Anonymous: a ética da ação digital diretaPolícia norte-americana detém hackers mesmo reconhecendo que não cometeram crimes. Pode ser grave ameaça à liberdade e direito de protesto
O movimento político conhecido como Anonymous conseguiu capturar a atenção da imprensa, os corações de muitos apoiadores e a ira de muitos espectadores, depois de oito meses de intervenções políticas, que vão de campanhas de ataques DDoS (Distributed Denial of Service) e garantir assistência técnica a grupos de direitos humanos na Tunísia, até ataques mais recentes de hacking sob o codinome de Operation Antisec.
Agora, o estado entrou completamente na disputa, também ele em surto de hiperatividade. Mês passado [agosto de 2011], 22 supostos participantes do movimento foram presos nos EUA e na Grã-Bretanha, 14 deles na investigação de uma única operação: a espetacular onda de ataques DDoS orientados diretamente para protestar contra atos das empresas Mastercard e Paypal em dezembro de 2010. Os ataques foram deflagrados depois que aquelas empresas recusaram-se a aceitar doações para o principal animador de Wikileaks, Julian Assange. Os hackers e ativistas que apoiaram a campanha de ataques DDoS (e nem todos os Anonymous apóiam a campanha) veem o ato como legítima atividade de protesto, semelhante a ocupar uma calçada ou uma rua, como uma “ocupação digital”. Se forem condenados, os supostos Anonymous que foram presos podem ter de cumprir longas penas de prisão.
Dia 20/7/2011, um dia depois das prisões nos EUA, agentes do FBI deixaram escapar uma rara explicação para as prisões; falaram da necessidade de matar o caos, ainda na semente: “queremos deixar bem claro que o caos na internet é inadmissível” – disse Steven Chabinsky, vice-diretor do FBI.
Embora a maioria das prisões estivessem associadas à campanha de ataques DDoS, o agente do FBI não deu qualquer sinal de conhecer a diferença entre o hacking e os ataques DDoS. “Hacking” implica invadir computadores ou sistemas protegidos. Um ataque DDoS é ação na qual vários computadores passam a bombardear um servidor com pedidos de acesso, até derrubá-lo por sobrecarga. Estranhamente, o mesmo agente do FBI não disse, dos supostos Anonymous presos, que seriam criminosos, terroristas ou espiões.
Quando prende Anonymous (também chamados individualmente Anons) e rotula como crimes as suas práticas, mesmo sem que haja lei que defina aquelas práticas como crimes, o FBI dá sinais de reconhecer, embora por via oblíqua, que a caça aos Anons é politicamente motivada. O FBI também dá sinais de reconhecer que o caso dos Anons não se compara aos de terroristas ou criminosos — que o Estado tem pleno direito e legitimidade de prender e processar, havendo provas que comprovem as acusações, porque violam a lei e a norma social, .
De fato, o FBI dá sinais de reconhecer que os Anons apenas exercem seus direitos de cidadãos e manifestam-se a favor de causas nas quais acreditam: “Embora se possa crer que os hackers defendem causas sociais, é absolutamente inaceitável que invadam páginas na Internet e pratiquem atos ilegais. Não se constatou qualquer indício de que usem o hacking para destruir páginas na internet, mas o que fazem pode atrair a atenção de criminosos e terroristas. Por isso, o ‘hackativismo’, embora seja visto por alguns como simples incômodo sem consequências, mostra alto potencial de desestabilização” – insistiu Steve Chabinsky, chefe do cyber-departamento do FBI, em linguajar no qual se ouvem ecos das críticas que se faziam nos anos 1960s contra os movimentos sociais.
Claro que essas declarações não podem ser tomadas como a voz do Estado, nem como sua palavra final sobre os Anonymous. Mas interessam, porque são indício claro de um fato social novo: os Anonymous vão, paulatinamente, ganhando destaque nos movimentos de protesto social. Muitas de suas ações são politicamente motivadas e conscientes. A campanha de dezembro de 2010, de ataques DDoS, que recebeu o nome de “Operação Vingar Assange”, não foi exceção.
As campanhas DDoS podem ser táticas legítimas
Concorde-se ou não com todas as táticas que os Anonymous usam – algumas ilegais, outras de colaboração e ajuda pacíficas à defesa legal de direitos humanos, outras, ainda no limbo, numa zona cinzenta que separa o legal do ilegal e o moral do imoral – sob determinadas circunstâncias os ataques DDoS podem ser vistos como protesto não violento, perfeitamente alinhados entre outros protocolos reconhecidos de manifestação pública de massa; diferentes nos dois casos, só, os meios de agir. Claro que, como acontece também nas assembleias presenciais, muitos Anons apenas se deixam levar, seguindo a onda. Outros, sim, podem ter comportamento absolutamente inconveniente.
Mas esse é traço inevitável da plataforma dos Anonymous, aberta tanto para ativistas experientes quanto para os mais neófitos. Alguns Anons estão, pela primeira vez na vida, experimentando o sabor da militância pública, acompanhando os “irmãos” Anons; e forjando a própria consciência política individual. No caso dos Anonymous, ela já nasce na prática de uma robusta democracia em ação. Sobretudo, depois de organizarem campanhas de apoio aos levantes populares no Oriente Médio e na África e participaram da derrubada de ditadores que ocuparam o poder por muitas décadas.
Apesar da ambiguidade do FBI — que não denuncia explicitamente a prática dos Anonymous como ameaça criminosa — a ação de prendê-los e de criminalizar suas táticas já é abordagem de segurança e controle que exige atenção crítica, sobretudo se alguma dessas prisões levar a acusações e julgamentos formais.
Há vários modos de ver a campanha de ataques DDoS contra as empresas PayPal e Mastercard. Um deles é defini-la como ação digital direta.
Brotado organicamente da prática social, esse movimento não esperou que algum juiz, algum político, nem algum especialista, nem algum jornalista o declarasse legal ou moral. Os cidadãos tomaram o problema nas próprias mãos. Em menos de 24 horas, uma vasta assembleia de cidadãos ocuparam, não as calçadas – tradicional cenário dos protestos sociais –, mas a ágora digital. E ali agiram, auto-organizados, para manifestar sua opinião sobre um questão. Assim, agiram diretamente contra outros atores sociais que, na avaliação dos cidadãos reunidos, não estavam agindo com justiça. Se aconteceu de ferirem alguma lei, a lei – e por boas razões – também foi considerada injusta.
Como em todas as tradições, a ação direta é variada e diversa nas propostas, na organização, na história e nos objetivos. Em outras ocasiões, os ativistas Anonymous trabalham para bloquear acessos para proteger algum recurso que consideram valioso, como aconteceu no bloqueio da linha Pacific Northwest para preservar as árvores; ou no bloqueio de navios baleeiros japoneses, no caso do Sea Shepherd [ler, em Outras Palavras, "Sea Shepherd, a guerrilha do mar"]. Na longa tradição de converter espadas em arados[1], a intenção pode ser atrair a atenção da polícia e deixar-se prender, para atrair a atenção pública sobre alguma questão. Os Anonymous derrubaram e tornaram inoperantes as páginas internet das empresas Mastercard e Paypal por vários dias, porque inundaram os servidores com quantidade gigantesca de pedidos de acesso; fizeram o que fizeram para chamar a atenção da imprensa, para dar visibilidade à sua plataforma política, e para exigir que Assange recebesse julgamento legal e justo. Nesse sentido, foram bem sucedidos, independente de qualquer sentença que os envolvidos venham a receber.
O que, porém, tornou excepcionais e extraordinários os eventos de dezembro de 2010, foi que acabaram por demarcar um momento em que a ação direta surgiu numa via diferente da prevista pelas teorias dominantes da desobediência civil. Até então, praticamente todos os atos de desobediência civil mais notáveis — mesmo os que usaram a internet — haviam sido organizados por pequenos grupos de afinidade, cujos participantes têm bem claras as possíveis consequências legais de seus atos. Tradicionalmente, aqueles militantes já saem de casa com o número do telefone do advogado escrito com tinta à prova d’água, no braço.
Quanto aos Anonymous, que se orgulham de não ter identidade “física” facilmente comprovada ou localizável e de não terem forma nem pessoal nem empresarial, essas táticas de proteção não seriam eficazes. Por isso, em dezembro, enquanto os ataques estavam em andamento, vivi colada ao computador, tentando ver como os Anons conseguiriam – se conseguissem – controlar o risco e o caos que, em certa medida, caracterizam aquele tipo de interação. De fato, “a inteligência do enxame” – que é como os Anonymous falam deles mesmos – em momento algum perdeu o controle da ação. Mantiveram fixos contra os alvos, em ataques massivos, e entremearam os ataques com vídeos e manifestos nos quais explicavam o que estavam fazendo e por que faziam.
Mas, já naquele momento, simpatizantes e opositores viam e repetiam uma mesma observação: muitos participantes não tinham qualquer ideia clara do risco que enfrentavam, opondo-se a lei. E não tinham à mão qualquer telefone de advogado ao qual recorrer numa emergência, mais altamente provável a cada minuto que passava.
Os eventos espetaculares de dezembro de 2010, combinados com as recentes prisões de Anons, evidentemente mudaram tudo isso; muitos de nós já nos informamos atentamente sobre riscos. Os riscos legais e as sutilezas filosóficas dos ataques DDoS considerados como tática de ação direta já não são questão e problema exclusivo de um pequeno círculo de ativistas que praticam e teorizam, na tradição da ação direta, já há uma década. Hoje, um número muito maior de cidadãos já abraçaram a mesma tática.
Mas à luz da recente prisão de Anons, discutir se campanhas de ataques DDoS são sempre arma política eficaz a ser usada ou não (e há bons argumentos a favor dos dois lados) não é a questão básica que mais nos deve ocupar. A questão central agora é o critério usado para decidir quem está envolvido e para determinar se os envolvidos devem ou não ser acusados. Em outras palavras, a questão central é o critério usado para determinar se há crime, ou não, nas ações dos Anonymous. Se se considera que um ataque DDoS seja ação sempre inaceitável, em todas as circunstâncias – definido como tática que só semeia o caos –, essa ideia resultará, em pouco tempo, em penalizações indiscriminadas e excessivas; no longo prazo, essa criminalização generalizada poderá paralisar todos os tipos de iniciativas semelhantes, em toda a internet.
Isso acabará tendo efeitos sobre toda a cultura política da internet, que deve permitir que floresça a máxima diversidade de táticas, inclusive as táticas de ação coletiva, de ação direta e de manifestação pacífica de opiniões – ou a internet deixará de ser instrumento para a democratização das lutas políticas e da própria vida.
Al-Jazeera | Tradução Vila Vudu
Fonte: http://www.outraspalavras.net/
terça-feira, 31 de janeiro de 2012
Relato de um fotojornalista sobre Pinheirinho - Por Anderson Barbosa
Relato de um fotojornalista sobre Pinheirinho
Essas coisas não serão apagadas da minha memória, mesmo que eu delete todas as fotos que fiz, pois vivenciei e senti visceralmente na pele o que essas pessoas sentiram nestes últimos dias dentro daquele lugar que lhes pertencia. Por Anderson Barbosa
A situação está bastante crítica nos alojamentos onde os pinheirenses estão.
Eu acompanhei de perto todo esse processo de organização da resistência dos moradores e moradoras, passando aproximadamente 15 dias na ocupação, junto com o pessoal que fazia a segurança durante a madrugada, dentro da ocupação. O clima era de apreensão em alguns momentos. Ninguém dormia. Havia pessoas que, antes da falsa trégua do dia 17 de janeiro, estavam sem dormir há 10 dias, isso quando cheguei na ocupação.
Como de costume, diante do pano de fundo de eminente e, depois, evidente confronto, a vida seguia normal. Às 5:30 da manhã começava a movimentação das pessoas que saíam para trabalhar, algumas com suas crianças, para levá-las para as creches que ainda aceitavam moradores do Pinheirinho; outras com seus carrinhos para reciclagem; outras com seus carros. Esta rotina normal não foi vista por todas as pessoas, inclusive pela sociedade conservadora de São José dos Campos, que limitava suas análises sobre os moradores e moradoras da ocupação a dizer que se tratava de bandidos, vagabundos, prostitutas, como se pessoas que sejam vagabundas, prostitutas e bandidas não tivessem o direito de ter uma casa.Durante a madrugada do dia 17, quando a justiça federal cassou a liminar, por volta dos 30 minutos do dia, sob uma forte chuva que caía, viaturas da Força Tática (FT) se posicionaram próximas a um dos acessos à ocupação. Iniciou-se uma movimentação de moradores que faziam rondas de motocicletas no terreno e nas ruas próximas. Um morador do bairro, que mantinha relação com a ocupação, disse que os policiais o abordaram perguntando se ele vivia no Pinheirinho e ele disse que não. Os policiais disseram para ele dar o recado que quem estivesse no portão, dentro de meia hora seria alvejado. Minutos depois se inicia uma correria e boatos de que ônibus estavam sendo queimados na cidade. Um desses ônibus foi incendiado ao lado da ocupação e, segundo fotojornalistas da região do Vale do Paraíba que conseguiram chegar até o ônibus em chamas, uma vizinha da ocupação disse que havia visto uma viatura da FT parando o ônibus que só transportava o motorista e o cobrador e outros 3 homens, de barba bem feita e cabelo bem cortado, atearam fogo no ônibus. Relato que eu ouvi de um outro fotógrafo com quem conversei neste último sábado (28/01), 15 dias após o ocorrido, pois ele estava de carro e o ônibus pegou fogo com seu carro parado ao lado.Com isso, o clima de correria começou, em meio à lama, debaixo de chuva. O pessoal que estava fazendo treinamento para o confronto se mobilizou, tentou-se derrubar alguns pinheiros que ficam à margem do terreno, para evitar o avanço dos matadores a serviço do Estado – não é relato de militante, mas sim de quem presenciou essa tensão, de perto. Visto que nada acontecia, e com a tentativa de acalmar os ânimos por parte das lideranças e advogados do movimento, a situação ficou mais tranquila, até a hora do anúncio de que a justiça federal havia cassado a liminar. Uma festa tomou conta do lugar e olhos, que há horas atrás ferviam em sangue, derramavam lágrimas – e isso não é poético, mais uma vez foi o que eu vi. Quando cruzei com um dos moradores que falava ao celular e ele me viu, gritou chorando e me abraçou: “O Pinheirinho é nosso!”.Com o vaivém das liminares e depois com a falsa trégua dos 15 dias, pude me aproximar mais das pessoas e acompanhar o dia a dia de algumas delas e saber um pouco de suas histórias. Resumidamente e sem detalhes mais longos, todas se alimentavam, além da esperança, também da persistência e do sentimento de pertencimento àquele lugar, construído com suor, sem ajuda do Estado. Uma senhora me contava de sua varanda que construíra sua casa com dinheiro recebido por cuidar de filhos de vizinhos que não tinham onde deixar para trabalhar. Ela ainda tinha dentro de casa material de construção que seria usado para terminar sua suíte. Outro caso, de um casal de idosos que construíram a casa com trabalho de reciclagem. Coisas que ficaram na história dessas pessoas e que, como todos já sabem, foi tratorado pelas grandes forças da justiça.
Ter vivido esse processo todo, mesmo que apenas por 15 dias, me fez sentir parte daquele lugar, talvez por ter sido contaminado pelo sentimento que todas aquelas pessoas tinham ali. Aquilo era delas, por uso e justiça. Muitas tiveram ali a possibilidade de ter algo de que podiam dizer: “Isso é meu”, desde a casa a eletrodomésticos, inclusive carro, que conseguiram graças a se livrarem da exploração de imobiliárias e especuladores imobiliários.
Após todo o ocorrido que repercutiu mundo afora, nos confrontos durante a reintegração de posse, um dos piores que presenciei em minha vida de fotojornalista que acompanha as lutas por moradia há quase 11 anos, toda incerteza vista nos rostos daquelas pessoas me fez pensar sobre a validade de muitos de nossos códigos de sociabilidade. Vale a pena ser legalista? Vale crer na incerteza de uma justiça supostamente oferecida pelo Estado?E como todo pós-guerra tem os campos de refugiados e de concentração, o Pinheirinho não foi diferente. Realmente, a alguns dos alojamentos não é permitido o acesso nem das lideranças, menos ainda da imprensa, para que não se divulgue o que está acontecendo lá dentro. Ontem, quando voltava de lá, de carona com uma amiga fotógrafa, trouxemos Claudineide da Silva para São Paulo, para a casa de uma irmã, que está fazendo tratamento contra metástase óssea (um tipo de câncer que ataca os ossos), que na primeira noite pós-desalojamento passou o tempo todo sentada na cadeira de rodas, tomando morfina para aliviar a dor e tentar desinchar as pernas. Além do caso da Pamela, travesti soropositivo, que tentei ver na tarde de ontem, mas impedido de entrar, há também o caso de outra mulher que teve um AVC e está totalmente paralisada, literalmente jogada em um dos abrigos. Nos primeiros dias ela estava na igreja do Campo dos Alemães; agora, não sei onde está.
Os relatos são de uma enorme brutalidade. Sim, o pior é relatar o que vi esses dias e conversar com essas pessoas e ter que segurar o nó na garganta e saber que não posso fazer muita coisa além de tentar levar para mais pessoas esse relato que a imprensa convencional não faz, e sem o sentimentalismo, para mim falso, feito pela chamada imprensa alternativa. Para terminar, o que contribuiu alimentando a carga de desespero foi presenciar, entre os escombros da demolição das casas, grupos de proteção animal em busca dos animais, e frases do tipo: “Ah coitadinho, vem cá meu amor!”. E ao perguntar se eles haviam feito algum contato anterior com os moradores, diziam que não pois tinham medo de se aproximar. O mesmo era dito pelos saqueadores e as saqueadoras que estavam pegando telhas e outros materiais de construção das casas que ainda não haviam sido demolidas.Essas coisas não serão apagadas da minha memória, mesmo que eu delete todas as fotos que fiz, pois vivenciei e pude sentir visceralmente na pele o que essas pessoas sentiram nestes últimos dias dentro daquele lugar que lhes pertencia, não simplesmente pela posse do terreno, mas pelas histórias que surgiram, pelas histórias que recomeçaram ali. Gente que não tinha mais nada, nem nome limpo no comércio, que conseguiram – dentro do que compreendem por dignidade – que conseguiram resgatar tudo.
Para mim, Pinheirinho será a experiência mais marcante de toda minha vida, em todos os sentidos, desde o modo de organização, a preparação da resistência, a truculência da reintegração, o atraiçoamento do Estado e da justiça, o tratamento de última categoria pelo qual estão passando, me fazendo fortalecer e resgatar princípios de negação do Estado e busca por outros meios de organização social.
Para mim, Pinheirinho será uma referência.
29 de janeiro de 2012
Nota
O autor, Anderson Barbosa, é fotojornalista.
Fonte: http://passapalavra.info/
Essas coisas não serão apagadas da minha memória, mesmo que eu delete todas as fotos que fiz, pois vivenciei e senti visceralmente na pele o que essas pessoas sentiram nestes últimos dias dentro daquele lugar que lhes pertencia. Por Anderson Barbosa
A situação está bastante crítica nos alojamentos onde os pinheirenses estão.
