Ato marca início da mobilização contra mudanças no Código Florestal
Manifestação no Rio de Janeiro reuniu ativistas e lideranças de organizações ambientalistas na crítica à comissão especial criada na Câmara para discutir a reforma do Código Florestal e ao relatório com 11 sugestões de mudança que começou a ser lido na terça-feira pelo deputado federal Aldo Rebelo (PCdoB-SP). Em nota pública, o MST e a Via Campesina denunciaram que o texto de Aldo Rebelo “atende apenas aos interesses dos ruralistas”, e defenderam a lei em vigor. Para Rebelo, lei, na sua forma atual, é impossível de ser aplicada.
Maurício Thuswohl
RIO DE JANEIRO – Cerca de 200 pessoas participaram na quinta-feira (10) de um ato público contra a proposta de reformulação do Código Florestal Brasileiro que tramita na Câmara dos Deputados. Convocada pelo ex-ministro do Meio Ambiente, o deputado estadual Carlos Minc (PT-RJ), e realizada nas escadarias da Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro, a manifestação reuniu ativistas e lideranças de organizações ambientalistas na crítica à comissão especial criada na Câmara para discutir a reforma do Código Florestal e ao relatório com 11 sugestões de mudança que começou a ser lido na terça-feira (8) pelo deputado federal Aldo Rebelo (PCdoB-SP).
Enquanto manifestações semelhantes são agendadas em todo o país, cresce em Brasília o clima de pressão em torno do tema. De um lado, deputados afinados com o movimento ambientalista se esforçam para adiar ao máximo a votação do relatório de Aldo e apostam que, com Copa do Mundo e eleições, esse assunto só seja efetivamente debatido pela Câmara na próxima legislatura. De outro, a máquina parlamentar ligada aos ruralistas e ao agronegócio quer pressa na votação das mudanças no Código Florestal, e já conseguiu a primeira vitória com o texto elaborado pelo deputado comunista, que contempla quase todas as reivindicações do setor.
As mudanças propostas por Aldo Rebelo são significativas. Apesar de, em tese, manter os índices de preservação dos biomas brasileiros em seu patamar atual - Amazônia (80%), Cerrado (35%), Mata Atlântica, Caatinga, Pantanal e Pampas (20%) -, o texto permite que cada estado defina seus próprios limites. Com isso, na prática, o novo Código Florestal permitiria que cada governo estadual possa repetir o que foi feito em Santa Catarina, onde o governador Luiz Henrique da Silveira (PMDB) conseguiu aprovar uma lei reduzindo o limite mínimo de matas ciliares (vegetação às margens dos rios) do parâmetro de 30 a 500 metros para outro de cinco a 30 metros, dependendo da localidade. Coincidência, ou não, Santa Catarina nunca sofreu tanto com deslizamentos de terreno como nas últimas chuvas.
O mesmo artifício foi utilizado no relatório elaborado por Aldo nos pontos referentes às Áreas de Preservação Permanente (APPs), como morros, encostas, várzeas e margens dos rios. Segundo o atual Código Florestal, elaborado em 1965, o limite de preservação obrigatória nessas áreas, dependendo das condições, varia de 30 a 500 metros. No relatório do deputado, essa margem mínima cai a 15 metros, e o texto ainda dá aos estados a prerrogativa de reduzi-la em 50%, ou seja, cada governo estadual poderia legalizar faixas de proteção com apenas 7,5 metros: “É uma questão de se adequar à realidade. Noventa por cento das propriedades rurais brasileiras já não cumprem as exigências em vigor”, disse Aldo.
Outra mudança que preocupa os parlamentares ambientalistas é a proposta de permissão para a realização de atividades econômicas nas APPs. O Código Florestal em vigor proíbe qualquer atividade econômica dentro dessas áreas, mas o relatório de Aldo Rebelo fala na liberação até mesmo de “atividades de larga escala, que poderão ser autorizadas pelo devido licenciamento ambiental”, e também “assegura a manutenção de atividades agropecuárias desenvolvidas nas APPs até 22 de julho de 2008”.
Arroz ilegal
O deputado comunista defende sua posição: “A lei, na sua forma atual, é impossível de ser aplicada. Deixaria na ilegalidade 75% do arroz produzido no país, 80% da produção de banana no Vale da Ribeira (SP), quase toda a criação de gado no Pantanal, boa parte do café produzido em Minas Gerais e no Espírito Santo, da maçã produzida em Santa Catarina e da uva produzida no Rio Grande do Sul”, disse.
A próxima reunião da comissão especial da Câmara que discute a reformulação do Código Florestal está marcada para terça-feira (15), dia da estréia do Brasil na Copa do Mundo. Fatos como esse aumentam as esperanças dos ambientalistas de protelar a discussão para 2011. Os ruralistas, no entanto, fazem pressão sobre Aldo para que a comissão vote o relatório até o fim de junho: “Hoje estamos produzindo em 220 milhões de hectares, o resto é tudo reserva. É um percentual muito pequeno do território para a agricultura e a pecuária no Brasil. Não podemos estrangular ainda mais nossa produção”, afirma a senadora Kátia Abreu (DEM-TO), que é presidente da Comissão Nacional de Agricultura (CNA) e chegou a ser cotada para vice na chapa do tucano José Serra.
Ganhar tempo
Entre os ambientalistas, ganhar tempo também é importante para aumentar na sociedade a discussão sobre as mudanças no Código Florestal e evitar que elas sejam aprovadas pela Câmara enquanto os olhos do país estão voltados para os estádios da África do Sul. Organizações como MST, Via Campesina, FBOMS, WWF, Greenpeace, Grupo de Trabalho Amazônico (GTA), Rede de ONGs da Mata Atlântica (RMA), Instituto Vitae Civilis e Instituto Sociomabiental (ISA), entre outras, devem realizar em breve manifestações contra as mudanças no Código.
Em nota pública, o MST e a Via Campesina denunciaram que o texto de Aldo Rebelo “atende apenas aos interesses dos ruralistas”, e defenderam a lei em vigor: “O Código Florestal é uma barreira ao avanço do agronegócio porque impõe limites à devastação ambiental na atividade agrícola, com a aplicação da Reserva Legal e das APPs. A flexibilização da legislação ambiental, defendida pela bancada ruralista, é de interesse do agronegócio, das empresas transnacionais da agricultura e do capital financeiro”.
“Proposta ruim”
No ato do Rio de Janeiro, marcaram presença representantes do MST e da Via Campesina, da Fetraf/CUT (Federação dos Trabalhadores da Agricultura Familiar) e da Contag (Confederação Nacional dos Trabalhadores da Agricultura), além de dirigentes de diversas ONGs: “Não aceitamos que o Código Florestal Brasileiro seja descaracterizado. A proposta de alteração do código da bancada ruralista é ruim, vai provocar mais desmatamento no país e comprometer a realização das metas brasileiras assumidas na ONU de redução das emissões de CO2”, disse o ex-ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc.
Minc afirmou ainda que os ruralistas estão aproveitando alguns pontos do código que ainda precisam ser aperfeiçoados para provocar pânico no setor, como se a atual lei inviabilizasse a produção agrícola. “Estudos científicos mostram que é possível dobrar a produção no Brasil sem se avançar sobre novas áreas verdes”, afirmou. Coordenador da Fetraf e presidente da União das Cooperativas da Agricultura Familiar e Economia Solidária o Rio de Janeiro (Unicafes), Paulo César Ventura Mendonça, afirmou ser importante “juntar a sociedade do campo e da cidade para defender o Código Florestal e uma produção sustentável”.
Fonte: http://www.cartamaior.com.br/
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário