Palestina: desafios do governo de unidade
Manifestação
pelo fim das divisões entre os grupos políticos palestinos, em 2011. Unidade
nacional contra ocupação é desejo histórico dos movimentos sociais
Acordo
entre Fatah e Hamas pode marcar retomada da luta contra dominação israelense.
Mas há obstáculos à frente, e Telaviv já lança ameaças
A formação
de um novo governo palestino, com apoio do Fatah e do Hamas, anunciada na
segunda-feira (2/6) é uma estação importante, na rota da reconciliação. “Mas
ainda há muitas estações onde parar, antes de chegar à unidade real baseada
numa parceria entre todos os grupos palestinos”.
Com estas
palavras, Amjad Al-Shawa, porta-voz da rede de ONGs palestinas na Faixa de
Gaza, saudou o governo de consenso nacional, mas afirmou à IPS que todas as
decisões adotadas durante o período de divisão entre os grupos deveriam agora
ser anuladas.
“A formação
de um governo de consenso impõe responsabilidades maiores para nós, como
organizações civis, para lutar pela efetivação do acordo de reconciliação, e
contribuir de modo eficaz na definição de planos nacionais”.
“Reivindicamos
a garantia dos direitos dos palestinos, inclusive a reabertura das organizações
fechadas no período da divisão e a garantia do estado de direito”, acrescentou
Al-Shawa.
O novo
governo palestino, anunciado para acabar com a divisão política entre os
palestinos da Cisjordânia e os da Faixa de Gaza, é o terceiro gabinete liderado
por Ramy Al Hamdallah. Ele sucedeu o antigo primeiro-ministro, Salam Fayyad, e
lidera o 17º equipe ministerial desde que foi estabelecida a Autoridade
Nacional Palestina, em 1994.
O governo
de unidade tomou posse nos escritórios da Organização pela Libertação da
Palestina (OLP), em Ramallah, com a presença do presidente Mahmoud Abbas.
Quatro ministros que vivem na Faixa de Gaza não puderam comparecer ao ato,
porque Israel negou seu acesso à Cisjordânia.
O papel do
governo de consenso nacional é preparar eleições presidenciais e parlamentares
nos territórios palestinos, além de reconstruir a Faixa de Gaza. Esta segunda
prioridade indica a intenção de priorizar a região e tentar romper o bloqueio
imposto por Israel desde que o governo do Hamas assumiu o poder, em junho de
2007.
O
presidente palestino Mahmoud Abbas afirmou, num pronunciamento pela TV, que o
novo governo significará o fim da divisão interna que afetou a causa da
independência nacional. Acrescentou que se trata de um governo de transição,
cuja missão é preparar as eleições.
Abbas
frisou que o novo governo, assim como os anteriores, segue comprometido com os
acordos internacionais firmados pela Autoridade Nacional Palestina (ANP), e com
o programa adotado pelas instituições da OLP. O mandato para negociações
políticas, ele prosseguiu, permanece com a OLP, como única representante
legítima do povo palestino. O presidente advertiu Israel que qualquer ação
punitiva considerada prejudicial aos interesses do povo palestino terá resposta
apropriada.
O novo
governo Fatah-Hamas. Ao centro, o presidente Mahmoud Abbas
Esta parte
do pronunciamento expressa as claras preocupações palestinas sobre a
possibilidade de ações punitivas lançadas por Israel. Em Telaviv, membros do
governo Netanyahu ameaçaram adotar tal atitude, se o processo de reconciliação
entre Fatah e Hamas prosseguisse. As ameaças dirigem-se em particular ao Hamas,
a facção islâmica que Israel e muitos países ocidentais insistem em qualificar
como “terrorista”.
O
primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu não demorou a agir, após o
anúncio da formação do novo governo palestino. Seu gabinete de Segurança
Política anunciou um encontro urgente, para discutir formas de responder à
Autoridade Nacional Palestina, após o acordo desta com o Hamas. A reunião
decidiu autorizar Netanyahu a impor sanções à ANP e ao governo de reconciliação
nacional, mas não deu detalhes.
Observadores
viram o fato como sinal de que o governo de Telaviv escolheu um caminho
centrista, para satisfazer dois extremos. De um lado, está o determinado
ministro da Economia, Naftali Bennet, o líder do partido de direita “Lar
Judeu”, que rejeita qualquer acordo com os palestinos, reivindicando punição e
anexação de suas terras. De outro, Yair Lapid, ministro das Finanças e líder do
partido Yesh Atid (“Há um Futuro”), que propôs esperar. A este, juntou-se o
ministro do Exterior, Avigdor Lieberman [tradicionalmente à direita], para o
qual o governo israelense não deveria apressar-se em responder aos palestinos.
O governo
formado pelo Hamas na Faixa de Gaza – que se manteve sete anos no poder sob cerrado
cerco israelense, isolamento quase total da região e crises sucessivas – deixou
o posto. Ismail Haniya, ex-primeiro-ministro deste governo, afirmou em
entrevista coletiva que saudava o novo governo palestino de consenso, e frisou
a necessidade de acabar com a divisão.
Um dos
desafios com os quais o novo governo palestino defronta-se é restabelecer as
relações entre Gaza e o Egito. Espera-se que este reabra a passagem de Rafah,
que liga a Faixa de Gaza com o resto do mundo. O Cairo havia afirmado que a formação
de um governo de unidade nacional era condição para abertura da passagem.
O governo
egípcio saudou a formação deste novo governo. Num comunicado emitido
segunda-feira, Badr Abdel-Atti, porta-voz do ministério do Exterior, afirmou:
“A formação de um governo de consenso é um passo importante para estabelecer a
unidade da Palestina e a restauração dos direitos legítimos de seu povo – em
especial o direito a autodeterminação e ao estabelecimento de um Estado
independente e soberano, baseado nas fronteiras de 4 de junho de 1967”.
As próximas
semanas serão muito importantes para saber como o novo governo palestino
exercerá suas funções, especialmente na Faixa de Gaza, que sofreu duramente,
nos anos de abusos e violações dos direitos de suas instituições e cidadãos. O
novo governo precisará de tempo e de passos concretos para restaurar a
confiança do povo palestino.
Agência IPS | Tradução: Antonio
Martins
Fonte: http://outraspalavras.net/
Nenhum comentário:
Postar um comentário