Trilha sonora!
Existem ou existiram algumas bandas que se perpetuam em nossos ouvidos e mentes!
E como esquecer aquele longínquo domingo no Jabaquara.
Provos Brasil
quinta-feira, 30 de setembro de 2010
Uma revolução intelectual - por José Luís Fiori
Uma revolução intelectual
Certa vez, Jean Paul Sartre disse que “era mais fácil ser escravo do que senhor”, e talvez, de fato, seja mais fácil pensar como escravo, do que como senhor. Mas depois da revolução intelectual em curso na America Latina, já não há mais necessidade de ninguém seguir pensando como escravo, ou mesmo, como aluno primário das “civilizações superiores”.
“Enquanto se pensava que com as leis de Newton e as que lhe sucederam podíamos compreender o universo, o diálogo com as outras civilizações era um diálogo de professor e aluno, aluno primário.”
Ilya Prigogine, “Nome de Deuses”, Ed. UNESP, 2002, p:64
Na segunda metade do Século XX, o físico norte-americano, Thomas Kuhn, e o químico russo, Ilya Prigogine, revolucionaram a epistemologia e a história da ciência, colocando uma pá de cal sobre a visão positivista do conhecimento, e colocando um ponto de interrogação definitivo sobre todas as teorias mecanicistas e deterministas, a respeito do mundo físico, do cosmos e das sociedades humanas.
Para Thomas Kuhn, o avanço da ciência não é acumulativo, nem se dá de forma linear e contínua. Pelo contrário, se dá de forma descontínua e através de grandes rupturas, ou “revoluções científicas”, que assinalam um momento de “mudança de paradigmas”, que são definidos por Kuhn, como uma maneira particular de olhar o mundo, que articula de forma coerente, problemas, conceitos, métodos de pesquisa e critérios de verdade, que só são válidos dentro de determinadas comunidades específicas, e durante períodos determinados de tempo.
Por outro lado, Ilya Prigogine se rebelou contra o determinismo e o mecanicismo das teorias de Isaac Newton e Albert Einstein, e demonstrou que a irreversibilidade do tempo, a desordem e a incerteza são elementos essenciais e construtivos, do mundo físico e biológico. Ou seja: Kuhn defende a historicidade da ciência e dos seus critérios de verdade; e Prigogine defende a importância da “flecha do tempo” e das “escolhas”, para a construção do futuro de um universo físico e de uma sociedade humana, que são rigorosamente imprevisíveis.
Por analogia, também é possível falar da existência de “paradigmas”, e de “revoluções intelectuais”, no campo do pensamento social, onde se formam e se transformam os valores, conceitos e critérios de verdade, que as sociedades humanas utilizam para interpretar o seu passado e o seu presente, e para descodificar e responder às incertezas do seu futuro. São modelos, enfoques e crenças que atravessam o pensamento acadêmico e o pensamento político – de esquerda e de direita - e também fazem parte do senso comum e da formação da opinião publica.
Estes “paradigmas sociais”, também são válidos apenas para certas comunidades específicas, e durante um certo período, por mais longo que ele possa vir a ser. Com o passar do tempo e das mudanças sociais, entretanto, estes paradigmas “societários” perdem fôlego, se esclerosam, e acabam sendo superados por novas “visões do mundo”, mais capazes de compreender e enfrentar os desafios criados pela chegada do futuro.
Pois bem: tudo indica que a América Latina e o Brasil estão vivendo um destes momentos de “revolução intelectual”, e de mudança da sua forma de olhar para si mesmo e para o mundo. De um lado, o que se vê, é um “paradigma intelectual” em franco declínio, incluindo algumas idéias e teorias de esquerda e de direita, que já não dão conta das transformações do continente, e do Brasil, em particular. Seus conceitos e seus debates parecem velhos e repetitivos, e por isto, filtram as novidades trazidas pelo futuro, de forma extremamente reativa, defensiva e medrosa.
Alguns “intelectuais orgânicos” deste velho paradigma vivem fascinados pela idéia do “fim”, seja da democracia, do capitalismo, das espécies, ou da própria terra; outros, estão sempre lamentando as “imperfeições constitutivas” da sociedade latino-americana, tão distantes dos seus modelos ideais de sociedade civil, de classe social, de partido político, ou mesmo, de estado e de capitalismo, E quase todos vivem atormentados com medo do populismo, do corporativismo, do nacional-desenvolvimentismo, do estatismo, entre tantos outros fantasmas do passado. Sem se dar conta que este conceitos e algumas de suas velhas teorias sociológicas e econômicas perderam aderência aos fatos, e já não demonstram nenhuma eficácia como ferramentas analíticas, e como instrumentos estratégicas, voltados para a construção do futuro.
Apesar disto, entretanto, ainda não se pode falar do aparecimento e da existência de novas teorias consistentes, e o próprio continente latino-americano ainda não superou alguns de seus grandes desafios sociais e econômicos. Mas com certeza já se pode falar de uma “revolução intelectual” e de um novo “paradigma”, porque já se consolidou uma nova maneira do continente olhar para si mesmo, para o mundo e para os seus desafios, assumidos como oportunidades e como escolhas, que devem ser feitas, a partir de sua própria identidade, e de seus próprios interesses.
Certa vez, Jean Paul Sartre disse que “era mais fácil ser escravo do que senhor”, e talvez, de fato, seja mais fácil pensar como escravo, do que como senhor. Mas depois desta “revolução intelectual” da America Latina, já não há mais necessidade de ninguém seguir pensando como escravo, ou mesmo, como aluno primário das “civilizações superiores”.
José Luís Fiori, cientista político, é professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Fonte: http://www.cartamaior.com.br
Certa vez, Jean Paul Sartre disse que “era mais fácil ser escravo do que senhor”, e talvez, de fato, seja mais fácil pensar como escravo, do que como senhor. Mas depois da revolução intelectual em curso na America Latina, já não há mais necessidade de ninguém seguir pensando como escravo, ou mesmo, como aluno primário das “civilizações superiores”.
“Enquanto se pensava que com as leis de Newton e as que lhe sucederam podíamos compreender o universo, o diálogo com as outras civilizações era um diálogo de professor e aluno, aluno primário.”
Ilya Prigogine, “Nome de Deuses”, Ed. UNESP, 2002, p:64
Na segunda metade do Século XX, o físico norte-americano, Thomas Kuhn, e o químico russo, Ilya Prigogine, revolucionaram a epistemologia e a história da ciência, colocando uma pá de cal sobre a visão positivista do conhecimento, e colocando um ponto de interrogação definitivo sobre todas as teorias mecanicistas e deterministas, a respeito do mundo físico, do cosmos e das sociedades humanas.
Para Thomas Kuhn, o avanço da ciência não é acumulativo, nem se dá de forma linear e contínua. Pelo contrário, se dá de forma descontínua e através de grandes rupturas, ou “revoluções científicas”, que assinalam um momento de “mudança de paradigmas”, que são definidos por Kuhn, como uma maneira particular de olhar o mundo, que articula de forma coerente, problemas, conceitos, métodos de pesquisa e critérios de verdade, que só são válidos dentro de determinadas comunidades específicas, e durante períodos determinados de tempo.
Por outro lado, Ilya Prigogine se rebelou contra o determinismo e o mecanicismo das teorias de Isaac Newton e Albert Einstein, e demonstrou que a irreversibilidade do tempo, a desordem e a incerteza são elementos essenciais e construtivos, do mundo físico e biológico. Ou seja: Kuhn defende a historicidade da ciência e dos seus critérios de verdade; e Prigogine defende a importância da “flecha do tempo” e das “escolhas”, para a construção do futuro de um universo físico e de uma sociedade humana, que são rigorosamente imprevisíveis.
Por analogia, também é possível falar da existência de “paradigmas”, e de “revoluções intelectuais”, no campo do pensamento social, onde se formam e se transformam os valores, conceitos e critérios de verdade, que as sociedades humanas utilizam para interpretar o seu passado e o seu presente, e para descodificar e responder às incertezas do seu futuro. São modelos, enfoques e crenças que atravessam o pensamento acadêmico e o pensamento político – de esquerda e de direita - e também fazem parte do senso comum e da formação da opinião publica.
Estes “paradigmas sociais”, também são válidos apenas para certas comunidades específicas, e durante um certo período, por mais longo que ele possa vir a ser. Com o passar do tempo e das mudanças sociais, entretanto, estes paradigmas “societários” perdem fôlego, se esclerosam, e acabam sendo superados por novas “visões do mundo”, mais capazes de compreender e enfrentar os desafios criados pela chegada do futuro.
Pois bem: tudo indica que a América Latina e o Brasil estão vivendo um destes momentos de “revolução intelectual”, e de mudança da sua forma de olhar para si mesmo e para o mundo. De um lado, o que se vê, é um “paradigma intelectual” em franco declínio, incluindo algumas idéias e teorias de esquerda e de direita, que já não dão conta das transformações do continente, e do Brasil, em particular. Seus conceitos e seus debates parecem velhos e repetitivos, e por isto, filtram as novidades trazidas pelo futuro, de forma extremamente reativa, defensiva e medrosa.
Alguns “intelectuais orgânicos” deste velho paradigma vivem fascinados pela idéia do “fim”, seja da democracia, do capitalismo, das espécies, ou da própria terra; outros, estão sempre lamentando as “imperfeições constitutivas” da sociedade latino-americana, tão distantes dos seus modelos ideais de sociedade civil, de classe social, de partido político, ou mesmo, de estado e de capitalismo, E quase todos vivem atormentados com medo do populismo, do corporativismo, do nacional-desenvolvimentismo, do estatismo, entre tantos outros fantasmas do passado. Sem se dar conta que este conceitos e algumas de suas velhas teorias sociológicas e econômicas perderam aderência aos fatos, e já não demonstram nenhuma eficácia como ferramentas analíticas, e como instrumentos estratégicas, voltados para a construção do futuro.
Apesar disto, entretanto, ainda não se pode falar do aparecimento e da existência de novas teorias consistentes, e o próprio continente latino-americano ainda não superou alguns de seus grandes desafios sociais e econômicos. Mas com certeza já se pode falar de uma “revolução intelectual” e de um novo “paradigma”, porque já se consolidou uma nova maneira do continente olhar para si mesmo, para o mundo e para os seus desafios, assumidos como oportunidades e como escolhas, que devem ser feitas, a partir de sua própria identidade, e de seus próprios interesses.
Certa vez, Jean Paul Sartre disse que “era mais fácil ser escravo do que senhor”, e talvez, de fato, seja mais fácil pensar como escravo, do que como senhor. Mas depois desta “revolução intelectual” da America Latina, já não há mais necessidade de ninguém seguir pensando como escravo, ou mesmo, como aluno primário das “civilizações superiores”.
José Luís Fiori, cientista político, é professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Fonte: http://www.cartamaior.com.br
[EUA] Apelo para uma semana de Manifestações anti-FMI a nível mundial, de 8 a 11 de outubro - por ANA
[EUA] Apelo para uma semana de Manifestações anti-FMI a nível mundial, de 8 a 11 de outubro
O Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial têm a (merecida) reputação de serem os "tubarões à serviço" do capitalismo global. Ambas as instituições têm a fama de forçar os países pobres do Sul a arruinar as suas próprias economias, a fim de enriquecer ainda mais as Corporações e as Bolsas do Norte. As nações que recusam o dinheiro emprestado a taxas de juros exorbitantes e não aceitem o mendigar do seu povo (ou pior, nações que decidam suspender a sua dívida) estão sujeitas a sanções comerciais que têm vindo a ser descritas como "o equivalente econômico a uma bomba nuclear”.
O regime neoliberal representado pelo FMI gerou uma intensa e amplamente bem-sucedida resistência em todo o mundo. Imediatamente após a aprovação do tratado do NAFTA (Tratado Norte-Americano de Livre Comércio), os e as Zapatistas formaram o seu próprio território autônomo no estado mexicano de Chiapas, que se mantém até hoje, resistindo a uma repressão contínua do governo. Na América do Norte e na Europa, protestos massivos confrontam-se com a elite neoliberal a cada nova Cúpula, desde Seattle, em 1999 – durante a da reunião da Organização Mundial do Comércio, quando esta foi completamente paralisada e cancelada. Em 2001, em Barcelona, o Banco Mundial cancelou uma Cúpula devido ao receio da magnitude dos protestos. Na Argentina, uma revolta popular, em resposta à recessão econômica de 2001, causada pela estrita observância da política neoliberal, provocou a queda de três governos, em um só mês. Piqueteros ergueram barricadas com pneus em chamas nas estradas, trabalhadores tomaram as suas fábricas, e o "Que se vayan todos!" converteu-se no grito de guerra de uma nação inteira.
Mais recentemente, “líderes mundiais” têm se ocupado a restabelecer o neoliberalismo, sob o pretexto de ser necessário recuperar do colapso econômico (que eles mesmos causaram). O FMI foi recapitalizado com 1,1 trilhões de dólares, fornecidos pelo grupo de nações do denominado G20.
Empregadores, em toda a parte, impuseram redução de salários, ao mesmo tempo em que os governos foram fazendo cortes nos serviços sociais, justificando-se tudo isto por ser necessário "compartilhar a crise”. A resistência intensificou-se, em conformidade com esta situação intolerável.
As greves selvagens (greves sem convocatória sindical) em Bangladesh debilitaram a indústria do vestuário, onde os trabalhadores exigem melhorias de segurança e pagamento de salários atrasados. Manifestantes na Romênia realizaram inúmeros protestos contra as medidas de austeridade impostas pelo governo.
Toda a Grécia ficou praticamente ingovernável devido à revolta pela morte de Alexis Grigoropoulos, um jovem de 15 anos, assassinado por um policial, em dezembro de 2008. Motins, greves gerais e ataques insurgentes tornam-se ocorrências comuns naquele país. Agricultores bloquearam a fronteira da Bulgária com seus tratores e banners foram colocados na Acrópole. O anúncio, em abril, de que o governo grego estaria instituindo medidas de austeridade, como parte do resgate monetário do FMI e da União Européia, confrontou-se com 200 mil trabalhadores, imigrantes, anarquistas e radicais nas ruas de Atenas.
Aqui, nos Estados Unidos, marco zero para o neoliberalismo, a reação à crise foi relativamente débil. Os recentes protestos não têm tido nem o tamanho nem a intensidade dos da era antiglobalização. A Rede de Resistência ao FMI existe para ajudar a mudar isso. Somos um grupo antiautoritário da costa Este, dedicado a mobilizar e organizar manifestações contra o FMI e o Banco Mundial e as suas reuniões em Washington DC. A sua próxima Cúpula será de 9 a 11 de outubro deste ano.
Estão todo/a convidados/as.
Visitem imfresistance.org para mais informações ou para contato.
Nos vemos nas ruas!
Rede de Resistência ao FMI
agência de notícias anarquistas-ana
Num banco de praça
a sombra de um velho assombra
o vento que passa.
Luciano Maia
O Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial têm a (merecida) reputação de serem os "tubarões à serviço" do capitalismo global. Ambas as instituições têm a fama de forçar os países pobres do Sul a arruinar as suas próprias economias, a fim de enriquecer ainda mais as Corporações e as Bolsas do Norte. As nações que recusam o dinheiro emprestado a taxas de juros exorbitantes e não aceitem o mendigar do seu povo (ou pior, nações que decidam suspender a sua dívida) estão sujeitas a sanções comerciais que têm vindo a ser descritas como "o equivalente econômico a uma bomba nuclear”.
O regime neoliberal representado pelo FMI gerou uma intensa e amplamente bem-sucedida resistência em todo o mundo. Imediatamente após a aprovação do tratado do NAFTA (Tratado Norte-Americano de Livre Comércio), os e as Zapatistas formaram o seu próprio território autônomo no estado mexicano de Chiapas, que se mantém até hoje, resistindo a uma repressão contínua do governo. Na América do Norte e na Europa, protestos massivos confrontam-se com a elite neoliberal a cada nova Cúpula, desde Seattle, em 1999 – durante a da reunião da Organização Mundial do Comércio, quando esta foi completamente paralisada e cancelada. Em 2001, em Barcelona, o Banco Mundial cancelou uma Cúpula devido ao receio da magnitude dos protestos. Na Argentina, uma revolta popular, em resposta à recessão econômica de 2001, causada pela estrita observância da política neoliberal, provocou a queda de três governos, em um só mês. Piqueteros ergueram barricadas com pneus em chamas nas estradas, trabalhadores tomaram as suas fábricas, e o "Que se vayan todos!" converteu-se no grito de guerra de uma nação inteira.
Mais recentemente, “líderes mundiais” têm se ocupado a restabelecer o neoliberalismo, sob o pretexto de ser necessário recuperar do colapso econômico (que eles mesmos causaram). O FMI foi recapitalizado com 1,1 trilhões de dólares, fornecidos pelo grupo de nações do denominado G20.
Empregadores, em toda a parte, impuseram redução de salários, ao mesmo tempo em que os governos foram fazendo cortes nos serviços sociais, justificando-se tudo isto por ser necessário "compartilhar a crise”. A resistência intensificou-se, em conformidade com esta situação intolerável.
As greves selvagens (greves sem convocatória sindical) em Bangladesh debilitaram a indústria do vestuário, onde os trabalhadores exigem melhorias de segurança e pagamento de salários atrasados. Manifestantes na Romênia realizaram inúmeros protestos contra as medidas de austeridade impostas pelo governo.
Toda a Grécia ficou praticamente ingovernável devido à revolta pela morte de Alexis Grigoropoulos, um jovem de 15 anos, assassinado por um policial, em dezembro de 2008. Motins, greves gerais e ataques insurgentes tornam-se ocorrências comuns naquele país. Agricultores bloquearam a fronteira da Bulgária com seus tratores e banners foram colocados na Acrópole. O anúncio, em abril, de que o governo grego estaria instituindo medidas de austeridade, como parte do resgate monetário do FMI e da União Européia, confrontou-se com 200 mil trabalhadores, imigrantes, anarquistas e radicais nas ruas de Atenas.
Aqui, nos Estados Unidos, marco zero para o neoliberalismo, a reação à crise foi relativamente débil. Os recentes protestos não têm tido nem o tamanho nem a intensidade dos da era antiglobalização. A Rede de Resistência ao FMI existe para ajudar a mudar isso. Somos um grupo antiautoritário da costa Este, dedicado a mobilizar e organizar manifestações contra o FMI e o Banco Mundial e as suas reuniões em Washington DC. A sua próxima Cúpula será de 9 a 11 de outubro deste ano.
Estão todo/a convidados/as.
Visitem imfresistance.org para mais informações ou para contato.
Nos vemos nas ruas!
Rede de Resistência ao FMI
agência de notícias anarquistas-ana
Num banco de praça
a sombra de um velho assombra
o vento que passa.
Luciano Maia
quarta-feira, 29 de setembro de 2010
Estado Assassino: Israel prende britânicos que tentavam romper bloqueio à Faixa de Gaza - por EFE
Estado Assassino: Israel prende britânicos que tentavam romper bloqueio à Faixa de Gaza - por EFE
As autoridades israelenses prenderam dois britânicos que viajavam em um barco que tentava romper o bloqueio marítimo à Faixa de Gaza, informou a organização "Judeus pela Justiça para os Palestinos" nesta quarta-feira (29/9).
O Irene, embarcação com bandeira britânica e fretado por organizações judias internacionais, foi abordado ontem pela Marinha israelense quando se aproximava da reigão bloqueada.
Os dois britânicos - o capitão Glyn Secker e a fotógrafa Vish Vishvanath - foram levados a um centro de imigração em Israel e serão deportados, segundo uma porta-voz dos ativistas.
De acordo com a organização, que perdeu contato com Secker na terça-feira às 6h37 (pelo horário de Brasília), os dois britânicos estão sob custódia policial no aeroporto Ben Gurion, de Israel, de onde retornarão ainda nesta quarta-feira ao Reino Unido.
"Seus representantes legais afirmaram que eles estão bem, um pouco cansados. Informamos às famílias sobre seus retornos", assinalou em nota o grupo Judeus pela Justiça para os Palestinos.
Já o ministério britânico de Assuntos Exteriores informou que seu pessoal consular em Tel Aviv vai fornecer ajuda caso seja requisitado.
