Governo de SP se curva diante de argumentos preconceituosos
A estação Angélica foi planejada de acordo com estudos de demanda feitos pelo Metrô. A previsão era de que 25 mil pessoas usassem a estação diariamente. Mas os argumentos dos moradores de Higienópolis tiveram mais peso que o planejamento técnico.
Li na Folha hoje: Governo de São Paulo desiste de construir a Estação Angélica do Metrô depois de protestos e abaixo-assinado de moradores de Higienópolis (bairro nobre de São Paulo próximo ao centro). A estação seria parte da futura Linha 6 – Laranja, que ligará a Brasilândia, na Zona Norte, ao centro. Com a desistência, o Metrô voltou a estudar a possibilidade de construir uma estação na Praça Charles Miller, em frente ao estádio do Pacaembu.
A estação Angélica foi planejada de acordo com estudos de demanda feitos pelo Metrô. A previsão era de que 25 mil pessoas usassem a estação diariamente. Mas os argumentos dos moradores de Higienópolis aparentemente tiveram mais peso que planejamento técnico. Eles reclamam, entre outras coisas, que já existem estações de Metrô no entorno, que o fluxo de pessoas no local seria aumentado, que haveria um aumento no número de ocorrências indesejáveis no bairro e também da possibilidade de instalação de camelôs no local. Poucas vezes o nome do bairro e seu perfil estiveram mais consonantes: todos os argumentos são higienistas. Os moradores não querem contato com pobres, simplesmente. O fato de que existem 3 faculdades na região (Mackenzie, PUC e Faap) e de vários prédios de escritórios na Av. Angélica não pareceu importante para os verdadeiros ‘donos’ do local. Aliás, nem a possibilidade de melhorar a mobilidade em benefício próprio contou. Afinal, quem assina abaixo-assinado contra o Metrô está bastante satisfeito com sua vida dentro de um carro.
Mais importante que criticar a postura dos moradores – por inaceitáveis que sejam os argumentos, eles têm o direito de tentar manter seu padrão de vida – é entender os motivos que levaram o Governo a aceitar a pressão local. Ou o estudo técnico era de má qualidade ou a pressão de moradores ditos influentes pesou. Como exemplo, a nata do tucanato paulista mora no bairro (não insinuo aqui que eles foram contra a obra, duvido que algum político faria isso; só quero mostrar o nível de ‘influência’ dos moradores do bairro). Ambos os casos são ruins.
Pior ainda é o plano de instalar uma estação na frente do Pacaembu. A prática recente em todo o mundo é construir estações de trens e metrô a pelo menos algumas centenas de metros dos estádios. Isso ajuda a encaminhar melhor o fluxo de pessoas. É assim em Wembley, em Londres, no Stade de France, em Paris e até no Morumbi, em São Paulo (a estação será a 1 quilômetro, só não se sabe quando será inaugurada). Em contrapartida, o Emirates Stadium, em Londres, tem uma estação praticamente na porta (que foi construída em 1906, antes que o Arsenal se instalasse no bairro). Tive a oportunidade de usar a estação depois de um jogo e a experiência não foi boa. A estação fica lotada ao ponto de ser insegura.
Espero que a reação contrária a essa decisão consiga fazer um contraponto aos desejos dos moradores locais. O bairro não é usado apenas por eles, mas pelos que lá trabalham, estudam ou simplesmente passam. O envolvimento dos moradores é importante sim e deve acontecer em todos os bairros. Quando só os cidadãos ricos e influentes são ouvidos, fica clara a assimetria da democracia na cidade.
Publicado originalmente em Desafios Urbanos
Fonte: http://www.revistaforum.com.br/
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