quarta-feira, 10 de abril de 2013

Palestinos com passagem para o apartheid - Por Mel Frykberg

Palestinos com passagem para o apartheid

Israel lançou na Cisjordânia uma nova linha de ônibus exclusivos para palestinos, após reclamações de colonos judeus de que sua segurança estaria “ameaçada”
“Pelo menos não nos tratam como cães”, disse à IPS o diarista Amjad Samara, de 30 anos, da cidade de Naplusa, na Cisjordânia, em referência a como se sente utilizando um novo serviço de ônibus exclusivo para palestinos. Ele e um grupo de palestinos estavam em um posto de controle próximo da localidade de Qalqilia, esperando seu transporte para Israel para um dia de trabalho.

Israel lançou na Cisjordânia uma nova linha de ônibus exclusivos para palestinos, para que os colonos judeus possam “evitar” o “incômodo” de compartilhar o transporte com árabes. O serviço foi criado depois da queixa apresentada pelos colonos no ano passado às autoridades militares israelenses segundo a qual os palestinos que viajavam em “seus ônibus” representavam uma ameaça para sua segurança.

O governo israelense rechaçou as acusações de organizações de direitos humanos, de que o novo serviço é racista e representa uma forma de apartheid (sistema de segregação), e argumentou que a linha foi “planejada para melhorar o transporte de palestinos que entram em Israel”. Mas alguns membros liberais do parlamento israelense não estão convencidos. “Isto se parece com o apartheid”, escreveu a presidente do partido Meretz, Zahava Gal, em seu mural no Facebook.

Yariv Oppenheimer, do movimento Peace Now, contrário às colônias judias, afirmou que a criação do novo serviço envia uma mensagem inadequada. “Em vez de lutar contra o racismo, este governo de fato colabora com o sistema racista e cria ônibus diferentes para palestinos e para colonos israelenses. Na Cisjordânia não há democracia. Se parece mais com o apartheid do que com a democracia”, afirmou.

Funcionários do Ministério do Transporte israelense asseguram que os palestinos não estão oficialmente excluídos dos ônibus para colonos, mas os diaristas contam experiências que contradizem essa afirmação.
“Antes eu procurava pegar ônibus de colonos, mas, em geral, o veículo não parava e seguia viagem. Ou, se parava, para a entrada de colonos, o motorista me dizia que não podia entrar”, contou à IPS o palestino Adnan Omar, de 28 anos, da localidade de Azzun Atme. “E, quando nos deixavam subir, era uma experiência muito desagradável ter de viajar com os colonos, que nos deixavam bem claro que não éramos bem-vindos. Nos olhavam feio e às vezes nos insultavam”, disse Samara à IPS

Motoristas da empresa de ônibus Afikim asseguraram que não são eles que impedem a entrada de palestinos nos veículos, mas os soldados israelenses nos postos de controle. Vários jornalistas que acompanharam de perto a situação informaram que viram palestinos impedidos de subir nos ônibus, ou obrigados a descer deles.
Yirsael Maidad, porta-voz do Conselho de Colonos Judeus, disse que a resistência dos israelenses em compartilhar ônibus com os palestinos se explica pela constante ameaça dos atacantes suicidas. Apesar das críticas de ativistas, alguns dos 29 mil diaristas palestinos que viajam todos os dias a Israel consideram que o novo serviço tem vantagens.

“Esses veículos são mais baratos do que os micro-ônibus palestinos que muitos colegas meus usam para atravessar a Linha Verde para Israel. Também nos sentimos mais seguros do que nos ônibus com colonos, porque não sofremos hostilidades que, às vezes incluíam ataques físicos”, disse Omar à IPS. O novo serviço de transporte para palestinos, que funcionários israelenses admitiram de forma particular que não foi criado por razões altruístas, alimenta os argumentos dos que acusam Israel de adotar um sistema segregacionista.

A Cisjordânia está dividida nas áreas A, sob teórico controle palestino; B, sob controle misto, e C (que representa mais de 60% do território) sob pleno domínio israelense. Os mais de 300 mil colonos judeus na área C gozam de todos os privilégios que foram tirados da população local.

“Os palestinos sofrem uma discriminação sistemática simplesmente por sua raça, etnia e origem nacional. São privados de eletricidade, água, educação e acesso a estradas, enquanto os colonos judeus gozam de todos estes benefícios”, disse Carroll Bogert, subdiretora-executiva para relações exteriores da organização Human Rights Watch (HRW).

“Enquanto se multiplicam os assentamentos, os palestinos sob controle israelense vivem em um túnel do tempo, não apenas separados e em condição desigual, mas também, às vezes, expulsos de suas próprias terras e casas”, lamentou Bogert. “Ao tornarem suas comunidades praticamente inabitáveis, as políticas discriminatórias de Israel frequentemente têm o efeito de obrigar os residentes a abandoná-las”, acrescentou.

A HRW investigou a área C e Jerusalém oriental, e concluiu que a administração israelense fornece generosos benefícios financeiros e infraestrutura aos colonos judeus, enquanto deliberadamente priva de serviços básicos e impõe duras condições às comunidades palestinas. Essa discriminação é feita com base em critérios raciais, de etnia e de nação, o que viola o direito internacional, afirmou a organização.


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