O barco - com dez ativistas procedentes do Reino Unido, Estados Unidos, Alemanha e Israel - saiu no domingo do porto cipriota de Famagusta com a intenção de levar ajuda humanitária simbólica à população de Gaza.
O Irene foi fretado por organizações como a britânica "Judeus pela Justiça para os Palestinos", a europeia "Judeus Europeus por uma Paz Justa", a norte-americana "Voz Judia pela Paz" e a australiana "Judeus contra a Ocupação".
Segundo os organizadores, trata-se de "um ato simbólico de solidariedade e protesto não violento" que pede o fim do bloqueio ao território palestino.
A expedição ocorre quatro meses depois do ataque militar de Israel contra a Flotilha da Liberdade - comboio naval que se dirigia à Faixa de Gaza em 31 de maio para levar ajuda humanitária.
Desde 2007, depois que o Hamas, partido vencedor das eleições de 2006, assumiu o poder no território palestino, Israel impõe bloqueio à Faixa de Gaza. Segundo o governo, o objetivo é impedir a entrada de armas que poderiam ser usadas pelo Hamas para atacar Israel.
Fonte: Opera Mundi
As autoridades israelenses prenderam dois britânicos que viajavam em um barco que tentava romper o bloqueio marítimo à Faixa de Gaza, informou a organização "Judeus pela Justiça para os Palestinos" nesta quarta-feira (29/9).
O Irene, embarcação com bandeira britânica e fretado por organizações judias internacionais, foi abordado ontem pela Marinha israelense quando se aproximava da reigão bloqueada.
Os dois britânicos - o capitão Glyn Secker e a fotógrafa Vish Vishvanath - foram levados a um centro de imigração em Israel e serão deportados, segundo uma porta-voz dos ativistas.
De acordo com a organização, que perdeu contato com Secker na terça-feira às 6h37 (pelo horário de Brasília), os dois britânicos estão sob custódia policial no aeroporto Ben Gurion, de Israel, de onde retornarão ainda nesta quarta-feira ao Reino Unido.
"Seus representantes legais afirmaram que eles estão bem, um pouco cansados. Informamos às famílias sobre seus retornos", assinalou em nota o grupo Judeus pela Justiça para os Palestinos.
Já o ministério britânico de Assuntos Exteriores informou que seu pessoal consular em Tel Aviv vai fornecer ajuda caso seja requisitado.
O barco - com dez ativistas procedentes do Reino Unido, Estados Unidos, Alemanha e Israel - saiu no domingo do porto cipriota de Famagusta com a intenção de levar ajuda humanitária simbólica à população de Gaza.
O Irene foi fretado por organizações como a britânica "Judeus pela Justiça para os Palestinos", a europeia "Judeus Europeus por uma Paz Justa", a norte-americana "Voz Judia pela Paz" e a australiana "Judeus contra a Ocupação".
Segundo os organizadores, trata-se de "um ato simbólico de solidariedade e protesto não violento" que pede o fim do bloqueio ao território palestino.
A expedição ocorre quatro meses depois do ataque militar de Israel contra a Flotilha da Liberdade - comboio naval que se dirigia à Faixa de Gaza em 31 de maio para levar ajuda humanitária.
Desde 2007, depois que o Hamas, partido vencedor das eleições de 2006, assumiu o poder no território palestino, Israel impõe bloqueio à Faixa de Gaza. Segundo o governo, o objetivo é impedir a entrada de armas que poderiam ser usadas pelo Hamas para atacar Israel.
Fonte: Opera Mundi
Estados Unidos a caminho de ser o Grande Irmão - por William Fisher
Estados Unidos a caminho de ser o Grande Irmão - por William Fisher
As últimas blitzes de agentes federais em residências e escritórios de pacifistas são consideradas por defensores das liberdades civis como uma prova de que os Estados Unidos se convertem em um “Estado de vigilância”, onde o direito à privacidade e outras proteções legais desaparecem.
As últimas blitzes de agentes federais em residências e escritórios de pacifistas são consideradas por defensores das liberdades civis como uma prova de que os Estados Unidos se convertem em um “Estado de vigilância”, onde o direito à privacidade e outras proteções legais desaparecem. No dia 24, agentes do Escritório Federal de Investigações (FBI) realizaram na cidade de Minneapolis uma série revistas em casas de ativistas contra a guerra e no escritório de um grupo pacifista, bem como na casa, em Chicago, do chefe de uma organização árabe-norte-americana.
O jornal Minneapolis Star Tribune informou que as revistas eram parte de uma investigação sobre “atividades relacionadas com apoio material ao terrorismo”. Ninguém foi detido. O porta-voz do FBI, Steve Warfield, disse aos jornalistas que as operações aconteceram por volta das sete horas da manhã. Advogados afirmam que os agentes apreenderam computadores, celulares e documentos dos ativistas.
“O continuado e escandaloso assédio a pacifistas, ambientalistas e outros ativistas e dissidentes no governo de Barack Obama, neste e em outros casos, é indesculpável e deve acabar”, disse à IPS o presidente do independente Comitê de Defesa da Carta dos Direitos, Chip Pitts. “Isto confirma a urgência de simpatizantes de todos os partidos, de todas as idades e de todos os setores de opinião unirem-se à comunidade pelas liberdades civis em esforços para resistir ao emergente Estado de vigilância e para restaurar as proteções constitucionais”, acrescentou.
Segundo Chip, as garantias individuais “se diluíram com a Lei Patriota e outras similares aprovadas no medo politicamente manipulado depois dos atentados terroristas de 11 de setembro de 2001” em Nova York e Washington. Ativistas disseram ao jornal de Minneapolis que as invasões “os surpreenderam”. Um deles, Mick Kelly, teve papel central nas manifestações diante da Convenção Nacional Republicana de 2008, na cidade de Saint Paul.
Consultado pelo jornal sobre se estava envolvido em alguma atividade ilegal, respondeu: “absolutamente não”. Ted Dooley, seu advogado, disse que as apreensões foram, na realidade, “uma investigação sobre as opiniões políticas de cidadãos norte-americanos e de qualquer organização contrária ao desígnio imperialista” de Washington.
Além disso, explicou que as ordens de invasão se basearam em uma lei federal que considera crime promover ou conspirar para fornecer apoio material a organizações terroristas estrangeiras. Supostamente eram investigadas ligações com grupos terroristas nos territórios palestinos e na Colômbia. Os ativistas foram intimados a comparecerem a um júri federal no próximo mês, em Chicago. Também foram emitidas intimações em Michigan e Carolina do Norte.
Após as blitzes, organizações pacifistas e similares começaram a preparar sua resposta. No dia 27, cerca de 150 pessoas reuniram-se diante do escritório do FBI em Minneapolis, algumas com cartazes onde se lia “Opor-se à guerra não é um crime”. Para ontem eram previstas outras manifestações em diferentes partes do país. Os ativistas investigados pelo FBI asseguram não ter cometido crime algum e anunciaram que continuariam se opondo à política norte-americana no Oriente Médio e na América do Sul.
Por sua vez, o jornal The New York Times informou, no dia 27, que o governo Obama preparava um projeto de lei para facilitar aos serviços de inteligência a interceptação de comunicações e informações na internet, incluindo e-mails e conteúdo privado em redes sociais. A Casa Branca prevê apresentar o texto ao Congresso no próximo ano.
A nova lei, se aprovada, exigirá que todos os serviços via internet sejam tecnicamente capazes de permitir a interceptação das comunicações pelas autoridades federais em caso de uma ordem, informou o jornal. Os serviços de correio eletrônico através de telefone celular inteligente como BlackBerry, as redes sociais com Facebook e programas de telefone na Internet, como Skype, poderiam ser submetidos à vigilância.
Fonte: http://www.revistaforum.com.br
As últimas blitzes de agentes federais em residências e escritórios de pacifistas são consideradas por defensores das liberdades civis como uma prova de que os Estados Unidos se convertem em um “Estado de vigilância”, onde o direito à privacidade e outras proteções legais desaparecem.
As últimas blitzes de agentes federais em residências e escritórios de pacifistas são consideradas por defensores das liberdades civis como uma prova de que os Estados Unidos se convertem em um “Estado de vigilância”, onde o direito à privacidade e outras proteções legais desaparecem. No dia 24, agentes do Escritório Federal de Investigações (FBI) realizaram na cidade de Minneapolis uma série revistas em casas de ativistas contra a guerra e no escritório de um grupo pacifista, bem como na casa, em Chicago, do chefe de uma organização árabe-norte-americana.
O jornal Minneapolis Star Tribune informou que as revistas eram parte de uma investigação sobre “atividades relacionadas com apoio material ao terrorismo”. Ninguém foi detido. O porta-voz do FBI, Steve Warfield, disse aos jornalistas que as operações aconteceram por volta das sete horas da manhã. Advogados afirmam que os agentes apreenderam computadores, celulares e documentos dos ativistas.
“O continuado e escandaloso assédio a pacifistas, ambientalistas e outros ativistas e dissidentes no governo de Barack Obama, neste e em outros casos, é indesculpável e deve acabar”, disse à IPS o presidente do independente Comitê de Defesa da Carta dos Direitos, Chip Pitts. “Isto confirma a urgência de simpatizantes de todos os partidos, de todas as idades e de todos os setores de opinião unirem-se à comunidade pelas liberdades civis em esforços para resistir ao emergente Estado de vigilância e para restaurar as proteções constitucionais”, acrescentou.
Segundo Chip, as garantias individuais “se diluíram com a Lei Patriota e outras similares aprovadas no medo politicamente manipulado depois dos atentados terroristas de 11 de setembro de 2001” em Nova York e Washington. Ativistas disseram ao jornal de Minneapolis que as invasões “os surpreenderam”. Um deles, Mick Kelly, teve papel central nas manifestações diante da Convenção Nacional Republicana de 2008, na cidade de Saint Paul.
Consultado pelo jornal sobre se estava envolvido em alguma atividade ilegal, respondeu: “absolutamente não”. Ted Dooley, seu advogado, disse que as apreensões foram, na realidade, “uma investigação sobre as opiniões políticas de cidadãos norte-americanos e de qualquer organização contrária ao desígnio imperialista” de Washington.
Além disso, explicou que as ordens de invasão se basearam em uma lei federal que considera crime promover ou conspirar para fornecer apoio material a organizações terroristas estrangeiras. Supostamente eram investigadas ligações com grupos terroristas nos territórios palestinos e na Colômbia. Os ativistas foram intimados a comparecerem a um júri federal no próximo mês, em Chicago. Também foram emitidas intimações em Michigan e Carolina do Norte.
Após as blitzes, organizações pacifistas e similares começaram a preparar sua resposta. No dia 27, cerca de 150 pessoas reuniram-se diante do escritório do FBI em Minneapolis, algumas com cartazes onde se lia “Opor-se à guerra não é um crime”. Para ontem eram previstas outras manifestações em diferentes partes do país. Os ativistas investigados pelo FBI asseguram não ter cometido crime algum e anunciaram que continuariam se opondo à política norte-americana no Oriente Médio e na América do Sul.
Por sua vez, o jornal The New York Times informou, no dia 27, que o governo Obama preparava um projeto de lei para facilitar aos serviços de inteligência a interceptação de comunicações e informações na internet, incluindo e-mails e conteúdo privado em redes sociais. A Casa Branca prevê apresentar o texto ao Congresso no próximo ano.
A nova lei, se aprovada, exigirá que todos os serviços via internet sejam tecnicamente capazes de permitir a interceptação das comunicações pelas autoridades federais em caso de uma ordem, informou o jornal. Os serviços de correio eletrônico através de telefone celular inteligente como BlackBerry, as redes sociais com Facebook e programas de telefone na Internet, como Skype, poderiam ser submetidos à vigilância.
Fonte: http://www.revistaforum.com.br
terça-feira, 28 de setembro de 2010
A imprensa, verdadeira oposição no Brasil - por Eric Nepomuceno.
A imprensa, verdadeira oposição no Brasil - por Eric Nepomuceno.
Getúlio Vargas foi alvo de uma contundente campanha encabeçada pelo jornal Tribuna da Imprensa. Juscelino Kubitschek enfrentou a resistência feroz do conservador O Estado de São Paulo. Leonel Brizola passou seus dois governos no Rio sob uma campanha implacável (e freqüentemente mentirosa) do mais poderoso grupo de comunicações da América Latina. Nunca antes, porém, um presidente foi tão perseguido pelos meios de comunicação como ocorre com Luiz Inácio Lula da Silva. E isso que a liberdade de imprensa é absoluta no Brasil e Lula optou pelo não enfrentamento com as 8 famílias que controlam a mídia no país. Ao contrário do que ocorreu com outros países que viveram ditaduras, no Brasil a imprensa não se democratizou.
Artigo publicado originalmente no jornal Página/12
Considerado o fundador do Estado moderno no Brasil, Getúlio Vargas foi alvo de uma contundente campanha encabeçada pelo jornal Tribuna da Imprensa, do Rio de Janeiro. Terminou se suicidando com um tiro no coração em agosto de 1954. Criador de Brasília e um dos presidentes mais populares do Brasil, Juscelino Kubitschek enfrentou a resistência feroz do conservador O Estado de São Paulo. Acusado de corrupção irremediável, jamais se comprovou nada contra ele. Histórico dirigente da esquerda, o trabalhista Leonel Brizola foi governador do Rio de Janeiro em 1982, no início do processo da democratização, e passou seus dois governos sob uma campanha implacável (e freqüentemente mentirosa) do mais poderoso grupo de comunicações da América Latina, que controla a TV Globo e o jornal O Globo.
Nunca antes, porém, um presidente foi tão perseguido pelos meios de comunicação como ocorre com Luiz Inácio Lula da Silva. Com freqüência assombrosa foram abandonadas as regras básicas do mínimo respeito cidadão. Um bom exemplo disso é a revista Veja, semanário de maior circulação no país, que sem resquícios de pudor público denuncia escândalos em seqüência que acabam não sendo comprovados. Em sua página na internet abriga comentaristas que tratam o presidente da Nação de “essa pessoa”. O mesmo grupo que controla a TV Globo, cujo noticiário tem a maioria da audiência, o matutino O Globo, principal jornal do Rio e segundo em circulação no Brasil, e a principal cadeia de rádio, CBN, não perde a oportunidade de destroçar Lula e seu governo, sem preocupar-se nem um pouco com a veracidade de seus ataques. O jornal Folha de São Paulo, de maior circulação no país, divulga qualquer denúncia como se fosse verdadeira e não se priva de aceitar que um ex-condenado por receptação de mercadorias roubadas e circulação de dinheiro falso se transforme em “consultor de negócios” e lance acusações sem apresentar nenhuma prova. Até o conservador O Estado de São Paulo, que até agora era o mais equilibrado na oposição ao governo, optou por ingressar neste jogo sem regras nem norte.
Frente á inércia dos principais partidos de oposição, o PSDB e o DEM, os meios de comunicação ocupam organicamente esse espaço. Isso foi admitido, há alguns meses, pela própria presidente da Associação nacional de Jornais (ANJ), Judith Brito, da Folha de São Paulo. Mais grave, porém, é o que nenhum destes grupos admite: mesmo antes de iniciar a campanha sucessória de Lula, esse enorme partido informal (mas muito eficaz) de oposição optou por um candidato, José Serra, que não respondeu às suas expectativas. E frente à incapacidade de sua campanha eleitoral, os meios de comunicação brasileiros decidiram atacar a candidatura de Dilma Rousseff, ignorando os limites éticos.
Essa politização absoluta e essa tomada de posição pela imprensa terminaram por provocar a reação de Lula. Suas críticas, por sua vez, provocaram uma irada onda de novas denúncias, indicando que o presidente pretendia impedir a liberdade de expressão e de opinião. No entanto, em seus quase oito anos como presidente, Lula em nenhum momento representou uma ameaça à grande imprensa, por mais remota que fosse. Alguns movimentos para impor algumas regras e impedir a permanência de um esquema de quase monopólio foram neutralizados pelo próprio Lula que optou pelo não enfrentamento com as oito famílias que concentram o controle dos meios de comunicação no maior país latinoamericano.
A liberdade de imprensa é absoluta no Brasil, ao ponto de ter se transformado em liberdade de caluniar. Os grosseiros ataques, freqüentemente baseados em nada, contra Lula e seus governo aparecem todos os dias, sem que ninguém trate de impedi-los. E, ainda assim, os grandes meios não deixam de denunciar ameaças à liberdade de expressão. Talvez a razão de tudo isso repouse no que ocorreu quando o Brasil voltou á democracia, há 25 anos. Ao contrário do que ocorreu em outros países que reencontraram a democracia – penso especificamente nos casos da Espanha e da Argentina -, no Brasil a imprensa não se democratizou. Não surgiram alternativas que respondessem aos diferentes segmentos políticos e ideológicos. Prevaleceu o cenário em que cada meio apresenta o eco de uma mesma voz, a do sistema dominante.
Para esse sistema, Lula era um risco suportável. Já a sua sucessão é outra coisa. E se o candidato da oposição se mostra um incapaz, o verdadeiro partido oposicionista revela sua cara mais feroz. Ao exercer a liberdade do denuncismo barato, mostra seu inconformismo com a manifestação do desejo dessa massa de ignaros que é chamada de povo. Essa gente que não era nada e passou a se considerar cidadã. Isso sim é inadmissível.
(*) Jornalista, escritor e tradutor
Tradução: Katarina Piexoto
Fonte: Carta Maior
Getúlio Vargas foi alvo de uma contundente campanha encabeçada pelo jornal Tribuna da Imprensa. Juscelino Kubitschek enfrentou a resistência feroz do conservador O Estado de São Paulo. Leonel Brizola passou seus dois governos no Rio sob uma campanha implacável (e freqüentemente mentirosa) do mais poderoso grupo de comunicações da América Latina. Nunca antes, porém, um presidente foi tão perseguido pelos meios de comunicação como ocorre com Luiz Inácio Lula da Silva. E isso que a liberdade de imprensa é absoluta no Brasil e Lula optou pelo não enfrentamento com as 8 famílias que controlam a mídia no país. Ao contrário do que ocorreu com outros países que viveram ditaduras, no Brasil a imprensa não se democratizou.
Artigo publicado originalmente no jornal Página/12
Considerado o fundador do Estado moderno no Brasil, Getúlio Vargas foi alvo de uma contundente campanha encabeçada pelo jornal Tribuna da Imprensa, do Rio de Janeiro. Terminou se suicidando com um tiro no coração em agosto de 1954. Criador de Brasília e um dos presidentes mais populares do Brasil, Juscelino Kubitschek enfrentou a resistência feroz do conservador O Estado de São Paulo. Acusado de corrupção irremediável, jamais se comprovou nada contra ele. Histórico dirigente da esquerda, o trabalhista Leonel Brizola foi governador do Rio de Janeiro em 1982, no início do processo da democratização, e passou seus dois governos sob uma campanha implacável (e freqüentemente mentirosa) do mais poderoso grupo de comunicações da América Latina, que controla a TV Globo e o jornal O Globo.
Nunca antes, porém, um presidente foi tão perseguido pelos meios de comunicação como ocorre com Luiz Inácio Lula da Silva. Com freqüência assombrosa foram abandonadas as regras básicas do mínimo respeito cidadão. Um bom exemplo disso é a revista Veja, semanário de maior circulação no país, que sem resquícios de pudor público denuncia escândalos em seqüência que acabam não sendo comprovados. Em sua página na internet abriga comentaristas que tratam o presidente da Nação de “essa pessoa”. O mesmo grupo que controla a TV Globo, cujo noticiário tem a maioria da audiência, o matutino O Globo, principal jornal do Rio e segundo em circulação no Brasil, e a principal cadeia de rádio, CBN, não perde a oportunidade de destroçar Lula e seu governo, sem preocupar-se nem um pouco com a veracidade de seus ataques. O jornal Folha de São Paulo, de maior circulação no país, divulga qualquer denúncia como se fosse verdadeira e não se priva de aceitar que um ex-condenado por receptação de mercadorias roubadas e circulação de dinheiro falso se transforme em “consultor de negócios” e lance acusações sem apresentar nenhuma prova. Até o conservador O Estado de São Paulo, que até agora era o mais equilibrado na oposição ao governo, optou por ingressar neste jogo sem regras nem norte.
