terça-feira, 13 de julho de 2010

Sartre ou a liberdade - por Eliades Acosta Matos (Cubarte).

Sartre ou a liberdade

Em uma entrevista concedida por Jean Paul Sartre a Serge Lanfaire [*], publicada por Le Nouvel Observateur, em seu número 188, correspondente à semana do dia 19 a 25 de junho de 1968, o menos importante é sua análise do Maio francês, dessa versão pop daquelas barricadas e daqueles comuneiros que talvez podiam filosofar mal, mas sabiam morrer bem, parafraseando José Martí, quando escrevia sobre os poetas da guerra de 68. Por Eliades Acosta Matos (Cubarte).


Em meio à sua análise do que chamou “a contra-violência”, estudantil e seus implacáveis adjetivos contra De Gaulle (O Velho, o chama), Sartre nos oferece certas definições, quase em chave, do que é, e o que há de ser, a liberdade e o pensamento crítico. Como se trata, do mesmo modo que há 40 anos, de uma assinatura pendente para o socialismo que pretende ser a alternativa do capitalismo decadente, essas palavras em sua boca adquirem um novo brilho, como se tivessem sido pronunciadas para debater hoje, entre as guerras genocidas que Obama continua e as notícias de que a crise econômica global, longe de estar concluída, entra em uma nova fase.

“Se se julga ao que não é julgado – afirma, referindo-se aos professores da Sorbonne, mas intuímos que a toda autoridade – não há verdadeira liberdade”. E não mente.

Sobre o saber, ou seja, o conhecimento, afirma:

“Todo saber que não é constantemente criticado, superando-se e reafirmando-se a partir desta crítica, não tem nenhum valor… O que é o saber? Sempre é alguma coisa nova, que já não é o que se acreditava, porque se realizaram novas observações e novas experiências com métodos e instrumentos melhores. E portanto, estas novas experiências são, por sua vez, discutidas por outros sábios, alguns retardatários e outros mais avançados…“

O caráter eminentemente conflitivo, ou seja, dialético, da cultura, define-se na próxima definição, tão sensível como rotunda. “A cultura só pode transmitir-se, se se deixa que as pessoas, em todos momentos, tenham possibilidade de discuti-la… A única maneira de aprender é discutir. É também a única maneira de fazer-se homem. Um homem não é nada senão um ser que cumpre isto: alguém que é fiel a uma realidade político-social, mas que não deixa de colocá-la em dúvida. Claro está que pode se apresentar uma contradição entre sua fidelidade e sua dúvida, mas isto é algo positivo, é uma contradição frutífera. Se há fidelidade, mas não há dúvida, a coisa não vai bem: deixa-se de ser um homem livre.”

Longe de admitir a domesticação da idade e dos costumes, Sartre nos anuncia:

“A universidade está feita para formar homens capazes de duvidar… Estou seguro de que Raymond Aron nunca duvidou de si mesmo, e, por isso, na minha opinião, é indigno de ser professor… O que Aron faz é pensar sozinho frente à secretária, e pensar o mesmo durante 30 anos… Agora que toda França viu completamente desnudado o Sr. De Gaulle – conclui – é preciso que os estudantes possam olhar Raymond Aron nu. Só lhes devolverão sua roupa se aceitar a crítica…“

Foram ditas as palavras inteligentes, conclusivas. Sartre, o míope, diverte-se e zomba: trata-se de um tema essencial, inevitável: o da Liberdade.
Pois, como se maneja o socialismo com esta santa palavra?

Há respostas vociferantes e também silenciosas. O importante é a constatação de que o normal é a liberdade e o estranho é a tirania. Disso falava Sartre.

O tema da liberdade é um dos temas mais centrais de nossa época. Trata-se de um antes e um depois, como se anuncia. Não haverá paz, nem delicadeza, nem processo natural, senão se tem em conta seu perfil, sua origem, seu desejo…

Não há mais. O socialismo ou é libertário ou não será. Por isso seus inimigos encarniçados tudo fazem para que caiamos na armadilha de limitá-la, na miragem do controle excessivo, da asfixia.

Liberdade e socialismo são a mesma coisa. Por isso nós, socialistas, temos sido, como dizia Martí, portadores de toda a justiça. Seria imperdoável, por carência, mediocridade ou covardia, ficarmos a meio do caminho.

[*] Jean Paul Sartre: “El movimiento estudiantil: una crítica radical de la sociedad , del (entrevista) “68 francés: 40 mayos después”. Editorial Ciencias Sociales y Ruth Casa Editorial
Fonte: http://www.cubarte.cult.cu/paginas/actualidad/conFilo.php?id=15038
Tradução: Lucas Morais.
Fonte: http://passapalavra.info/

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