Comércio de armas, hipocrisia europeia
Ao mesmo
tempo em que prega os valores democráticos e a proteção aos direitos humanos,
bloco europeu bate recorde em vendas de armas a cada ano
“Não apenas
a proteção dos direitos humanos, mas também a promoção da paz e dos valores
europeus, são a própria razão para a existência da União Europeia” – Herman Van
Rompuy, Presidente do Conselho Europeu
Enquanto no
Egito se celebra o terceiro aniversário da Primavera Árabe, a situação ainda é
instável. Quarenta e nove pessoas foram mortas nos protestos que marcam o
aniversário, o qual acontece no mesmo momento que um ex-presidente vai a
julgamento e um novo está para ser eleito.
Omã e
Emirados Árabes também foram grandes clientes daUE (Fonte US Peace
Council)
Com esse
cenário, era de se esperar que as potências europeias iriam apoiar o povo
egípcio e promover a reforma democrática na região. Infelizmente isso não
acontece. No mais recente relatório sobre exportações de armas da União
Europeia (UE), o qual inclui números de 2012, mostra que os países do bloco
adicionaram à instabilidade – ao bater um recorde de vendas – mais de 363
milhões de euros em vendas ao governo egípcio, incluindo 16 milhões em
“equipamentos para armas de fogo”; 28 milhões em “dispositivos explosivos” e 46
milhões em “veículos militares” – todo em euro.
Infelizmente,
o Egito não foi o único país instável a contar com esses números
significativos. Omã e Emirados Árabes também foram grandes clientes, comprando
mais de 3 bilhões e 2 bilhões de dólares em armas, respectivamente. De fato,
das 51 autoridades governamentais listadas pelo Índice da Unidade de Inteligência
em Democracias da publicação The Economist, de 2012, 43 delas contaram com
vendas militares, totalizando um recorde de 13 bilhões em vendas de armas para
o Oriente Médio, o que representa um assustador aumento em 22% nas vendas.
A UE era
para ser reconhecida pelo seu comprometimento aos direitos humanos e
democráticos, e isso precisa ser central em sua política externa. As políticas
de seus Estados-membros não foram apenas antiéticas, mas também de uma extrema
visão a curto prazo. Em nenhum lugar isso é tão evidente como no caso da Líbia.
Em 2004, o
embargo à venda de armas da UE na Líbia foi removido e quase que imediatamente
os países passaram a cortejar Qadafi com venda de armas. Apenas em 2010, a UE
vendeu ao país armas, equipamentos, munição e explosivos, totalizando 484
milhões de dólares. Essa política continuou até a Primavera Árabe, quando
Qadafi usou as exportações europeias contra os manifestantes pró-democracia.
Seguindo a queda de Qadafi, as vendas para a Líbia continuaram, com quase 30
milhões de exportações militares sendo autorizadas.
Mas claro,
os países da União Europeia estão longe dos países a quem vendem. E na
realidade, grande parte dessas exportações é destinada a governos opressores,
enquanto a UE tem influência global e deveria usá-la para promover a liberdade
e a democracia, ao invés de promover a legitimidade de ditaduras e violadores
dos direitos humanos.
No início
desse mês, a DAPA, agência de exportação da Coreia do Sul, anunciou que, na
sequencia de uma campanha internacional contra o comércio de armas, eles iriam
cancelar um envio de 1,6 milhões de latas de gás lacrimogênio ao Bahrein. Isso
estabelece um importante precedente que a Europa deveria seguir.
A Primavera
Árabe deveria ser vista como um novo modelo de como a Europa faz negócios com
esses países, mas a mudança foi negligenciada. Em seu relatório
recente, o Comitê do Parlamento para Assuntos Internacionais disse: “Tanto
o governo como a oposição no Bahrein, enxergam nas vendas do Reino Unido como
um sinal de apoio ao governo”. Só essa fala já dá duas boas razões para se opor
ao papel da UE no comércio global de armas.
Nesse ano
ocorrerá eleição no Parlamento Europeu e é importante que os direitos humanos
se central nos debates a respeito do futuro da Europa. Ativistas estão
implorando a todos os candidatos a mostrarem seu compromisso com a paz,
segurança e direitos humanos, garantindo que o comércio de armas e esse
relatório específico sejam discutidos no Parlamento Europeu. Não pode ser
permitido que tal comércio seja apenas mais um tipo de negócios para os
governos europeus e sua inegável contradição e hipocrisia nas políticas
externas – no qual os direitos humanos de todos os civis sejam muito
frequentemente colocados em segundo plano para o lucro rápido das fabricantes
de armas.
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Internationalist | Tradução: Vinicius Gomes
Fonte: http://revistaforum.com.br/
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