Frente á inércia dos principais partidos de oposição, o PSDB e o DEM, os meios de comunicação ocupam organicamente esse espaço. Isso foi admitido, há alguns meses, pela própria presidente da Associação nacional de Jornais (ANJ), Judith Brito, da Folha de São Paulo. Mais grave, porém, é o que nenhum destes grupos admite: mesmo antes de iniciar a campanha sucessória de Lula, esse enorme partido informal (mas muito eficaz) de oposição optou por um candidato, José Serra, que não respondeu às suas expectativas. E frente à incapacidade de sua campanha eleitoral, os meios de comunicação brasileiros decidiram atacar a candidatura de Dilma Rousseff, ignorando os limites éticos.
Essa politização absoluta e essa tomada de posição pela imprensa terminaram por provocar a reação de Lula. Suas críticas, por sua vez, provocaram uma irada onda de novas denúncias, indicando que o presidente pretendia impedir a liberdade de expressão e de opinião. No entanto, em seus quase oito anos como presidente, Lula em nenhum momento representou uma ameaça à grande imprensa, por mais remota que fosse. Alguns movimentos para impor algumas regras e impedir a permanência de um esquema de quase monopólio foram neutralizados pelo próprio Lula que optou pelo não enfrentamento com as oito famílias que concentram o controle dos meios de comunicação no maior país latinoamericano.
A liberdade de imprensa é absoluta no Brasil, ao ponto de ter se transformado em liberdade de caluniar. Os grosseiros ataques, freqüentemente baseados em nada, contra Lula e seus governo aparecem todos os dias, sem que ninguém trate de impedi-los. E, ainda assim, os grandes meios não deixam de denunciar ameaças à liberdade de expressão. Talvez a razão de tudo isso repouse no que ocorreu quando o Brasil voltou á democracia, há 25 anos. Ao contrário do que ocorreu em outros países que reencontraram a democracia – penso especificamente nos casos da Espanha e da Argentina -, no Brasil a imprensa não se democratizou. Não surgiram alternativas que respondessem aos diferentes segmentos políticos e ideológicos. Prevaleceu o cenário em que cada meio apresenta o eco de uma mesma voz, a do sistema dominante.
Para esse sistema, Lula era um risco suportável. Já a sua sucessão é outra coisa. E se o candidato da oposição se mostra um incapaz, o verdadeiro partido oposicionista revela sua cara mais feroz. Ao exercer a liberdade do denuncismo barato, mostra seu inconformismo com a manifestação do desejo dessa massa de ignaros que é chamada de povo. Essa gente que não era nada e passou a se considerar cidadã. Isso sim é inadmissível.
(*) Jornalista, escritor e tradutor
Tradução: Katarina Piexoto
Fonte: Carta Maior
segunda-feira, 27 de setembro de 2010
domingo, 26 de setembro de 2010
O problema palestino?
O problema palestino?
Vamos esclarecer essa história de problema palestino.
1 Os palestinos sempre viveram na Palestina
2 Os palestinos não invadiram a Europa
3 Os palestinos não provocaram a segunda guerra mundial
4 Os palestinos não têm nada a ver com o Holocausto
5 O Holocausto é um produto ocidental
6 Os judeus são um problema do Ocidente
7 Os judeus sofreram racismo no Ocidente
8 Se os ocidentais têm problema de consciência, isso não lhes dá o direito de ceder uma terra que não lhes pertence.
9 Os judeus nunca foram discriminados pelos palestinos
10 Os judeus invadiram a Palestina
Portanto o que existe é um problema israelense e não um problema palestino.
Por Georges Bourdoukan
Fonte: http://blogdobourdoukan.blogspot.com/
Vamos esclarecer essa história de problema palestino.
1 Os palestinos sempre viveram na Palestina
2 Os palestinos não invadiram a Europa
3 Os palestinos não provocaram a segunda guerra mundial
4 Os palestinos não têm nada a ver com o Holocausto
5 O Holocausto é um produto ocidental
6 Os judeus são um problema do Ocidente
7 Os judeus sofreram racismo no Ocidente
8 Se os ocidentais têm problema de consciência, isso não lhes dá o direito de ceder uma terra que não lhes pertence.
9 Os judeus nunca foram discriminados pelos palestinos
10 Os judeus invadiram a Palestina
Portanto o que existe é um problema israelense e não um problema palestino.
Por Georges Bourdoukan
Fonte: http://blogdobourdoukan.blogspot.com/
sábado, 25 de setembro de 2010
“Os Estados Unidos estão perdendo o controle”
“Os Estados Unidos estão perdendo o controle” Por Redação
O escritor e filósofo estadunidense Noam Chomsky assinalou que os Estados Unidos estão perdendo o controle no mundo e indicou que a América Latina, região que a nação norteamericana considerou por décadas como “quintal”, está se aproximando da sua independência e da integração.
“Agora estamos em um momento dramático porque os Estados Unidos estão perdendo o controle em todas as partes. O Oriente Médio é o lugar mais importante. Mas a China é outro caso, assim como é o hemisfério ocidental”, indicou Chomsky.
Acrescentou que “sempre se deu por certo que o chamado quintal estaria sob controle. Se você olhar os documentos internos, durante os anos de [ex-presidente estadunidense Richard ] Nixon, quando estavam planejando a derrocada do governo de [Salvador] Allende [ex-presidente chileno derrubado pelo ditador Augusto Pinochet], disseram exatamente que, se não podiam controlar a América Latina, como iriam controlar o resto do mundo”.
“Já não podem controlar a América Latina. De fato, passo a passo, a América Latina, pela primeira vez, está se aproximando da sua independência e da integração”, sublinhou.
Recordou que, em fevereiro, realizou-se a Cúpula da Unidade da América Latina e Caribe, em Cancún, no México, em que foi aprovado um organismo regional que reúne os países da América Latina e Caribe sem a participação dos Estados Unidos nem Canadá, com o objetivo de integrar a região, isso “foi um tapa” para ambos países norteamericanos.
“Por enquanto, somente é formal. Mas se chega a ser operativo, elimina a OEA [Organização dos Estados Americanos] que é dirigida pelos Estados Unidos. É como se dissessem aos Estados Unidos que se retirem de nossos assuntos. E há outras medidas que estão sendo tomadas. Por exemplo, a China superou os Estados Unidos como importador do Brasil e provavelmente o superará como sócio comercial. É uma grande notícia”, acrescentou.
A seguir, a entrevista na íntegra realizada com o escritor e filósofo estadunidense Noam Chomsky.
Quero começar perguntando-lhe sobre o Irã, os Estados Unidos estão pressionando para que o Conselho de Segurança da ONU [Organização das Nações Unidas] imponha-lhe sanções mais duras. Até onde vão os Estados Unidos ou Israel, poderiam invadir ou atacar o Irã?
Israel não é previsível. Particularmente, nos últimos dois anos, tem agido de maneira muito irracional, com muita paranóia, em uma situação em que não se pode saber o que vão fazer. Não creio que nem eles saibam o que vão fazer. Estão chegando a um ponto onde podem não ter outra saída a não ser bombardear o Irã. Mas não podem fazer isso sem o apoio dos Estados Unidos. Assim, a pergunta é se os Estados Unidos autorizarão.
Tecnicamente, Israel poderia fazê-lo. Tem submarinos, que conseguiram da Alemanha, com mísseis nucleares profundamente submersos no Golfo Pérsico.
Teoricamente, poderiam atacar ao Irã sem passar pelo espaço aéreo. Mas quase todos os ataques que se podem conceber passariam pelo espaço aéreo de algum país, assim seria difícil o fazerem sem algum tipo de autorização pelo menos tácita. A Turquia não vai consentir. A pergunta é se os Estados Unidos a autorizaria contra o Iraque. E a outra pergunta é a Arábia Saudita. É concebível que tentaria. Eu acredito que seria uma loucura. E os Estados Unidos? [Barack] Obama, que avançou com os programas de [George W.] Bush, junto com seus assessores, também está se metendo em uma situação onde poderia não ter opção. Porque criaram essa ideia de ameaça do Irã. A ilha mais importante é Diogo García, uma ilha africana onde a Grã-Bretanha expulsou todos os habitantes para que os Estados Unidos pudessem construir uma base militar grande, e é uma das bases militares para atacar o Oriente Médio na Ásia Central. E Obama avançou ali. Enviou centenas de artilharia com penetração profunda chamada “rompe-bunkers”, que estão apontados para o Irã. Enviou instalações para apoiar submarinos nucleares com mísseis Tomahawk. Tudo isso representa uma ameaça direta ao Irã. E as sanções estadunidenses estão ficando mais duras. Mas chama a atenção que fora da Europa e do Japão ninguém está prestando muita atenção. Esses países estão de acordo em ser servis aos Estados Unidos.
Não é o caso do resto do mundo. Os países não alinhados, que são a maioria dos países do mundo, têm apoiado fortemente o direito do Irã em enriquecer o urânio. Mas ninguém presta atenção a eles. São as colônias. Mas é cada vez mais difícil de evitá-los. Turquia, o poder regional mais importante, está construindo oleodutos através do Irã. Está aumentando o comércio com o Irã. Opuseram-se às sanções. O Paquistão acaba de abrir oleodutos para o Irã. Mas o que mais preocupa os Estados Unidos é a China. A China simplesmente não presta atenção às ordens dos Estados Unidos. E se acreditam que são o dono do mundo, isso dará medo. De fato, o governo de Obama está desesperado por isso. Apenas há duas semanas, o Departamento de Estado emitiu advertências à China, dizendo que, se querem ser aceitos no mundo civilizado, tem que cumprir com suas responsabilidades internacionais. O que são as responsabilidades internacionais? Seguir as ordens dos Estados Unidos. Obedecer às sanções dos Estados Unidos. Essas sanções não têm nenhuma força, exceto os meios de violência por detrás delas.
A China está satisfeita em obedecer às sanções da ONU [Organização das Nações Unidas] porque são fracas. Os Estados Unidos não podem fazer com que aprovem sanções sérias na ONU. Assim, a China aprova as sanções da ONU e não tem nenhuma responsabilidade de seguir as sanções dos Estados Unidos. O mais provável é que estejam rindo na Chancelaria porque os Estados Unidos não podem fazer nada.
Igual à Rússia, seguem com suas relações econômicas. Estão desenvolvendo suas terras para gás natural etc. É provável que a China esteja de acordo com as sanções dos Estados Unidos porque abre oportunidades a eles. Não tem que competir com empresas dos Estados Unidos e Europa. E as empresas estadunidenses e europeias provavelmente estão furiosas por isso. Mas é uma política de Estado. Isso também está se passando com as manobras navais. A China criticou que os Estados Unidos estejam fazendo manobras navais perto da costa da China. Estavam muito incomodados pelo plano de enviar um porta-aviões nuclear Aircraf avançado, com o nome de George Washington, ao mar Amarelo com capacidade para atacar Pequim [capital da China] com mísseis, segundo os chineses. Aqui nos Estados Unidos não dão importância. Mas nós não reagiríamos dessa forma se a China estivesse realizando manobras no Caribe. De fato, a reação dos Estados Unidos é muito interessante, tanto do governo como da imprensa. A China não está sendo razoável. Estão interferindo na liberdade dos mares, é dizer, nossa liberdade de realizar manobras militares perto de sua costa.
Claro que ninguém tem esse direito, somente nós. E estão possivelmente estão interferindo com nosso desenvolvimento avançado perto da sua costa. Ninguém tem esse direito perto da nossa costa. Todas essas coisas são reflexo de uma ideologia imperialista profundamente arraigada, que diz que é nosso mundo, nós somos os donos e, se alguém interfere com nosso direito de fazer o que queremos, é sua culpa. E quando a China não aceita, a China é considerada uma ameaça. Não seguem ordens e exercem sua própria soberania, e isso não se pode tolerar. E se nos voltarmos para o Irã, é a mesma coisa.
Segunda-feira [13], o Wall Street Journal anunciou que os Estados Unidos estão acelerando seus planos para um enorme envio de armas a Arábia Saudita. Helicópteros, aviões F-15 etc, projetado cuidadosamente para que Israel consiga armas avançadas e a Arábia Saudita consiga as armas inferiores. No entanto, é enorme. Talvez a maior venda de armas na história. Supostamente é para se defender contra o Irã. Mas o que é exatamente a ameaça iraniana? É interesante. Sempre se fala disso.
É considerado, pelos analistas da política externa dos Estados Unidos e pelo governo estadunidense, de ser um problema maior para a ordem mundial. De fato, tem se chamado o ano do Irã porque é um problema tão grande. Assim, qual é a ameaça? Na verdade, temos uma resposta definitiva para isso.
Desgraçadamente os meios não cubrirão isso. A cada ano, o Pentágono e os Serviços de Inteligência nos Estados Unidos entregam informes ao Congresso analisando a situação global de insegurança.
Acabam de fazê-lo em abril passado. Há uma seção sobre o Irã. O que dizem é muito interessante e, por isso, os meios não cobrem. Dizem que o Irã tem gastos militares muito baixos, inclusive em comparação com outros países da região. Portanto não está claro por que a Arábia Saudita necessita de helicópteros e F-15. O Irã não tem praticamente nenhuma capacidade de mobilizar forças no exterior. Sua doutrina militar é puramente defensiva, projetada para postergar uma invasão do Irã por tempo suficiente para permitir a diplomacia.
Os informes afirmam também que se o Irã está desenvolvendo uma capacidade nuclear, que não quer dizer uma arma nuclear necessariamente, seria parte da estratégia de uma força dissuasiva. Necessitam uma força dissuasiva que não é surpreendente porque há dois países em suas fronteiras ocupados por uma superpotência hostil. Israel e Paquistão têm armas nucleares. Assim, estão em uma situação de perigo. Portanto, se supõe que isso seria parte de sua estratégia de uma força dissuasiva, se estão fazendo isso. Assim, qual a ameaça? Os informes explicam a ameaça. A ameaça é que estão exercendo sua soberania. Estão tentando estender sua influência para países vizinhos, como o Afeganistão e o Iraque. E isso não se pode tolerar porque nós somos os donos desses países. Se nós invadimos esses países, está tudo bem. Mas se eles tentam influenciá-los, chama-se de desestabilização. Impomos a estabilidade. É uma terminologia comum. É tão comum que um editor de uma publicação de relações internacionais uma vez escreveu, sobre o golpe de Estado no Chile contra Allende, que desgraçadamente tivemos que desestabilizar o Chile para estabelecer a estabilidade. E não estava se contradizendo porque tivemos que desestabilizar ao depor o governo e impor uma ditadura, e o resultado é estabilidade porque o novo governo segue ordens e sua visão do mundo. Cada artigo do jornal que lê, cada publicação acadêmica sobre as relações internacionais, dão por certa essa perspectiva. É uma perspectiva natural se acredita que é o dono do mundo. E se você olha os documentos internos dos Estados Unidos, têm suas origens há muito tempo, desde a Segunda Guerra Mundial, quando os assessores de Roosevelt se deram conta de que os Estados Unidos saíam de uma guerra com um poder mundial dominante substituindo a Grã-Bretanha. E estabeleceram diretrizes que são explícitas e nunca são discutidas porque são demasiado explícitas. Dizem que os Estados Unidos devem controlar uma vasta área, pelo menos no hemisfério ocidental, o anterior império britânico, que inclui o Oriente Médio, o Extremo Oriente e, talvez mais, e dentro dessa área nenhum país pode exercer sua soberania se interfere com os planos dos Estados Unidos. Os Estados Unidos devem ter poder absoluto.
Professor Chomsky, o império dos Estados Unidos está acabando?
Agora estamos em um momento dramático porque os Estados Unidos estão perdendo o controle em todas as partes. O Oriente Médio é o lugar mais importante. Mas a China é outro caso, assim como é o hemisfério ocidental.
Sempre se deu por certo que o chamado pátio estaria sob controle. Se você olhar os documentos internos, durante os anos de [ex-presidente estadunidense Richard] Nixon, quando estavam planejando a derrocada do governo de [Salvador] Allende [ex-presidente chileno derrubado pelo ditador Augusto Pinochet], disseram exatamente que, se não podiam controlar a América Latina, como iriam controlar o resto do mundo.
Já não podem controlar a América Latina. De fato, passo a passo, a América Latina, pela primeira vez, está se aproximando da sua independência e da integração.
Por enquanto, somente é formal. Mas se chega a ser operativo, elimina a OEA [Organização dos Estados Americanos] que é dirigida pelos Estados Unidos. É como se dissessem aos Estados Unidos que se retirem de nossos assuntos. E há outras medidas que estão sendo tomadas. Por exemplo, a China superou os Estados Unidos como importador do Brasil e provavelmente o superará como sócio comercial. É uma grande notícia.
Professor Chomsky, no caso de Honduras, o golpe de Estado do ano passado. Esse não foi um golpe duro para a Aliança Bolivariana para os Povos de Nossa América (Alba) e uma grande vitória para os Estados Unidos?
A América do Sul avançou em direção à independência e a integração. A Unasul [União de Nações Sul-americanas], por exemplo, não é uma organização somente escrita no papel. Não faz muito, mas se opôs às bases estadunidenses na Colômbia. Apoiou a [presidente boliviano Evo] Morales quando estava sob atraque da velha elite nas províncias do leste.
O Banco do Sul poderia chegar a ter importância e o Mercosul [Mercado Comum do Sul] está se formando. Assim a América do Sul está saindo do controle dos Estados Unidos, o que é muito significativo. Mas a América Central está sob controle até agora. Foi devastada pelas guerras terroristas de [Ronald] Reagan, incluindo Honduras, e apenas está emergindo disso. Porém tem estado disciplinada pelos Estados Unidos.
Com a Nicarágua tem sido um pouco diferente, mas também não tem incomodado muito os Estados Unidos. Honduras é sério. E uma razão é a base de Palmerola. É a única base militar importante que os Estados Unidos têm nessa região. Foi a principal base para atacar a Nicarágua durante a guerra dos Contras. E os Estados Unidos querem mantê-la. E como disse, Honduras é a república bananeira tradicional. Se não podemos mantê-la, estamos com problemas sérios.
Assim, Obama apoiou o golpe de Estado astutamente. Nas palavras, estavam contra, mas nas ações, mostravam que apoiavam. E conseguiram fazer isso. Foi um golpe militar de Estado exitoso. Mas se você fizer uma comparação com o passado, a forma como foi realizado explica muito.
Em anos passados, se os Estados Unidos quisessem apoiar um golpe militar de Estado, simplesmente diriam às Forças Armadas que derrubassem o Governo, e o fariam por si mesmos. Desta vez, se obrigaram a fazê-lo de uma forma mais astuta e indireta que poderia chegar a ser aprovada na Europa.
A Europa é tão obediente aos Estados Unidos. A Europa poderia dizer que não gostou, mas poderia dizer que se manteve dentro da lei, o que por certo não é verdade por certo. Mas não puderam fazer algo assim com o resto do mundo e não puderam fazer como faziam no passado.
São sinais da debilidade crescente dos Estados Unidos, de impor o que chamam de estabilidade no hemisfério. Se fixar nesta década, houve três tentativas de golpe de Estado. O primeiro na Venezuela, apoiado abertamente pelos Estados Unidos, foi revertido. O segundo, no Haiti, os Estados Unidos conseguiram levar a cabo. Estados Unidos, França e Canadá, de fato, levaram a cabo um golpe militar no Hati. Sequestraram o presidente e o enviaram á África Central e baniram seu partido, que ganharia qualquer eleição. Foi um golpe militar de Estado verdadeiro. O Haiti é um Estado fraco, assim puderam fazer isso. E o terceiro foi em Honduras.
São três em uma década. Mas não tem nada a ver com a época em que os Estados Unidos podiam derrubar governos à vontade.
Nada a ver, por exemplo, com John F. Kennedy, que pôde organizar um golpe militar de Estado no Brasil, que ocorreu justamente depois de seu assassinato, mas foi organizado pelos Kennedy. O Brasil é um país grande, não é um lugar pequeno, e não foi um grande problema. Instalaram um de seus primeiro países assassinos de segurança nacional que depois se estendeu como uma praga por todo o continente.
Esses dias acabaram. E está causando muita preocupação entre os formadores da política externa dos Estados Unidos. Inclusive um país tão poderoso como os Estados Unidos já não podem manter o tipo de dominação mundial que foi projetada depois da Segunda Guerra Mundial e implementá-la em grande medida.