Eu acompanhei de perto todo esse processo de organização da resistência dos moradores e moradoras, passando aproximadamente 15 dias na ocupação, junto com o pessoal que fazia a segurança durante a madrugada, dentro da ocupação. O clima era de apreensão em alguns momentos. Ninguém dormia. Havia pessoas que, antes da falsa trégua do dia 17 de janeiro, estavam sem dormir há 10 dias, isso quando cheguei na ocupação.
Como de costume, diante do pano de fundo de eminente e, depois, evidente confronto, a vida seguia normal. Às 5:30 da manhã começava a movimentação das pessoas que saíam para trabalhar, algumas com suas crianças, para levá-las para as creches que ainda aceitavam moradores do Pinheirinho; outras com seus carrinhos para reciclagem; outras com seus carros. Esta rotina normal não foi vista por todas as pessoas, inclusive pela sociedade conservadora de São José dos Campos, que limitava suas análises sobre os moradores e moradoras da ocupação a dizer que se tratava de bandidos, vagabundos, prostitutas, como se pessoas que sejam vagabundas, prostitutas e bandidas não tivessem o direito de ter uma casa.Durante a madrugada do dia 17, quando a justiça federal cassou a liminar, por volta dos 30 minutos do dia, sob uma forte chuva que caía, viaturas da Força Tática (FT) se posicionaram próximas a um dos acessos à ocupação. Iniciou-se uma movimentação de moradores que faziam rondas de motocicletas no terreno e nas ruas próximas. Um morador do bairro, que mantinha relação com a ocupação, disse que os policiais o abordaram perguntando se ele vivia no Pinheirinho e ele disse que não. Os policiais disseram para ele dar o recado que quem estivesse no portão, dentro de meia hora seria alvejado. Minutos depois se inicia uma correria e boatos de que ônibus estavam sendo queimados na cidade. Um desses ônibus foi incendiado ao lado da ocupação e, segundo fotojornalistas da região do Vale do Paraíba que conseguiram chegar até o ônibus em chamas, uma vizinha da ocupação disse que havia visto uma viatura da FT parando o ônibus que só transportava o motorista e o cobrador e outros 3 homens, de barba bem feita e cabelo bem cortado, atearam fogo no ônibus. Relato que eu ouvi de um outro fotógrafo com quem conversei neste último sábado (28/01), 15 dias após o ocorrido, pois ele estava de carro e o ônibus pegou fogo com seu carro parado ao lado.Com isso, o clima de correria começou, em meio à lama, debaixo de chuva. O pessoal que estava fazendo treinamento para o confronto se mobilizou, tentou-se derrubar alguns pinheiros que ficam à margem do terreno, para evitar o avanço dos matadores a serviço do Estado – não é relato de militante, mas sim de quem presenciou essa tensão, de perto. Visto que nada acontecia, e com a tentativa de acalmar os ânimos por parte das lideranças e advogados do movimento, a situação ficou mais tranquila, até a hora do anúncio de que a justiça federal havia cassado a liminar. Uma festa tomou conta do lugar e olhos, que há horas atrás ferviam em sangue, derramavam lágrimas – e isso não é poético, mais uma vez foi o que eu vi. Quando cruzei com um dos moradores que falava ao celular e ele me viu, gritou chorando e me abraçou: “O Pinheirinho é nosso!”.Com o vaivém das liminares e depois com a falsa trégua dos 15 dias, pude me aproximar mais das pessoas e acompanhar o dia a dia de algumas delas e saber um pouco de suas histórias. Resumidamente e sem detalhes mais longos, todas se alimentavam, além da esperança, também da persistência e do sentimento de pertencimento àquele lugar, construído com suor, sem ajuda do Estado. Uma senhora me contava de sua varanda que construíra sua casa com dinheiro recebido por cuidar de filhos de vizinhos que não tinham onde deixar para trabalhar. Ela ainda tinha dentro de casa material de construção que seria usado para terminar sua suíte. Outro caso, de um casal de idosos que construíram a casa com trabalho de reciclagem. Coisas que ficaram na história dessas pessoas e que, como todos já sabem, foi tratorado pelas grandes forças da justiça.
Ter vivido esse processo todo, mesmo que apenas por 15 dias, me fez sentir parte daquele lugar, talvez por ter sido contaminado pelo sentimento que todas aquelas pessoas tinham ali. Aquilo era delas, por uso e justiça. Muitas tiveram ali a possibilidade de ter algo de que podiam dizer: “Isso é meu”, desde a casa a eletrodomésticos, inclusive carro, que conseguiram graças a se livrarem da exploração de imobiliárias e especuladores imobiliários.
Após todo o ocorrido que repercutiu mundo afora, nos confrontos durante a reintegração de posse, um dos piores que presenciei em minha vida de fotojornalista que acompanha as lutas por moradia há quase 11 anos, toda incerteza vista nos rostos daquelas pessoas me fez pensar sobre a validade de muitos de nossos códigos de sociabilidade. Vale a pena ser legalista? Vale crer na incerteza de uma justiça supostamente oferecida pelo Estado?E como todo pós-guerra tem os campos de refugiados e de concentração, o Pinheirinho não foi diferente. Realmente, a alguns dos alojamentos não é permitido o acesso nem das lideranças, menos ainda da imprensa, para que não se divulgue o que está acontecendo lá dentro. Ontem, quando voltava de lá, de carona com uma amiga fotógrafa, trouxemos Claudineide da Silva para São Paulo, para a casa de uma irmã, que está fazendo tratamento contra metástase óssea (um tipo de câncer que ataca os ossos), que na primeira noite pós-desalojamento passou o tempo todo sentada na cadeira de rodas, tomando morfina para aliviar a dor e tentar desinchar as pernas. Além do caso da Pamela, travesti soropositivo, que tentei ver na tarde de ontem, mas impedido de entrar, há também o caso de outra mulher que teve um AVC e está totalmente paralisada, literalmente jogada em um dos abrigos. Nos primeiros dias ela estava na igreja do Campo dos Alemães; agora, não sei onde está.
Os relatos são de uma enorme brutalidade. Sim, o pior é relatar o que vi esses dias e conversar com essas pessoas e ter que segurar o nó na garganta e saber que não posso fazer muita coisa além de tentar levar para mais pessoas esse relato que a imprensa convencional não faz, e sem o sentimentalismo, para mim falso, feito pela chamada imprensa alternativa. Para terminar, o que contribuiu alimentando a carga de desespero foi presenciar, entre os escombros da demolição das casas, grupos de proteção animal em busca dos animais, e frases do tipo: “Ah coitadinho, vem cá meu amor!”. E ao perguntar se eles haviam feito algum contato anterior com os moradores, diziam que não pois tinham medo de se aproximar. O mesmo era dito pelos saqueadores e as saqueadoras que estavam pegando telhas e outros materiais de construção das casas que ainda não haviam sido demolidas.Essas coisas não serão apagadas da minha memória, mesmo que eu delete todas as fotos que fiz, pois vivenciei e pude sentir visceralmente na pele o que essas pessoas sentiram nestes últimos dias dentro daquele lugar que lhes pertencia, não simplesmente pela posse do terreno, mas pelas histórias que surgiram, pelas histórias que recomeçaram ali. Gente que não tinha mais nada, nem nome limpo no comércio, que conseguiram – dentro do que compreendem por dignidade – que conseguiram resgatar tudo.
Para mim, Pinheirinho será a experiência mais marcante de toda minha vida, em todos os sentidos, desde o modo de organização, a preparação da resistência, a truculência da reintegração, o atraiçoamento do Estado e da justiça, o tratamento de última categoria pelo qual estão passando, me fazendo fortalecer e resgatar princípios de negação do Estado e busca por outros meios de organização social.
Para mim, Pinheirinho será uma referência.
29 de janeiro de 2012
Nota
O autor, Anderson Barbosa, é fotojornalista.
Fonte: http://passapalavra.info/
Tortura e sofrimento: Empresa brasileira de aviação é acusada de transportar macacos para laboratórios - Por Natalia Cesana
Tortura e sofrimento: Empresa brasileira de aviação é acusada de transportar macacos para laboratórios
Macacos amontaoados em caixas e gaiolas são transportados para experimentação em laboratórios (Foto: Reprodução/BUAV)
A British Union for the Abolition of Vivisection (BUAV) divulgou nesta segunda-feira, dia 30, o nome de mais uma companhia aérea envolvida no transporte de primatas para fins experimentais. Trata-se da empresa brasileira TAM Linhas Aéreas. A companhia é acusada de transportar 11 saguis do Brasil para a Universidade de Nebraska, nos EUA.
Milhares de primatas são transportados por centenas de quilômetros mundo afora a serviço da indústria de pesquisa. Alguns são capturados na selva e cruelmente arrancados de seus grupos. Outros são criados em cativeiro e vivem confinados.
Nos últimos anos, um número crescente de companhias aéreas interrompeu seu envolvimento no transporte de primatas. Recentemente passaram a integrar essa lista a American Airlines, Caribbean Airlines e a IBC Airways.Foto: Reprodução/BUAV
A BUAV ressalta sua preocupação com os direitos animais. Ao longo dos anos muitos acidentes têm ocorrido pelo mundo, causando sofrimento e até a morte destes animais durante a viagem para os laboratórios. As causas da morte dos macacos geralmente estão relacionadas com pneumonia, gastroenterite, desidratação, perda de peso e infecções.
Manifeste-se
Por favor, entre em contato com a TAM Linhas Aéreas e peça o fim do envolvimento da empresa em um ato de crueldade e sofrimento como esse, que está intrinsecamente ligado ao comércio de primatas para pesquisa:
Emails: tamimprensa@tam.com.br e responsabilidade.social@tam.com.br .
Fonte: http://www.anda.jor.br/
Macacos amontaoados em caixas e gaiolas são transportados para experimentação em laboratórios (Foto: Reprodução/BUAV)
A British Union for the Abolition of Vivisection (BUAV) divulgou nesta segunda-feira, dia 30, o nome de mais uma companhia aérea envolvida no transporte de primatas para fins experimentais. Trata-se da empresa brasileira TAM Linhas Aéreas. A companhia é acusada de transportar 11 saguis do Brasil para a Universidade de Nebraska, nos EUA.
Milhares de primatas são transportados por centenas de quilômetros mundo afora a serviço da indústria de pesquisa. Alguns são capturados na selva e cruelmente arrancados de seus grupos. Outros são criados em cativeiro e vivem confinados.
Nos últimos anos, um número crescente de companhias aéreas interrompeu seu envolvimento no transporte de primatas. Recentemente passaram a integrar essa lista a American Airlines, Caribbean Airlines e a IBC Airways.Foto: Reprodução/BUAV
A BUAV ressalta sua preocupação com os direitos animais. Ao longo dos anos muitos acidentes têm ocorrido pelo mundo, causando sofrimento e até a morte destes animais durante a viagem para os laboratórios. As causas da morte dos macacos geralmente estão relacionadas com pneumonia, gastroenterite, desidratação, perda de peso e infecções.
Manifeste-se
Por favor, entre em contato com a TAM Linhas Aéreas e peça o fim do envolvimento da empresa em um ato de crueldade e sofrimento como esse, que está intrinsecamente ligado ao comércio de primatas para pesquisa:
Emails: tamimprensa@tam.com.br e responsabilidade.social@tam.com.br .
Fonte: http://www.anda.jor.br/
segunda-feira, 30 de janeiro de 2012
A face do preconceito: Soninha Francine acusa moradores do Pinheirinho de serem criminosos aproveitadores - da Redação
Soninha Francine acusa moradores do Pinheirinho de serem criminosos aproveitadores
A ex-apresentadora, ex-vereadora e celebridade filiada ao PPS esbravejou via twitter
A ex-apresentadora, ex-vereadora e celebridade filiada ao PPS, Soninha Francine, acusou via twitter, na manhã desta sexta-feira (27), os moradores desabrigados do bairro do Pinheirinho, em São josé dos Campos, de serem criminosos aproveitadores. "São criminosos tirando vantagem da situação, não apenas pessoas comuns defendendo suas terras" disse a ex-apresentadora.
Horas depois a celebridade reforçou seu pensamento. "Chamo criminosos de aproveitadores, SIM.O que é COMPLETAMENTE diferente de chamar desabrigados de criminosos". Em seguida Francine colocou um link para o seu blog (http://www.gabinetesoninha.blogspot.com) onde desenvolveu melhor (ou pior) o seu pensamento. "Se são trabalhadores, lamento, escolheram métodos de bandidagem. O que pretendem, "matar ou morrer"?".
Segundo Francine, o que justificaria sua opinião seriam as imagens da semana passada onde aparecem os moradores preparando-se para receber a PM.
Fonte: http://www.brasildefato.com.br/
A ex-apresentadora, ex-vereadora e celebridade filiada ao PPS esbravejou via twitter
A ex-apresentadora, ex-vereadora e celebridade filiada ao PPS, Soninha Francine, acusou via twitter, na manhã desta sexta-feira (27), os moradores desabrigados do bairro do Pinheirinho, em São josé dos Campos, de serem criminosos aproveitadores. "São criminosos tirando vantagem da situação, não apenas pessoas comuns defendendo suas terras" disse a ex-apresentadora.
Horas depois a celebridade reforçou seu pensamento. "Chamo criminosos de aproveitadores, SIM.O que é COMPLETAMENTE diferente de chamar desabrigados de criminosos". Em seguida Francine colocou um link para o seu blog (http://www.gabinetesoninha.blogspot.com) onde desenvolveu melhor (ou pior) o seu pensamento. "Se são trabalhadores, lamento, escolheram métodos de bandidagem. O que pretendem, "matar ou morrer"?".
Segundo Francine, o que justificaria sua opinião seriam as imagens da semana passada onde aparecem os moradores preparando-se para receber a PM.
Fonte: http://www.brasildefato.com.br/
Atitude do bem: Proprietária de chácara em Suzano (SP) ampara 250 animais - por ANDA
Atitude do bem: Proprietária de chácara em Suzano (SP) ampara 250 animais
Na área de 4.250 metros quadrados de uma chácara em Suzano, município próximo à divisa com Ribeirão Pires, Dolores Gonçalves, 60 anos, mantém assistência para aproximadamente 250 animais, sendo 30 gatos.
A dona de casa nunca teve ideia de montar abrigo para cuidar de animais, mas a paixão pelos bichanos desde a infância lhe rendeu grande responsabilidade hoje: amparar cães e gatos vítimas de maus-tratos, abandonados, doentes, mutilados e famintos. Ela transformou sua chácara, onde mora, em teto seguro para felinos e cachorros. E os números só crescem.
“Quando vim para cá, há dez anos, tinha 40 cães. Depois só aumentou. Quem realiza essas ações é vítima de abandonos”, disse. A cuidadora refere-se às ações de populares que, conhecedores de sua afeição por animais, abandonam grandes ninhadas de filhotes em seu portão. Por esse motivo, ela preferiu não divulgar o endereço.
Quando pequenos, são doados mais rápido. Já os maiores têm menor procura, principalmente os acidentados. Alguns chegam a ficar anos e outros nunca saíram de lá. À medida que atingem a idade, todos são submetidos à castração.
A ajuda fornecida pela equipe do Clube dos Vira Latas, entidade parceira que abriga animais em Ribeirão Pires, garante a cirurgia dos bichos para evitar a reprodução desenfreada que enche os centros urbanos de animais sem donos.
Os bichos são distribuídos em espaços separados. Por idade, tamanho, temperamento ou tipo de doença. Cerca de 25 cachorros estão em fase de tratamento quimioterápico e vivem separados dos demais. Tomam medicações específicas e, mesmo doentes, são ativos e carinhosos.
O custo com remédios, castrações, produtos de limpeza, rações, entre outras despesas, chega a R$ 15 mil por mês à dona de casa, que também sobrevive por meio de doações. A conta é bancada inteiramente por colaboradores. Para alimentar tantas bocas famintas é preciso, no mínimo, duas toneladas de ração por mês – para adultos e filhotes. O foco é castrar, medicar, alimentar e colocá-los para doação. Em média, 60 animais são adotados por mês. Mas, a rotatividade é grande. “Tem época que as pessoas colocam animais todos os dias no meu portão. Além disso, muitos são devolvidos. As pessoas não têm paciência para cuidar. Alguns devolvem no dia seguinte”, explica Dolores.
São tantos animais que sua casa, aos poucos, foi invadida pela matilha. O micro-ondas virou estoque de remédios e o quarto transformou-se na área VIP dos ‘filhos’. “Minha casa não é mais minha, é deles. Para mim é normal. Não saberia viver sem.”
Para manter a área em ordem e limpa, quatro ajudantes dão assistência diária à dona de casa. Apesar de tantos animais, os canis são limpos, há ração e água para todos, além de ossinhos, casinhas e brinquedos.
Cuidadora busca apoio para construção de canis
Todos os canis foram construídos por meio de doações. Para poder abrigar os cachorros com mais comodidade, é preciso erguer, pelo menos, mais quatro, segundo Dolores Gonçalves, 60. Os outros foram feitos com envio de casinhas, telhas, areia, cimento e pedras. Para quem quiser ajudar basta acessar o site www.chacaradadolores.blogspot.com. No endereço eletrônico há também fotos dos animais que estão disponíveis para adoação e daqueles que conseguiram um lar.
Quem quiser contribuir financeiramente pode acessar o site para ter acesso aos dados bancários da responsável. De acordo com Dolores, “todas as doações são bem-vindas”. Rações, correntes, coleiras, produtos de limpeza, cobertores, jornais, remédios, vassouras e sacos de lixo. Mesmo com rotina cheia de afazeres por conta dos animais, ela minimiza o cansaço. “Cuidar deles não tem preço. Não vivo sem isso.”
Fonte: Diário do Grande ABC
Retirado: http://www.anda.jor.br/
Na área de 4.250 metros quadrados de uma chácara em Suzano, município próximo à divisa com Ribeirão Pires, Dolores Gonçalves, 60 anos, mantém assistência para aproximadamente 250 animais, sendo 30 gatos.
A dona de casa nunca teve ideia de montar abrigo para cuidar de animais, mas a paixão pelos bichanos desde a infância lhe rendeu grande responsabilidade hoje: amparar cães e gatos vítimas de maus-tratos, abandonados, doentes, mutilados e famintos. Ela transformou sua chácara, onde mora, em teto seguro para felinos e cachorros. E os números só crescem.
“Quando vim para cá, há dez anos, tinha 40 cães. Depois só aumentou. Quem realiza essas ações é vítima de abandonos”, disse. A cuidadora refere-se às ações de populares que, conhecedores de sua afeição por animais, abandonam grandes ninhadas de filhotes em seu portão. Por esse motivo, ela preferiu não divulgar o endereço.
Quando pequenos, são doados mais rápido. Já os maiores têm menor procura, principalmente os acidentados. Alguns chegam a ficar anos e outros nunca saíram de lá. À medida que atingem a idade, todos são submetidos à castração.
A ajuda fornecida pela equipe do Clube dos Vira Latas, entidade parceira que abriga animais em Ribeirão Pires, garante a cirurgia dos bichos para evitar a reprodução desenfreada que enche os centros urbanos de animais sem donos.
Os bichos são distribuídos em espaços separados. Por idade, tamanho, temperamento ou tipo de doença. Cerca de 25 cachorros estão em fase de tratamento quimioterápico e vivem separados dos demais. Tomam medicações específicas e, mesmo doentes, são ativos e carinhosos.
