México e Colômbia: colônias norte-americanas - por Laerte Braga
O NAFTA (North American Free Trade Agreement, ou Acordo de Livre Comércio Norte-Americano) é um tratado de livre comércio assinado entre os Estados Unidos, o Canadá e o México, tendo o Chile como país associado.
Quem prestar atenção à safra de filmes produzidos por Hollywood no pós 11 de Setembro vai perceber, sem muitas dificuldades, que norte-americanos transformaram o caráter espetáculo do famoso subúrbio de Los Angeles em ponta-de-lança do combate midiático aos adversários do império.
Foi por esse motivo e debaixo de forte pressão de senadores republicanos e grupos sionistas que Guerra ao Terror venceu Avatar como melhor filme no Oscar de 2009. Segundo John McCain, derrotado por Obama nas eleições de 2008 e um dos principais líderes da extrema-direita nos EUA, Avatar “é um filme com nítidas tendências comunistas, fala em igualdade”.
A descoberta de um túmulo coletivo no México com corpos de cidadãos latino-americanos – quatro brasileiros inclusive – exibe o real objetivo do NAFTA. Aos EUA e ao Canadá tudo; ao México, o lixo.
Injustiças
Mexicanos e latinos são caçados na fronteira México-EUA tanto por forças policiais como por milícias de norte-americanos indignados com a crescente presença de latinos em seu país. Segundo um morador de Atlanta, “eles são sujos, emporcalham as cidades e trazem o desemprego”. A Califórnia, o Texas, o Novo México e partes do estado do Arizona foram conquistadas do México pelos EUA. Entre 1824 e 1854, os mexicanos foram obrigados a ceder a maior parte de seu território aos EUA.
Na chamada Guerra dos Mil Dias entre liberais e conservadores na Colômbia, no período de 1899 a 1903, com morte de cerca de 120 mil pessoas, os EUA e a França incentivaram e financiaram “rebeldes” na província colombiana do Panamá para buscar a independência e formar um novo país. Foi o que aconteceu: o projeto era o canal do Panamá.
Uma cidade mexicana que negou licença a uma empresa norte-americana para a construção de um aterro de lixo nuclear foi processada numa corte de Nova York, condenada a pesada multa e a aceitar a presença do aterro e do lixo, tudo nos termos do NAFTA.
Uma das maiores empresas dos EUA na área da suinocultura, a Granjas Carrol, foi expulsa de vários estados em seu país por crimes ambientais e, beneficiada pelo NAFTA, instalou-se numa cidade mexicana. Surgiu ali o vírus da gripe suína, pela contaminação da água das fontes que cortam a cidade e seu entorno.
Mea culpa
Nem o governo mexicano e nem os governos departamentais ou de municípios têm como enfrentar o problema: o de o México ter sido transformado em colônia dos EUA, com direito a servir de depósito de lixo e empresas como as Granjas Carrol.
Uma das séries de tevê mais assistidas nos EUA, Law and Order, exibiu um capítulo em que um cidadão hondurenho é vítima da fúria fascista de jovens norte-americanos e termina morto. Numa espécie de mea culpa, no episódio, o júri é criticado por falta de isenção para julgar crimes cometidos contra latinos residentes nos EUA, mesmo que ilegais.
De um modo geral cidadãos latino-americanos, considerados de segunda classe pelos norte-americanos, fazem os chamados serviços domésticos em residências de gente como John McCain, ainda que sem os “papéis” e sob o risco constante de deportação. Não ocorre o mesmo em relação a norte-americanos ou canadenses no México, na Colômbia e no Chile.
O governo do presidente Felipe Calderón, México, foi eleito sob acusações comprovadas de fraude eleitoral. Seu adversário ameaçava romper o tratado de livre comércio com os EUA. Álvaro Uribe, ex-presidente da Colômbia, foi acusado pelo Departamento Anti-Drogas dos EUA de ter sido eleito pelo tráfico, de ser complacente com o tráfico e beneficiário do tráfico de drogas. Mas é amigo.
Dilema
Os EUA têm o absoluto controle tanto do México quanto da Colômbia, reduzidos ao papel de colônia. O Panamá permanece sendo um protetorado norte-americano a despeito dos muitos tratados para a retirada do controle sobre aquele país, nenhum cumprido integralmente. O canal do Panamá é considerado estratégico para interesses comerciais e militares dos EUA.
O dilema da América Latina é esse: ou se resigna a ser o que se costumava falar nas décadas de 50 e 60 do século passado, América Latrina, ou se integra sem qualquer tipo de interferência ou participação dos EUA e ganha perspectivas de tornar-se um bloco político e econômico que permita aos latino-americanos preservar a independência e a soberania de seus países.
Por isso, Chávez é inimigo. Evo Morales é inimigo. Daniel Ortega é inimigo. Outros são inimigos em menor escala. E Uribe e Pepe Lobo são amigos. O tráfico aí é irrelevante para o “processo democrático”.
Continência
O Brasil é chave nesse processo. A perspectiva de uma realidade capitalista à brasileira, como define Ivan Pinheiro (candidato do Partido Comunista Brasileiro a presidente da República) aterroriza os EUA. É um país de dimensões continentais. Tem todas as condições para se transformar numa potência mundial – já se faz sentir assim nesses oito anos de governo Lula – e abre perspectivas para um processo de transformações mais amplo que o que está em curso em países como a Venezuela, a Bolívia, a Nicarágua, o Equador e Cuba, consolidando a revolução pós-Fidel.
Foi nesse sentido, como alerta, que os EUA patrocinaram o golpe militar que transformou Honduras num grande campo de concentração. A média de pessoas assassinadas naquele país por forças militares e policiais no arremedo de democracia do governo Pepe Lobo é de duas por dia. É por aí que a extrema-direita em todos os países latino-americanos busca formas de retomar posições perdidas e “recolocar” a América Latina na condição de América Latrina. O fantasma dos golpes militares não está descartado a médio e longo prazos, dependendo da forma como o processo evoluir. A realidade dos EUA hoje mostra que a reeleição de Obama é incerta.
E mesmo governos democratas, tidos como liberais, nunca foram obstáculos a golpes nessa parte do mundo. A derrubada de João Goulart, no Brasil, em 1964, foi orquestrada no governo democrata de Lyndon Johnson, por um embaixador integrante do partido Democrata e um general que falava português fluentemente e serviu a Kennedy, a Johnson e a Nixon.
Para que todo o planeta bata continência a Washington, adote o hambúrguer como prato do cotidiano e tenha como sonho tirar uma foto com o imenso letreiro Hollywood ao fundo, falta ainda a América Latina. Boa parte da Europa (Reino Unido, Alemanha e Itália principalmente) já vai ganhando contornos de colônia. Por aqui, as colônias neste momento são México e Colômbia. Honduras é base exportadora de terrorismo de Estado.
*Laerte Braga é jornalista brasileiro. Artigo publicado no Diário Liberdade (Galiza, Espanha).
Fonte: Opera Mundi
quinta-feira, 23 de setembro de 2010
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