Professor Chomsky, você escreveu um livro muito importante há 20 anos sobre a fabricação do consenso feito por grandes meios comerciais. A capacidade dessas empresas de controlar o pensamento das pessoas mudou nesse período?
Tomamos os exemplos da Telesur, RT, Press TV ou Al-Jazeera, que é o maior. Vemos um exemplo real, como a invasão israelense a Gaza, que foi uma invasão israelense e estadunidense a Gaza porque os Estados Unidos participaram plenamente. Foi possível conseguir uma cobertura ao vivo 24 horas de Gaza da Al Jazeera. E havia dois povos nos Estados Unidos de onde se poderia ver. Um está em Michigan [centro-norte] onde há uma grande população árabe e outro é um pequeno povo no norte de Nova Hampshire.
No resto do mundo, foi possível ver a cobertura 24 horas do evento mais importante desse período. Nos Estados Unidos, foi proibido. Se por acaso estivesse nesses povos, poderia ver pela televisão a cabo. Se foi suficientemente inteligente para encontrar pela internet, podia encontrar pela internet. Mas quanto ao impacto sobre a população, teve mais êxito sobre os que viviam na União Soviética. Havia muito mais gente escutando a BBC na União Soviética, escutando fontes no exterior.
Um grande número estava conseguindo suas notícias da BBC e pela Voz da América. Sabemos isso por estudos que foram realizados. Aqui está essa voz alternativa, e se sabe o que busca e faz um esforço, pode encontrar. Isso é bom, porém só alguns aproveitam.
A internet tem muito valor se você sabe o que está fazendo. Mas para a maioria da população, é como se você quisesse ser biólogo e eu diga que vá a bibliotecas de Harvard e leia todas as revistas sobre biologia. Não vai aprender nada. Estão ali. No entanto, tem que saber o que está buscando. E as pessoas nos Estados Unidos não sabem porque tem havido uma campanha extremamente exitosa, especialmente nos últimos 20 anos, de fragmentação para as pessoas, subordinando-as.
Professor Chomsky e a mudança climática, a possibilidade de uma guerra nuclear, a crise alimentar, os desastres naturais, nesse sentido o mundo é assustador. Você tem esperança?
O mais surpreendente é que quase não há uma forma de abordar a mudança climática com as instituições já existentes. Os Estados Unidos realmente não têm um sistema de mercados, nenhum país poderia sobreviver com um sistema de mercados. Mas têm um sistema de mercados parcial. E na medida em que funciona um sistema de mercados, você perdeu. Se você é executivo de uma empresa, está obrigado por lei a maximizar as ganâncias em curto prazo e ignorar as externalidades, por exemplo, o destino da espécie humana.
Não faz isso porque é uma pessoa má, talvez lhe importe o destino da espécie. Mas não pode importar em teus negócios. Se você decide ser uma pessoa decente, está fora, e se incorpora outra pessoa que vai fazer o que se requer institucionalmente. O efeito nos Estados Unidos é que há campanhas de propaganda importantes dirigidas a um mundo dos negócios que tentam convencer as pessoas a esquecer. O que não está se passando, o que os humanos não têm que ver, o que seja. É uma sentença de morte.
E as mesmas pessoas que estão fazendo essa campanha sabem bem disso. Sabem igualmente como eu, você e outros que é muito sério. Mas estão presos. Estão nessa estrutura institucional e não podem sair. E isso é sério. Se você vê o mundo, há duas trajetórias. Há a trajetória que está sendo perseguida, lentamente, irregular, de que na América Latina há mais independência em direção aos horríveis problemas internos da pobreza massiva e o sofrimento e a desigualdade. Há passos tímidos para essa direção. É uma trajetória positiva. Há outra trajetória que conduz à destruição. A mudança climática é um caso. A guerra nuclear é outro. E há outros. A pergunta é qual trajetória acabará dominando. Não tem sentido especular.
(*) Entrevista publicada originalmente pela Telesur, e reproduzida no Brasil de Fato. Tradução: Patrícia Benvenuti
Fonte: http://www.fazendomedia.com
O escritor e filósofo estadunidense Noam Chomsky assinalou que os Estados Unidos estão perdendo o controle no mundo e indicou que a América Latina, região que a nação norteamericana considerou por décadas como “quintal”, está se aproximando da sua independência e da integração.
“Agora estamos em um momento dramático porque os Estados Unidos estão perdendo o controle em todas as partes. O Oriente Médio é o lugar mais importante. Mas a China é outro caso, assim como é o hemisfério ocidental”, indicou Chomsky.
Acrescentou que “sempre se deu por certo que o chamado quintal estaria sob controle. Se você olhar os documentos internos, durante os anos de [ex-presidente estadunidense Richard ] Nixon, quando estavam planejando a derrocada do governo de [Salvador] Allende [ex-presidente chileno derrubado pelo ditador Augusto Pinochet], disseram exatamente que, se não podiam controlar a América Latina, como iriam controlar o resto do mundo”.
“Já não podem controlar a América Latina. De fato, passo a passo, a América Latina, pela primeira vez, está se aproximando da sua independência e da integração”, sublinhou.
Recordou que, em fevereiro, realizou-se a Cúpula da Unidade da América Latina e Caribe, em Cancún, no México, em que foi aprovado um organismo regional que reúne os países da América Latina e Caribe sem a participação dos Estados Unidos nem Canadá, com o objetivo de integrar a região, isso “foi um tapa” para ambos países norteamericanos.
“Por enquanto, somente é formal. Mas se chega a ser operativo, elimina a OEA [Organização dos Estados Americanos] que é dirigida pelos Estados Unidos. É como se dissessem aos Estados Unidos que se retirem de nossos assuntos. E há outras medidas que estão sendo tomadas. Por exemplo, a China superou os Estados Unidos como importador do Brasil e provavelmente o superará como sócio comercial. É uma grande notícia”, acrescentou.
A seguir, a entrevista na íntegra realizada com o escritor e filósofo estadunidense Noam Chomsky.
Quero começar perguntando-lhe sobre o Irã, os Estados Unidos estão pressionando para que o Conselho de Segurança da ONU [Organização das Nações Unidas] imponha-lhe sanções mais duras. Até onde vão os Estados Unidos ou Israel, poderiam invadir ou atacar o Irã?
Israel não é previsível. Particularmente, nos últimos dois anos, tem agido de maneira muito irracional, com muita paranóia, em uma situação em que não se pode saber o que vão fazer. Não creio que nem eles saibam o que vão fazer. Estão chegando a um ponto onde podem não ter outra saída a não ser bombardear o Irã. Mas não podem fazer isso sem o apoio dos Estados Unidos. Assim, a pergunta é se os Estados Unidos autorizarão.
Tecnicamente, Israel poderia fazê-lo. Tem submarinos, que conseguiram da Alemanha, com mísseis nucleares profundamente submersos no Golfo Pérsico.
Teoricamente, poderiam atacar ao Irã sem passar pelo espaço aéreo. Mas quase todos os ataques que se podem conceber passariam pelo espaço aéreo de algum país, assim seria difícil o fazerem sem algum tipo de autorização pelo menos tácita. A Turquia não vai consentir. A pergunta é se os Estados Unidos a autorizaria contra o Iraque. E a outra pergunta é a Arábia Saudita. É concebível que tentaria. Eu acredito que seria uma loucura. E os Estados Unidos? [Barack] Obama, que avançou com os programas de [George W.] Bush, junto com seus assessores, também está se metendo em uma situação onde poderia não ter opção. Porque criaram essa ideia de ameaça do Irã. A ilha mais importante é Diogo García, uma ilha africana onde a Grã-Bretanha expulsou todos os habitantes para que os Estados Unidos pudessem construir uma base militar grande, e é uma das bases militares para atacar o Oriente Médio na Ásia Central. E Obama avançou ali. Enviou centenas de artilharia com penetração profunda chamada “rompe-bunkers”, que estão apontados para o Irã. Enviou instalações para apoiar submarinos nucleares com mísseis Tomahawk. Tudo isso representa uma ameaça direta ao Irã. E as sanções estadunidenses estão ficando mais duras. Mas chama a atenção que fora da Europa e do Japão ninguém está prestando muita atenção. Esses países estão de acordo em ser servis aos Estados Unidos.
Não é o caso do resto do mundo. Os países não alinhados, que são a maioria dos países do mundo, têm apoiado fortemente o direito do Irã em enriquecer o urânio. Mas ninguém presta atenção a eles. São as colônias. Mas é cada vez mais difícil de evitá-los. Turquia, o poder regional mais importante, está construindo oleodutos através do Irã. Está aumentando o comércio com o Irã. Opuseram-se às sanções. O Paquistão acaba de abrir oleodutos para o Irã. Mas o que mais preocupa os Estados Unidos é a China. A China simplesmente não presta atenção às ordens dos Estados Unidos. E se acreditam que são o dono do mundo, isso dará medo. De fato, o governo de Obama está desesperado por isso. Apenas há duas semanas, o Departamento de Estado emitiu advertências à China, dizendo que, se querem ser aceitos no mundo civilizado, tem que cumprir com suas responsabilidades internacionais. O que são as responsabilidades internacionais? Seguir as ordens dos Estados Unidos. Obedecer às sanções dos Estados Unidos. Essas sanções não têm nenhuma força, exceto os meios de violência por detrás delas.
A China está satisfeita em obedecer às sanções da ONU [Organização das Nações Unidas] porque são fracas. Os Estados Unidos não podem fazer com que aprovem sanções sérias na ONU. Assim, a China aprova as sanções da ONU e não tem nenhuma responsabilidade de seguir as sanções dos Estados Unidos. O mais provável é que estejam rindo na Chancelaria porque os Estados Unidos não podem fazer nada.
Igual à Rússia, seguem com suas relações econômicas. Estão desenvolvendo suas terras para gás natural etc. É provável que a China esteja de acordo com as sanções dos Estados Unidos porque abre oportunidades a eles. Não tem que competir com empresas dos Estados Unidos e Europa. E as empresas estadunidenses e europeias provavelmente estão furiosas por isso. Mas é uma política de Estado. Isso também está se passando com as manobras navais. A China criticou que os Estados Unidos estejam fazendo manobras navais perto da costa da China. Estavam muito incomodados pelo plano de enviar um porta-aviões nuclear Aircraf avançado, com o nome de George Washington, ao mar Amarelo com capacidade para atacar Pequim [capital da China] com mísseis, segundo os chineses. Aqui nos Estados Unidos não dão importância. Mas nós não reagiríamos dessa forma se a China estivesse realizando manobras no Caribe. De fato, a reação dos Estados Unidos é muito interessante, tanto do governo como da imprensa. A China não está sendo razoável. Estão interferindo na liberdade dos mares, é dizer, nossa liberdade de realizar manobras militares perto de sua costa.
Claro que ninguém tem esse direito, somente nós. E estão possivelmente estão interferindo com nosso desenvolvimento avançado perto da sua costa. Ninguém tem esse direito perto da nossa costa. Todas essas coisas são reflexo de uma ideologia imperialista profundamente arraigada, que diz que é nosso mundo, nós somos os donos e, se alguém interfere com nosso direito de fazer o que queremos, é sua culpa. E quando a China não aceita, a China é considerada uma ameaça. Não seguem ordens e exercem sua própria soberania, e isso não se pode tolerar. E se nos voltarmos para o Irã, é a mesma coisa.
Segunda-feira [13], o Wall Street Journal anunciou que os Estados Unidos estão acelerando seus planos para um enorme envio de armas a Arábia Saudita. Helicópteros, aviões F-15 etc, projetado cuidadosamente para que Israel consiga armas avançadas e a Arábia Saudita consiga as armas inferiores. No entanto, é enorme. Talvez a maior venda de armas na história. Supostamente é para se defender contra o Irã. Mas o que é exatamente a ameaça iraniana? É interesante. Sempre se fala disso.
É considerado, pelos analistas da política externa dos Estados Unidos e pelo governo estadunidense, de ser um problema maior para a ordem mundial. De fato, tem se chamado o ano do Irã porque é um problema tão grande. Assim, qual é a ameaça? Na verdade, temos uma resposta definitiva para isso.
Desgraçadamente os meios não cubrirão isso. A cada ano, o Pentágono e os Serviços de Inteligência nos Estados Unidos entregam informes ao Congresso analisando a situação global de insegurança.
Acabam de fazê-lo em abril passado. Há uma seção sobre o Irã. O que dizem é muito interessante e, por isso, os meios não cobrem. Dizem que o Irã tem gastos militares muito baixos, inclusive em comparação com outros países da região. Portanto não está claro por que a Arábia Saudita necessita de helicópteros e F-15. O Irã não tem praticamente nenhuma capacidade de mobilizar forças no exterior. Sua doutrina militar é puramente defensiva, projetada para postergar uma invasão do Irã por tempo suficiente para permitir a diplomacia.
Os informes afirmam também que se o Irã está desenvolvendo uma capacidade nuclear, que não quer dizer uma arma nuclear necessariamente, seria parte da estratégia de uma força dissuasiva. Necessitam uma força dissuasiva que não é surpreendente porque há dois países em suas fronteiras ocupados por uma superpotência hostil. Israel e Paquistão têm armas nucleares. Assim, estão em uma situação de perigo. Portanto, se supõe que isso seria parte de sua estratégia de uma força dissuasiva, se estão fazendo isso. Assim, qual a ameaça? Os informes explicam a ameaça. A ameaça é que estão exercendo sua soberania. Estão tentando estender sua influência para países vizinhos, como o Afeganistão e o Iraque. E isso não se pode tolerar porque nós somos os donos desses países. Se nós invadimos esses países, está tudo bem. Mas se eles tentam influenciá-los, chama-se de desestabilização. Impomos a estabilidade. É uma terminologia comum. É tão comum que um editor de uma publicação de relações internacionais uma vez escreveu, sobre o golpe de Estado no Chile contra Allende, que desgraçadamente tivemos que desestabilizar o Chile para estabelecer a estabilidade. E não estava se contradizendo porque tivemos que desestabilizar ao depor o governo e impor uma ditadura, e o resultado é estabilidade porque o novo governo segue ordens e sua visão do mundo. Cada artigo do jornal que lê, cada publicação acadêmica sobre as relações internacionais, dão por certa essa perspectiva. É uma perspectiva natural se acredita que é o dono do mundo. E se você olha os documentos internos dos Estados Unidos, têm suas origens há muito tempo, desde a Segunda Guerra Mundial, quando os assessores de Roosevelt se deram conta de que os Estados Unidos saíam de uma guerra com um poder mundial dominante substituindo a Grã-Bretanha. E estabeleceram diretrizes que são explícitas e nunca são discutidas porque são demasiado explícitas. Dizem que os Estados Unidos devem controlar uma vasta área, pelo menos no hemisfério ocidental, o anterior império britânico, que inclui o Oriente Médio, o Extremo Oriente e, talvez mais, e dentro dessa área nenhum país pode exercer sua soberania se interfere com os planos dos Estados Unidos. Os Estados Unidos devem ter poder absoluto.
Professor Chomsky, o império dos Estados Unidos está acabando?
Agora estamos em um momento dramático porque os Estados Unidos estão perdendo o controle em todas as partes. O Oriente Médio é o lugar mais importante. Mas a China é outro caso, assim como é o hemisfério ocidental.
Sempre se deu por certo que o chamado pátio estaria sob controle. Se você olhar os documentos internos, durante os anos de [ex-presidente estadunidense Richard] Nixon, quando estavam planejando a derrocada do governo de [Salvador] Allende [ex-presidente chileno derrubado pelo ditador Augusto Pinochet], disseram exatamente que, se não podiam controlar a América Latina, como iriam controlar o resto do mundo.
Já não podem controlar a América Latina. De fato, passo a passo, a América Latina, pela primeira vez, está se aproximando da sua independência e da integração.
Por enquanto, somente é formal. Mas se chega a ser operativo, elimina a OEA [Organização dos Estados Americanos] que é dirigida pelos Estados Unidos. É como se dissessem aos Estados Unidos que se retirem de nossos assuntos. E há outras medidas que estão sendo tomadas. Por exemplo, a China superou os Estados Unidos como importador do Brasil e provavelmente o superará como sócio comercial. É uma grande notícia.
Professor Chomsky, no caso de Honduras, o golpe de Estado do ano passado. Esse não foi um golpe duro para a Aliança Bolivariana para os Povos de Nossa América (Alba) e uma grande vitória para os Estados Unidos?
A América do Sul avançou em direção à independência e a integração. A Unasul [União de Nações Sul-americanas], por exemplo, não é uma organização somente escrita no papel. Não faz muito, mas se opôs às bases estadunidenses na Colômbia. Apoiou a [presidente boliviano Evo] Morales quando estava sob atraque da velha elite nas províncias do leste.
O Banco do Sul poderia chegar a ter importância e o Mercosul [Mercado Comum do Sul] está se formando. Assim a América do Sul está saindo do controle dos Estados Unidos, o que é muito significativo. Mas a América Central está sob controle até agora. Foi devastada pelas guerras terroristas de [Ronald] Reagan, incluindo Honduras, e apenas está emergindo disso. Porém tem estado disciplinada pelos Estados Unidos.
Com a Nicarágua tem sido um pouco diferente, mas também não tem incomodado muito os Estados Unidos. Honduras é sério. E uma razão é a base de Palmerola. É a única base militar importante que os Estados Unidos têm nessa região. Foi a principal base para atacar a Nicarágua durante a guerra dos Contras. E os Estados Unidos querem mantê-la. E como disse, Honduras é a república bananeira tradicional. Se não podemos mantê-la, estamos com problemas sérios.
Assim, Obama apoiou o golpe de Estado astutamente. Nas palavras, estavam contra, mas nas ações, mostravam que apoiavam. E conseguiram fazer isso. Foi um golpe militar de Estado exitoso. Mas se você fizer uma comparação com o passado, a forma como foi realizado explica muito.
Em anos passados, se os Estados Unidos quisessem apoiar um golpe militar de Estado, simplesmente diriam às Forças Armadas que derrubassem o Governo, e o fariam por si mesmos. Desta vez, se obrigaram a fazê-lo de uma forma mais astuta e indireta que poderia chegar a ser aprovada na Europa.
A Europa é tão obediente aos Estados Unidos. A Europa poderia dizer que não gostou, mas poderia dizer que se manteve dentro da lei, o que por certo não é verdade por certo. Mas não puderam fazer algo assim com o resto do mundo e não puderam fazer como faziam no passado.
São sinais da debilidade crescente dos Estados Unidos, de impor o que chamam de estabilidade no hemisfério. Se fixar nesta década, houve três tentativas de golpe de Estado. O primeiro na Venezuela, apoiado abertamente pelos Estados Unidos, foi revertido. O segundo, no Haiti, os Estados Unidos conseguiram levar a cabo. Estados Unidos, França e Canadá, de fato, levaram a cabo um golpe militar no Hati. Sequestraram o presidente e o enviaram á África Central e baniram seu partido, que ganharia qualquer eleição. Foi um golpe militar de Estado verdadeiro. O Haiti é um Estado fraco, assim puderam fazer isso. E o terceiro foi em Honduras.
São três em uma década. Mas não tem nada a ver com a época em que os Estados Unidos podiam derrubar governos à vontade.
Nada a ver, por exemplo, com John F. Kennedy, que pôde organizar um golpe militar de Estado no Brasil, que ocorreu justamente depois de seu assassinato, mas foi organizado pelos Kennedy. O Brasil é um país grande, não é um lugar pequeno, e não foi um grande problema. Instalaram um de seus primeiro países assassinos de segurança nacional que depois se estendeu como uma praga por todo o continente.
Esses dias acabaram. E está causando muita preocupação entre os formadores da política externa dos Estados Unidos. Inclusive um país tão poderoso como os Estados Unidos já não podem manter o tipo de dominação mundial que foi projetada depois da Segunda Guerra Mundial e implementá-la em grande medida.
Professor Chomsky, você escreveu um livro muito importante há 20 anos sobre a fabricação do consenso feito por grandes meios comerciais. A capacidade dessas empresas de controlar o pensamento das pessoas mudou nesse período?