O custo com remédios, castrações, produtos de limpeza, rações, entre outras despesas, chega a R$ 15 mil por mês à dona de casa, que também sobrevive por meio de doações. A conta é bancada inteiramente por colaboradores. Para alimentar tantas bocas famintas é preciso, no mínimo, duas toneladas de ração por mês – para adultos e filhotes. O foco é castrar, medicar, alimentar e colocá-los para doação. Em média, 60 animais são adotados por mês. Mas, a rotatividade é grande. “Tem época que as pessoas colocam animais todos os dias no meu portão. Além disso, muitos são devolvidos. As pessoas não têm paciência para cuidar. Alguns devolvem no dia seguinte”, explica Dolores.
São tantos animais que sua casa, aos poucos, foi invadida pela matilha. O micro-ondas virou estoque de remédios e o quarto transformou-se na área VIP dos ‘filhos’. “Minha casa não é mais minha, é deles. Para mim é normal. Não saberia viver sem.”
Para manter a área em ordem e limpa, quatro ajudantes dão assistência diária à dona de casa. Apesar de tantos animais, os canis são limpos, há ração e água para todos, além de ossinhos, casinhas e brinquedos.
Cuidadora busca apoio para construção de canis
Todos os canis foram construídos por meio de doações. Para poder abrigar os cachorros com mais comodidade, é preciso erguer, pelo menos, mais quatro, segundo Dolores Gonçalves, 60. Os outros foram feitos com envio de casinhas, telhas, areia, cimento e pedras. Para quem quiser ajudar basta acessar o site www.chacaradadolores.blogspot.com. No endereço eletrônico há também fotos dos animais que estão disponíveis para adoação e daqueles que conseguiram um lar.
Quem quiser contribuir financeiramente pode acessar o site para ter acesso aos dados bancários da responsável. De acordo com Dolores, “todas as doações são bem-vindas”. Rações, correntes, coleiras, produtos de limpeza, cobertores, jornais, remédios, vassouras e sacos de lixo. Mesmo com rotina cheia de afazeres por conta dos animais, ela minimiza o cansaço. “Cuidar deles não tem preço. Não vivo sem isso.”
Fonte: Diário do Grande ABC
Retirado: http://www.anda.jor.br/
sexta-feira, 27 de janeiro de 2012
Mumia Abu-Jamal foi transferido para a prisão comum - Por Freemumia.com
Mumia Abu-Jamal foi transferido para a prisão comum
Em 27 de Janeiro, Mumia recebeu ordem de transferência para a prisão comum. Desde que foi preso em 1981, esta é a primeira vez que Mumia está na prisão comum. Por Freemumia.comEm 27 de Janeiro, Mumia Abu-Jamal recebeu oficialmente a ordem de transferência para a prisão comum (General Prison Population), depois de ter permanecido durante sete semanas sob Custódia Administrativa (no Buraco ou prisão solitária) no SCI Mahanoy, em Frackville, na Pennsylvania. Desde que foi preso em 1981, esta é a primeira vez que Mumia está na prisão comum.
Aquela decisão foi tomada poucas horas depois da entrega de um abaixo-assinado com mais de 5.500 assinaturas na sede do Department of Corrections em Camp Hill, Pennsylvania, e de ter sido feita uma queixa com o apoio do relator Especial das Nações Unidas para a Tortura, Juan Mendez.
Notem bem que, ainda que constitua uma vitória o facto de Mumia ter sido transferido do confinamento cruel na Restricted Housing Unit, RHU, nós exigimos o encerramento de todas as RHUs. Além disso, exigimos a libertação imediata de Mumia Abu-Jamal e aquela transferência não nos lança poeira nos olhos.
Liberdade para Mumia!
Tradução: Passa Palavra
Fonte: http://passapalavra.info/
Em 27 de Janeiro, Mumia recebeu ordem de transferência para a prisão comum. Desde que foi preso em 1981, esta é a primeira vez que Mumia está na prisão comum. Por Freemumia.comEm 27 de Janeiro, Mumia Abu-Jamal recebeu oficialmente a ordem de transferência para a prisão comum (General Prison Population), depois de ter permanecido durante sete semanas sob Custódia Administrativa (no Buraco ou prisão solitária) no SCI Mahanoy, em Frackville, na Pennsylvania. Desde que foi preso em 1981, esta é a primeira vez que Mumia está na prisão comum.
Aquela decisão foi tomada poucas horas depois da entrega de um abaixo-assinado com mais de 5.500 assinaturas na sede do Department of Corrections em Camp Hill, Pennsylvania, e de ter sido feita uma queixa com o apoio do relator Especial das Nações Unidas para a Tortura, Juan Mendez.
Notem bem que, ainda que constitua uma vitória o facto de Mumia ter sido transferido do confinamento cruel na Restricted Housing Unit, RHU, nós exigimos o encerramento de todas as RHUs. Além disso, exigimos a libertação imediata de Mumia Abu-Jamal e aquela transferência não nos lança poeira nos olhos.
Liberdade para Mumia!
Tradução: Passa Palavra
Fonte: http://passapalavra.info/
Terror imobiliário ou a expulsão dos pobres do centro de São Paulo - por Ermínia Maricato
Terror imobiliário ou a expulsão dos pobres do centro de São PauloO modelo é contra os pobres que estão longe de constituírem minoria em nossa sociedade. O modelo quer os pobres fora do centro de São Paulo. Isso é óbvio. O que não parece ser óbvio é que, em última instância, a determinação disso tudo é econômica. A centralidade é a produção do espaço urbano e a mola propulsora, a renda imobiliária. E depois dizem que Marx está morto.
Dificilmente, durante nossa curta existência, assistiremos disputa mais explícita que esta, que opõe prefeitura e Câmara Municipal de São Paulo (além do governo estadual), que representam os interesses do mercado imobiliário, contra os moradores e usuários pobres, pelo acesso ao centro antigo de São Paulo. Trata-se do único lugar na cidade onde os interesses de todas as partes (mercado imobiliário, prefeitura, Câmara Municipal, comerciantes locais, movimentos de luta por moradia, moradores de cortiços, moradores de favelas, recicladores, ambulantes, moradores de rua, dependentes químicos, e outros) estão muito claros, e os pobres não estão aceitando passivamente a expulsão.
No restante da cidade, como em todas as metrópoles brasileiras, um furacão imobiliário revoluciona bairros residenciais e até mesmo as periferias distantes, empurrando os pobres para além dos antigos limites, insuflado pelos recursos do Minha Casa Minha Vida no contexto de total falta de regulação fundiária/imobiliária ou, em outras palavras, de planejamento urbano por parte dos municípios. A especulação corre solta, auxiliada por políticas públicas que identificam valorização imobiliária como progresso.
Ao contrário do silêncio (ou protestos pontuais) que acompanha essa escandalosa especulação que, a partir de 2010, levou à multiplicação dos preços dos imóveis, em todo o país, no centro de São Paulo, foi deflagrada uma guerra de classes.
Não faltaram planos para recuperar o centro tradicional de São Paulo. Desde a gestão do prefeito Faria Lima, vários governos defenderam a promoção de moradia pública na região. Governos tucanos apostaram em estratégias de distinção local por meio de investimento na cultura (como demonstraram muitos trabalhos acadêmicos) Vários museus, salas de espetáculo, centros culturais, edifícios históricos, foram criados ou renovados. No entanto, o mercado imobiliário nunca respondeu ao convite dos diversos governos, de investir na região, seja para um mercado diferenciado, seja para habitação social como pretenderam os governos Erundina e Marta.
Outras localizações (engendradas pelas parcerias estado/capital privado, como demonstrou Mariana Fix) foram mais bem sucedidas como foi o caso da região Berrini/Águas Espraiadas. Outro fator que inibiu a entrada mais decisiva dos empreendedores no centro foi a reduzida dimensão dos terrenos. O mercado imobiliário busca terrenos amplos que permitam a construção de uma ou de várias torres- clube, padrão praticamente generalizado atualmente no Brasil.
Finalmente, há os pobres - com toda a diversidade já exposta - cuja proximidade desvaloriza imóveis novos ou reformados, coerentemente com os valores de uma sociedade que além de patrimonialista (e por isso mesmo) está entre as mais desiguais do mundo. Aceita-se que os pobres ocupem até áreas de proteção ambiental: as Áreas de Proteção dos Mananciais (são quase 2 milhões de habitantes apenas no sul da metrópole), as encostas do Parque Estadual da Serra do Mar, as favelas em áreas de risco, mas não se aceita que ocupem áreas valorizadas pelo mercado, como revela a atual disputa pelo centro.
Enquanto os planos das várias gestões municipais para o centro não deslancharam (leia-se: não interessaram ao mercado imobiliário), os serviços públicos declinaram (o acúmulo de lixo se tornou regra), num contexto já existente de imóveis vazios e moradia precária. O baixo preço do metro quadrado afastou investidores e, mais recentemente, nos últimos anos... também o poder público. Nessa área assim “liberada” e esquecida pelos poderes públicos, os dependentes químicos também se concentraram. No entanto a vitalidade do comércio na região, que inclui um dos maiores centros de venda de computadores e artigos eletrônicos da América Latina, não permite classificar essa área como abandonada, senão pelo falta de serviços públicos de manutenção urbana e políticas sociais.
Frente a isso, a gestão do prefeito Kassab deu continuidade ao projeto NOVA LUZ, iniciado por seu antecessor, José Serra, e vem se empenhando em retirar os obstáculos que afastam o mercado imobiliário de investir na área. Estão previstos a desapropriação de imóveis em dezenas de quadras e o remembramento dos lotes para constituírem grandes terrenos de modo a viabilizar a entrada do mercado imobiliário.
A retomada de recursos de financiamento habitacional com o MCMV, após praticamente duas décadas de baixa produção, muda completamente esse quadro. Os novos lançamentos do mercado imobiliário passam a cercar a região. Vários bairros vizinhos, como a Barra Funda, apresentam um grande número de galpões vazios em terrenos de dimensões atraentes. A ampliação de outro bairro vizinho, Água Branca, vai se constituir em um bairro novo .
Finalmente, o mercado imobiliário e a prefeitura lançam informalmente a ideia de uma fantástica operação urbana que irá ladear a ferrovia começando no bairro da Lapa e estendendo-se até o Brás. O projeto inclui a construção de vias rebaixadas. Todos ficam felizes: empreiteiras de construção pesada, mercado imobiliário, integrantes do executivo e legislativo (que garantem financiamento para suas campanhas eleitorais) e a classe média que ascendeu ao mercado residencial com os subsídios.
O Projeto Nova Luz parece ser a ponta de lança dessa gigantesca operação urbana.
Mas ainda resta um obstáculo a ser removido: os pobres que se apresentam sobre a forma de moradores dos cortiços, moradores de favelas, dependentes de droga, moradores de rua, vendedores ambulantes... Com eles ali, a taxa de lucro que pode ser obtida na venda de imóveis não compensa.
Algumas ações não deixam dúvida sobre as intenções de quem as promove. Um incêndio, cujas causas são ignoradas, atingiu a Favela do Moinho, situada na região central ao lado da ferrovia. Alguns dias depois, numa ação de emergência, a prefeitura contrata a implosão de um edifício no local sob alegação do risco que ele podia oferecer aos trens que passam ali (enquanto os moradores continuavam sem atendimento, ocupando as calçadas da área incendiada). Em seguida os dependentes químicos são literalmente atacados pela polícia sem qualquer diálogo e sem a oferta de qualquer alternativa. (Esperavam que eles fossem evaporar?). Alguns dias depois vários edifícios onde funcionavam bares, pensões, moradias, são fechados pela prefeitura sob alegação de uso irregular. (O restante da cidade vai receber o mesmo tratamento? Quantos usos ilegais há nessa cidade?).
O centro de São Paulo constitui uma região privilegiada em relação ao resto da cidade. Trata-se do ponto de maior mobilidade da metrópole, com seu entroncamento rodo-metro- ferroviário. A partir dali, pode-se acessar qualquer ponto da cidade o que constitui uma característica ímpar se levarmos em conta a trágica situação dos transportes coletivos. Trata-se ainda do local de maior oferta de emprego na região metropolitana. Nele estão importantes museus e salas de espetáculo, bem como universidades, escolas públicas, equipamentos de saúde, sedes do judiciário, órgãos governamentais.
Apenas para dar uma ideia da expectativa em relação ao futuro da região está prevista ali uma Escola de Dança, na vizinhança da Sala São Paulo, cujo projeto, elaborado por renomados arquitetos suíços – autores do arena esportiva chinesa “Ninho de Pássaro” - custou a módica quantia de R$ 20 milhões de acordo com informações da imprensa. É preciso lembrar ainda que infraestrutura local é completa: iluminação pública, calçamento, pavimentação, água e esgoto, drenagem como poucas localizações na cidade.
Trata-se de um patrimônio social já amortizado por décadas de investimento público e privado. A disputa irá definir quem vai se apropriar desse ativo urbano e com que finalidade. A desvalorização de tal ambiente é um fenômeno estritamente ou intrinsecamente capitalista, como já apontou David Harvey analisando outros processos de “renovação” de centros de cidades americanas.
A luta pela Constituição Federal de 1988 e a regulamentação de seus artigos 182 e 183, que gerou o Estatuto da Cidade, se inspirou, em parte, na possibilidade de utilizar imóveis vazios em centros urbanos antigos para moradia social. Nessas áreas ditas “deterioradas” está a única alternativa dos pobres vivenciarem o “direito à cidade” pois de um modo geral, eles são expulsos para fora da mesma. Executivos e legislativos evitam aplicar leis tão avançadas. O judiciário parece esquecer-se de que o direito à moradia é absoluto em nossa Carta Magna enquanto que o direito à propriedade é relativo, à função social. (Escrevo essas linhas enquanto decisão judicial autorizou o despejo –que se fez de surpresa e de forma violenta- de mais de 1.600 famílias de uma área cujo proprietário – Naji Nahas - deve 15 milhões em IPTU, ao município de São José dos Campos. Antes de mais nada, é preciso ver se ele era mesmo proprietário da terra, já que no Brasil, a fraude registraria de grandes terrenos é mais regra que exceção, e depois verificar se ela estava ou não cumprindo a função social).
É óbvio, que o caso que nos ocupa aqui mostra a falta de compaixão, de solidariedade, de espírito público. Crianças moram em péssimas condições nos cortiços, em cômodos insalubres, dividem banheiros imundos com um grande número de adultos (quando há banheiros). Com os despejos violentos são remetidas para uma condição ainda pior de moradia pelo Estado que , legalmente, deveria responder pela solução do problema. Num mundo com tantas conquistas científicas e tecnológicas, dependentes químicos são tratados com balas de borracha e spray de pimenta para se dispersarem. Um comércio dinâmico, formado por pequenas empresas e ambulantes, que poderia ter apoio para a sua legalização, organização e inovação é visto como atrasado e indesejável. O modelo perseguido é o do shopping center, o monopólio, e não o pequeno e vivo comércio de rua ou o boteco da esquina.
O modelo é contra os pobres que estão longe de constituírem minoria em nossa sociedade. O modelo quer os pobres fora do centro como anunciou o jornal Brasil de Fato. Tudo isso é óbvio. O que não parece ser óbvio é que, em última instância, como diria Althusser, a determinação disso tudo é econômica. A centralidade é a produção do espaço urbano e a mola propulsora, a renda imobiliária. E depois dizem que Marx está morto.
Ermínia Maricato é urbanista.
Fonte: www.cartamaior.com.br/
Dificilmente, durante nossa curta existência, assistiremos disputa mais explícita que esta, que opõe prefeitura e Câmara Municipal de São Paulo (além do governo estadual), que representam os interesses do mercado imobiliário, contra os moradores e usuários pobres, pelo acesso ao centro antigo de São Paulo. Trata-se do único lugar na cidade onde os interesses de todas as partes (mercado imobiliário, prefeitura, Câmara Municipal, comerciantes locais, movimentos de luta por moradia, moradores de cortiços, moradores de favelas, recicladores, ambulantes, moradores de rua, dependentes químicos, e outros) estão muito claros, e os pobres não estão aceitando passivamente a expulsão.
No restante da cidade, como em todas as metrópoles brasileiras, um furacão imobiliário revoluciona bairros residenciais e até mesmo as periferias distantes, empurrando os pobres para além dos antigos limites, insuflado pelos recursos do Minha Casa Minha Vida no contexto de total falta de regulação fundiária/imobiliária ou, em outras palavras, de planejamento urbano por parte dos municípios. A especulação corre solta, auxiliada por políticas públicas que identificam valorização imobiliária como progresso.
Ao contrário do silêncio (ou protestos pontuais) que acompanha essa escandalosa especulação que, a partir de 2010, levou à multiplicação dos preços dos imóveis, em todo o país, no centro de São Paulo, foi deflagrada uma guerra de classes.
Não faltaram planos para recuperar o centro tradicional de São Paulo. Desde a gestão do prefeito Faria Lima, vários governos defenderam a promoção de moradia pública na região. Governos tucanos apostaram em estratégias de distinção local por meio de investimento na cultura (como demonstraram muitos trabalhos acadêmicos) Vários museus, salas de espetáculo, centros culturais, edifícios históricos, foram criados ou renovados. No entanto, o mercado imobiliário nunca respondeu ao convite dos diversos governos, de investir na região, seja para um mercado diferenciado, seja para habitação social como pretenderam os governos Erundina e Marta.
Outras localizações (engendradas pelas parcerias estado/capital privado, como demonstrou Mariana Fix) foram mais bem sucedidas como foi o caso da região Berrini/Águas Espraiadas. Outro fator que inibiu a entrada mais decisiva dos empreendedores no centro foi a reduzida dimensão dos terrenos. O mercado imobiliário busca terrenos amplos que permitam a construção de uma ou de várias torres- clube, padrão praticamente generalizado atualmente no Brasil.
Finalmente, há os pobres - com toda a diversidade já exposta - cuja proximidade desvaloriza imóveis novos ou reformados, coerentemente com os valores de uma sociedade que além de patrimonialista (e por isso mesmo) está entre as mais desiguais do mundo. Aceita-se que os pobres ocupem até áreas de proteção ambiental: as Áreas de Proteção dos Mananciais (são quase 2 milhões de habitantes apenas no sul da metrópole), as encostas do Parque Estadual da Serra do Mar, as favelas em áreas de risco, mas não se aceita que ocupem áreas valorizadas pelo mercado, como revela a atual disputa pelo centro.
Enquanto os planos das várias gestões municipais para o centro não deslancharam (leia-se: não interessaram ao mercado imobiliário), os serviços públicos declinaram (o acúmulo de lixo se tornou regra), num contexto já existente de imóveis vazios e moradia precária. O baixo preço do metro quadrado afastou investidores e, mais recentemente, nos últimos anos... também o poder público. Nessa área assim “liberada” e esquecida pelos poderes públicos, os dependentes químicos também se concentraram. No entanto a vitalidade do comércio na região, que inclui um dos maiores centros de venda de computadores e artigos eletrônicos da América Latina, não permite classificar essa área como abandonada, senão pelo falta de serviços públicos de manutenção urbana e políticas sociais.
Frente a isso, a gestão do prefeito Kassab deu continuidade ao projeto NOVA LUZ, iniciado por seu antecessor, José Serra, e vem se empenhando em retirar os obstáculos que afastam o mercado imobiliário de investir na área. Estão previstos a desapropriação de imóveis em dezenas de quadras e o remembramento dos lotes para constituírem grandes terrenos de modo a viabilizar a entrada do mercado imobiliário.
