Fome, guerra civil e bombas dos Estados UnidosEnquanto a Somália sofre sua pior fome em seis décadas e o Iêmen desliza para uma guerra civil, o governo dos Estados Unidos expande sua rede de bases para realizar ataques com aviões não tripulados contra suspeitos de terrorismo nos dois países. Baseando-se em parte em novos telegramas diplomáticos norte-americanos divulgados pelo grupo WikiLeaks, o jornal The Washington Post informou, no dia 22, que as forças norte-americanas lançaram ataques com aviões não tripulados sobre esses dois países, a partir de uma instalação militar no Djibuti, e que planejam construir uma segunda na Etiópia.
O The Washington Post e o The Wall Street Journal também informaram que uma base em Seychelles, utilizada pelas forças dos Estados Unidos para enviar aviões de vigilância, agora contaria com naves armadas capazes de levar sua carga mortal ao longo dos mais de 1.500 quilômetros que separam esta ilha do Oceano Índico do Chifre da África, e regressar. A nova “constelação” de bases de aviões não tripulados também incluirá uma da CIA (Agência Central de Inteligência) que a administração anunciou no começo deste ano que estaria localizada na Península Arábica.
Essa instalação seria construída na Arábia Saudita, segundo um “alto funcionário militar norte-americano” citado em um informe de rede de TV Fox News no dia 22. “As operações na Arábia Saudita são a única nova expansão deste plano”, disse a fonte. “O restante funciona há mais de um ano, quando nos demos conta do perigo que representava a AQPA” (Al Qaeda na Península Arábica), acrescentou. A AQPA é uma célula terrorista iemenita que teria consolidado seus vínculos com o grupo radical islâmico somaliano Al Shabaab.
A IPS telefonou para o Departamento da Defesa em Washington a fim de confirmar se instalaria uma nova base na Arábia Saudita, mas não recebeu resposta. Entretanto, Chas Freeman, ex-embaixador norte-americano em Riad, que mantém boas ligações com o governo saudita, disse que a versão é “altamente plausível”, devido à “estreita e forte” cooperação contraterrorista entre os dois países e a proximidade geográfica da Arábia Saudita com o Iêmen.
Segundo um dos autores da matéria do The Washington Post, a expansão da rede de bases aéreas tinha o objetivo de “evitar os erros do passado. Quando a Al Qaeda fugiu do Afeganistão para o Paquistão em 2001 e 2002, passaram-se anos até que a CIA pudesse armar um programa de aviões não tripulados capaz de colocar a rede terrorista sob pressão”, escreveu Greg Miller no site do jornal. “Essa demora, junto com os caros acordos para ter acesso a bases aéreas em países vizinhos, permitiu o florescimento da Al Qaeda”.
Os informes chegaram em meio a uma considerável polêmica sobre o crescente uso da administração de Barack Obama de aviões não tripulados, que, segundo seu alcance, podem levar os sinistros nomes de Predator (Predador), Reaper (ceifador) ou Parca (morte).
No Paquistão, onde a CIA aumentou drasticamente os ataques com aviões não tripulados (para quase 200) contra objetivos de “alto valor” da Al Qaeda e do movimento islâmico Talibã nos primeiros dois anos do governo Obama, a estratégia contribuiu para um aumento do sentimento antinorte-americano na população local. Uma esmagadora maioria de 97% dos consultados em uma pesquisa do Centro Pew de Pesquisa, realizada recentemente no Paquistão, expressaram uma opinião negativa sobre os ataques com aviões não tripulados.
De fato, nada menos que o alto chefe de inteligência do governo norte-americano, Dennis Blair, disse em uma reunião com especialistas em política externa e segurança nacional, em julho, que é um erro deixar que a campanha militar domine as relações com Paquistão, Iêmen e Somália. “Estamos alienando os países envolvidos porque os tratamos apenas como lugares aonde vamos atacar grupos que nos ameaçam, porque estamos arriscando as perspectivas de uma reforma de longo prazo”, acrescentou Blair. Além disso, ressaltou que essas operações bélicas deveriam contar com o consentimento das autoridades dos países onde são realizadas.
Porém, o novo chefe do Pentágono e ex-diretor da CIA, Leon Panetta, rejeitou essas críticas, insistindo que a estratégia foi e continuaria sendo “efetiva para minar a Al Qaeda e sua capacidade de planejar ataques” contra os Estados Unidos. Panetta e o Pentágono também estariam liderando um debate em Washington para ampliar a atual lista de objetivos, até agora integrada apenas por altos líderes das redes terroristas, e dessa forma poder atacar também combatentes a pé.
Os aviões não tripulados se converteram na principal arma dos Estados Unidos em seus esforços para derrotar a Al Qaeda e seus aliados, embora seja usada com menor frequência contra objetivos no Iêmen e na Somália do que no Afeganistão, Paquistão e Iraque. Pelo menos seis ataques foram cometidos com aviões não tripulados contra supostos combatentes islâmicos no Iêmen em 2010 e 2011, mas esse número pode ter aumentado nos últimos meses devido ao colapso da autoridade do governo em várias partes desse país. Combatentes islâmicos que Washington acredita estarem relacionados com a AQPA assumiram controle de cidades perto do Golfo de Aden.
O blog de Jim Lobe sobre política externa pode ser lido em www.lobelog.com.
Artigo reproduzido pelo site Envolverde/IPS
Fonte: Opera Mundi
terça-feira, 27 de setembro de 2011
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