Tomamos os exemplos da Telesur, RT, Press TV ou Al-Jazeera, que é o maior. Vemos um exemplo real, como a invasão israelense a Gaza, que foi uma invasão israelense e estadunidense a Gaza porque os Estados Unidos participaram plenamente. Foi possível conseguir uma cobertura ao vivo 24 horas de Gaza da Al Jazeera. E havia dois povos nos Estados Unidos de onde se poderia ver. Um está em Michigan [centro-norte] onde há uma grande população árabe e outro é um pequeno povo no norte de Nova Hampshire.
No resto do mundo, foi possível ver a cobertura 24 horas do evento mais importante desse período. Nos Estados Unidos, foi proibido. Se por acaso estivesse nesses povos, poderia ver pela televisão a cabo. Se foi suficientemente inteligente para encontrar pela internet, podia encontrar pela internet. Mas quanto ao impacto sobre a população, teve mais êxito sobre os que viviam na União Soviética. Havia muito mais gente escutando a BBC na União Soviética, escutando fontes no exterior.
Um grande número estava conseguindo suas notícias da BBC e pela Voz da América. Sabemos isso por estudos que foram realizados. Aqui está essa voz alternativa, e se sabe o que busca e faz um esforço, pode encontrar. Isso é bom, porém só alguns aproveitam.
A internet tem muito valor se você sabe o que está fazendo. Mas para a maioria da população, é como se você quisesse ser biólogo e eu diga que vá a bibliotecas de Harvard e leia todas as revistas sobre biologia. Não vai aprender nada. Estão ali. No entanto, tem que saber o que está buscando. E as pessoas nos Estados Unidos não sabem porque tem havido uma campanha extremamente exitosa, especialmente nos últimos 20 anos, de fragmentação para as pessoas, subordinando-as.
Professor Chomsky e a mudança climática, a possibilidade de uma guerra nuclear, a crise alimentar, os desastres naturais, nesse sentido o mundo é assustador. Você tem esperança?
O mais surpreendente é que quase não há uma forma de abordar a mudança climática com as instituições já existentes. Os Estados Unidos realmente não têm um sistema de mercados, nenhum país poderia sobreviver com um sistema de mercados. Mas têm um sistema de mercados parcial. E na medida em que funciona um sistema de mercados, você perdeu. Se você é executivo de uma empresa, está obrigado por lei a maximizar as ganâncias em curto prazo e ignorar as externalidades, por exemplo, o destino da espécie humana.
Não faz isso porque é uma pessoa má, talvez lhe importe o destino da espécie. Mas não pode importar em teus negócios. Se você decide ser uma pessoa decente, está fora, e se incorpora outra pessoa que vai fazer o que se requer institucionalmente. O efeito nos Estados Unidos é que há campanhas de propaganda importantes dirigidas a um mundo dos negócios que tentam convencer as pessoas a esquecer. O que não está se passando, o que os humanos não têm que ver, o que seja. É uma sentença de morte.
E as mesmas pessoas que estão fazendo essa campanha sabem bem disso. Sabem igualmente como eu, você e outros que é muito sério. Mas estão presos. Estão nessa estrutura institucional e não podem sair. E isso é sério. Se você vê o mundo, há duas trajetórias. Há a trajetória que está sendo perseguida, lentamente, irregular, de que na América Latina há mais independência em direção aos horríveis problemas internos da pobreza massiva e o sofrimento e a desigualdade. Há passos tímidos para essa direção. É uma trajetória positiva. Há outra trajetória que conduz à destruição. A mudança climática é um caso. A guerra nuclear é outro. E há outros. A pergunta é qual trajetória acabará dominando. Não tem sentido especular.
(*) Entrevista publicada originalmente pela Telesur, e reproduzida no Brasil de Fato. Tradução: Patrícia Benvenuti
Fonte: http://www.fazendomedia.com
A Esquerda como projeto político-social «para além do capital» - Uma visão a partir de István Mészáros - por Demétrio Cherobini
A Esquerda como projeto político-social «para além do capital» - Uma visão a partir de István Mészáros
Socialismo não tem a ver com cem reais a mais na conta bancária ou com quantidade de coisas consumidas, e sim com a realização de uma forma de organização social e política em que todos os indivíduostenham a condição de decidir acerca dos rumos da atividade produtiva. Por Demétrio Cherobini [*]
No Brasil contemporâneo, os períodos que antecedem as eleições são dominados por uma série de clichês que já podem ser considerados típicos de tais ocasiões especiais: salvo raríssimas exceções, os candidatos, em todos os níveis, prometem lutar por mais emprego, segurança, saúde e educação. No que toca à concorrência pelo poder executivo, a situação, tanto em nível federal quanto estadual, esforça-se para convencer a sociedade de que nunca o país ou o estado estiveram tão bem. A oposição, como é de se esperar, procura demonstrar o contrário, e usa, para isso, por vezes, os discursos e estratégias mais torpes, como escândalos, sensacionalismos e, não raro, as armações mais cínicas e deslavadas. Nessas horas, é bom prestar atenção não somente naquilo que é dito, mas principalmente no silêncio compartilhado acerca de temas fundamentais. Por exemplo: quem controla o que é produzido no país? Qual o melhor modo de distribuir entre as pessoas aquilo que elas mesmas produzem? Vivemos realmente na melhor forma de democracia ou podemos aperfeiçoar as coisas de modo a repartir cada vez mais entre a população o poder de decisão sobre os processos sociais, econômicos, políticos e culturais que afetam e determinam a sua vida?
Embora jamais coloquem em pauta assuntos importantes como esses, cada um dos partidos que domina o noticiário político pretende fazer-nos crer que o seu projeto, cuja retórica gravita invariavelmente em torno dos típicos clichês, é diferente e melhor que o dos seus concorrentes. Será mesmo que são diferentes? Não podemos pensar que, apesar de algumas singelas nuances a respeito de questões secundárias ou mesmo marginais, o silêncio sobre problemas centrais seja algo que os unifique e os identifique? E um retumbante calar não pode ser considerado algo muito mais revelador sobre a essência de um partido do que aquilo que é manifesto em seu discurso? Vale a pena considerar tal possibilidade, pois deixar de propor um debate sobre um problema que atinge a todos contribui para que esse mesmo problema se perpetue sem ser solucionado. Nesse sentido, calar sobre certa questão pode significar a preservação de um determinado status quo.
No processo eleitoral brasileiro atual, uma candidatura parece despontar entre as demais: Dilma Roussef, do PT, ameaça vencer a disputa já no primeiro turno. A princípio, um fato nada extraordinário, visto que recebe o apoio de um presidente que, por encabeçar um projeto extremamente hábil de conciliação social, acumula recordes de aprovação. Mas o que é interessante notar aqui é que, se oferecermos a qualquer militante petista as tradicionais categorias de análise por meio das quais se costuma definir o espectro político de uma sociedade numa conjuntura histórica específica e lhe perguntarmos onde está situado o seu partido, ele responderá sem titubeios: na esquerda. Na esquerda? Isto mesmo. O Partido dos Trabalhadores insiste em se recobrir com uma “aura” de acordo com essa legenda, de tal forma que o presidente da República chegou a afirmar, há algum tempo atrás, que “a próxima eleição não terá candidato de direita”, querendo significar com isso que, por causa da sua tremenda popularidade, todos tentariam se identificar com ele, evitando conseqüentemente o rótulo de direita sob o risco de fracasso no pleito deste ano. Em suma: é o partido da estrela fulgurante, do pavilhão vermelho, do quase mítico jargão “dos Trabalhadores” – símbolos historicamente associados ao socialismo –, e que se envaidece de ter “transformado o país” por haver elevado a “qualidade de vida” dos segmentos menos favorecidos da população. Mas será mesmo que alguns reais a mais no bolso e um aumento de consumo propiciado por “bolsas” de diferentes tipos podem ser parâmetros utilizados para definir uma política como sendo de esquerda e distingui-la assim, substancialmente, das dos seus principais opositores?
É para nos orientarmos em relação a essa dúvida que devemos consultar a obra de István Mészáros, um dos mais destacados pensadores marxistas da atualidade. Em seu clássico Para além do capital: rumo a uma teoria da transição (Boitempo Editorial: São Paulo, 2002), ele estabelece que “o padrão de avaliação das realizações socialistas continua a ser a contribuição que as medidas e políticas adotadas possam dar à constituição e à consolidação de um modo de controle social global e de auto-administração substantivamente democráticos (isto é, verdadeiramente não-hierárquicos em seu modo de operação em todas as esferas).” (p. 861)
Isso significa precisamente o seguinte: socialismo não tem a ver com cem reais a mais na conta bancária ou com quantidade de coisas consumidas, e sim com a realização de uma forma de organização social e política em que todos os indivíduos – os verdadeiros sujeitos que diariamente produzem a riqueza que a humanidade consome – tenham a condição de decidir acerca dos rumos da atividade produtiva. Em outras palavras: que possam regular conscientemente o metabolismo social humano de uma forma não antagônica, não predatória, não destrutiva, e verdadeiramente sustentável.
Para além do capital é uma defesa intransigente e sem concessões dessa proposta alternativa. Mészáros trata, do início ao fim do livro, da questão das mediações. O que vem a ser isso? A atividade social humana é sempre mediada. No seu processo de vida, no seu movimento constitutivo, no seu vir-a-ser, homens e mulheres constroem os meios necessários para satisfazer as suas necessidades. A mediação mais fundamental de todas é a atividade produtiva. É através dela que os indivíduos, em conjunto, estabelecem o intercâmbio com a natureza, extraem dela os elementos que precisam, modificam-nos conforme o seu desejo, dando à luz assim criações das mais variadas. Nesse contexto, o capital também é uma mediação, constituída igualmente pelo trabalho, mas uma mediação terrivelmente problemática. O que define o capital é exatamente o fato de ele entrar em conflito com os sujeitos da atividade produtiva, subjugando-os e extraindo deles muito mais do que aquilo que de fato necessitariam para a satisfação das suas necessidades – isto é, o trabalho excedente. O capital, diz Mészáros, é uma forma de mediação antagônica, e esse antagonismo consiste no exercício de um controle hierárquico, fetichista, perdulário e, hoje mais do que nunca, destrutivo sobre o metabolismo social.
É plenamente adequado, portanto, definir o capital como mediação. Mas, se queremos ser ainda mais precisos, devemos dizer que ele é, em realidade, um sistema de mediações. Dentro dessa complexa estrutura, uma das mediações mais importantes é o Estado. Por meio, dentre outras coisas, do Estado, o capital se auto-organiza, afasta temporariamente as suas crises, seus limites relativos, sejam eles internos ou externos. Em outras palavras: o capital controla o metabolismo social humano e usa, para tal fim, como meio, o Estado. É completamente equivocado, pois, de acordo com a teoria de Mészáros, acreditar que o Estado pode controlar o capital. O que ocorre é exatamente o contrário. Ao longo de sua história, verifica-se que o capital utilizou, de maneira cada vez mais crescente, esse meio para deslocar as suas contradições, e até mesmo aquilo que se costuma chamar de neoliberalismo só pôde ser implementado por intermédio de maciças e profundas ações estatais.
Em virtude de sua própria dinâmica interna, o capital, enquanto sistema de mediações “de segunda ordem” que controla e subjuga as mediações primárias da atividade produtiva, passou por um longo processo histórico de ascendência até chegar ao ponto de se tornar hegemônico por todo o globo. Durante sua ascensão, podia solucionar as suas crises inerentes por meio de um processo expansivo, impondo sua forma de sociabilidade a novos povos e nações. Contudo, uma vez conquistado o planeta inteiro, o capital encontra limitações acerbas que o impedem de se expandir e, portanto, deslocar suas contradições. Nesse momento, o sistema vê desenvolvidas plenamente certas tendências que já trazia em seu bojo, e que, assim realizadas, começam a comprometer sua própria viabilidade. O capital se choca, desse modo, com os seus limites absolutos, isto é, limites que não podem ser transcendidos se não se modifica radicalmente a estrutura de relações sociais que lhe dá sustentação. É exatamente então que tem início aquilo que Mészáros chama de crise estrutural do sistema do capital, um período histórico onde a única maneira encontrada pela ordem vigente para continuar existindo é fomentar uma forma de produção essencialmente destrutiva, isto é, tendo a destrutividade – elemento intrínseco ao capital desde os seus primórdios, mas que até então não era dominante – como “motor” da dinâmica social. A destrutividade do capital se expressa sob vários aspectos: na precarização do trabalho, na degradação ambiental, na obsolescência planejada – mercadorias produzidas propositalmente para, num curtíssimo espaço de tempo, se tornarem obsoletas, a fim de que outras mercadorias sejam fabricadas para substituí-las – e no “complexo militar-industrial”, setor chave da economia mundial atual, onde as mercadorias – artefatos bélicos, etc. – se destroem imediatamente no ato mesmo do seu consumo.
Ora, é exatamente a crise estrutural do sistema do capital, em razão de sua imensa e cada vez mais abrangente destrutividade – que invade até mesmo as relações sociais mais comezinhas –, que confronta a humanidade com a necessidade de elaborar uma alternativa radical ao atual estado de coisas. Para Mészáros, essa alternativa tem nome: socialismo. E isto depende, justamente, da criação de novas formas de mediações materiais, que superem de uma vez por todas o sistema de mediações do capital e permitam à humanidade regular de um modo consciente e não antagônico o seu metabolismo com a natureza. A ofensiva socialista de que o filósofo fala é a estratégia para, transcendendo-se a ação política tradicional situada dentro dos limites do parlamento e do Estado burguês, levar a efeito tais mediações materiais com a correspondente forma de consciência e de valores que a ordem alternativa requer.
Um projeto político-social de esquerda exige, portanto, que orientemos nossas ações com vistas a irmos para além do capital. Para além das mistificações ideológicas que querem nos manter paralisados e entorpecidos com mais e mais consumo, para além das mediações práticas antagônicas e destrutivas que controlam hierarquicamente o metabolismo social humano. Este é o padrão para definir um projeto qualitativamente diferente, verdadeiramente alternativo (e não a maior posse por parte dos trabalhadores das múltiplas formas de expressão do capital – por exemplo: mercadorias ou dinheiro).
Ora, o Partido dos Trabalhadores, que uma vez até tocou nesses assuntos mas que hoje cala sobre tudo isso, tem em conta que, mais do que ninguém, representa a esquerda no plano da política brasileira. Faz aliança com antigos inimigos (quem sabe por achar que agora estejam mais à esquerda…), zomba dos adversários, dizendo que não terão coragem de se auto-definir como sendo de “direita”, e realiza uma espécie de chantagem intelectual contra os militantes dos pequenos partidos socialistas, afirmando que criticar o governo federal é fazer o jogo da “direita”. Enfim, estão completamente satisfeitos e envaidecidos por administrarem medidas assistencialistas para os trabalhadores e se converterem assim naquilo que Mészáros, na esteira de Marx, chama de “personificações do capital”.
É bem verdade que isso tem que ser analisado como expressão das contradições sociais objetivas específicas da realidade brasileira, principalmente da fragmentação existente no seio da própria classe trabalhadora. Mas é deprimente observar alguns dos porta-vozes ideológicos do partido tecendo louvores à figura de Getúlio Vargas e se esforçando para vincular a imagem de Lula com este, do ponto de vista da alternativa do trabalho, tristemente célebre personagem da política nacional do século passado. Getúlio Vargas, que mandou matar comunistas, que realizou autoritariamente um projeto radical de conciliação de classes para que o capital se desenvolvesse, de maneira livre e desimpedida, em nossas terras, como nunca antes havia feito. Talvez mais cedo do que supõem, a história peça contas a tais ideólogos por causa de suas infâmias.
É justamente por nos manter alertas e prevenidos contra esse tipo de mistificação que os revolucionários do século XXI devem muito a István Mészáros. Suas idéias críticas já estão sendo debatidas em vários lugares. Elas constituem-se numa das mais consistentes expressões teóricas sintetizadoras das contradições de nosso tempo histórico. Ainda servirão de fonte de reflexão para muitos. Nos últimos anos, com o agravamento da crise do capital, vários movimentos de luta surgiram, predominantemente espontâneos, imbuídos do objetivo de enfrentar as forças repressivas da ordem dominante. Uma variedade de grupos tomando as ruas a fim de condenar as desigualdades do sistema e reivindicar uma alternativa abrangente. Quem sabe um dia esses movimentos se articulem em torno de uma estratégia eficaz, se condensem e componham uma força coesa, coerente e radical. Talvez, então, vejamos uma vez mais revoluções despontarem no horizonte da história.
[*] Demétrio Cherobini é licenciado em educação especial (UFSM), bacharel em ciências sociais (UFSM), mestrando em educação (UFSC).
Fonte: http://passapalavra.info/
Socialismo não tem a ver com cem reais a mais na conta bancária ou com quantidade de coisas consumidas, e sim com a realização de uma forma de organização social e política em que todos os indivíduostenham a condição de decidir acerca dos rumos da atividade produtiva. Por Demétrio Cherobini [*]
No Brasil contemporâneo, os períodos que antecedem as eleições são dominados por uma série de clichês que já podem ser considerados típicos de tais ocasiões especiais: salvo raríssimas exceções, os candidatos, em todos os níveis, prometem lutar por mais emprego, segurança, saúde e educação. No que toca à concorrência pelo poder executivo, a situação, tanto em nível federal quanto estadual, esforça-se para convencer a sociedade de que nunca o país ou o estado estiveram tão bem. A oposição, como é de se esperar, procura demonstrar o contrário, e usa, para isso, por vezes, os discursos e estratégias mais torpes, como escândalos, sensacionalismos e, não raro, as armações mais cínicas e deslavadas. Nessas horas, é bom prestar atenção não somente naquilo que é dito, mas principalmente no silêncio compartilhado acerca de temas fundamentais. Por exemplo: quem controla o que é produzido no país? Qual o melhor modo de distribuir entre as pessoas aquilo que elas mesmas produzem? Vivemos realmente na melhor forma de democracia ou podemos aperfeiçoar as coisas de modo a repartir cada vez mais entre a população o poder de decisão sobre os processos sociais, econômicos, políticos e culturais que afetam e determinam a sua vida?
Embora jamais coloquem em pauta assuntos importantes como esses, cada um dos partidos que domina o noticiário político pretende fazer-nos crer que o seu projeto, cuja retórica gravita invariavelmente em torno dos típicos clichês, é diferente e melhor que o dos seus concorrentes. Será mesmo que são diferentes? Não podemos pensar que, apesar de algumas singelas nuances a respeito de questões secundárias ou mesmo marginais, o silêncio sobre problemas centrais seja algo que os unifique e os identifique? E um retumbante calar não pode ser considerado algo muito mais revelador sobre a essência de um partido do que aquilo que é manifesto em seu discurso? Vale a pena considerar tal possibilidade, pois deixar de propor um debate sobre um problema que atinge a todos contribui para que esse mesmo problema se perpetue sem ser solucionado. Nesse sentido, calar sobre certa questão pode significar a preservação de um determinado status quo.
No processo eleitoral brasileiro atual, uma candidatura parece despontar entre as demais: Dilma Roussef, do PT, ameaça vencer a disputa já no primeiro turno. A princípio, um fato nada extraordinário, visto que recebe o apoio de um presidente que, por encabeçar um projeto extremamente hábil de conciliação social, acumula recordes de aprovação. Mas o que é interessante notar aqui é que, se oferecermos a qualquer militante petista as tradicionais categorias de análise por meio das quais se costuma definir o espectro político de uma sociedade numa conjuntura histórica específica e lhe perguntarmos onde está situado o seu partido, ele responderá sem titubeios: na esquerda. Na esquerda? Isto mesmo. O Partido dos Trabalhadores insiste em se recobrir com uma “aura” de acordo com essa legenda, de tal forma que o presidente da República chegou a afirmar, há algum tempo atrás, que “a próxima eleição não terá candidato de direita”, querendo significar com isso que, por causa da sua tremenda popularidade, todos tentariam se identificar com ele, evitando conseqüentemente o rótulo de direita sob o risco de fracasso no pleito deste ano. Em suma: é o partido da estrela fulgurante, do pavilhão vermelho, do quase mítico jargão “dos Trabalhadores” – símbolos historicamente associados ao socialismo –, e que se envaidece de ter “transformado o país” por haver elevado a “qualidade de vida” dos segmentos menos favorecidos da população. Mas será mesmo que alguns reais a mais no bolso e um aumento de consumo propiciado por “bolsas” de diferentes tipos podem ser parâmetros utilizados para definir uma política como sendo de esquerda e distingui-la assim, substancialmente, das dos seus principais opositores?