A retomada de recursos de financiamento habitacional com o MCMV, após praticamente duas décadas de baixa produção, muda completamente esse quadro. Os novos lançamentos do mercado imobiliário passam a cercar a região. Vários bairros vizinhos, como a Barra Funda, apresentam um grande número de galpões vazios em terrenos de dimensões atraentes. A ampliação de outro bairro vizinho, Água Branca, vai se constituir em um bairro novo .
Finalmente, o mercado imobiliário e a prefeitura lançam informalmente a ideia de uma fantástica operação urbana que irá ladear a ferrovia começando no bairro da Lapa e estendendo-se até o Brás. O projeto inclui a construção de vias rebaixadas. Todos ficam felizes: empreiteiras de construção pesada, mercado imobiliário, integrantes do executivo e legislativo (que garantem financiamento para suas campanhas eleitorais) e a classe média que ascendeu ao mercado residencial com os subsídios.
O Projeto Nova Luz parece ser a ponta de lança dessa gigantesca operação urbana.
Mas ainda resta um obstáculo a ser removido: os pobres que se apresentam sobre a forma de moradores dos cortiços, moradores de favelas, dependentes de droga, moradores de rua, vendedores ambulantes... Com eles ali, a taxa de lucro que pode ser obtida na venda de imóveis não compensa.
Algumas ações não deixam dúvida sobre as intenções de quem as promove. Um incêndio, cujas causas são ignoradas, atingiu a Favela do Moinho, situada na região central ao lado da ferrovia. Alguns dias depois, numa ação de emergência, a prefeitura contrata a implosão de um edifício no local sob alegação do risco que ele podia oferecer aos trens que passam ali (enquanto os moradores continuavam sem atendimento, ocupando as calçadas da área incendiada). Em seguida os dependentes químicos são literalmente atacados pela polícia sem qualquer diálogo e sem a oferta de qualquer alternativa. (Esperavam que eles fossem evaporar?). Alguns dias depois vários edifícios onde funcionavam bares, pensões, moradias, são fechados pela prefeitura sob alegação de uso irregular. (O restante da cidade vai receber o mesmo tratamento? Quantos usos ilegais há nessa cidade?).
O centro de São Paulo constitui uma região privilegiada em relação ao resto da cidade. Trata-se do ponto de maior mobilidade da metrópole, com seu entroncamento rodo-metro- ferroviário. A partir dali, pode-se acessar qualquer ponto da cidade o que constitui uma característica ímpar se levarmos em conta a trágica situação dos transportes coletivos. Trata-se ainda do local de maior oferta de emprego na região metropolitana. Nele estão importantes museus e salas de espetáculo, bem como universidades, escolas públicas, equipamentos de saúde, sedes do judiciário, órgãos governamentais.
Apenas para dar uma ideia da expectativa em relação ao futuro da região está prevista ali uma Escola de Dança, na vizinhança da Sala São Paulo, cujo projeto, elaborado por renomados arquitetos suíços – autores do arena esportiva chinesa “Ninho de Pássaro” - custou a módica quantia de R$ 20 milhões de acordo com informações da imprensa. É preciso lembrar ainda que infraestrutura local é completa: iluminação pública, calçamento, pavimentação, água e esgoto, drenagem como poucas localizações na cidade.
Trata-se de um patrimônio social já amortizado por décadas de investimento público e privado. A disputa irá definir quem vai se apropriar desse ativo urbano e com que finalidade. A desvalorização de tal ambiente é um fenômeno estritamente ou intrinsecamente capitalista, como já apontou David Harvey analisando outros processos de “renovação” de centros de cidades americanas.
A luta pela Constituição Federal de 1988 e a regulamentação de seus artigos 182 e 183, que gerou o Estatuto da Cidade, se inspirou, em parte, na possibilidade de utilizar imóveis vazios em centros urbanos antigos para moradia social. Nessas áreas ditas “deterioradas” está a única alternativa dos pobres vivenciarem o “direito à cidade” pois de um modo geral, eles são expulsos para fora da mesma. Executivos e legislativos evitam aplicar leis tão avançadas. O judiciário parece esquecer-se de que o direito à moradia é absoluto em nossa Carta Magna enquanto que o direito à propriedade é relativo, à função social. (Escrevo essas linhas enquanto decisão judicial autorizou o despejo –que se fez de surpresa e de forma violenta- de mais de 1.600 famílias de uma área cujo proprietário – Naji Nahas - deve 15 milhões em IPTU, ao município de São José dos Campos. Antes de mais nada, é preciso ver se ele era mesmo proprietário da terra, já que no Brasil, a fraude registraria de grandes terrenos é mais regra que exceção, e depois verificar se ela estava ou não cumprindo a função social).
É óbvio, que o caso que nos ocupa aqui mostra a falta de compaixão, de solidariedade, de espírito público. Crianças moram em péssimas condições nos cortiços, em cômodos insalubres, dividem banheiros imundos com um grande número de adultos (quando há banheiros). Com os despejos violentos são remetidas para uma condição ainda pior de moradia pelo Estado que , legalmente, deveria responder pela solução do problema. Num mundo com tantas conquistas científicas e tecnológicas, dependentes químicos são tratados com balas de borracha e spray de pimenta para se dispersarem. Um comércio dinâmico, formado por pequenas empresas e ambulantes, que poderia ter apoio para a sua legalização, organização e inovação é visto como atrasado e indesejável. O modelo perseguido é o do shopping center, o monopólio, e não o pequeno e vivo comércio de rua ou o boteco da esquina.
O modelo é contra os pobres que estão longe de constituírem minoria em nossa sociedade. O modelo quer os pobres fora do centro como anunciou o jornal Brasil de Fato. Tudo isso é óbvio. O que não parece ser óbvio é que, em última instância, como diria Althusser, a determinação disso tudo é econômica. A centralidade é a produção do espaço urbano e a mola propulsora, a renda imobiliária. E depois dizem que Marx está morto.
Ermínia Maricato é urbanista.
Fonte: www.cartamaior.com.br/
Meu nome é Clay? Qual é meu nome, idiota? - por Igor Ojeda
Meu nome é Clay? Qual é meu nome, idiota?
Entrevista com o cronista Dave Zirin sobre o livro que tem como personagem central Muhammad Ali, que completou 70 anos esta semana
“Se eu ganhasse um dólar por cada coisa que há de errado no esporte, Bill Gates seria meu mordomo”, disse certa vez o cronista esportivo estadunidense Dave Zirin. Vivendo em Washington, capital dos Estados Unidos, Zirin se diferencia da imensa maioria dos colegas de profissão por seu estilo contestador. Critica o esporte como negócio e seu uso por políticos oportunistas. Sobretudo, abomina a mídia esportiva de seu país que, de tão corporativa, “diminui os esportistas que expressam opiniões políticas”. Segundo ele, nunca houve espaço nos jornais para demonstrações de resistência, ou para manifestações radicais no setor esportivo. São histórias muitas vezes escondidas, “pela mesma razão que a maioria das histórias de radicalismo nos EUA está escondida”. Mas Zirin se propõe a trazê-las à luz. Pela editora Haymarket Books (www.haymarketbooks.org), lançou o livro What’s my name, fool? Resistance in the United States (em tradução livre, Qual é meu nome, idiota? Esportes e resistência nos Estados Unidos). Na obra, resgata exemplos de resistência no esporte desde o começo do século 20 até os dias atuais. Exemplos como o de Marvin Miller, pioneiro na conquista de benefícios, pensões e melhores condições de trabalho para jogadores de beisebol na década de 1960. Ou como o de Jackie Robinson, primeiro negro a ingressar na liga profissional de beisebol, em 1947. Ou ainda como o de Pat Tillman, jogador de futebol americano do Arizona Cardinals que, apesar de voluntário para lutar no Afeganistão depois dos atentados de 11 de setembro de 2001, recusou inúmeros convites do governo para fazer comerciais incentivando o alistamento. Mas, principalmente, exemplos como o de Muhammad Ali, campeão mundial de boxe que está semana completaria 70 anos e que, nos anos 1960, criou comoção nacional ao aderir à luta dos negros estadunidenses e ao movimento antiguerra – e que, além de tudo, inspirou o título do livro. Mas essa é uma história para o próprio Dave Zirin contar.Muhammad Ali, o atleta mais polêmico de sua época
Brasil de Fato – Esporte e política podem vir juntos? Devem vir juntos? Por quê?
Dave Zirin – O fato é que esporte já é muito político, queiramos admitir ou não. Os políticos usam o esporte como uma boa oportunidade de foto e também durante os ciclos eleitorais. Estádios foram construídos nos EUA com dinheiro dos contribuintes. O Pentágono tem acordos comerciais com todas as grandes ligas para estimular o recrutamento: as Forças Armadas são um dos maiores patrocinadores das ligas de beisebol e futebol americano. Lembre-se que esporte, nos EUA, é um negócio de 220 bilhões de dólares, mais lucrativo que o aço estadunidense. É um processo muito político. O meu objetivo com o livro é lembrar a tradição radical nos esportes para se contrapor à “política de sempre” nas ligas profissionais.
Por que o seu interesse por esse assunto?
Eu amo esportes. Sou um enorme fã da arte, da competição e da beleza nas disputas atléticas. Mas estou cheio e cansado de que os jogos que amo sejam usados como instrumentos para uma agenda que acho repulsiva.
Que tipo de agenda?
Por exemplo, o ufanismo e a transformação da mulher em objeto.
Que tipo de leitor você pretendia atingir com seu livro? Atletas, pessoas de esquerda, fãs de esportes em geral?
Eu queria que esse livro fosse lido por fãs de esportes que odeiam política e ativistas que odeiam esportes. Parece que vem cumprindo as duas metas, o que é muito excitante.
Você disse em uma entrevista que seu livro é sobre histórias escondidas de resistência. Por que essas histórias foram escondidas?
Elas estão escondidas pela mesma razão que a maioria das histórias de radicalismo nos EUA está escondida. Os EUA têm uma enorme tradição de lutas laborais, anti-racistas, batalhas contra opressão e por justiça social. O problema é que a mídia esportiva estadunidense é tão corporativa que sobra muito pouco oxigênio para contar a história esportiva de um povo.
Foi muito difícil pesquisar para o livro, já que as histórias são secretas?
Algumas histórias foram muito difíceis de trazer à luz, mas as entrevistas ajudaram muito. Eu entrevistei pessoas como o cronista esportivo radical dos anos 1930 Lester “Red” Rodney (editor de esportes do jornal do Partido Comunista The Daily Worker, que, nos anos 1930 usou a publicação como um centro organizativo da luta pela integração racial no beisebol) e o atleta olímpico John Carlos (velocista medalha de bronze nas Olimpíadas de 1968, na Cidade do México, que, junto com Tommie Smith, medalha de ouro, subiu ao pódio erguendo o braço direito com as mãos cerradas e vestidas com luvas negras, em um gesto típico dos Panteras Negras, grupo político radical de defesa dos negros nos EUA). Eles me contaram suas histórias sem filtro.Atletas fazem um gesto típico dos Panteras Negras - Foto: Divulgação
Muhammad Ali é o personagem central do livro. Por quê? Ele é o personagem central da resistência política nos esportes nos EUA?
Esse livro é sobre a intersecção entre esporte e política radical. E o ponto alto dessa história é o momento quando o campeão mundial peso-pesado de boxe tinha um pé na luta pela liberdade dos negros e um pé no movimento antiguerra (Ali recusou- se a lutar na Guerra do Vietnã). Essa é a história do grande Muhammad Ali, a pessoa a quem de fato devo o título de meu livro. Hoje fica difícil de imaginar, pois sua imagem é usada para vender de tudo, de Sprite a Microsoft, mas nos anos 1960 Ali foi o atleta mais polarizador, caluniado e destacado do planeta. O campeão tornou pública sua jornada política quando começou uma amizade com Malcolm X (líder do Movimento dos Muçulmanos Negros e mais tarde criador da organização Unidade Afro-Americana, não-religiosa e de inspiração socialista. Foi assassinado em fevereiro de 1965, com 13 tiros) e mudou seu nome de Cassius Clay primeiro para Cassius X e depois para Muhammad Ali. Não há palavras para descrever a tempestade que isso causou. O campeão dos peso-pesados, supostamente um símbolo da bandeira vermelha, branca e azul dos EUA, entra no Movimento dos Muçulmanos Negros, organização de Malcolm X que, de forma não-apologética, acreditava na violência dos negros em defesa própria. Se quiser pensar em uma comparação com os dias de hoje, imagine a filha de George W. Bush, Jenna Bush, casada com John Walker Lindh (jovem estadunidense preso em 2001 por lutar ao lado dos talebãs no Afeganistão).
E por que o título What´s my name, fool? (Qual é meu nome, idiota?)?
Chamar o campeão de Clay ou Ali dizia tudo sobre você. Dizia de que lado você estava na luta pela libertação dos negros, nas batalhas pelo direito à expressão e, em breve, na Guerra do Vietnã (1965-1975). Essa controvérsia sobre o nome alcançou seu auge em novembro de 1965, quando Ali lutou contra o patrioticamente e orgulhosamente chamado Floyd Patterson, boxeador que já havia sido duas vezes campeão mundial. Na coletiva de imprensa pré-luta, Patterson disse: “Esta luta é uma cruzada para recuperar o título dos muçulmanos negros. Como um católico, estou lutando contra Clay – e, sim, seu nome é Clay – como um dever patriótico para devolver a coroa para a América”. Ali prolongou a luta e golpeou Patterson brutalmente por nove rounds, gritando “Vamos América! Vamos, América Branca! Qual é meu nome? Meu nome é Clay? Qual é meu nome, idiota?” “Qual é meu nome, idiota?” foi uma declaração, um aviso de que uma voz emergente não seria silenciada.
Como foi a reação da sociedade e da mídia estadunidense aos exemplos de resistência no esporte?
Sempre depende do quão grandes são os movimentos sociais nos EUA. A mídia, quase de forma uniforme, diminui os esportistas que expressam opiniões políticas, principalmente se por trás do que eles falam há um movimento social avançado, ou se abraçam campanhas por justiça.
Parece que muitos dos exemplos de resistência no esporte têm um forte componente racial. É isso mesmo? Por quê?
Alguns têm. Isso acontece pelo modo como esporte e raça funcionam nos EUA. Esporte, na teoria, é um campo onde todos são iguais, então é um lugar onde os povos chamados “inferiores” podem desafiar ideias racistas em um ambiente muito público.
A Olimpíada é o melhor momento para protestar, como fizeram os Panteras Negras em 1968?
A Olimpíada é certamente o evento esportivo mais político e global do mundo. Então se torna uma plataforma onde os atletas podem expressar suas visões.
Você pretende um dia pesquisar histórias de resistência no esporte que aconteceram em outros países?
Certamente espero fazer isso em meus livros futuros, em especial pesquisar a função do futebol na Europa, África e América Latina.
Qual será o tema de seu próximo livro?
Quero pesquisar sobre futebol e movimentos sociais.
QUEM É
O cronista esportivo estadunidense Dave Zirin é editor do Prince George’s Post (jornal do condado de Prince George, em Maryland), onde escreve a coluna semanal Edge of Sports (EdgeOfSports.com). Colabora regularmente como comentarista esportivo no programa da rádio Air América “So What Else Is News”, que se propõe a desconstruir as notícias veiculadas pela mídia corporativa, e na revista Slam Magazine, especializada em basquete.
Fonte:http:www.brasildefato.com.br
Entrevista com o cronista Dave Zirin sobre o livro que tem como personagem central Muhammad Ali, que completou 70 anos esta semana
“Se eu ganhasse um dólar por cada coisa que há de errado no esporte, Bill Gates seria meu mordomo”, disse certa vez o cronista esportivo estadunidense Dave Zirin. Vivendo em Washington, capital dos Estados Unidos, Zirin se diferencia da imensa maioria dos colegas de profissão por seu estilo contestador. Critica o esporte como negócio e seu uso por políticos oportunistas. Sobretudo, abomina a mídia esportiva de seu país que, de tão corporativa, “diminui os esportistas que expressam opiniões políticas”. Segundo ele, nunca houve espaço nos jornais para demonstrações de resistência, ou para manifestações radicais no setor esportivo. São histórias muitas vezes escondidas, “pela mesma razão que a maioria das histórias de radicalismo nos EUA está escondida”. Mas Zirin se propõe a trazê-las à luz. Pela editora Haymarket Books (www.haymarketbooks.org), lançou o livro What’s my name, fool? Resistance in the United States (em tradução livre, Qual é meu nome, idiota? Esportes e resistência nos Estados Unidos). Na obra, resgata exemplos de resistência no esporte desde o começo do século 20 até os dias atuais. Exemplos como o de Marvin Miller, pioneiro na conquista de benefícios, pensões e melhores condições de trabalho para jogadores de beisebol na década de 1960. Ou como o de Jackie Robinson, primeiro negro a ingressar na liga profissional de beisebol, em 1947. Ou ainda como o de Pat Tillman, jogador de futebol americano do Arizona Cardinals que, apesar de voluntário para lutar no Afeganistão depois dos atentados de 11 de setembro de 2001, recusou inúmeros convites do governo para fazer comerciais incentivando o alistamento. Mas, principalmente, exemplos como o de Muhammad Ali, campeão mundial de boxe que está semana completaria 70 anos e que, nos anos 1960, criou comoção nacional ao aderir à luta dos negros estadunidenses e ao movimento antiguerra – e que, além de tudo, inspirou o título do livro. Mas essa é uma história para o próprio Dave Zirin contar.Muhammad Ali, o atleta mais polêmico de sua época
Brasil de Fato – Esporte e política podem vir juntos? Devem vir juntos? Por quê?
Dave Zirin – O fato é que esporte já é muito político, queiramos admitir ou não. Os políticos usam o esporte como uma boa oportunidade de foto e também durante os ciclos eleitorais. Estádios foram construídos nos EUA com dinheiro dos contribuintes. O Pentágono tem acordos comerciais com todas as grandes ligas para estimular o recrutamento: as Forças Armadas são um dos maiores patrocinadores das ligas de beisebol e futebol americano. Lembre-se que esporte, nos EUA, é um negócio de 220 bilhões de dólares, mais lucrativo que o aço estadunidense. É um processo muito político. O meu objetivo com o livro é lembrar a tradição radical nos esportes para se contrapor à “política de sempre” nas ligas profissionais.
Por que o seu interesse por esse assunto?
Eu amo esportes. Sou um enorme fã da arte, da competição e da beleza nas disputas atléticas. Mas estou cheio e cansado de que os jogos que amo sejam usados como instrumentos para uma agenda que acho repulsiva.
Que tipo de agenda?
Por exemplo, o ufanismo e a transformação da mulher em objeto.
Que tipo de leitor você pretendia atingir com seu livro? Atletas, pessoas de esquerda, fãs de esportes em geral?
Eu queria que esse livro fosse lido por fãs de esportes que odeiam política e ativistas que odeiam esportes. Parece que vem cumprindo as duas metas, o que é muito excitante.
Você disse em uma entrevista que seu livro é sobre histórias escondidas de resistência. Por que essas histórias foram escondidas?
Elas estão escondidas pela mesma razão que a maioria das histórias de radicalismo nos EUA está escondida. Os EUA têm uma enorme tradição de lutas laborais, anti-racistas, batalhas contra opressão e por justiça social. O problema é que a mídia esportiva estadunidense é tão corporativa que sobra muito pouco oxigênio para contar a história esportiva de um povo.
