quarta-feira, 8 de abril de 2009

Conversa com um anarquista sírio sobre Gaza, no Oriente Médio - ANA

Conversa com um anarquista sírio sobre Gaza, no Oriente Médio

[Mazen Kamalmaz é um anarquista sírio, editor do site de análise e opinião libertária [www.ahewar.org]. A seguir ele fala sobre a questão do recente massacre em Gaza, seus impactos na região e o rol de anarquistas em luta contra o capitalismo e o imperialismo,

Como anarquista no Oriente Médio, como você analisa o recente conflito em Gaza e a frágil trégua alcançada pouco antes da ascensão de Barack Obama ao poder?

Mazen Kamalmaz > O recente ataque de Israel à Gaza foi extremamente sanguinário, mas essa não é a primeira vez. Esta guerra foi a continuação da agressão israelense ao Líbano no verão de 2006. Nessa ocasião, a Secretaria de Estado dos Estados Unidos da América descreveu esta agressão como “Novo Oriente Médio”, supostamente, de forma que se somaria por completo a vontade do super-imperialismo norte-americano. Em ambos os casos se alcançou uma trégua ao final, que não é outra coisa que uma pausa, até que a situação torne-se favorável para o desejo norte-americano. Os bombardeios cessaram somente porque o governo de Obama ordenou aos generais israelenses condições de relativa calma durante a posse do novo presidente da Casa Branca. O pior dos combates e das tréguas resultantes dessa situação, é que as massas, a população, são aqueles que têm sofrido mais e cujos interesses são absolutamente ignorados pelas elites governantes.

Qual foi realmente o motivo do último ataque de Israel?

Mazen Kamalmaz > Impor a vontade de Israel (com o apoio norte-americano) as populações palestinas, e árabes.

Qual foi a reação do mundo árabe frente a essa nova agressão por parte de Israel?

Mazen Kamalmaz > Houve muita raiva nas ruas árabes. Os intelectuais que foram stalinistas e nacionalistas e as elites políticas tiveram de enfrentar esse assunto, alguns apoiaram aos regimes árabes pró-norte-americanos, que são descritos como “modernos”, “moderados”, porque reprimem o fundamentalismo islâmico... essa é a nova forma de “medir” a modernidade do Oriente Médio, com a desculpa da “guerra contra o terrorismo”. Outros se posicionaram do lado do Hamas, assinalando-os como luta anti-Israel, como forma de resistência nacional. Os meios pró-norte-americanos e pró-israelenses não apresentam nem um pouco de credibilidade para o povo árabe durante o conflito, porque a população ficou exposta, e sofreu muito da influência dos islâmicos.

Existem atividades anarquistas de apoio a Gaza e nos países árabes?

Mazen Kamalmaz > A resposta a esta pergunta deve necessariamente levar em conta o estado atual do anarquismo árabe, ainda somos, enquanto movimento, não mais que alguns grupos reduzidos, sem nenhuma influência real entre as massas, além disso, nossas idéias são respeitadas pela elite intelectual, o que não é nosso objetivo. O que queremos é a criação de um forte movimento social de base, fundamentado nos valores de liberdade, igualdade e solidariedade. Em alguns lugares somos apenas uma minoria nos protestos de rua contra a guerra; enfrentamos em todas as partes, medidas repressivas, e isso prejudica a opinião das pessoas em geral. Mas é no aprofundamento das crises generalizadas que nossas idéias são necessárias, para transformar nas bases, e criar uma democracia real em oposição às elites opressoras e exploradoras.

Você acredita que os recentes resultados das eleições em Israel afetarão o conflito palestino?

Mazen Kamalmaz > As eleições israelenses não tiveram grande impacto, se é que teve algum, sobre o destino do conflito. O povo israelense é envenenado pela propaganda sionista, e confia na elite governante. Isto demonstra que as trocas não aconteceram nas eleições. O caso dos judeus israelenses é um exemplo terrível das políticas imperialistas e colonialistas do capitalismo. Depois de ter usado os judeus como símbolo de “bode expiatório” frente a situações de mal-estar social, e logo massacrar milhões, agora se utilizam do mesmo argumento para avançar com seus interesses. Os judeus agora assassinam os palestinos em benefício do capitalismo ocidental, por estarem em uma zona rica em petróleo.

De que maneira a questão palestina afeta o conjunto da região árabe?

Mazen Kamalmaz > A causa palestina possui muita influência no mundo árabe. Depois de 1948, que é o que chamamos de Al-Nakba (O Desastre), na história palestina, a região passou por épocas problemáticas e de agitação, que resultaram em regimes de cunho “nacionalistas” no Cairo, em Bagdá e Damasco. Essas ditaduras opressivas utilizaram o conflito árabe-israelense como uma desculpa para o regime, como um “ópio para as nossas nações”. Agora, temos os fundamentalistas islâmicos, que utilizam a “natureza anti-ocidental” como uma fundamentação para continuar com o seu domínio sobre as massas. Como resultado disso temos a causa palestina como fonte de agitação e confusão entre os discursos, sobre um sistema injusto de exploração.

Como o movimento anarquista pode ajudar o povo palestino? O boicote à Israel é uma tática que você considera correta?

Mazen Kamalmaz > A solidariedade do movimento anarquista internacional é muito necessária e importante. E o “chamado ao boicote” é também muito importante. A experiência oriunda da luta contra o Apartheid, nos mostra que esse tipo de ação é bastante efetivo para enfraquecer o agressor e as posições dos que os apóiam internacionalmente. Nós, ao contrário dos fundamentalistas islâmicos, não vemos o conflito como algo meramente local. De fato, este conflito é parte da luta da humanidade contra um sistema internacional injusto, dominado por multinacionais e potências capitalistas. Para a população árabe, a voz de solidariedade que chega do Ocidente, e inclusive de Israel, é uma prova clara de que o conflito não é um assunto de choque de religiões ou civilizações.

Existe um sentimento amplamente difundido entre os palestinos de que sua causa tem sido ouvida por todo o mundo... Você acredita que é o momento de reviver um movimento internacional de solidariedade? O que deve ser feito por esse movimento?

Mazen Kamalmaz > Concordo plenamente que é isso mesmo. O efeito das atividades “Anarquistas contra o Muro” é contra o muro da segregação racista, é um bom exemplo. O problema é que essas atividades ainda estão em uma pequena escala, e localizada em lugares muito específicos, principalmente na Cisjordânia. Acredito que Gaza deverá se converter em um foco maior de importância para as ações solidárias. O sofrimento da população de Gaza é absurdo, indescritível, e por isso o povo, que carece absolutamente de todo o básico para sobreviver, ficam entre o Hamas e o Fatah, que lhes entregam os bens de consumo básicos e em troca do apoio no conflito do controle territorial.

Você acredita em uma Paz duradoura na Palestina?

Mazen Kamalmaz > Temos argumentado que não pode haver uma solução estatal para este problema, ao menos em caráter de longa duração. Nem as elites locais, nem internacionais podem resolver este conflito. Apenas a população pode fazê-lo. Isto significa que temos de estabelecer laços com os anarquistas em Israel, assim como em outros países da região, e não apenas entre ativistas ou anarquistas, mas sim entre os povos; apenas desta maneira podemos compreender a natureza real do conflito e lutar e enfrentar aqueles que nos dominam.

Tradução > Palomilla Negra

agência de notícias anarquistas-ana

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Karoline de Lima Walczak

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