É para nos orientarmos em relação a essa dúvida que devemos consultar a obra de István Mészáros, um dos mais destacados pensadores marxistas da atualidade. Em seu clássico Para além do capital: rumo a uma teoria da transição (Boitempo Editorial: São Paulo, 2002), ele estabelece que “o padrão de avaliação das realizações socialistas continua a ser a contribuição que as medidas e políticas adotadas possam dar à constituição e à consolidação de um modo de controle social global e de auto-administração substantivamente democráticos (isto é, verdadeiramente não-hierárquicos em seu modo de operação em todas as esferas).” (p. 861)
Isso significa precisamente o seguinte: socialismo não tem a ver com cem reais a mais na conta bancária ou com quantidade de coisas consumidas, e sim com a realização de uma forma de organização social e política em que todos os indivíduos – os verdadeiros sujeitos que diariamente produzem a riqueza que a humanidade consome – tenham a condição de decidir acerca dos rumos da atividade produtiva. Em outras palavras: que possam regular conscientemente o metabolismo social humano de uma forma não antagônica, não predatória, não destrutiva, e verdadeiramente sustentável.
Para além do capital é uma defesa intransigente e sem concessões dessa proposta alternativa. Mészáros trata, do início ao fim do livro, da questão das mediações. O que vem a ser isso? A atividade social humana é sempre mediada. No seu processo de vida, no seu movimento constitutivo, no seu vir-a-ser, homens e mulheres constroem os meios necessários para satisfazer as suas necessidades. A mediação mais fundamental de todas é a atividade produtiva. É através dela que os indivíduos, em conjunto, estabelecem o intercâmbio com a natureza, extraem dela os elementos que precisam, modificam-nos conforme o seu desejo, dando à luz assim criações das mais variadas. Nesse contexto, o capital também é uma mediação, constituída igualmente pelo trabalho, mas uma mediação terrivelmente problemática. O que define o capital é exatamente o fato de ele entrar em conflito com os sujeitos da atividade produtiva, subjugando-os e extraindo deles muito mais do que aquilo que de fato necessitariam para a satisfação das suas necessidades – isto é, o trabalho excedente. O capital, diz Mészáros, é uma forma de mediação antagônica, e esse antagonismo consiste no exercício de um controle hierárquico, fetichista, perdulário e, hoje mais do que nunca, destrutivo sobre o metabolismo social.
É plenamente adequado, portanto, definir o capital como mediação. Mas, se queremos ser ainda mais precisos, devemos dizer que ele é, em realidade, um sistema de mediações. Dentro dessa complexa estrutura, uma das mediações mais importantes é o Estado. Por meio, dentre outras coisas, do Estado, o capital se auto-organiza, afasta temporariamente as suas crises, seus limites relativos, sejam eles internos ou externos. Em outras palavras: o capital controla o metabolismo social humano e usa, para tal fim, como meio, o Estado. É completamente equivocado, pois, de acordo com a teoria de Mészáros, acreditar que o Estado pode controlar o capital. O que ocorre é exatamente o contrário. Ao longo de sua história, verifica-se que o capital utilizou, de maneira cada vez mais crescente, esse meio para deslocar as suas contradições, e até mesmo aquilo que se costuma chamar de neoliberalismo só pôde ser implementado por intermédio de maciças e profundas ações estatais.
Em virtude de sua própria dinâmica interna, o capital, enquanto sistema de mediações “de segunda ordem” que controla e subjuga as mediações primárias da atividade produtiva, passou por um longo processo histórico de ascendência até chegar ao ponto de se tornar hegemônico por todo o globo. Durante sua ascensão, podia solucionar as suas crises inerentes por meio de um processo expansivo, impondo sua forma de sociabilidade a novos povos e nações. Contudo, uma vez conquistado o planeta inteiro, o capital encontra limitações acerbas que o impedem de se expandir e, portanto, deslocar suas contradições. Nesse momento, o sistema vê desenvolvidas plenamente certas tendências que já trazia em seu bojo, e que, assim realizadas, começam a comprometer sua própria viabilidade. O capital se choca, desse modo, com os seus limites absolutos, isto é, limites que não podem ser transcendidos se não se modifica radicalmente a estrutura de relações sociais que lhe dá sustentação. É exatamente então que tem início aquilo que Mészáros chama de crise estrutural do sistema do capital, um período histórico onde a única maneira encontrada pela ordem vigente para continuar existindo é fomentar uma forma de produção essencialmente destrutiva, isto é, tendo a destrutividade – elemento intrínseco ao capital desde os seus primórdios, mas que até então não era dominante – como “motor” da dinâmica social. A destrutividade do capital se expressa sob vários aspectos: na precarização do trabalho, na degradação ambiental, na obsolescência planejada – mercadorias produzidas propositalmente para, num curtíssimo espaço de tempo, se tornarem obsoletas, a fim de que outras mercadorias sejam fabricadas para substituí-las – e no “complexo militar-industrial”, setor chave da economia mundial atual, onde as mercadorias – artefatos bélicos, etc. – se destroem imediatamente no ato mesmo do seu consumo.
Ora, é exatamente a crise estrutural do sistema do capital, em razão de sua imensa e cada vez mais abrangente destrutividade – que invade até mesmo as relações sociais mais comezinhas –, que confronta a humanidade com a necessidade de elaborar uma alternativa radical ao atual estado de coisas. Para Mészáros, essa alternativa tem nome: socialismo. E isto depende, justamente, da criação de novas formas de mediações materiais, que superem de uma vez por todas o sistema de mediações do capital e permitam à humanidade regular de um modo consciente e não antagônico o seu metabolismo com a natureza. A ofensiva socialista de que o filósofo fala é a estratégia para, transcendendo-se a ação política tradicional situada dentro dos limites do parlamento e do Estado burguês, levar a efeito tais mediações materiais com a correspondente forma de consciência e de valores que a ordem alternativa requer.
Um projeto político-social de esquerda exige, portanto, que orientemos nossas ações com vistas a irmos para além do capital. Para além das mistificações ideológicas que querem nos manter paralisados e entorpecidos com mais e mais consumo, para além das mediações práticas antagônicas e destrutivas que controlam hierarquicamente o metabolismo social humano. Este é o padrão para definir um projeto qualitativamente diferente, verdadeiramente alternativo (e não a maior posse por parte dos trabalhadores das múltiplas formas de expressão do capital – por exemplo: mercadorias ou dinheiro).
Ora, o Partido dos Trabalhadores, que uma vez até tocou nesses assuntos mas que hoje cala sobre tudo isso, tem em conta que, mais do que ninguém, representa a esquerda no plano da política brasileira. Faz aliança com antigos inimigos (quem sabe por achar que agora estejam mais à esquerda…), zomba dos adversários, dizendo que não terão coragem de se auto-definir como sendo de “direita”, e realiza uma espécie de chantagem intelectual contra os militantes dos pequenos partidos socialistas, afirmando que criticar o governo federal é fazer o jogo da “direita”. Enfim, estão completamente satisfeitos e envaidecidos por administrarem medidas assistencialistas para os trabalhadores e se converterem assim naquilo que Mészáros, na esteira de Marx, chama de “personificações do capital”.
É bem verdade que isso tem que ser analisado como expressão das contradições sociais objetivas específicas da realidade brasileira, principalmente da fragmentação existente no seio da própria classe trabalhadora. Mas é deprimente observar alguns dos porta-vozes ideológicos do partido tecendo louvores à figura de Getúlio Vargas e se esforçando para vincular a imagem de Lula com este, do ponto de vista da alternativa do trabalho, tristemente célebre personagem da política nacional do século passado. Getúlio Vargas, que mandou matar comunistas, que realizou autoritariamente um projeto radical de conciliação de classes para que o capital se desenvolvesse, de maneira livre e desimpedida, em nossas terras, como nunca antes havia feito. Talvez mais cedo do que supõem, a história peça contas a tais ideólogos por causa de suas infâmias.
É justamente por nos manter alertas e prevenidos contra esse tipo de mistificação que os revolucionários do século XXI devem muito a István Mészáros. Suas idéias críticas já estão sendo debatidas em vários lugares. Elas constituem-se numa das mais consistentes expressões teóricas sintetizadoras das contradições de nosso tempo histórico. Ainda servirão de fonte de reflexão para muitos. Nos últimos anos, com o agravamento da crise do capital, vários movimentos de luta surgiram, predominantemente espontâneos, imbuídos do objetivo de enfrentar as forças repressivas da ordem dominante. Uma variedade de grupos tomando as ruas a fim de condenar as desigualdades do sistema e reivindicar uma alternativa abrangente. Quem sabe um dia esses movimentos se articulem em torno de uma estratégia eficaz, se condensem e componham uma força coesa, coerente e radical. Talvez, então, vejamos uma vez mais revoluções despontarem no horizonte da história.
[*] Demétrio Cherobini é licenciado em educação especial (UFSM), bacharel em ciências sociais (UFSM), mestrando em educação (UFSC).
Fonte: http://passapalavra.info/
sexta-feira, 24 de setembro de 2010
Estadão põe gás no fogo - Alberto Dines
Estadão põe gás no fogo - Alberto Dines
O Estadão ensandesceu: a manchete de capa de quarta-feira (22/9) transforma um embate episódico entre o governo e alguns veículos de comunicação numa confrontação política de grandes proporções e imprevisíveis conseqüências. E coloca indevidamente o Brasil ao lado da Venezuela e a Argentina no rol dos países latino-americanos onde o exercício do jornalismo e a liberdade de expressão correm riscos.
A manchete da edição – "TV de Lula contrata empresa que emprega filho de Franklin" – é exemplo clássico de um jornalismo panfletário que está substituindo o jornalismo investigativo, com sérios prejuízos para a credibilidade de uma instituição que não pode sobreviver sob suspeição.
O Observatório da Imprensa entrou para a programação da antiga TV Educativa (TVE) em maio de 1998, no último ano do primeiro mandato do presidente Fernando Henrique Cardoso. Nestes 12 anos jamais sofreu do governo federal qualquer tipo de pressão no tocante ao seu conteúdo. No segundo mandato de FHC e ao longo dos dois quadriênios do presidente Lula jamais houve qualquer interferência do Executivo seja na escolha dos temas ou teor dos comentários.
O Observatório da Imprensa atacou abertamente o presidente Lula quando fez críticas indiscriminadas aos meios de comunicação. Se a TV Brasil fosse mesmo a TV de Lula, o programa televisivo do Observatório da Imprensa não gozaria deste tipo de autonomia.
Clima fabricado
Convém lembrar que este observador já foi demitido inúmeras vezes de grandes veículos por manifestar, em artigos assinados, opiniões que desagradaram as respectivas direções. Já houve casos em que textos publicados neste OI serviram de pretexto para punições em outros órgãos.
Os castigos impostos ao programa na TV Cultura e Rádio Cultura – contrariando voto do Conselho Curador da Fundação Padre Anchieta – e que culminaram com suas eliminações durante a gestão de Paulo Markun jamais levaram este observador a dar dimensão política a divergências técnicas.
Quando o Estadão noticiou a recente crise na TV Cultura, jamais designou a emissora como "TV do Serra ". Afrontaria todas as normas de decoro jornalístico e seria rigorosamente injusta para com o então governador de São Paulo.
As denúncias de favorecimento da empresa Tecnet numa licitação da TV Brasil não pode partir de um fato secundário – seu representante comercial, Cláudio Martins, é filho do ministro-chefe da Secretaria de Comunicação, Franklin Martins.
A irregularidade e aquele que supostamente a praticou compõem os ingredientes básicos da notícia. O destaque ao parentesco do denunciado com um funcionário do primeiro escalão presume uma interferência que não foi verificada. A esta altura, uma acusação rigorosamente leviana.
Este clima exacerbado não ajuda o processo eleitoral, não ajuda o day after, não fortalece nossa democracia nem reforça os paradigmas de objetividade tão caros ao exercício profissional.
Fonte: http://www.novae.inf.br
O Estadão ensandesceu: a manchete de capa de quarta-feira (22/9) transforma um embate episódico entre o governo e alguns veículos de comunicação numa confrontação política de grandes proporções e imprevisíveis conseqüências. E coloca indevidamente o Brasil ao lado da Venezuela e a Argentina no rol dos países latino-americanos onde o exercício do jornalismo e a liberdade de expressão correm riscos.
A manchete da edição – "TV de Lula contrata empresa que emprega filho de Franklin" – é exemplo clássico de um jornalismo panfletário que está substituindo o jornalismo investigativo, com sérios prejuízos para a credibilidade de uma instituição que não pode sobreviver sob suspeição.
O Observatório da Imprensa entrou para a programação da antiga TV Educativa (TVE) em maio de 1998, no último ano do primeiro mandato do presidente Fernando Henrique Cardoso. Nestes 12 anos jamais sofreu do governo federal qualquer tipo de pressão no tocante ao seu conteúdo. No segundo mandato de FHC e ao longo dos dois quadriênios do presidente Lula jamais houve qualquer interferência do Executivo seja na escolha dos temas ou teor dos comentários.
O Observatório da Imprensa atacou abertamente o presidente Lula quando fez críticas indiscriminadas aos meios de comunicação. Se a TV Brasil fosse mesmo a TV de Lula, o programa televisivo do Observatório da Imprensa não gozaria deste tipo de autonomia.
Clima fabricado
Convém lembrar que este observador já foi demitido inúmeras vezes de grandes veículos por manifestar, em artigos assinados, opiniões que desagradaram as respectivas direções. Já houve casos em que textos publicados neste OI serviram de pretexto para punições em outros órgãos.
Os castigos impostos ao programa na TV Cultura e Rádio Cultura – contrariando voto do Conselho Curador da Fundação Padre Anchieta – e que culminaram com suas eliminações durante a gestão de Paulo Markun jamais levaram este observador a dar dimensão política a divergências técnicas.
Quando o Estadão noticiou a recente crise na TV Cultura, jamais designou a emissora como "TV do Serra ". Afrontaria todas as normas de decoro jornalístico e seria rigorosamente injusta para com o então governador de São Paulo.
As denúncias de favorecimento da empresa Tecnet numa licitação da TV Brasil não pode partir de um fato secundário – seu representante comercial, Cláudio Martins, é filho do ministro-chefe da Secretaria de Comunicação, Franklin Martins.
A irregularidade e aquele que supostamente a praticou compõem os ingredientes básicos da notícia. O destaque ao parentesco do denunciado com um funcionário do primeiro escalão presume uma interferência que não foi verificada. A esta altura, uma acusação rigorosamente leviana.
Este clima exacerbado não ajuda o processo eleitoral, não ajuda o day after, não fortalece nossa democracia nem reforça os paradigmas de objetividade tão caros ao exercício profissional.
Fonte: http://www.novae.inf.br
O socialista inglês George Orwell foi dedo-duro? - por Euler de França Belém
O socialista inglês George Orwell foi dedo-duro? - por Euler de França Belém
Quando lançado no Brasil, em 2008, o livro “Quem Pagou a Conta — A CIA na Guerra Fria da Cultura” (Record, 556 páginas, tradução de Vera Ribeiro), de Frances Stonor Saunders, formada em Oxford, ganhou resenhas elogiosas, mas nenhum comentário crítico. O motivo é o de sempre: teorias conspiratórias de esquerda são aceitas como verdades irretorquíveis nos cadernos culturais. O jornalista e escritor inglês George Orwell, morto aos 46 anos, em 1950, é uma das “vítimas” da autora. Ao contrário de biógrafos e ensaístas, Saunders acredita na história de Isaac Deutscher de que Orwell plagiou o romance “Nós”, do russo Yevgeny Zamyatin, que, perseguido pelo stalinismo, exilou-se na França. Ex-trotskista e eterno socialista, Deutscher escreveu que faltavam ao seu adversário “senso histórico e compreensão psicológica da vida política”. Sessenta quatro anos depois da morte de Orwell, sabemos que sua crítica ao totalitarismo, de esquerda (stalinismo) e de direita (nazi-fascismo), permanece pertinente. O romance “1984”, de 1948, persiste vivo, um perceptivo mapeamento histórico e psicológico, além de resistir como literatura, de uma sociedade totalitária. O herói ou ex-herói de Deutscher, Liev Trotski, era menos perspicaz do que o autor da novela “A Revolução dos Bichos”. Se a crítica do biógrafo de Trotski não resiste a um peteleco, outra crítica é mais grave. Orwell teria sido “dedo-duro”, segundo a versão apresentada por Saunders.
A oxfordiana afirma que Orwell entregou ao Departamento de Pesquisa de Informações (IRD), braço secreto do Ministério das Relações Exteriores da Inglaterra, em 1949, uma lista que denunciava “35 pessoas como simpatizantes, ou como suspeitas de serem testas-de-ferro ou ‘adeptas’ do comunismo”. Alguns dos supostamente “dedurados”: Kingsley Martin, Paul Robeson, J. B. Priestley, Michael Redgrave. Saunders admite que Orwell elaborou uma lista com o objetivo de “brincar” com os amigos Arthur Koestler e Richard Rees. Os integrantes da lista — além dos citados, o escritor arrolou Stephen Spender (supostamente lembrado por ser homossexual), John Steinbeck, Upton Sinclair, George Padmore, Tom Driberg (também homossexual) — eram comunistas notórios ou simpatizantes.
Para se apresentar como “isenta”, Saunders inclui a ressalva de Bernard Crick, biógrafo de Orwell. O escritor, na versão de Crick, “não diferiu dos cidadãos responsáveis de hoje que transmitem ao esquadrão antiterrorista informações a respeito de pessoas de suas relações que eles acreditam ser terroristas do IRA. Essa era uma época vista como perigosa, o fim dos anos quarenta”. A escolha deste trecho da biografia escrita por Crick é uma jogada inteligente de Saunders, porque sugere que, em algum momento, a deduragem é necessária. O golpe de misericórdia é dado por Peregrine Worsthorne: “Um ato desonroso não se torna honrado pelo simples fato de ter sido cometido por George Orwell”. Saunders bate abaixo da linha de cintura: “Ele demonstrou haver confundido o papel do intelectual com o do policial. (...) Mary McCarthy observou que era uma bênção ele ter morrido muito moço” (46 anos!). McCarthy, que entendia muito de literatura e quase nada de política (conta-se que, para escrever seus livros, teve de ser trancada num quarto por Edmund Wilson, que a considerava preguiçosa), acreditava que Orwell, se vivesse mais, teria se tornado um intelectual de direita — no que se engana.
Orwell era/é um intelectual admirável e, ao mesmo tempo, equivocado. “Admirável” porque escreveu textos que deverão sobreviver, como “1984” (espécie de “Odisséia” do totalitarismo), “A Revolução dos Bichos” e ensaios magistrais sobre literatura e indivíduos. “Equivocado” porque morreu acreditando, e dizendo isto com todas as letras — sem subordinar-se à direita, ao contrário do que sugerem McCarthy e Saunders —, no socialismo, especialmente na ficção chamada “socialismo democrático”, como se democracia e socialismo não fossem incompatíveis (a Espanha não é socialista porque o primeiro-ministro é socialista e estranhamente a China é socialista, embora, para sobreviver, tenha incorporado a economia de mercado). Por mais que fosse um apóstolo da liberdade individual, Orwell não percebeu que um indivíduo singular como ele, que prezava acima de tudo a independência de expressão e tinha opiniões às vezes idiossincráticas, de tão pessoais, só tinha espaço numa sociedade democrática, sem nenhum arremedo de socialismo. Orwell nasceu e morreu na Inglaterra, sem ter sido perseguido. Foi perseguido na Espanha socialista, durante a Guerra Civil. Cadê o Orwell russo e o Orwell cubano que sobreviveram ao stalinismo e ao castrismo?
Quanto ao Orwell “delator” há livros — como “A Vitória de Orwell” (Companhia das Letras, 204 páginas, tradução de Laura Teixeira Motta), do jornalista e polemista profissional Christopher Hitchens, e “George Orwell — Uma Biografia Política” (Antígona, 282 páginas, tradução de Fernando Gonçalves), de John Newsinger — que reduzem a pó a “teoria” de madame Saunders.