Foi muito difícil pesquisar para o livro, já que as histórias são secretas?
Algumas histórias foram muito difíceis de trazer à luz, mas as entrevistas ajudaram muito. Eu entrevistei pessoas como o cronista esportivo radical dos anos 1930 Lester “Red” Rodney (editor de esportes do jornal do Partido Comunista The Daily Worker, que, nos anos 1930 usou a publicação como um centro organizativo da luta pela integração racial no beisebol) e o atleta olímpico John Carlos (velocista medalha de bronze nas Olimpíadas de 1968, na Cidade do México, que, junto com Tommie Smith, medalha de ouro, subiu ao pódio erguendo o braço direito com as mãos cerradas e vestidas com luvas negras, em um gesto típico dos Panteras Negras, grupo político radical de defesa dos negros nos EUA). Eles me contaram suas histórias sem filtro.Atletas fazem um gesto típico dos Panteras Negras - Foto: Divulgação
Muhammad Ali é o personagem central do livro. Por quê? Ele é o personagem central da resistência política nos esportes nos EUA?
Esse livro é sobre a intersecção entre esporte e política radical. E o ponto alto dessa história é o momento quando o campeão mundial peso-pesado de boxe tinha um pé na luta pela liberdade dos negros e um pé no movimento antiguerra (Ali recusou- se a lutar na Guerra do Vietnã). Essa é a história do grande Muhammad Ali, a pessoa a quem de fato devo o título de meu livro. Hoje fica difícil de imaginar, pois sua imagem é usada para vender de tudo, de Sprite a Microsoft, mas nos anos 1960 Ali foi o atleta mais polarizador, caluniado e destacado do planeta. O campeão tornou pública sua jornada política quando começou uma amizade com Malcolm X (líder do Movimento dos Muçulmanos Negros e mais tarde criador da organização Unidade Afro-Americana, não-religiosa e de inspiração socialista. Foi assassinado em fevereiro de 1965, com 13 tiros) e mudou seu nome de Cassius Clay primeiro para Cassius X e depois para Muhammad Ali. Não há palavras para descrever a tempestade que isso causou. O campeão dos peso-pesados, supostamente um símbolo da bandeira vermelha, branca e azul dos EUA, entra no Movimento dos Muçulmanos Negros, organização de Malcolm X que, de forma não-apologética, acreditava na violência dos negros em defesa própria. Se quiser pensar em uma comparação com os dias de hoje, imagine a filha de George W. Bush, Jenna Bush, casada com John Walker Lindh (jovem estadunidense preso em 2001 por lutar ao lado dos talebãs no Afeganistão).
E por que o título What´s my name, fool? (Qual é meu nome, idiota?)?
Chamar o campeão de Clay ou Ali dizia tudo sobre você. Dizia de que lado você estava na luta pela libertação dos negros, nas batalhas pelo direito à expressão e, em breve, na Guerra do Vietnã (1965-1975). Essa controvérsia sobre o nome alcançou seu auge em novembro de 1965, quando Ali lutou contra o patrioticamente e orgulhosamente chamado Floyd Patterson, boxeador que já havia sido duas vezes campeão mundial. Na coletiva de imprensa pré-luta, Patterson disse: “Esta luta é uma cruzada para recuperar o título dos muçulmanos negros. Como um católico, estou lutando contra Clay – e, sim, seu nome é Clay – como um dever patriótico para devolver a coroa para a América”. Ali prolongou a luta e golpeou Patterson brutalmente por nove rounds, gritando “Vamos América! Vamos, América Branca! Qual é meu nome? Meu nome é Clay? Qual é meu nome, idiota?” “Qual é meu nome, idiota?” foi uma declaração, um aviso de que uma voz emergente não seria silenciada.
Como foi a reação da sociedade e da mídia estadunidense aos exemplos de resistência no esporte?
Sempre depende do quão grandes são os movimentos sociais nos EUA. A mídia, quase de forma uniforme, diminui os esportistas que expressam opiniões políticas, principalmente se por trás do que eles falam há um movimento social avançado, ou se abraçam campanhas por justiça.
Parece que muitos dos exemplos de resistência no esporte têm um forte componente racial. É isso mesmo? Por quê?
Alguns têm. Isso acontece pelo modo como esporte e raça funcionam nos EUA. Esporte, na teoria, é um campo onde todos são iguais, então é um lugar onde os povos chamados “inferiores” podem desafiar ideias racistas em um ambiente muito público.
A Olimpíada é o melhor momento para protestar, como fizeram os Panteras Negras em 1968?
A Olimpíada é certamente o evento esportivo mais político e global do mundo. Então se torna uma plataforma onde os atletas podem expressar suas visões.
Você pretende um dia pesquisar histórias de resistência no esporte que aconteceram em outros países?
Certamente espero fazer isso em meus livros futuros, em especial pesquisar a função do futebol na Europa, África e América Latina.
Qual será o tema de seu próximo livro?
Quero pesquisar sobre futebol e movimentos sociais.
QUEM É
O cronista esportivo estadunidense Dave Zirin é editor do Prince George’s Post (jornal do condado de Prince George, em Maryland), onde escreve a coluna semanal Edge of Sports (EdgeOfSports.com). Colabora regularmente como comentarista esportivo no programa da rádio Air América “So What Else Is News”, que se propõe a desconstruir as notícias veiculadas pela mídia corporativa, e na revista Slam Magazine, especializada em basquete.
Fonte:http:www.brasildefato.com.br
Irã: quando será a nova guerra? - por Francisco Carlos Teixeira da Silva (*)
Irã: quando será a nova guerra?As condições geopolíticas da região – incluindo aí todo o Oriente Médio e áreas adjacentes – mudam a cada dia ( em parte em função das revoltas populares em curso ), com conseqüências que só podemos com dificuldade avaliar. Contudo, o risco de uma crise que escale em proporções militares generalizadas é real. De certo ponto de vista a guerra já começou, num estilo novo, de guerra “encoberta e psicológica".
A situação política e militar na região do Golfo Pérsico, em especial junto ao Estreito de Hormuz, chegou nestes últimos dias a um ponto de altíssima tensão. Um conjunto de medidas políticas, militares e econômicas tomadas pelos Estados Unidos, União Européia, Japão, Coréia do Sul e Austrália colocam o Irã na mais delicada situação desde o ataque americano ao Iraque em 2003. As condições geopolíticas da região – incluindo aí todo o Oriente Médio e áreas adjacentes – mudam a cada dia ( em parte em função das revoltas populares em curso ), com conseqüências que só podemos com dificuldade avaliar. Contudo, o risco de uma crise que escale em proporções militares generalizadas é real. De certo ponto de vista a guerra já começou, num estilo novo, de guerra “encoberta e psicológica".
Da guerra “encoberta” a guerra psicológica
Nos últimos meses quatro importantes cientistas nucleares iranianos – acadêmicos, de formação universitária e civil – foram mortos por atentados terroristas no próprio Irã. Da mesma forma, várias unidades nucleares iranianas (e outras instituições de pesquisa e financeiras) foram atingidas por ataques cibernéticos de origem desconhecida, com graves prejuízos para os trabalhos em curso. Os analistas internacionais, mesmo os americanos e israelenses mais próximos de seus governos, não negam a provável origem americana e/ou israelense de tais procedimentos. Chegou-se mesmo a avocar uma categoria especial de conflito não-declarado: a guerra encoberta. Ambos os países, EUA e Israel, possuem meios e interesses que se coadunam claramente com o desenho dos ataques contra a inteligência nuclear iraniana.
A estes ataques somar-se-iam uma série de medidas de restrição e boicote econômico e financeiro decidido ora no âmbito do Conselho de Segurança da ONU (com abstenção da China Popular e da Federação Russa), ora no âmbito de alianças especificas, como a NATO ou OTAN. Até esta semana a União Européia, em grave crise financeira e com altíssimos índices de desemprego, estava recusando, ou adiando, uma clara adesão ao boicote econômico proposto pelos EUA contra o Irã. No entanto, esta semana (20/01/2012), a União Européia declarou adesão ampla ao bloqueio, decidindo encerrar suas compras de petróleo iraniano até o dia 1 de julho de 2012. Os três principais compradores – Grécia, Itália e Espanha, justamente países mais fortemente atingidos pela crise financeira – devem encerrar seus contratos com Irã, sob garantia de que a Arábia Saudita – um oponente sunita do Irã - fornecerá petróleo pelo mesmo preço e sem alterações, mesmo que a crise leve o preço do barril a novos patamares.
Japão e Coréia do Sul, ambos grandes compradores, já haviam declarado sua adesão na semana anterior e no final do dia (22/01/2012) a Austrália aderiu ao boicote.
Além disso, a Secretaria do Tesouro dos EUA declarou embargo contra o banco central do Irã, três dos seus maiores bancos privados e várias empresas de petróleo e petroquímicas. Isso impede que façam negócios com empresas americanas ou com empresas não-americanas, mas que também negociem com os EUA. Assim, quinhentas instituições e pessoas no Irã foram “bloqueadas” pelos EUA.
A inusitada unanimidade entre os aliados ocidentais foi desenhada através de um giro mundial do secretário (ministro) do Tesouro dos EUA, Thimoty Geither, por vários países. Desenha-se assim uma atuação consistente e sistêmica de Washington visando à asfixia econômica do país.
Ao mesmo tempo o Chefe da Junta de Chefes do Estado-Maior norte-americano, general Martin Dempsey, deslocou-se para Israel e teve longos e fraternos encontros com a cúpula militar israelense – o assunto central era o “risco Irã”. Enquanto isso o porta-aviões “USS Abraham Lincoln” (navio aeródromo de propulsão nuclear, com cerca de 90 aviões e helicópteros de combate e cinco mil homens) foi deslocado para a ultra-sensível Estreito de Hormuz, com uma escolta de navios de guerra da Inglaterra e França. No Golfo Pérsico já se encontra a Va. Frota dos EUA.
Cria-se um possível ambiente de guerra na região.
A posição do Irã
O Irã negocia, ou negociou, com o Ocidente em três frentes diversas: no próprio Conselho de Segurança da ONU, em conversações com a União Européia em Istambul, na Turquia, e na mesma cidade, com o Brasil e a própria Turquia, como mediadores para uma solução negociada do controverso programa nuclear do país.
Desde 2011 o Irã opera com 40% da sua capacidade (de 1000 megawatts) uma usina nuclear na região de Bushsher (com assistência inicial das firmas alemãs Siemens e Telefunken, e mais tarde da empresa russa Atomstroyexport e RosTom, com algumas centenas de técnicos russos).
Segundo a Agência Internacional de Energia Atômica/AIEA, órgão assessor da ONU com sede em Viena, a usina de Bushsher possui “possible military dimension” e o Irã estaria “desenvolvendo atividades relevantes para dotar-se de uma capacidade nuclear”. Ao mesmo tempo a AIEA acusa o país de manter parte de seu programa, perto da cidade de Qom, secreto e sem acesso aos inspetores da AIEA. Da mesma forma declara ter “detectado” esforços na direção de testar dispositivos de gatilho que podem ser usados em armas nucleares. De posse de tais evidências solicita, de forma enérgica, que o Irã assine o “Protocolo Adicional” do Tratado de Não-Proliferação Nuclear/TNP, que permite inspeções internacionais das plantas de um país, com aviso prévio de apenas 24 horas e sem limites de acesso.
O Irã insiste que seu programa é pacífico, visa à produção de energia eletrifica – mais limpa e mais barata do que o petróleo, que seria reservado para as exportações gerando divisas para o desenvolvimento do país. Além disso, precisa da energia nuclear para fins médicos, como qualquer país. Cabe ainda destacar que a região geopolítica do Irã é altamente “nuclearizada”: os vizinhos orientais do país – Paquistão e Índia, são potências nucleares; o vizinho norte, no Cáspio, é a Rússia e a ocidente Israel é dotado de pelo menos 200 ogivas nucleares. Além disso, a Va. Frota dos EUA, estacionada no Golfo Pérsico, é dotada de capacidade nuclear. Assim, a proposta do então presidente Lula de uma “zona desnuclearizada” (como a América Latina o é) não parece realista.
As conversações com a U.E. em Istambul não resultaram em qualquer avanço, posto que o Irã não mostrasse interesse em acessar o conjunto de suas instalações nucleares aos inspetores internacionais e a U.E., por sua vez, assumiu uma posição fundamentalista, exigindo a assinatura do Protocolo Adicional e livre acesso ao conjunto das instalações locais. Cabe lembrar, que o primeiro inspetor chefe da AIEA, e embaixador da Austrália na ONU (o senhor Richard Buttler), ao examinar as instalações iraquianas – em busca das míticas “armas de destruição em massa” – passava informações estratégicas diretamente aos governos dos EUA e de Israel, antes mesmo de enviar seu relatório a AIEA ou a ONU. Da mesma forma Hans Blix e Mohammad El-Baradei (este atual carta política dos EUA na “Primavera Egípcia”) jamais conseguiram dizer, com clareza, se o Iraque possuía ou não armas de destruição em massa. Ou seja, o passado das inspeções da AIEA é, no mínimo, duvidoso.
O acordo assinado com o Brasil e a Turquia – sob incentivo direto do Presidente Obama – foi desconsiderado por Washington, que o declarou insuficiente. Na verdade, Obama viu-se em choque direto com a Secretaria de Estado e de Defesa, e, isolado, para manter a face recusou o acordo que ele mesmo pediu ao Brasil para negociar.
O que mais complica o quadro acima é que a maioria da população iraniana – cerca de 68 milhões de pessoas, num país do tamanho do estado do Amazonas - concorda, neste ponto, com o governo Ahmandinejad: Teerã tem direitos iguais a de qualquer país, digamos como o Brasil, de se dotar de tecnologia nuclear sem ser tutelado pelas potências ocidentais. Mesmo a oposição interna defende o desenvolvimento da tecnologia nuclear e afirma que o Ocidente fortalece Ahmandinejad ao ameaçar o país com boicotes e sanções.
Por que uns podem e o Irã não pode?
Este tem sido um argumento muito usado pelo governo de Teerã para caracterizar a injustiça das medidas da AIEA, da ONU e das potências ocidentais sobre o seu programa nuclear. Há aqui casos e casos. O mais notável é de países como Israel – com suas duas centrais nucleares em Dimona, no Deserto do Neguev e um possível arsenal de 200 ogivas atômicas. Ou ainda a Índia, com um não-calculado arsenal nuclear (ao menos 40 ogivas) e poderosos vetores de ataque (a performática aviação militar indu e os mísseis de longo alcance “Agni”). Com este último país a Administração Obama assinou acordos de ampla cooperação, inclusive no campo nuclear e com Israel, é claro, trata-se de um aliado, destino da maior ajuda militar e econômica dos EUA.
A resposta para os diferentes tratamentos é clara e direta: ambos os países são democracias consolidadas, que respeitam os acordos internacionais e os direitos humanos. Enquanto isso o Irã é uma ditadura religiosa, falsificou os resultados das últimas eleições presidenciais (em junho de 2009, quando Ahmandinejad foi reeleito), massacrou e torturou a oposição democrática no interior do país e adotou medidas brutais contra seus próprios cidadãos – como o apedrejamento de mulheres ou o enforcamento de homossexuais. Além disso, o Irã apóia, financia e arma redes “terroristas internacionais”, como o Hezbollah no Líbano e a Milícia do Mahdi (xiita radical) no Iraque. Com tais diferenças notáveis o Irã não seria um país confiável na comunidade internacional para poder dotar-se de armas nucleares.
Bem, sempre podemos discutir se Israel respeita os tratados e acordos internacionais (Israel é o segundo país do mundo, depois do Marrocos, a descumprir decisões da ONU) e já usou, e usa, meios como assassinatos seletivos em territórios estrangeiros, como no Kuwait, Turquia, Jordânia e no prórpio Irã. Mas, sem dúvida, Israel é um país institucionalmente estabelecido e não apedreja pessoas, não estupra presos políticos ou enforca diferentes em praça pública...
Cabe destacar que mais de cinqüenta países possuem, hoje, capacidade de desenvolver tecnologia nuclear e os limites entre pesquisa nuclear para “fins pacíficos” e o desenvolvimento de armas é bastante tênue. Entre os países que se recusam assinar o Protocolo Adicional do TNP estão aliados dos Estados Unidos, tais como Índia e Paquistão. E é claro, Alemanha, Japão, Canadá, Coréia do Sul, Egito ou Turquia podem desenvolver armas nucleares assim o que queiram. O caso mais significativo é do Brasil: o país possui hoje capacidade nuclear plena, tecnologia própria de enriquecimento de combustível (em Rezende, RJ) e se nega a assinar o Protocolo Adicional, considerado um mecanismo de espionagem industrial das grandes potências. Bem, tratam-se de países “sérios”, democracias que cumprem seus contratos internacionais.
Mas, existe um outro caso: Paquistão e Coréia do Norte. No primeiro caso trata-se de um país de grave instabilidade interna, onde o ISIS, o serviço de espionagem das FFAA é praticamente um Estado dentro do Estado. A situação dos direitos humanos no país é lamentável, com militantes humanistas ou religiosos cristãos ou xiitas mortos dentro de seus templos. Lá estava ocultado, sem incômodos, Bin Laden e de lá partem organizações terroristas para atacar hotéis e mercados na Índia ou mesmo tropas dos Estados Unidos no Afeganistão. Contudo, os Estados Unidos, a AIEA ou o Conselho de Segurança da ONU não boicotam o Paquistão. Pior ainda é o caso da Coréia do Norte: uma ditadura ridícula, com brutal repressão da população, com gastos miliatres que geram ondas de fome que matam milhares de pessoas por ano. O país é dotado de mísseis que podem arrasar Seul ou cerca de dez cidades do Japão com mais de três milhões de habitantes e fez testes nucleares (de difícil operação tática). Contudo, no caso da Coréia do Norte os Estados Unidos preferem negociar.
Em suma, o Irã é um caso especial, escolhido como exemplo. Dois fatores podem explicar a decisão de dobrar o Irã: sua produção de petróleo, essencial (como no caso da Líbia) para a sobrevivência econômica do Ocidente e, por outro lado, sua insistente política anti-Israel.
Como seria a guerra?
É pouco provável que os Estados Unidos pretendam invadir o Irã. Este não é um cenário provável. Depois dos envolvimentos americanos no Afeganistão, em 2001 (com 2876 baixas ocidentais, das quais 1886 norte-americanas até janeiro de 2012), e no Iraque, em 2003 (com 4484 mortes norte-americanas) – sem falar nos milhares de civis locais mortos – não parece ser a invasão (tipo “boots on the ground”) uma opção para a Administração Obama. Na verdade Obama se esforçou, até o momento, para “cumprir as tarefas” auto-impostas na campanha eleitoral: matou Bin Laden numa operação de vídeo-game; e fez a retirada das tropas do Iraque e se prepara para fazer o mesmo no Afeganistão. Assim, não é o caso de mandar mais “american boys” morreram em algum lugar estranho do mundo...
