem a maior demanda de drogas e a maior
oferta de armas.
“O
Partido Democrata tratou a classe trabalhadora branca como uma estúpida”
O
surgimento dos novos movimentos sociais contra as políticas neoliberais do fim
dos anos noventa, conhecidos como antiglobalização, recuperaram a figura do
veterano filósofo com títulos como El Miedo
a la Democracia ou Como nos
Venden la Moto (com Ignacio Ramonet), em que explica, com linguagem
simples e vontade pedagógica, os perigos da desregulamentação dos mercados, da
entronização das finanças e do enfraquecimento dos sindicatos.
Aplicadas,
por exemplo, ao fenômeno do aquecimento global,
suas teses ecoaram assim nesta quarta-feira na Cidade do México: “Se você é uma
empresa de petróleo, seu único interesse e objetivo é o lucro imediato. Em seus
planos operacionais você não concebe que o que está fazendo pode acabar com a
vida dos seus filhos. Tudo o que não é benefício é considerado uma
externalidade, algo acessório. Esse é o coração da economia capitalista, um
sistema destinado à autodestruição”.
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