Hitchens é o mais virulento na defesa de Orwell. O autor inglês esclarece que a lista não foi divulgada em 1996, como sugere Saunders e outros, mas em 1980, na biografia escrita por Bernard Crick. Quer dizer, era tão sem importância que ninguém tentou escondê-la. Ao contrário do que afirma Saunders, Hitchens revela que “o Departamento de Estudo de Informações não tinha ligação com nenhuma ‘Polícia do Pensamento’, muito menos com a Polícia do Pensamento das páginas de ‘1984’”.
A lista elaborada por Orwell, com o apoio do amigo Rees, resultou de uma espécie de “jogo de salão”. “O jogo consistia em lançar hipóteses sobre quais figuras públicas seriam capazes de vender-se na eventualidade de uma invasão ou ditadura. Orwell dedicava-se a esse jogo, a sério ou de brincadeira, há anos.” Tinha o hábito de mostrar “a tentação dos intelectuais a adaptar-se ao poder”. Num texto de 1942, na “Partisan Review”, ataca duramente Pierre Drieu de la Rochelle, Ezra Pound e L. F. Céline, os três de direita. Não vituperava apenas os intelectuais stalinistas.
Ao contrário do que Saunders insinua, Hitchens restaura o Orwell verdadeiro: “A repugnância de Orwell” pela “cultura da traição não se limitava ao estilo visceral com que a retratou e condenou em ‘1984’. Orwell a vida toda demonstrou ódio por todas as formas de censura, proscrição e lista negra”. A lista que escreveu, insiste Hitchens, não foi feita a pedido do Estado. “Orwell hoje não está sendo acusado de fazer listas, e sim meramente de fazer listas sobre as pessoas erradas.” A nomeação dos intelectuais de direita, que eram criticados asperamente por Orwell, não é notada por seus críticos de esquerda.
Na verdade, afirma Hitchens, “a lista certamente ilustra os ressentimentos privados e as excentricidade de Orwell”. O jornalista esclarece que, “para ser exato, uma única pessoa foi acusada de ser um agente. (...) Trata-se de Peter Smolka. (...) Hoje está indiscutivelmente confirmado que Smolka era, com certeza, agente da segurança soviética, o que significa uma correspondência de cem por cento entre os fatos e a afirmação de Orwell sobre o recrutamento direto de estrangeiros. (...) Ninguém sofreu nem poderia ter sofrido por causa das opiniões privadas de Orwell; ele não disse ‘em particular’ nada que não tenha afirmado coerentemente em público. E, embora algumas pessoas da ‘lista’ fossem conhecidas pessoais de Orwell, a maioria não era. Isso tem certa importância, pois define-se corretamente o ‘alcaguete’ ou dedo-duro como aquele que trai colegas ou amigos em troca de um indulto ou de alguma outra vantagem para si mesmo”. Orwell morreu tuberculoso, em decorrência possivelmente do período em que passou fome.
Numa síntese perfeita, Newsinger é mais esclarecedor e moderado do que o “cruzado” Hitchens: “O envolvimento de Orwell com o IRD resume-se à entrega, a uma agência de propaganda criada pelo governo trabalhista, de uma lista de pessoas [E. H. Carr, Chaplin, Alex Comfort, V. Gordon Childe, entre outras] a não contatar. (...) Orwell cometeu grave erro ao envolver-se com o IRD, mas há que reconhecer que esse envolvimento foi mínimo e, se estivermos de boa-fé, não pode ser visto como ‘bufaria’, ‘espionagem’ ou ‘traição’. No momento em que colaborou com o IRD, este ainda tinha um ‘rosto de esquerda’
Fonte: http://www.revistabula.com
Quando lançado no Brasil, em 2008, o livro “Quem Pagou a Conta — A CIA na Guerra Fria da Cultura” (Record, 556 páginas, tradução de Vera Ribeiro), de Frances Stonor Saunders, formada em Oxford, ganhou resenhas elogiosas, mas nenhum comentário crítico. O motivo é o de sempre: teorias conspiratórias de esquerda são aceitas como verdades irretorquíveis nos cadernos culturais. O jornalista e escritor inglês George Orwell, morto aos 46 anos, em 1950, é uma das “vítimas” da autora. Ao contrário de biógrafos e ensaístas, Saunders acredita na história de Isaac Deutscher de que Orwell plagiou o romance “Nós”, do russo Yevgeny Zamyatin, que, perseguido pelo stalinismo, exilou-se na França. Ex-trotskista e eterno socialista, Deutscher escreveu que faltavam ao seu adversário “senso histórico e compreensão psicológica da vida política”. Sessenta quatro anos depois da morte de Orwell, sabemos que sua crítica ao totalitarismo, de esquerda (stalinismo) e de direita (nazi-fascismo), permanece pertinente. O romance “1984”, de 1948, persiste vivo, um perceptivo mapeamento histórico e psicológico, além de resistir como literatura, de uma sociedade totalitária. O herói ou ex-herói de Deutscher, Liev Trotski, era menos perspicaz do que o autor da novela “A Revolução dos Bichos”. Se a crítica do biógrafo de Trotski não resiste a um peteleco, outra crítica é mais grave. Orwell teria sido “dedo-duro”, segundo a versão apresentada por Saunders.
A oxfordiana afirma que Orwell entregou ao Departamento de Pesquisa de Informações (IRD), braço secreto do Ministério das Relações Exteriores da Inglaterra, em 1949, uma lista que denunciava “35 pessoas como simpatizantes, ou como suspeitas de serem testas-de-ferro ou ‘adeptas’ do comunismo”. Alguns dos supostamente “dedurados”: Kingsley Martin, Paul Robeson, J. B. Priestley, Michael Redgrave. Saunders admite que Orwell elaborou uma lista com o objetivo de “brincar” com os amigos Arthur Koestler e Richard Rees. Os integrantes da lista — além dos citados, o escritor arrolou Stephen Spender (supostamente lembrado por ser homossexual), John Steinbeck, Upton Sinclair, George Padmore, Tom Driberg (também homossexual) — eram comunistas notórios ou simpatizantes.
Para se apresentar como “isenta”, Saunders inclui a ressalva de Bernard Crick, biógrafo de Orwell. O escritor, na versão de Crick, “não diferiu dos cidadãos responsáveis de hoje que transmitem ao esquadrão antiterrorista informações a respeito de pessoas de suas relações que eles acreditam ser terroristas do IRA. Essa era uma época vista como perigosa, o fim dos anos quarenta”. A escolha deste trecho da biografia escrita por Crick é uma jogada inteligente de Saunders, porque sugere que, em algum momento, a deduragem é necessária. O golpe de misericórdia é dado por Peregrine Worsthorne: “Um ato desonroso não se torna honrado pelo simples fato de ter sido cometido por George Orwell”. Saunders bate abaixo da linha de cintura: “Ele demonstrou haver confundido o papel do intelectual com o do policial. (...) Mary McCarthy observou que era uma bênção ele ter morrido muito moço” (46 anos!). McCarthy, que entendia muito de literatura e quase nada de política (conta-se que, para escrever seus livros, teve de ser trancada num quarto por Edmund Wilson, que a considerava preguiçosa), acreditava que Orwell, se vivesse mais, teria se tornado um intelectual de direita — no que se engana.
Orwell era/é um intelectual admirável e, ao mesmo tempo, equivocado. “Admirável” porque escreveu textos que deverão sobreviver, como “1984” (espécie de “Odisséia” do totalitarismo), “A Revolução dos Bichos” e ensaios magistrais sobre literatura e indivíduos. “Equivocado” porque morreu acreditando, e dizendo isto com todas as letras — sem subordinar-se à direita, ao contrário do que sugerem McCarthy e Saunders —, no socialismo, especialmente na ficção chamada “socialismo democrático”, como se democracia e socialismo não fossem incompatíveis (a Espanha não é socialista porque o primeiro-ministro é socialista e estranhamente a China é socialista, embora, para sobreviver, tenha incorporado a economia de mercado). Por mais que fosse um apóstolo da liberdade individual, Orwell não percebeu que um indivíduo singular como ele, que prezava acima de tudo a independência de expressão e tinha opiniões às vezes idiossincráticas, de tão pessoais, só tinha espaço numa sociedade democrática, sem nenhum arremedo de socialismo. Orwell nasceu e morreu na Inglaterra, sem ter sido perseguido. Foi perseguido na Espanha socialista, durante a Guerra Civil. Cadê o Orwell russo e o Orwell cubano que sobreviveram ao stalinismo e ao castrismo?
Quanto ao Orwell “delator” há livros — como “A Vitória de Orwell” (Companhia das Letras, 204 páginas, tradução de Laura Teixeira Motta), do jornalista e polemista profissional Christopher Hitchens, e “George Orwell — Uma Biografia Política” (Antígona, 282 páginas, tradução de Fernando Gonçalves), de John Newsinger — que reduzem a pó a “teoria” de madame Saunders.
Hitchens é o mais virulento na defesa de Orwell. O autor inglês esclarece que a lista não foi divulgada em 1996, como sugere Saunders e outros, mas em 1980, na biografia escrita por Bernard Crick. Quer dizer, era tão sem importância que ninguém tentou escondê-la. Ao contrário do que afirma Saunders, Hitchens revela que “o Departamento de Estudo de Informações não tinha ligação com nenhuma ‘Polícia do Pensamento’, muito menos com a Polícia do Pensamento das páginas de ‘1984’”.
A lista elaborada por Orwell, com o apoio do amigo Rees, resultou de uma espécie de “jogo de salão”. “O jogo consistia em lançar hipóteses sobre quais figuras públicas seriam capazes de vender-se na eventualidade de uma invasão ou ditadura. Orwell dedicava-se a esse jogo, a sério ou de brincadeira, há anos.” Tinha o hábito de mostrar “a tentação dos intelectuais a adaptar-se ao poder”. Num texto de 1942, na “Partisan Review”, ataca duramente Pierre Drieu de la Rochelle, Ezra Pound e L. F. Céline, os três de direita. Não vituperava apenas os intelectuais stalinistas.
Ao contrário do que Saunders insinua, Hitchens restaura o Orwell verdadeiro: “A repugnância de Orwell” pela “cultura da traição não se limitava ao estilo visceral com que a retratou e condenou em ‘1984’. Orwell a vida toda demonstrou ódio por todas as formas de censura, proscrição e lista negra”. A lista que escreveu, insiste Hitchens, não foi feita a pedido do Estado. “Orwell hoje não está sendo acusado de fazer listas, e sim meramente de fazer listas sobre as pessoas erradas.” A nomeação dos intelectuais de direita, que eram criticados asperamente por Orwell, não é notada por seus críticos de esquerda.
Na verdade, afirma Hitchens, “a lista certamente ilustra os ressentimentos privados e as excentricidade de Orwell”. O jornalista esclarece que, “para ser exato, uma única pessoa foi acusada de ser um agente. (...) Trata-se de Peter Smolka. (...) Hoje está indiscutivelmente confirmado que Smolka era, com certeza, agente da segurança soviética, o que significa uma correspondência de cem por cento entre os fatos e a afirmação de Orwell sobre o recrutamento direto de estrangeiros. (...) Ninguém sofreu nem poderia ter sofrido por causa das opiniões privadas de Orwell; ele não disse ‘em particular’ nada que não tenha afirmado coerentemente em público. E, embora algumas pessoas da ‘lista’ fossem conhecidas pessoais de Orwell, a maioria não era. Isso tem certa importância, pois define-se corretamente o ‘alcaguete’ ou dedo-duro como aquele que trai colegas ou amigos em troca de um indulto ou de alguma outra vantagem para si mesmo”. Orwell morreu tuberculoso, em decorrência possivelmente do período em que passou fome.
Numa síntese perfeita, Newsinger é mais esclarecedor e moderado do que o “cruzado” Hitchens: “O envolvimento de Orwell com o IRD resume-se à entrega, a uma agência de propaganda criada pelo governo trabalhista, de uma lista de pessoas [E. H. Carr, Chaplin, Alex Comfort, V. Gordon Childe, entre outras] a não contatar. (...) Orwell cometeu grave erro ao envolver-se com o IRD, mas há que reconhecer que esse envolvimento foi mínimo e, se estivermos de boa-fé, não pode ser visto como ‘bufaria’, ‘espionagem’ ou ‘traição’. No momento em que colaborou com o IRD, este ainda tinha um ‘rosto de esquerda’
Fonte: http://www.revistabula.com
quinta-feira, 23 de setembro de 2010
O estranho plano de Rashid - por Tariq Ali
O estranho plano de Rashid
Ahmed Rashid quer entregar o Paquistão aos EUA e instituições sob o seu controle. É um pouco mesquinho para as outras potências. Seria mais aconselhável expandir a lista.
Há uns dias atrás, o jornalista paquistanês favorito do Ocidente, Ahmed Rashid, escreveu uma “coluna de convidado” no sítio web da BBC no qual sugeria que o modelo governativo afegão fosse transferido para o Paquistão:
“O Fundo para a Reconstrução do Paquistão podia ser gerido por um conselho de administração que incluísse o Banco Mundial, outras agências de empréstimos internacionais e proeminentes economistas independentes paquistaneses e personalidades sem qualquer vínculo ao governo.
Os paquistaneses ainda tomariam todas as decisões mais importantes, mas aqueles que o fizessem não podiam ser os amigos íntimos do presidente, o primeiro-ministro ou os líderes da oposição. A burocracia financeira do Paquistão e o exército teriam lugar à mesa, mas certamente não teriam qualquer poder de voto sobre como gastar o dinheiro.
O seu trabalho seria a implementação imparcial da recuperação supervisionada pelo Fundo. Este Fundo seria não só para controlar o dinheiro, mas também para ajudar o governo a elaborar um esforço de reconstrução neutro, não político. Iria, além disso, ajudar a planear reformas económicas de longo prazo….”
A noção de que o Banco Mundial, o FMI e amigos são “não políticos” e “neutros” é caricata e não vale a pena perder tempo com ela, principalmente quando a sua supervisão efetuada ao maior banco do Afeganistão (em grande parte detido e controlado pela família Karzai, quase tão corrupta como Zardari e os seus amigos) não parece ter sido muito eficaz, pois faliu na mesma altura em que o sítio web da BBC publicou o texto inovador.
Claro que é inegável que a decadência e a desintegração internas do Paquistão, sobre a qual tenho escrito há tantos anos, prosseguem a passos rápidos. Uma desilusão profunda acompanhada de niilismo já estava instalada há algumas décadas, quando, num dos seus poemas, Faiz Ahmed Faiz se referiu à pátria como “uma floresta de folhas mortas”, “uma congregação de dor”. E desde então piorou.
Como se a guerra Af-Pak (apoiada por Rashid e companhia) já não fosse suficientemente má. A reação que criou, na forma de extremistas religiosos armados que bombardeiam alvos em todas as principais cidades paquistanesas, é incontrolável. Ou, dito de outra forma, se o Estado paquistanês, com o seu exército de meio milhão de efetivos, as suas inúmeras redes secretas operacionais militares e policiais, escondidas em cada canto e instituição do país, é incapaz de penetrar e isolar os grupos que transportam as bombas, então o fim está verdadeiramente próximo.
Ou pode ser que os serviços secretos se tenham infiltrado a partir de dentro e de fora. Caso contrário, seria um mistério completo explicar o timing de alguns ataques contra alvos internos ou agentes e soldados dos serviços secretos externos. Tomemos o exemplo de alguns anos atrás: os membros dos serviços secretos dos Estados Unidos e da Otan decidem encontrar-se para um almoço informal num restaurante de luxo de Islamabad. A localização e a lista de convidados são secretas, só conhecidas deles próprios e dos seus guardas de confiança dentro dos serviços secretos do Paquistão. Uma bomba bem colocada interrompe o almoço, deixando um rasto de morte. E isto não foi o Wikileaks, com certeza.
A corrupção política destruiu o país a outros níveis, espalhando a raiva contra os políticos e o desespero pela incapacidade de alguém poder fazer alguma coisa. A indiferença pela política é profunda e o cidadão comum considera os políticos no poder como um negócio sujo, e tenta refugiar-se na vida privada. O cidadão ativo, pelo menos neste momento, é uma raça em extinção, apesar da coragem de uma pequena minoria de ativistas e jornalistas que se recusam a desistir.
O país tropeça de um desastre para o outro, e com o fosso que existe entre os super-ricos, cujos banquetes de casamento são trazidos de avião do Dubai, e que construíram escolas, universidades e hospitais para si próprios, e as famílias da classe média normal que não conseguem aceder a essas instituições e que procuram desesperadamente alguma forma de emigrar para algum lugar – o que já não é fácil, dada a segurança reforçada desde o 11 de setembro. E isto é só 20% da população.
Os apresentadores de televisivos que falam de uma revolução de limpeza nunca conseguem fazer uma, e aqueles que os ouvem, cujos sofrimentos se tornam evidentes apenas quando os desastres ocorrem, estão tão desmoralizados e amedrontados e concentrados em alimentar os seus filhos e a eles próprios que a ação política significativa está, no momento, longe dos seus pensamentos. Os extremistas religiosos, felizmente, continuam impopulares. O seu modelo de desenvolvimento não é nenhum segredo na região.
Ahmed Rashid quer entregar o país aos Estados Unidos e instituições sob o seu controle. Certamente que isto é um pouco mesquinho para as outras potências mundiais. Tendo em conta a instabilidade da economia dos Estados Unidos, seria mais aconselhável expandir a lista. Talvez quatro multinacionais mundiais (com base nos Estados Unidos, Alemanha, China e Rússia) pudessem formar um consórcio (AFPAKCO) e convidar os estados falhados, começando pelo Paquistão.
O que a Blackwater, os seus subsidiários e rivais estão fazendo pelos exércitos dos Estados Unidos e da Inglaterra, podia ter uma réplica na sociedade civil através dos grandes bancos, dos gigantes do petróleo e a da indústria nuclear. Podiam controlar e gerir alguns países, e se eles atrapalhassem, o Banco Mundial e o FMI podiam resgatá-los. As elites, muitas com o seu número já nas folhas de pagamento, seriam, com prazer, completamente vendidas. E se o consórcio estivesse bem generalizado, o Exército paquistanês de bom grado podia policiar a nova estrutura em troca de um cheque mensal mais chorudo do que o que recebe actualmente do CENTCOM.
Onde em tempos a Companhia das Índias Orientais controlou todo um subcontinente, o consórcio AFPAKCO agora só precisaria comprar um pequeno pedaço de terra do Norte. Desta vez o interesse económico próprio pode obrigar à educação da população, certificando-se de que a força trabalhadora está convenientemente alimentada (alimentos geneticamente modificados seriam acessíveis nesta frente) e que se mantém relativamente saudável.
Naturalmente que os meios de comunicação social, tão selvagens e sem controle, hoje em dia, teriam de ser contidos e ajustados às necessidades da AFPAKCO. Aqui a BBC, a CNN e a Fox podiam tomar o controle, e Rashid seria a pessoa indicada para ser nomeado como o primeiro diretor geral da consolidada PTV. É uma questão tática se alguns canais pornográficos devem ser autorizados para fins recreativos, embora nesta frente muitos dos políticos que actualmente desperdiçam o seu tempo podem fornecer conselhos e serviços úteis.
Dentro de 25 anos, sejamos pessimistas, uma enorme revolta anti-AFPAKCO pode irromper e trazer verdadeira mudança e independência de uma maneira bem diferente e sob uma nova liderança não manchada de laços de sangue, corrupção e colaboração. Então sim, este seria um novo começo.
O último livro de Tariq Ali,“The Obama Syndrome: Surrender at Home, War Abroad” é publicado este mês pela Verso.
Fonte: http://www.revistaforum.com.br
Ahmed Rashid quer entregar o Paquistão aos EUA e instituições sob o seu controle. É um pouco mesquinho para as outras potências. Seria mais aconselhável expandir a lista.
Há uns dias atrás, o jornalista paquistanês favorito do Ocidente, Ahmed Rashid, escreveu uma “coluna de convidado” no sítio web da BBC no qual sugeria que o modelo governativo afegão fosse transferido para o Paquistão:
“O Fundo para a Reconstrução do Paquistão podia ser gerido por um conselho de administração que incluísse o Banco Mundial, outras agências de empréstimos internacionais e proeminentes economistas independentes paquistaneses e personalidades sem qualquer vínculo ao governo.