A solução estaria em combinar a “guerra encoberta” – assassinatos e sabotagens – com a guerra “econômica e psicológica” para levar o Irã a capitular. Caso tais medidas não resultem nos objetivos propostos, teríamos o “Plano B”. Alguns conselheiros de Obama, como o “superfalcão” Matthew Kroenig advogam uma guerra de tipo “surgical strikes”. Trata-se do uso da superioridade aérea dos Estados Unidos (e de Israel), com aviação, mísseis e dromes diretamente contra as instalações nucleares iranianas em Natanz, Esfahan, Bushsher, Arak, Fordo e nos subúrbios de Teerã. Mesmo que as instalações estejam em bunkers subterrâneos – muitos há quinze metros de profundidade e com casamatas de concreto reforçado – os EUA usariam armas do tipo “Massive Ordnance Penetrator”, capazes de perfurar tais instalações.
Como se justificaria o ataque? Neste caso existem algumas possibilidades previstas, a saber: 1. Conflito direto EUA-Irã, sem a presença de Israel (em respeito aos aliados árabes): qualquer incidente no Estreito de Hormuz ou no Golfo Pérsico, onde os EUA concentraram grande parte de seus navios da Va. Frota pode seria o estopim. Caberiam mesmo simulações, como o “inventado” incidente do Golfo de Tonquim, que serviu de justificativa para os bombardeios de Hanói e Haiphong em 1964; 2. Uma ação descontrolada de uma das instâncias de poder em Teerã, como a Guarda da Revolução Islâmica contra interesses ocidentais – como o fluxo de petróleo no Estreito de Hormuz - e que acabaria sendo respondida por uma ação bélica generalizada; 3. Uma ação de Israel, contra instalações ou cientistas nucleares iranianos, que seria respondida pelos iranianos. Neste caso os EUA iriam em defesa do aliado israelense... e com apoio da opinião pública americana.
Nos três casos a guerra seria longa e penosa, como na Líbia, mas com maior capacidade de resposta por parte dos iranianos. Não bastaria o ataque aos centros nucleares – com risco de converter-se numa “bomba suja”. Seria necessário atacar toda a defesa iraniana, espalhada por um país imenso, montanhoso e com longo litoral.
A dificuldade de tais “pré-cenários” reside em saber a possibilidade de resposta do Irã. O país é dotado de mísseis de médio e longo alcance, capazes de atingir todo o território de Israel, incluindo aí as centrais nucleares de Dimona. Além disso, as tropas americanas no Iraque, Bahrein, Kuwait e Arábia Saudita poderiam ser duramente atingidas. O fluxo do petróleo poderia ser paralisado, mesmo que por algumas semanas, o que chutaria o preço do barril para a casa dos 200 dólares, causando grande dano ao conjunto da economia mundial (já fragilizada). Além disso, os aliados do Irã, como o Hezbollah e o Hamas poderiam lançar graves ataques contra Israel e os aliados dos EUA.
Em suma, as possibilidades de uma nova guerra são reais, mas de conseqüências imprevisíveis, o que faz a decisão ser muito difícil para a Administração Obama. No entanto, estamos num ano eleitoral. Os falcões ultraconservadores do Partido Republicano mordem os calcanhares de Obama... Na tradição americana, presidentes em guerra não perdem eleições!
(*) Professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)
Fonte: http://www.cartamaior.com.br/
A situação política e militar na região do Golfo Pérsico, em especial junto ao Estreito de Hormuz, chegou nestes últimos dias a um ponto de altíssima tensão. Um conjunto de medidas políticas, militares e econômicas tomadas pelos Estados Unidos, União Européia, Japão, Coréia do Sul e Austrália colocam o Irã na mais delicada situação desde o ataque americano ao Iraque em 2003. As condições geopolíticas da região – incluindo aí todo o Oriente Médio e áreas adjacentes – mudam a cada dia ( em parte em função das revoltas populares em curso ), com conseqüências que só podemos com dificuldade avaliar. Contudo, o risco de uma crise que escale em proporções militares generalizadas é real. De certo ponto de vista a guerra já começou, num estilo novo, de guerra “encoberta e psicológica".
Da guerra “encoberta” a guerra psicológica
Nos últimos meses quatro importantes cientistas nucleares iranianos – acadêmicos, de formação universitária e civil – foram mortos por atentados terroristas no próprio Irã. Da mesma forma, várias unidades nucleares iranianas (e outras instituições de pesquisa e financeiras) foram atingidas por ataques cibernéticos de origem desconhecida, com graves prejuízos para os trabalhos em curso. Os analistas internacionais, mesmo os americanos e israelenses mais próximos de seus governos, não negam a provável origem americana e/ou israelense de tais procedimentos. Chegou-se mesmo a avocar uma categoria especial de conflito não-declarado: a guerra encoberta. Ambos os países, EUA e Israel, possuem meios e interesses que se coadunam claramente com o desenho dos ataques contra a inteligência nuclear iraniana.
A estes ataques somar-se-iam uma série de medidas de restrição e boicote econômico e financeiro decidido ora no âmbito do Conselho de Segurança da ONU (com abstenção da China Popular e da Federação Russa), ora no âmbito de alianças especificas, como a NATO ou OTAN. Até esta semana a União Européia, em grave crise financeira e com altíssimos índices de desemprego, estava recusando, ou adiando, uma clara adesão ao boicote econômico proposto pelos EUA contra o Irã. No entanto, esta semana (20/01/2012), a União Européia declarou adesão ampla ao bloqueio, decidindo encerrar suas compras de petróleo iraniano até o dia 1 de julho de 2012. Os três principais compradores – Grécia, Itália e Espanha, justamente países mais fortemente atingidos pela crise financeira – devem encerrar seus contratos com Irã, sob garantia de que a Arábia Saudita – um oponente sunita do Irã - fornecerá petróleo pelo mesmo preço e sem alterações, mesmo que a crise leve o preço do barril a novos patamares.
Japão e Coréia do Sul, ambos grandes compradores, já haviam declarado sua adesão na semana anterior e no final do dia (22/01/2012) a Austrália aderiu ao boicote.
Além disso, a Secretaria do Tesouro dos EUA declarou embargo contra o banco central do Irã, três dos seus maiores bancos privados e várias empresas de petróleo e petroquímicas. Isso impede que façam negócios com empresas americanas ou com empresas não-americanas, mas que também negociem com os EUA. Assim, quinhentas instituições e pessoas no Irã foram “bloqueadas” pelos EUA.
A inusitada unanimidade entre os aliados ocidentais foi desenhada através de um giro mundial do secretário (ministro) do Tesouro dos EUA, Thimoty Geither, por vários países. Desenha-se assim uma atuação consistente e sistêmica de Washington visando à asfixia econômica do país.
Ao mesmo tempo o Chefe da Junta de Chefes do Estado-Maior norte-americano, general Martin Dempsey, deslocou-se para Israel e teve longos e fraternos encontros com a cúpula militar israelense – o assunto central era o “risco Irã”. Enquanto isso o porta-aviões “USS Abraham Lincoln” (navio aeródromo de propulsão nuclear, com cerca de 90 aviões e helicópteros de combate e cinco mil homens) foi deslocado para a ultra-sensível Estreito de Hormuz, com uma escolta de navios de guerra da Inglaterra e França. No Golfo Pérsico já se encontra a Va. Frota dos EUA.
Cria-se um possível ambiente de guerra na região.
A posição do Irã
O Irã negocia, ou negociou, com o Ocidente em três frentes diversas: no próprio Conselho de Segurança da ONU, em conversações com a União Européia em Istambul, na Turquia, e na mesma cidade, com o Brasil e a própria Turquia, como mediadores para uma solução negociada do controverso programa nuclear do país.
Desde 2011 o Irã opera com 40% da sua capacidade (de 1000 megawatts) uma usina nuclear na região de Bushsher (com assistência inicial das firmas alemãs Siemens e Telefunken, e mais tarde da empresa russa Atomstroyexport e RosTom, com algumas centenas de técnicos russos).
Segundo a Agência Internacional de Energia Atômica/AIEA, órgão assessor da ONU com sede em Viena, a usina de Bushsher possui “possible military dimension” e o Irã estaria “desenvolvendo atividades relevantes para dotar-se de uma capacidade nuclear”. Ao mesmo tempo a AIEA acusa o país de manter parte de seu programa, perto da cidade de Qom, secreto e sem acesso aos inspetores da AIEA. Da mesma forma declara ter “detectado” esforços na direção de testar dispositivos de gatilho que podem ser usados em armas nucleares. De posse de tais evidências solicita, de forma enérgica, que o Irã assine o “Protocolo Adicional” do Tratado de Não-Proliferação Nuclear/TNP, que permite inspeções internacionais das plantas de um país, com aviso prévio de apenas 24 horas e sem limites de acesso.
O Irã insiste que seu programa é pacífico, visa à produção de energia eletrifica – mais limpa e mais barata do que o petróleo, que seria reservado para as exportações gerando divisas para o desenvolvimento do país. Além disso, precisa da energia nuclear para fins médicos, como qualquer país. Cabe ainda destacar que a região geopolítica do Irã é altamente “nuclearizada”: os vizinhos orientais do país – Paquistão e Índia, são potências nucleares; o vizinho norte, no Cáspio, é a Rússia e a ocidente Israel é dotado de pelo menos 200 ogivas nucleares. Além disso, a Va. Frota dos EUA, estacionada no Golfo Pérsico, é dotada de capacidade nuclear. Assim, a proposta do então presidente Lula de uma “zona desnuclearizada” (como a América Latina o é) não parece realista.
As conversações com a U.E. em Istambul não resultaram em qualquer avanço, posto que o Irã não mostrasse interesse em acessar o conjunto de suas instalações nucleares aos inspetores internacionais e a U.E., por sua vez, assumiu uma posição fundamentalista, exigindo a assinatura do Protocolo Adicional e livre acesso ao conjunto das instalações locais. Cabe lembrar, que o primeiro inspetor chefe da AIEA, e embaixador da Austrália na ONU (o senhor Richard Buttler), ao examinar as instalações iraquianas – em busca das míticas “armas de destruição em massa” – passava informações estratégicas diretamente aos governos dos EUA e de Israel, antes mesmo de enviar seu relatório a AIEA ou a ONU. Da mesma forma Hans Blix e Mohammad El-Baradei (este atual carta política dos EUA na “Primavera Egípcia”) jamais conseguiram dizer, com clareza, se o Iraque possuía ou não armas de destruição em massa. Ou seja, o passado das inspeções da AIEA é, no mínimo, duvidoso.
O acordo assinado com o Brasil e a Turquia – sob incentivo direto do Presidente Obama – foi desconsiderado por Washington, que o declarou insuficiente. Na verdade, Obama viu-se em choque direto com a Secretaria de Estado e de Defesa, e, isolado, para manter a face recusou o acordo que ele mesmo pediu ao Brasil para negociar.
O que mais complica o quadro acima é que a maioria da população iraniana – cerca de 68 milhões de pessoas, num país do tamanho do estado do Amazonas - concorda, neste ponto, com o governo Ahmandinejad: Teerã tem direitos iguais a de qualquer país, digamos como o Brasil, de se dotar de tecnologia nuclear sem ser tutelado pelas potências ocidentais. Mesmo a oposição interna defende o desenvolvimento da tecnologia nuclear e afirma que o Ocidente fortalece Ahmandinejad ao ameaçar o país com boicotes e sanções.
Por que uns podem e o Irã não pode?
Este tem sido um argumento muito usado pelo governo de Teerã para caracterizar a injustiça das medidas da AIEA, da ONU e das potências ocidentais sobre o seu programa nuclear. Há aqui casos e casos. O mais notável é de países como Israel – com suas duas centrais nucleares em Dimona, no Deserto do Neguev e um possível arsenal de 200 ogivas atômicas. Ou ainda a Índia, com um não-calculado arsenal nuclear (ao menos 40 ogivas) e poderosos vetores de ataque (a performática aviação militar indu e os mísseis de longo alcance “Agni”). Com este último país a Administração Obama assinou acordos de ampla cooperação, inclusive no campo nuclear e com Israel, é claro, trata-se de um aliado, destino da maior ajuda militar e econômica dos EUA.
A resposta para os diferentes tratamentos é clara e direta: ambos os países são democracias consolidadas, que respeitam os acordos internacionais e os direitos humanos. Enquanto isso o Irã é uma ditadura religiosa, falsificou os resultados das últimas eleições presidenciais (em junho de 2009, quando Ahmandinejad foi reeleito), massacrou e torturou a oposição democrática no interior do país e adotou medidas brutais contra seus próprios cidadãos – como o apedrejamento de mulheres ou o enforcamento de homossexuais. Além disso, o Irã apóia, financia e arma redes “terroristas internacionais”, como o Hezbollah no Líbano e a Milícia do Mahdi (xiita radical) no Iraque. Com tais diferenças notáveis o Irã não seria um país confiável na comunidade internacional para poder dotar-se de armas nucleares.
Bem, sempre podemos discutir se Israel respeita os tratados e acordos internacionais (Israel é o segundo país do mundo, depois do Marrocos, a descumprir decisões da ONU) e já usou, e usa, meios como assassinatos seletivos em territórios estrangeiros, como no Kuwait, Turquia, Jordânia e no prórpio Irã. Mas, sem dúvida, Israel é um país institucionalmente estabelecido e não apedreja pessoas, não estupra presos políticos ou enforca diferentes em praça pública...
Cabe destacar que mais de cinqüenta países possuem, hoje, capacidade de desenvolver tecnologia nuclear e os limites entre pesquisa nuclear para “fins pacíficos” e o desenvolvimento de armas é bastante tênue. Entre os países que se recusam assinar o Protocolo Adicional do TNP estão aliados dos Estados Unidos, tais como Índia e Paquistão. E é claro, Alemanha, Japão, Canadá, Coréia do Sul, Egito ou Turquia podem desenvolver armas nucleares assim o que queiram. O caso mais significativo é do Brasil: o país possui hoje capacidade nuclear plena, tecnologia própria de enriquecimento de combustível (em Rezende, RJ) e se nega a assinar o Protocolo Adicional, considerado um mecanismo de espionagem industrial das grandes potências. Bem, tratam-se de países “sérios”, democracias que cumprem seus contratos internacionais.
Mas, existe um outro caso: Paquistão e Coréia do Norte. No primeiro caso trata-se de um país de grave instabilidade interna, onde o ISIS, o serviço de espionagem das FFAA é praticamente um Estado dentro do Estado. A situação dos direitos humanos no país é lamentável, com militantes humanistas ou religiosos cristãos ou xiitas mortos dentro de seus templos. Lá estava ocultado, sem incômodos, Bin Laden e de lá partem organizações terroristas para atacar hotéis e mercados na Índia ou mesmo tropas dos Estados Unidos no Afeganistão. Contudo, os Estados Unidos, a AIEA ou o Conselho de Segurança da ONU não boicotam o Paquistão. Pior ainda é o caso da Coréia do Norte: uma ditadura ridícula, com brutal repressão da população, com gastos miliatres que geram ondas de fome que matam milhares de pessoas por ano. O país é dotado de mísseis que podem arrasar Seul ou cerca de dez cidades do Japão com mais de três milhões de habitantes e fez testes nucleares (de difícil operação tática). Contudo, no caso da Coréia do Norte os Estados Unidos preferem negociar.
Em suma, o Irã é um caso especial, escolhido como exemplo. Dois fatores podem explicar a decisão de dobrar o Irã: sua produção de petróleo, essencial (como no caso da Líbia) para a sobrevivência econômica do Ocidente e, por outro lado, sua insistente política anti-Israel.
Como seria a guerra?
É pouco provável que os Estados Unidos pretendam invadir o Irã. Este não é um cenário provável. Depois dos envolvimentos americanos no Afeganistão, em 2001 (com 2876 baixas ocidentais, das quais 1886 norte-americanas até janeiro de 2012), e no Iraque, em 2003 (com 4484 mortes norte-americanas) – sem falar nos milhares de civis locais mortos – não parece ser a invasão (tipo “boots on the ground”) uma opção para a Administração Obama. Na verdade Obama se esforçou, até o momento, para “cumprir as tarefas” auto-impostas na campanha eleitoral: matou Bin Laden numa operação de vídeo-game; e fez a retirada das tropas do Iraque e se prepara para fazer o mesmo no Afeganistão. Assim, não é o caso de mandar mais “american boys” morreram em algum lugar estranho do mundo...
A solução estaria em combinar a “guerra encoberta” – assassinatos e sabotagens – com a guerra “econômica e psicológica” para levar o Irã a capitular. Caso tais medidas não resultem nos objetivos propostos, teríamos o “Plano B”. Alguns conselheiros de Obama, como o “superfalcão” Matthew Kroenig advogam uma guerra de tipo “surgical strikes”. Trata-se do uso da superioridade aérea dos Estados Unidos (e de Israel), com aviação, mísseis e dromes diretamente contra as instalações nucleares iranianas em Natanz, Esfahan, Bushsher, Arak, Fordo e nos subúrbios de Teerã. Mesmo que as instalações estejam em bunkers subterrâneos – muitos há quinze metros de profundidade e com casamatas de concreto reforçado – os EUA usariam armas do tipo “Massive Ordnance Penetrator”, capazes de perfurar tais instalações.
Como se justificaria o ataque? Neste caso existem algumas possibilidades previstas, a saber: 1. Conflito direto EUA-Irã, sem a presença de Israel (em respeito aos aliados árabes): qualquer incidente no Estreito de Hormuz ou no Golfo Pérsico, onde os EUA concentraram grande parte de seus navios da Va. Frota pode seria o estopim. Caberiam mesmo simulações, como o “inventado” incidente do Golfo de Tonquim, que serviu de justificativa para os bombardeios de Hanói e Haiphong em 1964; 2. Uma ação descontrolada de uma das instâncias de poder em Teerã, como a Guarda da Revolução Islâmica contra interesses ocidentais – como o fluxo de petróleo no Estreito de Hormuz - e que acabaria sendo respondida por uma ação bélica generalizada; 3. Uma ação de Israel, contra instalações ou cientistas nucleares iranianos, que seria respondida pelos iranianos. Neste caso os EUA iriam em defesa do aliado israelense... e com apoio da opinião pública americana.
Nos três casos a guerra seria longa e penosa, como na Líbia, mas com maior capacidade de resposta por parte dos iranianos. Não bastaria o ataque aos centros nucleares – com risco de converter-se numa “bomba suja”. Seria necessário atacar toda a defesa iraniana, espalhada por um país imenso, montanhoso e com longo litoral.
A dificuldade de tais “pré-cenários” reside em saber a possibilidade de resposta do Irã. O país é dotado de mísseis de médio e longo alcance, capazes de atingir todo o território de Israel, incluindo aí as centrais nucleares de Dimona. Além disso, as tropas americanas no Iraque, Bahrein, Kuwait e Arábia Saudita poderiam ser duramente atingidas. O fluxo do petróleo poderia ser paralisado, mesmo que por algumas semanas, o que chutaria o preço do barril para a casa dos 200 dólares, causando grande dano ao conjunto da economia mundial (já fragilizada). Além disso, os aliados do Irã, como o Hezbollah e o Hamas poderiam lançar graves ataques contra Israel e os aliados dos EUA.
Em suma, as possibilidades de uma nova guerra são reais, mas de conseqüências imprevisíveis, o que faz a decisão ser muito difícil para a Administração Obama. No entanto, estamos num ano eleitoral. Os falcões ultraconservadores do Partido Republicano mordem os calcanhares de Obama... Na tradição americana, presidentes em guerra não perdem eleições!
