3º ato: São Paulo para, Haddad viaja
O movimento desta terça-feira não deixa dúvidas quanto à sua tenacidade e capacidade de fazer valer a vontade popular através da luta. Haddad e Alckimin negligenciam e fingem ignorar a situação. Por Passa Palavra
O terceiro ato contra o aumento das passagens do transporte público em São Paulo, novamente, surpreendeu a todos pela enorme quantidade de pessoas que aderiu à mobilização. Mesmo a Polícia Militar, num primeiro momento, hesitou em passar os seus números para não ter de admitir que o movimento cresceu bastante desde o início da jornada, mas entre os manifestantes estima-se que pelo menos 12 mil pessoas tenham comparecido à marcha que partiu um pouco antes das 18h da Praça do Ciclista, na Av. Paulista e se estendeu, com vários focos de ação, por toda a noite.
A manifestação tomava a Rua da Consolação quando um verdadeiro “pé d’água” desabou sobre São Paulo. Já aqui, impressionou o fato de, apesar de toda a chuva, o protesto ter seguido sem prejuízo. Ao contrário, subvertendo um pouco a palavra de ordem conhecida, milhares de pessoas gritavam “vem, vem, vem, vem pra chuva, vem, contra o aumento”.
Rapidamente o protesto desceu o túnel que passa por debaixo da Praça Roosevelt e seguiu um grande trecho inicial da ligação leste-oeste, a mais importante artéria que liga o centro à Zona Leste da cidade. Na altura da 23 de Maio, a marcha subiu uma rampa de acesso e ocupou a Avenida da Liberdade, contornou a Praça da Sé e por volta das 19h15 alcançava o Terminal de Ônibus Parque Dom Pedro. Houve então um grande momento de tensão, a polícia impedia a continuidade da marcha, bloqueando os acessos com bombas de gás.
Paralelamente, um grupo menor de manifestantes, com aproximadamente 300 pessoas, conseguiu chegar antes à região, ocupando a parte interna do terminal. Após bloquearem temporariamente a passagem, o grupo foi reprimido pela polícia com bombas e balas de borracha também na parte interna do terminal. Este grupo menor decidiu seguir o protesto até à região da Sé, visando a unificação com o outro grupo de manifestantes. Após seguir o caminho, a polícia os dispersou nas ruas de acesso, antes mesmo da chegada à catedral da Sé.
De volta à Praça da Sé, o conflito se intensificou. A polícia atirou inúmeras bombas de gás e balas de borracha, numa ação completamente arbitrária, visto que a permanência do protesto no local não afetava em nada o fluxo da cidade e, ao contrário, tendia para a dispersão voluntária dos próprios manifestantes. Na Catedral, um pequeno grupo de manifestante foi cercado por bombas de gás. Aos poucos aquele bloco da manifestação se dispersou, mas ao menos 10 pessoas foram detidas.
Diante da forte ação policial na região do centro antigo, cerca de duas mil pessoas seguiram pela Avenida Brigadeiro Luís Antônio para chegar à Avenida Paulista. Aos poucos, outros grupos dispersos também se dirigiram lá e, quando tudo parecia ter terminado na Praça da Sé, cerca de três mil pessoas ocupavam a Av. Paulista no final da noite e bloqueavam-na completamente. Quando os manifestantes já se dispersavam, próximo das 22h, na altura do MASP (Museu de Arte de São Paulo) a polícia voltou a reprimir a manifestação com bombas de gás lacrimogênio e balas de borracha.
Até o momento, tem-se notícia de que 20 pessoas foram presas: 10 indiciados sem fiança, outros com soltura condicionada à fiança de 20 mil reais (numa estipulação totalmente arbitrária por parte do delegado responsável). Ao que tudo indica, a Polícia tomou como posição prender indiscriminadamente o maior número de pessoas para tentar enfraquecer o movimento financeiramente.
Até às 23h, pelo menos, era possível receber notícias de focos de manifestação sendo brutalmente reprimidos pela polícia. Entre os manifestantes, pairava a certeza de que este teria sido o ato mais forte da cidade dos últimos tempo, mas também o mais violentamente reprimido.
Enquanto isso…
No mesmo momento em que a cidade vive uma verdadeira guerra contra o aumento da tarifa, o prefeito Fernando Haddad e o governador Geraldo Alckmin viajam a Paris num esforço de trazer para São Paulo o mega evento Expo 2020, dando mostras de que o que planejam nada tem em comum com o anseio da juventude que está nas ruas. Não fosse trágico, seria irônico, mas enquanto São Paulo arde em revolta contra a situação em que se encontra toda a sua estrutura de mobilidade urbana, do outro lado do oceano, Haddad e Alckimin aliam-se com a missão de apresentá-la como financeiramente atraente ao empresariado internacional e com boas estruturas para receber eventos de grande porte.
Em declaração aos jornais da grande imprensa, após serem perguntados sobre a onda de protestos, os dois maiores representantes do colapso em que se encontram os sistemas de transporte público da região metropolitana limitaram-se a se referir aos supostos atos de violência por parte dos manifestantes e, para além das promessas sobre investimentos futuros e autorização para a polícia reprimir, pouco ou quase nada disseram sobre como pretendem responder a uma questão imediata, à “única, clara e simples” reivindicação que está sendo gritada, escrita e panfletada nas ruas (e que nesta mesma terça-feira foi protocolada pelo Movimento Passe Livre-SP): “redução da tarifa de ônibus de R$3,20 para R$3,00″.
O movimento desta terça-feira, que mesmo com a chuva e talvez o maior episódio de repressão aberta já vivido na cidade manteve mais de 10 mil pessoas nas ruas, não deixa dúvidas quanto à sua tenacidade e capacidade de fazer valer a vontade popular através da luta – como o fizeram já neste período recente 6 capitais brasileiras. O cotidiano do cidadão paulistano está definitivamente alterado, São Paulo está parada. Assistindo a tudo de longe, bem de longe, Haddad e Alckimin negligenciam e fingem ignorar a situação.
Novo ato já está marcado para se concentrar na quinta-feira, dia 13 de junho, às 17h em frente ao Teatro Municipal.
Fonte: http://passapalavra.info/
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