Os paquistaneses ainda tomariam todas as decisões mais importantes, mas aqueles que o fizessem não podiam ser os amigos íntimos do presidente, o primeiro-ministro ou os líderes da oposição. A burocracia financeira do Paquistão e o exército teriam lugar à mesa, mas certamente não teriam qualquer poder de voto sobre como gastar o dinheiro.
O seu trabalho seria a implementação imparcial da recuperação supervisionada pelo Fundo. Este Fundo seria não só para controlar o dinheiro, mas também para ajudar o governo a elaborar um esforço de reconstrução neutro, não político. Iria, além disso, ajudar a planear reformas económicas de longo prazo….”
A noção de que o Banco Mundial, o FMI e amigos são “não políticos” e “neutros” é caricata e não vale a pena perder tempo com ela, principalmente quando a sua supervisão efetuada ao maior banco do Afeganistão (em grande parte detido e controlado pela família Karzai, quase tão corrupta como Zardari e os seus amigos) não parece ter sido muito eficaz, pois faliu na mesma altura em que o sítio web da BBC publicou o texto inovador.
Claro que é inegável que a decadência e a desintegração internas do Paquistão, sobre a qual tenho escrito há tantos anos, prosseguem a passos rápidos. Uma desilusão profunda acompanhada de niilismo já estava instalada há algumas décadas, quando, num dos seus poemas, Faiz Ahmed Faiz se referiu à pátria como “uma floresta de folhas mortas”, “uma congregação de dor”. E desde então piorou.
Como se a guerra Af-Pak (apoiada por Rashid e companhia) já não fosse suficientemente má. A reação que criou, na forma de extremistas religiosos armados que bombardeiam alvos em todas as principais cidades paquistanesas, é incontrolável. Ou, dito de outra forma, se o Estado paquistanês, com o seu exército de meio milhão de efetivos, as suas inúmeras redes secretas operacionais militares e policiais, escondidas em cada canto e instituição do país, é incapaz de penetrar e isolar os grupos que transportam as bombas, então o fim está verdadeiramente próximo.
Ou pode ser que os serviços secretos se tenham infiltrado a partir de dentro e de fora. Caso contrário, seria um mistério completo explicar o timing de alguns ataques contra alvos internos ou agentes e soldados dos serviços secretos externos. Tomemos o exemplo de alguns anos atrás: os membros dos serviços secretos dos Estados Unidos e da Otan decidem encontrar-se para um almoço informal num restaurante de luxo de Islamabad. A localização e a lista de convidados são secretas, só conhecidas deles próprios e dos seus guardas de confiança dentro dos serviços secretos do Paquistão. Uma bomba bem colocada interrompe o almoço, deixando um rasto de morte. E isto não foi o Wikileaks, com certeza.
A corrupção política destruiu o país a outros níveis, espalhando a raiva contra os políticos e o desespero pela incapacidade de alguém poder fazer alguma coisa. A indiferença pela política é profunda e o cidadão comum considera os políticos no poder como um negócio sujo, e tenta refugiar-se na vida privada. O cidadão ativo, pelo menos neste momento, é uma raça em extinção, apesar da coragem de uma pequena minoria de ativistas e jornalistas que se recusam a desistir.
O país tropeça de um desastre para o outro, e com o fosso que existe entre os super-ricos, cujos banquetes de casamento são trazidos de avião do Dubai, e que construíram escolas, universidades e hospitais para si próprios, e as famílias da classe média normal que não conseguem aceder a essas instituições e que procuram desesperadamente alguma forma de emigrar para algum lugar – o que já não é fácil, dada a segurança reforçada desde o 11 de setembro. E isto é só 20% da população.
Os apresentadores de televisivos que falam de uma revolução de limpeza nunca conseguem fazer uma, e aqueles que os ouvem, cujos sofrimentos se tornam evidentes apenas quando os desastres ocorrem, estão tão desmoralizados e amedrontados e concentrados em alimentar os seus filhos e a eles próprios que a ação política significativa está, no momento, longe dos seus pensamentos. Os extremistas religiosos, felizmente, continuam impopulares. O seu modelo de desenvolvimento não é nenhum segredo na região.
Ahmed Rashid quer entregar o país aos Estados Unidos e instituições sob o seu controle. Certamente que isto é um pouco mesquinho para as outras potências mundiais. Tendo em conta a instabilidade da economia dos Estados Unidos, seria mais aconselhável expandir a lista. Talvez quatro multinacionais mundiais (com base nos Estados Unidos, Alemanha, China e Rússia) pudessem formar um consórcio (AFPAKCO) e convidar os estados falhados, começando pelo Paquistão.
O que a Blackwater, os seus subsidiários e rivais estão fazendo pelos exércitos dos Estados Unidos e da Inglaterra, podia ter uma réplica na sociedade civil através dos grandes bancos, dos gigantes do petróleo e a da indústria nuclear. Podiam controlar e gerir alguns países, e se eles atrapalhassem, o Banco Mundial e o FMI podiam resgatá-los. As elites, muitas com o seu número já nas folhas de pagamento, seriam, com prazer, completamente vendidas. E se o consórcio estivesse bem generalizado, o Exército paquistanês de bom grado podia policiar a nova estrutura em troca de um cheque mensal mais chorudo do que o que recebe actualmente do CENTCOM.
Onde em tempos a Companhia das Índias Orientais controlou todo um subcontinente, o consórcio AFPAKCO agora só precisaria comprar um pequeno pedaço de terra do Norte. Desta vez o interesse económico próprio pode obrigar à educação da população, certificando-se de que a força trabalhadora está convenientemente alimentada (alimentos geneticamente modificados seriam acessíveis nesta frente) e que se mantém relativamente saudável.
Naturalmente que os meios de comunicação social, tão selvagens e sem controle, hoje em dia, teriam de ser contidos e ajustados às necessidades da AFPAKCO. Aqui a BBC, a CNN e a Fox podiam tomar o controle, e Rashid seria a pessoa indicada para ser nomeado como o primeiro diretor geral da consolidada PTV. É uma questão tática se alguns canais pornográficos devem ser autorizados para fins recreativos, embora nesta frente muitos dos políticos que actualmente desperdiçam o seu tempo podem fornecer conselhos e serviços úteis.
Dentro de 25 anos, sejamos pessimistas, uma enorme revolta anti-AFPAKCO pode irromper e trazer verdadeira mudança e independência de uma maneira bem diferente e sob uma nova liderança não manchada de laços de sangue, corrupção e colaboração. Então sim, este seria um novo começo.
O último livro de Tariq Ali,“The Obama Syndrome: Surrender at Home, War Abroad” é publicado este mês pela Verso.
Fonte: http://www.revistaforum.com.br
México e Colômbia: colônias norte-americanas - por Laerte Braga
México e Colômbia: colônias norte-americanas - por Laerte Braga
O NAFTA (North American Free Trade Agreement, ou Acordo de Livre Comércio Norte-Americano) é um tratado de livre comércio assinado entre os Estados Unidos, o Canadá e o México, tendo o Chile como país associado.
Quem prestar atenção à safra de filmes produzidos por Hollywood no pós 11 de Setembro vai perceber, sem muitas dificuldades, que norte-americanos transformaram o caráter espetáculo do famoso subúrbio de Los Angeles em ponta-de-lança do combate midiático aos adversários do império.
Foi por esse motivo e debaixo de forte pressão de senadores republicanos e grupos sionistas que Guerra ao Terror venceu Avatar como melhor filme no Oscar de 2009. Segundo John McCain, derrotado por Obama nas eleições de 2008 e um dos principais líderes da extrema-direita nos EUA, Avatar “é um filme com nítidas tendências comunistas, fala em igualdade”.
A descoberta de um túmulo coletivo no México com corpos de cidadãos latino-americanos – quatro brasileiros inclusive – exibe o real objetivo do NAFTA. Aos EUA e ao Canadá tudo; ao México, o lixo.
Injustiças
Mexicanos e latinos são caçados na fronteira México-EUA tanto por forças policiais como por milícias de norte-americanos indignados com a crescente presença de latinos em seu país. Segundo um morador de Atlanta, “eles são sujos, emporcalham as cidades e trazem o desemprego”. A Califórnia, o Texas, o Novo México e partes do estado do Arizona foram conquistadas do México pelos EUA. Entre 1824 e 1854, os mexicanos foram obrigados a ceder a maior parte de seu território aos EUA.
Na chamada Guerra dos Mil Dias entre liberais e conservadores na Colômbia, no período de 1899 a 1903, com morte de cerca de 120 mil pessoas, os EUA e a França incentivaram e financiaram “rebeldes” na província colombiana do Panamá para buscar a independência e formar um novo país. Foi o que aconteceu: o projeto era o canal do Panamá.
Uma cidade mexicana que negou licença a uma empresa norte-americana para a construção de um aterro de lixo nuclear foi processada numa corte de Nova York, condenada a pesada multa e a aceitar a presença do aterro e do lixo, tudo nos termos do NAFTA.
Uma das maiores empresas dos EUA na área da suinocultura, a Granjas Carrol, foi expulsa de vários estados em seu país por crimes ambientais e, beneficiada pelo NAFTA, instalou-se numa cidade mexicana. Surgiu ali o vírus da gripe suína, pela contaminação da água das fontes que cortam a cidade e seu entorno.
Mea culpa
Nem o governo mexicano e nem os governos departamentais ou de municípios têm como enfrentar o problema: o de o México ter sido transformado em colônia dos EUA, com direito a servir de depósito de lixo e empresas como as Granjas Carrol.
Uma das séries de tevê mais assistidas nos EUA, Law and Order, exibiu um capítulo em que um cidadão hondurenho é vítima da fúria fascista de jovens norte-americanos e termina morto. Numa espécie de mea culpa, no episódio, o júri é criticado por falta de isenção para julgar crimes cometidos contra latinos residentes nos EUA, mesmo que ilegais.
De um modo geral cidadãos latino-americanos, considerados de segunda classe pelos norte-americanos, fazem os chamados serviços domésticos em residências de gente como John McCain, ainda que sem os “papéis” e sob o risco constante de deportação. Não ocorre o mesmo em relação a norte-americanos ou canadenses no México, na Colômbia e no Chile.
O governo do presidente Felipe Calderón, México, foi eleito sob acusações comprovadas de fraude eleitoral. Seu adversário ameaçava romper o tratado de livre comércio com os EUA. Álvaro Uribe, ex-presidente da Colômbia, foi acusado pelo Departamento Anti-Drogas dos EUA de ter sido eleito pelo tráfico, de ser complacente com o tráfico e beneficiário do tráfico de drogas. Mas é amigo.
Dilema
Os EUA têm o absoluto controle tanto do México quanto da Colômbia, reduzidos ao papel de colônia. O Panamá permanece sendo um protetorado norte-americano a despeito dos muitos tratados para a retirada do controle sobre aquele país, nenhum cumprido integralmente. O canal do Panamá é considerado estratégico para interesses comerciais e militares dos EUA.
O dilema da América Latina é esse: ou se resigna a ser o que se costumava falar nas décadas de 50 e 60 do século passado, América Latrina, ou se integra sem qualquer tipo de interferência ou participação dos EUA e ganha perspectivas de tornar-se um bloco político e econômico que permita aos latino-americanos preservar a independência e a soberania de seus países.
Por isso, Chávez é inimigo. Evo Morales é inimigo. Daniel Ortega é inimigo. Outros são inimigos em menor escala. E Uribe e Pepe Lobo são amigos. O tráfico aí é irrelevante para o “processo democrático”.
Continência
O Brasil é chave nesse processo. A perspectiva de uma realidade capitalista à brasileira, como define Ivan Pinheiro (candidato do Partido Comunista Brasileiro a presidente da República) aterroriza os EUA. É um país de dimensões continentais. Tem todas as condições para se transformar numa potência mundial – já se faz sentir assim nesses oito anos de governo Lula – e abre perspectivas para um processo de transformações mais amplo que o que está em curso em países como a Venezuela, a Bolívia, a Nicarágua, o Equador e Cuba, consolidando a revolução pós-Fidel.
Foi nesse sentido, como alerta, que os EUA patrocinaram o golpe militar que transformou Honduras num grande campo de concentração. A média de pessoas assassinadas naquele país por forças militares e policiais no arremedo de democracia do governo Pepe Lobo é de duas por dia. É por aí que a extrema-direita em todos os países latino-americanos busca formas de retomar posições perdidas e “recolocar” a América Latina na condição de América Latrina. O fantasma dos golpes militares não está descartado a médio e longo prazos, dependendo da forma como o processo evoluir. A realidade dos EUA hoje mostra que a reeleição de Obama é incerta.
E mesmo governos democratas, tidos como liberais, nunca foram obstáculos a golpes nessa parte do mundo. A derrubada de João Goulart, no Brasil, em 1964, foi orquestrada no governo democrata de Lyndon Johnson, por um embaixador integrante do partido Democrata e um general que falava português fluentemente e serviu a Kennedy, a Johnson e a Nixon.
Para que todo o planeta bata continência a Washington, adote o hambúrguer como prato do cotidiano e tenha como sonho tirar uma foto com o imenso letreiro Hollywood ao fundo, falta ainda a América Latina. Boa parte da Europa (Reino Unido, Alemanha e Itália principalmente) já vai ganhando contornos de colônia. Por aqui, as colônias neste momento são México e Colômbia. Honduras é base exportadora de terrorismo de Estado.
*Laerte Braga é jornalista brasileiro. Artigo publicado no Diário Liberdade (Galiza, Espanha).
Fonte: Opera Mundi
O NAFTA (North American Free Trade Agreement, ou Acordo de Livre Comércio Norte-Americano) é um tratado de livre comércio assinado entre os Estados Unidos, o Canadá e o México, tendo o Chile como país associado.
Quem prestar atenção à safra de filmes produzidos por Hollywood no pós 11 de Setembro vai perceber, sem muitas dificuldades, que norte-americanos transformaram o caráter espetáculo do famoso subúrbio de Los Angeles em ponta-de-lança do combate midiático aos adversários do império.
Foi por esse motivo e debaixo de forte pressão de senadores republicanos e grupos sionistas que Guerra ao Terror venceu Avatar como melhor filme no Oscar de 2009. Segundo John McCain, derrotado por Obama nas eleições de 2008 e um dos principais líderes da extrema-direita nos EUA, Avatar “é um filme com nítidas tendências comunistas, fala em igualdade”.
A descoberta de um túmulo coletivo no México com corpos de cidadãos latino-americanos – quatro brasileiros inclusive – exibe o real objetivo do NAFTA. Aos EUA e ao Canadá tudo; ao México, o lixo.
Injustiças
Mexicanos e latinos são caçados na fronteira México-EUA tanto por forças policiais como por milícias de norte-americanos indignados com a crescente presença de latinos em seu país. Segundo um morador de Atlanta, “eles são sujos, emporcalham as cidades e trazem o desemprego”. A Califórnia, o Texas, o Novo México e partes do estado do Arizona foram conquistadas do México pelos EUA. Entre 1824 e 1854, os mexicanos foram obrigados a ceder a maior parte de seu território aos EUA.
Na chamada Guerra dos Mil Dias entre liberais e conservadores na Colômbia, no período de 1899 a 1903, com morte de cerca de 120 mil pessoas, os EUA e a França incentivaram e financiaram “rebeldes” na província colombiana do Panamá para buscar a independência e formar um novo país. Foi o que aconteceu: o projeto era o canal do Panamá.
Uma cidade mexicana que negou licença a uma empresa norte-americana para a construção de um aterro de lixo nuclear foi processada numa corte de Nova York, condenada a pesada multa e a aceitar a presença do aterro e do lixo, tudo nos termos do NAFTA.
Uma das maiores empresas dos EUA na área da suinocultura, a Granjas Carrol, foi expulsa de vários estados em seu país por crimes ambientais e, beneficiada pelo NAFTA, instalou-se numa cidade mexicana. Surgiu ali o vírus da gripe suína, pela contaminação da água das fontes que cortam a cidade e seu entorno.
Mea culpa
Nem o governo mexicano e nem os governos departamentais ou de municípios têm como enfrentar o problema: o de o México ter sido transformado em colônia dos EUA, com direito a servir de depósito de lixo e empresas como as Granjas Carrol.
Uma das séries de tevê mais assistidas nos EUA, Law and Order, exibiu um capítulo em que um cidadão hondurenho é vítima da fúria fascista de jovens norte-americanos e termina morto. Numa espécie de mea culpa, no episódio, o júri é criticado por falta de isenção para julgar crimes cometidos contra latinos residentes nos EUA, mesmo que ilegais.
De um modo geral cidadãos latino-americanos, considerados de segunda classe pelos norte-americanos, fazem os chamados serviços domésticos em residências de gente como John McCain, ainda que sem os “papéis” e sob o risco constante de deportação. Não ocorre o mesmo em relação a norte-americanos ou canadenses no México, na Colômbia e no Chile.
O governo do presidente Felipe Calderón, México, foi eleito sob acusações comprovadas de fraude eleitoral. Seu adversário ameaçava romper o tratado de livre comércio com os EUA. Álvaro Uribe, ex-presidente da Colômbia, foi acusado pelo Departamento Anti-Drogas dos EUA de ter sido eleito pelo tráfico, de ser complacente com o tráfico e beneficiário do tráfico de drogas. Mas é amigo.
Dilema
Os EUA têm o absoluto controle tanto do México quanto da Colômbia, reduzidos ao papel de colônia. O Panamá permanece sendo um protetorado norte-americano a despeito dos muitos tratados para a retirada do controle sobre aquele país, nenhum cumprido integralmente. O canal do Panamá é considerado estratégico para interesses comerciais e militares dos EUA.
O dilema da América Latina é esse: ou se resigna a ser o que se costumava falar nas décadas de 50 e 60 do século passado, América Latrina, ou se integra sem qualquer tipo de interferência ou participação dos EUA e ganha perspectivas de tornar-se um bloco político e econômico que permita aos latino-americanos preservar a independência e a soberania de seus países.
Por isso, Chávez é inimigo. Evo Morales é inimigo. Daniel Ortega é inimigo. Outros são inimigos em menor escala. E Uribe e Pepe Lobo são amigos. O tráfico aí é irrelevante para o “processo democrático”.
Continência
O Brasil é chave nesse processo. A perspectiva de uma realidade capitalista à brasileira, como define Ivan Pinheiro (candidato do Partido Comunista Brasileiro a presidente da República) aterroriza os EUA. É um país de dimensões continentais. Tem todas as condições para se transformar numa potência mundial – já se faz sentir assim nesses oito anos de governo Lula – e abre perspectivas para um processo de transformações mais amplo que o que está em curso em países como a Venezuela, a Bolívia, a Nicarágua, o Equador e Cuba, consolidando a revolução pós-Fidel.
Foi nesse sentido, como alerta, que os EUA patrocinaram o golpe militar que transformou Honduras num grande campo de concentração. A média de pessoas assassinadas naquele país por forças militares e policiais no arremedo de democracia do governo Pepe Lobo é de duas por dia. É por aí que a extrema-direita em todos os países latino-americanos busca formas de retomar posições perdidas e “recolocar” a América Latina na condição de América Latrina. O fantasma dos golpes militares não está descartado a médio e longo prazos, dependendo da forma como o processo evoluir. A realidade dos EUA hoje mostra que a reeleição de Obama é incerta.
E mesmo governos democratas, tidos como liberais, nunca foram obstáculos a golpes nessa parte do mundo. A derrubada de João Goulart, no Brasil, em 1964, foi orquestrada no governo democrata de Lyndon Johnson, por um embaixador integrante do partido Democrata e um general que falava português fluentemente e serviu a Kennedy, a Johnson e a Nixon.
Para que todo o planeta bata continência a Washington, adote o hambúrguer como prato do cotidiano e tenha como sonho tirar uma foto com o imenso letreiro Hollywood ao fundo, falta ainda a América Latina. Boa parte da Europa (Reino Unido, Alemanha e Itália principalmente) já vai ganhando contornos de colônia. Por aqui, as colônias neste momento são México e Colômbia. Honduras é base exportadora de terrorismo de Estado.
*Laerte Braga é jornalista brasileiro. Artigo publicado no Diário Liberdade (Galiza, Espanha).
Fonte: Opera Mundi
terça-feira, 14 de setembro de 2010
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