(*) Professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)
Fonte: http://www.cartamaior.com.br/
quinta-feira, 26 de janeiro de 2012
terça-feira, 24 de janeiro de 2012
Em nove anos, poder aquisitivo em São Paulo cresce menos que a média nacional - por Virginia Toledo
Em nove anos, poder aquisitivo em São Paulo cresce menos que a média nacional
Paulista ainda tem renda maior, mas de 2001 a 2009 a diferença diminuiu em relação a outras regiões
São Paulo – Apesar de manter-se à frente da média nacional, o crescimento do poder aquisitivo da população do estado de São Paulo foi inferior ao do país no período de 2001 a 2009, aponta pesquisa divulgada nesta terça-feira (24) pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). A renda per capita do paulista em 2001 era de R$ 738,20 e atingiu R$ 806,90 em 2009, o que representou um aumento de 9,3%. Já a média nacional em igual período subiu 23,5%, de R$ 511,50 para R$ 631,70.
Segundo o presidente do Ipea, Marcio Pochmann, o crescimento da renda per capita ser menor que a média nacional deve-se ao fato de São Paulo não manter o dinamismo apresentado anteriormente. "São Paulo no passado era conhecido como a locomotiva do Brasil. Nas décadas de 50 e 80 a renda domiciliar do estado crescia mais rapidamente que a do Brasil. O cenário de hoje mostra o dinamismo de outras regiões", destava Pochmann.
Em sua totalidade, a evolução dos índices sociais de São Paulo foi mais lenta se comparada aos índices brasileiros, mesmo o estado mantendo números maiores que as médias nacionais. A comparação faz parte da série "Situação Social nos Estados", em que o Ipea compara os dados de cada estado à média da região a que pertence e à média nacional. O estudo usa índices registrados na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (PNAD/IBGE).
Índices relacionados a trabalho e renda foram os que mais sinalizaram diferenças negativas de São Paulo em relação às médias do Brasil e de toda a região Sudeste. A taxa de desemprego está entre elas. Em 2001, os desempregados em São Paulo representavam 10,8% da população economicamente ativa (PEA), ante 9,3% em 2009. No Brasil, o índice de 9,2% em 2001 foi para 8,2% em 2009. Já no Sudeste, a taxa passou de 10,5% para 8,6%.
O presidente do Ipea relaciona os índices que apresentaram números mais modestos à vulnerabilidade de estados como São Paulo diante de crises econômicas mundiais. Por ter característica urbana e industrial, o estado apresentou queda relevante nos índices de desemprego por causa da crise financeira iniciada em 2008. Daquele ano para 2009, a taxa de desemprego subiu 19,2% em São Paulo (de 7,8% para 9,3%), um pouco acima da média do país (17,1%), de 7% para 8,2%.
Quanto à remuneração do trabalhador, de acordo com o Ipea, São Paulo ainda lidera a média nacional e regional, mas registra queda de 6,8% no período: de R$ 1.450 em 2001para R$ 1.362 em 2009. Em nível nacional e na região geográfica, o valor teve ligeiras altas: no Brasil, a média subiu de R$ 1.039,41 para R$ 1.116,39, enquanto no Sudeste foi de R$ 1.250 para R$ 1.264.
Fonte: http://www.redebrasilatual.com.br
Paulista ainda tem renda maior, mas de 2001 a 2009 a diferença diminuiu em relação a outras regiões
São Paulo – Apesar de manter-se à frente da média nacional, o crescimento do poder aquisitivo da população do estado de São Paulo foi inferior ao do país no período de 2001 a 2009, aponta pesquisa divulgada nesta terça-feira (24) pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). A renda per capita do paulista em 2001 era de R$ 738,20 e atingiu R$ 806,90 em 2009, o que representou um aumento de 9,3%. Já a média nacional em igual período subiu 23,5%, de R$ 511,50 para R$ 631,70.
Segundo o presidente do Ipea, Marcio Pochmann, o crescimento da renda per capita ser menor que a média nacional deve-se ao fato de São Paulo não manter o dinamismo apresentado anteriormente. "São Paulo no passado era conhecido como a locomotiva do Brasil. Nas décadas de 50 e 80 a renda domiciliar do estado crescia mais rapidamente que a do Brasil. O cenário de hoje mostra o dinamismo de outras regiões", destava Pochmann.
Em sua totalidade, a evolução dos índices sociais de São Paulo foi mais lenta se comparada aos índices brasileiros, mesmo o estado mantendo números maiores que as médias nacionais. A comparação faz parte da série "Situação Social nos Estados", em que o Ipea compara os dados de cada estado à média da região a que pertence e à média nacional. O estudo usa índices registrados na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (PNAD/IBGE).
Índices relacionados a trabalho e renda foram os que mais sinalizaram diferenças negativas de São Paulo em relação às médias do Brasil e de toda a região Sudeste. A taxa de desemprego está entre elas. Em 2001, os desempregados em São Paulo representavam 10,8% da população economicamente ativa (PEA), ante 9,3% em 2009. No Brasil, o índice de 9,2% em 2001 foi para 8,2% em 2009. Já no Sudeste, a taxa passou de 10,5% para 8,6%.
O presidente do Ipea relaciona os índices que apresentaram números mais modestos à vulnerabilidade de estados como São Paulo diante de crises econômicas mundiais. Por ter característica urbana e industrial, o estado apresentou queda relevante nos índices de desemprego por causa da crise financeira iniciada em 2008. Daquele ano para 2009, a taxa de desemprego subiu 19,2% em São Paulo (de 7,8% para 9,3%), um pouco acima da média do país (17,1%), de 7% para 8,2%.
Quanto à remuneração do trabalhador, de acordo com o Ipea, São Paulo ainda lidera a média nacional e regional, mas registra queda de 6,8% no período: de R$ 1.450 em 2001para R$ 1.362 em 2009. Em nível nacional e na região geográfica, o valor teve ligeiras altas: no Brasil, a média subiu de R$ 1.039,41 para R$ 1.116,39, enquanto no Sudeste foi de R$ 1.250 para R$ 1.264.
Fonte: http://www.redebrasilatual.com.br
Alckmin e a mídia mentem sem parar sobre o Pinheirinho - por Eduardo Guimarães
Alckmin e a mídia mentem sem parar sobre o PinheirinhoÉ de revolver o estômago a torrente de mentiras e distorções com que o governador Geraldo Alckmin e a mídia que o protege esbofeteiam a sociedade. Mentem para o tucano se eximir de suas responsabilidades. Mentem descaradamente, compulsivamente.
Televisões, rádios, jornais e revistas tentam transformar em criminosos os trabalhadores do Pinheirinho e suas famílias noticiando atos de vandalismo que poderiam ocorrer em qualquer comunidade submetida ao choque que sofreram.
Experimentem desalojar moradores dos Jardins paulistanos e verão quantos saqueadores e ladrões aparecerão. Mas como a população do Pinheirinho é pobre e quase sempre negra, noticiam ações isoladas como se fossem coletivas.
E as notícias de apreensão de drogas que tentam transformar todos os moradores do Pinheirinho em traficantes? Mesmo que não tenham sido plantadas, se derem uma batida ainda nos Jardins paulistanos provavelmente encontrarão não só maior quantidade de droga, mas maior variedade.
Alckmin mente compulsivamente ao tentar se eximir da responsabilidade pela ação criminosa da polícia que comanda quando tenta empurrá-la para a Justiça estadual.
O comandante da Polícia Militar de qualquer Estado é o seu governador. Alckmin, se estivesse bem-intencionado, poderia ter usado o conflito de instâncias da Justiça como desculpa para postergar a operação de reintegração de posse. Míseras 24 horas teriam sido suficientes.
O governador paulista também mente quando diz que o governo federal nada fez para interromper a reintegração de posse do Pinheirinho. As liminares concedidas contra ela foram pedidas pela Advocacia Geral da União e representantes do governo federal há muito tentam negociar com a prefeitura tucana de São José dos Campos.
O prefeito de São José dos Campos é do mesmo partido do governador e vinha rechaçando tentativas de acordo. E agora Alckmin diz que o governo federal não enfrentou suficientemente o seu correligionário, que certamente seria sensível a um pedido seu para que negociasse.
O secretário nacional de Articulação Social da Secretaria-Geral da Presidência da República, Paulo Maldos, passou a semana passada inteira no Pinheirinho tentando intervir junto às autoridades municipal e estadual e chegou a ser ferido pela truculência da PM, no domingo.
Alckmin esbofeteou a sociedade brasileira com seus cachorros loucos armados até os dentes e agora a esbofeteia com suas mentiras e com sua covardia insuperáveis. Esse homem é indigno do mandato popular que recebeu.
Fonte: www.blogcidadania.com.br/
Televisões, rádios, jornais e revistas tentam transformar em criminosos os trabalhadores do Pinheirinho e suas famílias noticiando atos de vandalismo que poderiam ocorrer em qualquer comunidade submetida ao choque que sofreram.
Experimentem desalojar moradores dos Jardins paulistanos e verão quantos saqueadores e ladrões aparecerão. Mas como a população do Pinheirinho é pobre e quase sempre negra, noticiam ações isoladas como se fossem coletivas.
E as notícias de apreensão de drogas que tentam transformar todos os moradores do Pinheirinho em traficantes? Mesmo que não tenham sido plantadas, se derem uma batida ainda nos Jardins paulistanos provavelmente encontrarão não só maior quantidade de droga, mas maior variedade.
Alckmin mente compulsivamente ao tentar se eximir da responsabilidade pela ação criminosa da polícia que comanda quando tenta empurrá-la para a Justiça estadual.
O comandante da Polícia Militar de qualquer Estado é o seu governador. Alckmin, se estivesse bem-intencionado, poderia ter usado o conflito de instâncias da Justiça como desculpa para postergar a operação de reintegração de posse. Míseras 24 horas teriam sido suficientes.
O governador paulista também mente quando diz que o governo federal nada fez para interromper a reintegração de posse do Pinheirinho. As liminares concedidas contra ela foram pedidas pela Advocacia Geral da União e representantes do governo federal há muito tentam negociar com a prefeitura tucana de São José dos Campos.
O prefeito de São José dos Campos é do mesmo partido do governador e vinha rechaçando tentativas de acordo. E agora Alckmin diz que o governo federal não enfrentou suficientemente o seu correligionário, que certamente seria sensível a um pedido seu para que negociasse.
O secretário nacional de Articulação Social da Secretaria-Geral da Presidência da República, Paulo Maldos, passou a semana passada inteira no Pinheirinho tentando intervir junto às autoridades municipal e estadual e chegou a ser ferido pela truculência da PM, no domingo.
Alckmin esbofeteou a sociedade brasileira com seus cachorros loucos armados até os dentes e agora a esbofeteia com suas mentiras e com sua covardia insuperáveis. Esse homem é indigno do mandato popular que recebeu.
Fonte: www.blogcidadania.com.br/
China e Estados Unidos: bem além dos mitos - Por Immanuel Wallerstein
China e Estados Unidos: bem além dos mitosApesar das aparências, Washington e Beijing já colaboram muito mais que admitem. Tal relação vai continuar se aprofundando, ao longo desta década
As relações entre a China e os Estados Unidos são uma grande preocupação dos que se preocupam com política (jornalistas, blogueiros, políticos, burocratas internacionais). A análise tradicional vê uma superpotência em declínio – os Estados Unidos – e um país que emerge rapidamente – a China. No mundo ocidental, a relação normalmente é definida como negativa, sendo a China vista como uma “ameaça”. Mas uma ameaça a quem, e em que sentido?
Alguns veem a “emergência” da China como a retomada de uma posição central no mundo — que o país já teve e estaria retomando. Outros enxergam um processo mais recente: a Beijing estaria desempenhando um novo papel nas relações geopolíticas e econômicas no sistema-mundo moderno.
Desde meados do século XIX, as relações entre os dois países tem sido ambígua. Por um lado, naquele momento os Estados Unidos começaram a expandir suas rotas de comércio com a China. Enviaram missionários cristãos. Na virada do século XX, proclamaram a Política das Portas Abertas, menos dirigida para a China do que para outras potências europeias. Pouco tempo depois, participaram, com outros países ocidentais, na campanha que sufocou a rebelião Boxer, contra imperialistas estrangeiros. Dentro dos Estados Unidos, o governo (e os sindicatos) procuraram evitar a imigração de chineses.
Por outro lado, havia um certo respeito – com algumas marcas de inveja – pela civilização chinesa. O extremo leste (China e Japão) eram os locais preferidos para trabalhos de missionários, à frente da Índia e da África, com a justificativa na suposição de que a China era uma civilização “mais avançada”. Talvez isso estivesse relacionado ao fato de nem a China, nem o Japão, terem sido diretamente colonizados, na maior parte de seus territórios. Por isso, nenhuma potência colonial europeia tentou reservar os dois países para seus próprios missionários.
Depois da revolução chinesa de 1911, Sun Yat-Sen, que viveu nos Estados Unidos, tornou-se uma figura simpática no discurso estadunidense. E na época da Segunda Guerra Mundial, a China era vista como uma aliada na luta contra o Japão. De fato, foram os Estados Unidos que insistiram para que a China tivesse uma cadeira permanente no Conselho de Segurança da ONU. Quando o Partido Comunista Chinês conquistou a maior parte do território e estabeleceu a República Popular da China, os dois países pareciam se tornar inimigos mortais. Na guerra da Coreia, estavam de lados diferentes; e foi a participação militar ativa da China, ao lado da Coreia do Norte, que garantiu que a guerra terminasse num impasse.
No entanto, após um tempo relativamente curto, o presidente Richard Nixon foi a Pequim, encontrou-se com Mao Zedong e estabeleceu uma aliança de fato contra a União Soviética. A situação geopolítica parecia dar uma reviravolta. Como parte do acordo com a República Popular da China, os Estados Unidos quebraram suas relações diplomáticas com Taiwan (apesar de continuarem garantindo que a China não a invadisse). E quando Deng Xiaoping tornou-se líder da China, o país entrou em um processo de lenta abertura para operações de mercado e integração nas correntes comerciais da economia-mundo capitalista.
Embora o colapso da União Soviética tornasse irrelevante a aliança China-EUA contra a União Soviética, as relações entre os dois países não mudaram realmente. Se algo aconteceu, foi uma aproximação ainda maior. Na situação em que o mundo se encontra hoje, a China tem um superávit significativo no balanço de pagamentos com os Estados Unidos. Mas investe muito deste saldo nos próprios títulos do Tesouro norte-americano, o que permite a Washington continuar a investir grandes recursos em suas múltiplas atividades militares no mundo todo (principalmente no Oriente Médio), assim como ser um bom consumidor de exportações chinesas.
De tempos em tempos, a retórica que cada governo usa em relação ao outro é um pouco dura, mas não chega nem perto da retórica da Guerra Fria entre Estados Unidos e União Soviética. Ainda assim, nunca é sábio prestar muita atenção na retórica. Em assuntos globais, a retórica normalmente é usada para produzir efeitos políticos dentro de cada país, e não para expressar a política realmente em relação ao país ao qual se destina.
Deve-se prestar mais atenção nas ações dos dois países. Em 2001 (pouco antes do 11/09), um avião chinês colidiu com um avião estadunidense, nas vizinhanças ilha Hainan. O avião dos EUA provavelmente estava espionando a China. Alguns políticos norte-americanos pediram uma resposta militar. O presidente George W. Bush não concordou. Ele desculpou-se razoavelmente com os chineses, e o avião foi devolvido junto, com os 24 militares capturados por Beijing. Nos vários esforços feitos pelos Estados Unidos para conseguir que a ONU apoiasse suas operações, a China discordou algumas vezes. Mas nunca vetou de fato uma resolução patrocinada por Washington. A precaução dos dois lados parece ser a forma de ação preferida, apesar da retórica.
Então, onde estamos? A China, assim como todas as potências de hoje, tem uma política externa multifacetada, envolvendo-se em todas as partes do mundo. A questão é quais são as prioridades do país. Penso que a número 1 é a relação com o Japão e com as duas Coreias. A China é forte, sim, mas seria imensuravelmente mais forte se fosse parte de uma confederação do nordeste asiático.
A China e o Japão precisam um do outro — primeiro, como parceiros comerciais; além disso, para assegurar que não haja confrontações militares de nenhum tipo. Apesar de surtos nacionalistas ocasionais, eles estão se movendo nessa direção. O movimento mais recente foi a decisão conjunta de realizar as operações comerciais entre as duas partes com suas próprias moedas — eliminando o uso do dólar, e protegendo-se das flutuações da moeda norte-americana, cada vez mais frequentes. Além disso, o Japão começou a considerar que o guarda-chuva do exército dos Estados Unidos pode não durar para sempre; e que portanto precisa de um acordo com a China.
A Coreia do Sul enfrenta os mesmos dilemas do Japão, e ainda precisa lidar com o problema espinhoso da Coreia do Norte. Para a Coreia do Sul, a China é a força de detenção crucial sobre os norte-coreanos. E para a China, a instabilidade da Coreia do Norte colocaria uma ameaça imediata para sua própria estabilidade. A China pode desempenhar, para a Coreia do Sul, o papel que os Estados Unidos já não têm condições de exercer. E nos termos complicados da colaboração que China e Japão desejam, a Coreia do Sul (ou quem sabe uma Coreia unida) pode jogar um papel essencial de equilíbrio.
Como os Estados Unidos percebem esses desenvolvimentos, não é razoável supor que o estejam tentando chegar a um acordo com esse tipo de confederação do nordeste asiático, enquanto ela se constrói? Pode-se analisar a postura militar dos Estados Unidos no Nordeste, Sudeste e e Sul asiáticos não como construção de uma posição militar — mas como uma estratégia de negociação no jogo geopolítico que está em curso e que se desenrolará na próxima década.
Os Estados Unidos e a China são rivais? Sim, até certo ponto. São inimigos? Não, eles não são inimigos. São colaboradores? Eles já são mais do que admitem, e serão muito mais no desenrolar da década.
Tradução: Daniela Frabasile
Fonte: www.outraspalavras.net
As relações entre a China e os Estados Unidos são uma grande preocupação dos que se preocupam com política (jornalistas, blogueiros, políticos, burocratas internacionais). A análise tradicional vê uma superpotência em declínio – os Estados Unidos – e um país que emerge rapidamente – a China. No mundo ocidental, a relação normalmente é definida como negativa, sendo a China vista como uma “ameaça”. Mas uma ameaça a quem, e em que sentido?
Alguns veem a “emergência” da China como a retomada de uma posição central no mundo — que o país já teve e estaria retomando. Outros enxergam um processo mais recente: a Beijing estaria desempenhando um novo papel nas relações geopolíticas e econômicas no sistema-mundo moderno.
Desde meados do século XIX, as relações entre os dois países tem sido ambígua. Por um lado, naquele momento os Estados Unidos começaram a expandir suas rotas de comércio com a China. Enviaram missionários cristãos. Na virada do século XX, proclamaram a Política das Portas Abertas, menos dirigida para a China do que para outras potências europeias. Pouco tempo depois, participaram, com outros países ocidentais, na campanha que sufocou a rebelião Boxer, contra imperialistas estrangeiros. Dentro dos Estados Unidos, o governo (e os sindicatos) procuraram evitar a imigração de chineses.
Por outro lado, havia um certo respeito – com algumas marcas de inveja – pela civilização chinesa. O extremo leste (China e Japão) eram os locais preferidos para trabalhos de missionários, à frente da Índia e da África, com a justificativa na suposição de que a China era uma civilização “mais avançada”. Talvez isso estivesse relacionado ao fato de nem a China, nem o Japão, terem sido diretamente colonizados, na maior parte de seus territórios. Por isso, nenhuma potência colonial europeia tentou reservar os dois países para seus próprios missionários.
Depois da revolução chinesa de 1911, Sun Yat-Sen, que viveu nos Estados Unidos, tornou-se uma figura simpática no discurso estadunidense. E na época da Segunda Guerra Mundial, a China era vista como uma aliada na luta contra o Japão. De fato, foram os Estados Unidos que insistiram para que a China tivesse uma cadeira permanente no Conselho de Segurança da ONU. Quando o Partido Comunista Chinês conquistou a maior parte do território e estabeleceu a República Popular da China, os dois países pareciam se tornar inimigos mortais. Na guerra da Coreia, estavam de lados diferentes; e foi a participação militar ativa da China, ao lado da Coreia do Norte, que garantiu que a guerra terminasse num impasse.
No entanto, após um tempo relativamente curto, o presidente Richard Nixon foi a Pequim, encontrou-se com Mao Zedong e estabeleceu uma aliança de fato contra a União Soviética. A situação geopolítica parecia dar uma reviravolta. Como parte do acordo com a República Popular da China, os Estados Unidos quebraram suas relações diplomáticas com Taiwan (apesar de continuarem garantindo que a China não a invadisse). E quando Deng Xiaoping tornou-se líder da China, o país entrou em um processo de lenta abertura para operações de mercado e integração nas correntes comerciais da economia-mundo capitalista.
Embora o colapso da União Soviética tornasse irrelevante a aliança China-EUA contra a União Soviética, as relações entre os dois países não mudaram realmente. Se algo aconteceu, foi uma aproximação ainda maior. Na situação em que o mundo se encontra hoje, a China tem um superávit significativo no balanço de pagamentos com os Estados Unidos. Mas investe muito deste saldo nos próprios títulos do Tesouro norte-americano, o que permite a Washington continuar a investir grandes recursos em suas múltiplas atividades militares no mundo todo (principalmente no Oriente Médio), assim como ser um bom consumidor de exportações chinesas.
De tempos em tempos, a retórica que cada governo usa em relação ao outro é um pouco dura, mas não chega nem perto da retórica da Guerra Fria entre Estados Unidos e União Soviética. Ainda assim, nunca é sábio prestar muita atenção na retórica. Em assuntos globais, a retórica normalmente é usada para produzir efeitos políticos dentro de cada país, e não para expressar a política realmente em relação ao país ao qual se destina.
Deve-se prestar mais atenção nas ações dos dois países. Em 2001 (pouco antes do 11/09), um avião chinês colidiu com um avião estadunidense, nas vizinhanças ilha Hainan. O avião dos EUA provavelmente estava espionando a China. Alguns políticos norte-americanos pediram uma resposta militar. O presidente George W. Bush não concordou. Ele desculpou-se razoavelmente com os chineses, e o avião foi devolvido junto, com os 24 militares capturados por Beijing. Nos vários esforços feitos pelos Estados Unidos para conseguir que a ONU apoiasse suas operações, a China discordou algumas vezes. Mas nunca vetou de fato uma resolução patrocinada por Washington. A precaução dos dois lados parece ser a forma de ação preferida, apesar da retórica.
Então, onde estamos? A China, assim como todas as potências de hoje, tem uma política externa multifacetada, envolvendo-se em todas as partes do mundo. A questão é quais são as prioridades do país. Penso que a número 1 é a relação com o Japão e com as duas Coreias. A China é forte, sim, mas seria imensuravelmente mais forte se fosse parte de uma confederação do nordeste asiático.
A China e o Japão precisam um do outro — primeiro, como parceiros comerciais; além disso, para assegurar que não haja confrontações militares de nenhum tipo. Apesar de surtos nacionalistas ocasionais, eles estão se movendo nessa direção. O movimento mais recente foi a decisão conjunta de realizar as operações comerciais entre as duas partes com suas próprias moedas — eliminando o uso do dólar, e protegendo-se das flutuações da moeda norte-americana, cada vez mais frequentes. Além disso, o Japão começou a considerar que o guarda-chuva do exército dos Estados Unidos pode não durar para sempre; e que portanto precisa de um acordo com a China.
A Coreia do Sul enfrenta os mesmos dilemas do Japão, e ainda precisa lidar com o problema espinhoso da Coreia do Norte. Para a Coreia do Sul, a China é a força de detenção crucial sobre os norte-coreanos. E para a China, a instabilidade da Coreia do Norte colocaria uma ameaça imediata para sua própria estabilidade. A China pode desempenhar, para a Coreia do Sul, o papel que os Estados Unidos já não têm condições de exercer. E nos termos complicados da colaboração que China e Japão desejam, a Coreia do Sul (ou quem sabe uma Coreia unida) pode jogar um papel essencial de equilíbrio.
Como os Estados Unidos percebem esses desenvolvimentos, não é razoável supor que o estejam tentando chegar a um acordo com esse tipo de confederação do nordeste asiático, enquanto ela se constrói? Pode-se analisar a postura militar dos Estados Unidos no Nordeste, Sudeste e e Sul asiáticos não como construção de uma posição militar — mas como uma estratégia de negociação no jogo geopolítico que está em curso e que se desenrolará na próxima década.
Os Estados Unidos e a China são rivais? Sim, até certo ponto. São inimigos? Não, eles não são inimigos. São colaboradores? Eles já são mais do que admitem, e serão muito mais no desenrolar da década.
Tradução: Daniela Frabasile
Fonte: www.outraspalavras.net
Estado fascista do Partido da Socialdemocracia - Por Gislene Bosnich
Estado fascista do Partido da Socialdemocracia
São Paulo é um Estado Fascista de Direito Pleno da Burguesia. Seja na demolição especulativa dos imóveis da Luz, encobertos por projeto escuso de “reurbanização/revitalização” quando o certo seria reespeculação; seja como ontem em São José dos Campos.Ontem dia 22 de janeiro, um domingo, a PM do governador Geraldo Alckmin invadiu um terreno ocupado há oito anos por cerca de três mil famílias e conhecido como Pinheirinho. Sob a alegação de reintegração de posse, que foi contestada em instância superior e transformou-se em uma paralela e obscura disputa de poder dentro dos meandros do direito que só existem e servem para punir a classe trabalhadora, mais de 1800 policiais iniciaram a ofensiva de gases e bombas, atiradas de próprio punho ou por helicóptero para causar mais impacto. Como tantas vezes foi dito ontem no ato que ocorreu na Avenida Paulista: Habeas Corpus, suspensão de penas e outras incríveis facetas do Direito só existem para a burguesia e para seus representantes zelosos, casos de muitos que devem ter enchido suas contas bancárias nesta reintegração imoral e insana sob os olhos da razão.
Antes de mencionar o absurdo que foi a retirada a base de porrada e chumbo grosso e não somente balas de borracha – o que já não seria pouco - é preciso esclarecer alguns pontos que a imprensa, através de meus “coleguinhas” repórteres, editores e fotógrafos, não conta.
O que a imprensa não contou:
- a área estava já em processo adiantado de regularização para enfim transformar-se oficialmente em bairro;
- toda ocupação visa fazer cumprir a função da terra, que não é de caráter especulativo. E inclusive, para aqueles que são tão comprometidos com a Lei, legalistas que só querem que a lei funcione para o trabalhador, o caráter consta de nossa Constituição e também do Estatuto da Cidade;
- toda ocupação visa comprar a terra que ocupou. E não “ganhá-la” do Poder Público. Isso só acontece com os burgueses;
- Poucos devem saber que as nossas montadoras, nada nacionais, tiveram seus terrenos doados pelo Poder Público para se instalarem no ABC Paulista, ainda na década de 50. Alguns incautos devem pensar: Mas eles geraram emprego! Vale lembrar um pouco da aula de História do Ensino Fundamental. O mundo não começou com o capitalismo e não precisa acabar com ele. Tais empresas instalaram-se aqui naquele momento em que uma “nova” modalidade de imperialismo desenvolvia-se, sem precisar invadir com soldados enviaram seu capital para explorar a preço barato a nossa força de trabalho com todos os subsídios possíveis que inclusive não existiram para a formação de uma indústria nacional automobilística. Quem não se lembra do Gurgel?
- O terreno é do megaespeculador Naji Nahas que em 1989 detonou a Bolsa de Valores do Rio, o que exigiu o salvamento da burguesia financista da época com a injeção de dinheiro público. Que ninguém pagou. Muito menos Naji Nahas.
- Por que proteger um megaespeculador num terreno de uma massa falida? Ou seja, o dinheiro pode ser pago pelo financiamento da habitação dos milhares que lá se encontravam. Pagos por eles com juros que todos sabem estão longe de ser aqueles aplicados ao financiamento dos produtos da burguesia;- Por que desmantelar um bairro já formado se há em São José dos Campos um déficit de 25 mil moradias a partir da desapropriação do Pinheirinho?
- Para que esta truculência? Quando especuladores do porte de um Salvatore Cacciola são presos há praticamente um pedido de licença para a colocação das algemas mesmo que isso seja apenas um mise-én-scene. Não foi esta mise-én-scene que marcou a condição das mulheres, homens e crianças que foram feridos, alguns com muita gravidade. Havia notícia, não sei até o momento se confirmada, que tratores já destruíam casas com móveis dentro e tudo que estas pessoas acumularam durante a vida. Hoje há relatos sobre furto de móveis das casas das pessoas por parte dos leões de chácara que prosseguem no local.
O que a imprensa contou:
- Polícia enfrenta moradores. Quase anedótico, trata-se, todavia, de uma imoralidade. São os moradores que enfrentaram a PM e infelizmente sem nenhuma condição de defesa porque foram pegos de surpresa, já que havia uma situação de aparente trégua de 15 dias dos quais não havia decorrido nem três. Donde é possível novamente concluir que esperar justiça da instituição justiça é uma ilusão que infelizmente ainda temos diante de tanta nojeira e embuste;
- Polícia tem receio que traficantes vão para outros bairros. Nossa! Podem ter exclamado os pudicos ou inocentes despolitizados de plantão. Acaso há algum bairro em que não haja traficante? O Pinheirinho não é uma extensão idealista de vida terrena; é um bairro com trabalhadores e trabalhadores em sua maioria. Isso é o que importa.
- Há pessoas que estão no Pinheirinho que alugaram suas casas e estão ali para conseguir outra? Esse tipo de “denúncia” é ainda mais imoral. Onde estarão estas pessoas agora? Deixaram de existir? Ou nunca existiram? E se acaso existirem, são a maioria deste povo?
O que o Governador do Estado Fascista do Partido da Socialdemocracia disse:
Vários sites noticiosos destacaram hoje, dia 23 de janeiro, que o Governador Geraldo Alckmin disse que foi legítima a reintegração de posse do Pinheirinho. Essa legitimidade, que o aparente voto assegura, não pode valer para os trabalhadores. É preciso desmascarar essa vilania infindável dos ricos burgueses contra esses miseráveis que somos nós, que lutamos uma vida para ter direito àquilo que dizem já nascemos tendo: moradia, educação, saúde, lazer e cultura.
Haverá um dia em que não seremos cronistas destes tristes momentos em que passamos recebendo balas de chumbo e de borracha como único direito.Por último, o que possibilitou o ato de ontem na avenida Paulista a partir das 17h foi a convocação rápida e funcional via twitter e facebook. Em menos de três horas o ato foi chamado e contou com mais de 500 pessoas, como saiu na imprensa em fotos ridículas que mostravam poucos PM´s porque os demais estavam espancando os trabalhadores em São José dos Campos.
Todavia também não é verdade como a imprensa contou que foi algo quase espontaneísta. Ocorre que os militantes têm nome e por isso quando alguém que não é figura pública começa a divulgar um horário e um local, a imprensa rapidamente se esforça em dizer que tudo é espontaneísta. Que não é preciso nem partido nem organização. Não é verdade. Tanto que os que estiveram na avenida Paulista sabem que houve dezenas de organizações que puderam expressar sua solidariedade, através de seus militantes.
É preciso parar de enaltecer esse antipartidarismo fanático. Porque aqueles que são contra partidos de esquerda podem nem desconfiar, mas estão defendendo os de direita, os explicitamente de direita.
Até a próxima, esperamos que com lágrimas de felicidade pela conquista que pertence ao povo de fato e já não sei se por direito, não esse que grassa por nossas terras tupiniquins. O Direito à verdade, porque essa sim é revolucionária, como já dizia nosso velho camarada.
Fonte: http://www.novae.inf.br/
São Paulo é um Estado Fascista de Direito Pleno da Burguesia. Seja na demolição especulativa dos imóveis da Luz, encobertos por projeto escuso de “reurbanização/revitalização” quando o certo seria reespeculação; seja como ontem em São José dos Campos.Ontem dia 22 de janeiro, um domingo, a PM do governador Geraldo Alckmin invadiu um terreno ocupado há oito anos por cerca de três mil famílias e conhecido como Pinheirinho. Sob a alegação de reintegração de posse, que foi contestada em instância superior e transformou-se em uma paralela e obscura disputa de poder dentro dos meandros do direito que só existem e servem para punir a classe trabalhadora, mais de 1800 policiais iniciaram a ofensiva de gases e bombas, atiradas de próprio punho ou por helicóptero para causar mais impacto. Como tantas vezes foi dito ontem no ato que ocorreu na Avenida Paulista: Habeas Corpus, suspensão de penas e outras incríveis facetas do Direito só existem para a burguesia e para seus representantes zelosos, casos de muitos que devem ter enchido suas contas bancárias nesta reintegração imoral e insana sob os olhos da razão.
Antes de mencionar o absurdo que foi a retirada a base de porrada e chumbo grosso e não somente balas de borracha – o que já não seria pouco - é preciso esclarecer alguns pontos que a imprensa, através de meus “coleguinhas” repórteres, editores e fotógrafos, não conta.
O que a imprensa não contou:
- a área estava já em processo adiantado de regularização para enfim transformar-se oficialmente em bairro;
- toda ocupação visa fazer cumprir a função da terra, que não é de caráter especulativo. E inclusive, para aqueles que são tão comprometidos com a Lei, legalistas que só querem que a lei funcione para o trabalhador, o caráter consta de nossa Constituição e também do Estatuto da Cidade;
- toda ocupação visa comprar a terra que ocupou. E não “ganhá-la” do Poder Público. Isso só acontece com os burgueses;
- Poucos devem saber que as nossas montadoras, nada nacionais, tiveram seus terrenos doados pelo Poder Público para se instalarem no ABC Paulista, ainda na década de 50. Alguns incautos devem pensar: Mas eles geraram emprego! Vale lembrar um pouco da aula de História do Ensino Fundamental. O mundo não começou com o capitalismo e não precisa acabar com ele. Tais empresas instalaram-se aqui naquele momento em que uma “nova” modalidade de imperialismo desenvolvia-se, sem precisar invadir com soldados enviaram seu capital para explorar a preço barato a nossa força de trabalho com todos os subsídios possíveis que inclusive não existiram para a formação de uma indústria nacional automobilística. Quem não se lembra do Gurgel?
- O terreno é do megaespeculador Naji Nahas que em 1989 detonou a Bolsa de Valores do Rio, o que exigiu o salvamento da burguesia financista da época com a injeção de dinheiro público. Que ninguém pagou. Muito menos Naji Nahas.
- Por que proteger um megaespeculador num terreno de uma massa falida? Ou seja, o dinheiro pode ser pago pelo financiamento da habitação dos milhares que lá se encontravam. Pagos por eles com juros que todos sabem estão longe de ser aqueles aplicados ao financiamento dos produtos da burguesia;- Por que desmantelar um bairro já formado se há em São José dos Campos um déficit de 25 mil moradias a partir da desapropriação do Pinheirinho?
- Para que esta truculência? Quando especuladores do porte de um Salvatore Cacciola são presos há praticamente um pedido de licença para a colocação das algemas mesmo que isso seja apenas um mise-én-scene. Não foi esta mise-én-scene que marcou a condição das mulheres, homens e crianças que foram feridos, alguns com muita gravidade. Havia notícia, não sei até o momento se confirmada, que tratores já destruíam casas com móveis dentro e tudo que estas pessoas acumularam durante a vida. Hoje há relatos sobre furto de móveis das casas das pessoas por parte dos leões de chácara que prosseguem no local.
O que a imprensa contou:
- Polícia enfrenta moradores. Quase anedótico, trata-se, todavia, de uma imoralidade. São os moradores que enfrentaram a PM e infelizmente sem nenhuma condição de defesa porque foram pegos de surpresa, já que havia uma situação de aparente trégua de 15 dias dos quais não havia decorrido nem três. Donde é possível novamente concluir que esperar justiça da instituição justiça é uma ilusão que infelizmente ainda temos diante de tanta nojeira e embuste;
- Polícia tem receio que traficantes vão para outros bairros. Nossa! Podem ter exclamado os pudicos ou inocentes despolitizados de plantão. Acaso há algum bairro em que não haja traficante? O Pinheirinho não é uma extensão idealista de vida terrena; é um bairro com trabalhadores e trabalhadores em sua maioria. Isso é o que importa.
- Há pessoas que estão no Pinheirinho que alugaram suas casas e estão ali para conseguir outra? Esse tipo de “denúncia” é ainda mais imoral. Onde estarão estas pessoas agora? Deixaram de existir? Ou nunca existiram? E se acaso existirem, são a maioria deste povo?
O que o Governador do Estado Fascista do Partido da Socialdemocracia disse:
Vários sites noticiosos destacaram hoje, dia 23 de janeiro, que o Governador Geraldo Alckmin disse que foi legítima a reintegração de posse do Pinheirinho. Essa legitimidade, que o aparente voto assegura, não pode valer para os trabalhadores. É preciso desmascarar essa vilania infindável dos ricos burgueses contra esses miseráveis que somos nós, que lutamos uma vida para ter direito àquilo que dizem já nascemos tendo: moradia, educação, saúde, lazer e cultura.
Haverá um dia em que não seremos cronistas destes tristes momentos em que passamos recebendo balas de chumbo e de borracha como único direito.Por último, o que possibilitou o ato de ontem na avenida Paulista a partir das 17h foi a convocação rápida e funcional via twitter e facebook. Em menos de três horas o ato foi chamado e contou com mais de 500 pessoas, como saiu na imprensa em fotos ridículas que mostravam poucos PM´s porque os demais estavam espancando os trabalhadores em São José dos Campos.
Todavia também não é verdade como a imprensa contou que foi algo quase espontaneísta. Ocorre que os militantes têm nome e por isso quando alguém que não é figura pública começa a divulgar um horário e um local, a imprensa rapidamente se esforça em dizer que tudo é espontaneísta. Que não é preciso nem partido nem organização. Não é verdade. Tanto que os que estiveram na avenida Paulista sabem que houve dezenas de organizações que puderam expressar sua solidariedade, através de seus militantes.
É preciso parar de enaltecer esse antipartidarismo fanático. Porque aqueles que são contra partidos de esquerda podem nem desconfiar, mas estão defendendo os de direita, os explicitamente de direita.
Até a próxima, esperamos que com lágrimas de felicidade pela conquista que pertence ao povo de fato e já não sei se por direito, não esse que grassa por nossas terras tupiniquins. O Direito à verdade, porque essa sim é revolucionária, como já dizia nosso velho camarada.
Fonte: http://www.novae.inf.br/
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