sexta-feira, 13 de maio de 2011

O Império Contra-Ataca - Por Norberto Emmerich

O Império Contra-AtacaWashington quer a todo custo recuperar o controle da América Latina, seriamente abalado em novembro de 2005, na Cúpula das Américas de Mar del Plata, na Argentina, quando foram encerradas definitivamente as negociações da Alca.

Em maio de 2011 se firmou o Acordo do Pacífico em Lima, articulando uma zona de livre comércio e proteção de investimentos sob a influência estadunidense. Os que assinam o Acordo do Pacífico (Chile, Colômbia, México e Peru), aos quais presumidamente se somarão Honduras, Nicarágua, El Salvador, Costa Rica, Panamá, Guatemala e possivelmente República Dominicana, deixam deslocada a União Sul-Americana de Nações (Unasul) e põe um limite à liderança do Brasil na região.

Washington quer a todo custo recuperar o controle da América Latina, seriamente abalado em novembro de 2005, na Cúpula das Américas de Mar del Plata, na Argentina, quando foram encerradas definitivamente as negociações da Área de Livre Comércio das Américas (Alca).

Os Estados Unidos tinham assegurado o voto de 21 dos 34 países convidados a participarem da Alca em Mar del Plata, mas Brasil, Argentina e Venezuela argumentaram que não se podia ignorar os 75% do PIB da região que eles representavam.

George W. Bush foi embora da Argentina e milhões de pessoas no continente celebraram a morte da Alca. O Mercosul ficou com possibilidades de construir junto com a Comunidade Andina de Nações a integração comercial da América do Sul e então a Unasul tomou força como espaço de integração política.

Muitos analistas observaram que a Alca voltaria e que o Tratado de Livre Comércio que os Estados Unidos insistiam em estabelecer com países com os quais tinha pouca relação comercial na zona andina era um indício de que os objetivos estratégicos estadunidenses não seriam abandonados. O Peru não somente assinou um Tratado de Livre Comércio com os Estados Unidos, como também começou outras negociações, firmando mais de seis Tratados de Livre Comércio com países de outros continentes. A integração sul-americana não chegava a se completar. O Peru segue sendo um eixo fundamental para a articulação desta nova Alca encoberta, já que sob o mando de Alan García se impulsionou o Acordo do Pacífico, preparatório das negociações do Acordo de Associação Econômica Estratégica Transpacífico (TPP) integrado por nove países da América, Ásia e Oceania. Este grande acordo de proteção de investimentos e livre comércio se dá no marco do Fórum Econômico Ásia Pacífico (APEC), onde se denominou o Arco do Pacífico.

O recente acordo do Pacífico pretende conectar parte da Comunidade Andina (Chile, Peru, Colômbia) com a América Central e os Estados Unidos, unindo quase toda a costa americana, desde o Alasca até a Patagônia chilena, em uma integração ao melhor estilo da Alca.

Uma América do Sul estadunidense no Pacífico, outra América do Sul brasileira no Atlântico
Os quatro signatários do Acordo do Pacífico (Chile, Colômbia, México e Peru), mais os seis países que firmaram o Tratado de Livre Comércio entre América Central e Estados Unidos (CAFTA), representam uma área comercial e de investimentos controlada por Washington. No momento em que a América do Sul emerge em um nível global como região avançada que propõe uma nova arquitetura financeira internacional com o Banco do Sul, a coordenação de seus bancos centrais, a livre circulação de seus cidadãos, e o Brasil surge como uma potência mundial com presença nos grandes fóruns dando grande força a Unasul, os Estados Unidos operam com seus governos aliados no Chile, Colômbia, México e Peru para frear a integração sul-americana. Este acordo permite a Washington dividir a América do Sul em duas costas, a do Pacífico, liderada pelos Estados Unidos, e a do Atlântico, liderada pelo Brasil.

Mas os Estados Unidos pretendem mais e não abandonam a costa atlântica. No dia 22 de janeiro se difundiu na Holanda uma informação, em nada nova, que falava sobre o fato de que Dési Bouterse, agora presidente do Suriname, manteve laços com o narcotráfico até o ano de 2006. Chamativamente junto À mesma informação se afirmava que o principal sócio do agora presidente do Suriname nas atividades do crime organizado era o narcotraficante guianês Roger Khan.

No início do mês de março de 2011 o informe 2010 da Junta Internacional de Fiscalização de Entorpecentes (Jife) das Nações Unidas menciona muito negativamente o Suriname como país de narcotráfico. Apesar de o informe da ONU avaliar como positivo o papel da Guiana na luta contra o narcotráfico e nas políticas de cooperação com as instâncias supranacionais de controle, o informe do Departamento de Estado, através de seu International Narcotics Control Strategy Report – Relatório de Estratégia de Controle Internacional de Narcóticos (INCSR, por sua sigla em inglês) -, manifestou que os esforços da Guiana eram “modestos”.

Ambos informes, o da Jife e do INCSR foram emitidos praticamente na mesma data, um em 7 de março e outro em 4 de março, respectivamente.

O governo guianês, através de seu ministro de Assuntos Internos, Clement Rohee, qualificou de “inexato e falso” o relatório do Departamento de Estado dos EUA, já que os Estados Unidos não consideraram os esforços de seu país na luta contra o narcotráfico. Ao mesmo tempo, denunciou o desinteresse estadunidense e a “escassa colaboração na luta contra o narcotráfico”.

Enquanto isso, no cenário regional, ambos os países estão desenvolvendo vigorosos esforços para estreitar os laços de vinculação regional em um amplo espectro de atividades e vertentes econômicas. Estes vínculos se estabelecem primariamente com Brasil e Venezuela, líderes do processo de integração sul-americano que ao mesmo tempo demonstram interesse institucional em manter estas políticas.
Ainda que não se tenha mencionado este informe, a multiplicidade de projetos de intercomunicação informática, econômica, judicial e policial expressa a vontade dos países envolvidos de construir uma infra-estrutura de integração que resista tanto ao passar do tempo quanto às mudanças de governo na região. A presidência da Unasul, nas mãos do mandatário da Guiana, Bharrat Jagdeo, é o motor de todos estes projetos.

Neste contexto de elogiável atividade integradora, a política exterior dos Estados Unidos manifesta com clareza o papel disciplinador e hegemônico da política desta luta contra o narcotráfico. Um exemplo paradigmático da utilização desta política como parte de um projeto de política exterior é a ambígua relação do Departamento de Estado com a Costa Rica, por um lado, e com a Nicarágua, pelo outro.
Enquanto a Costa Rica perde seu histórico status de desmilitarização e permite a presença de 7 mil soldados norte-americanos para a luta contra o narcotráfico, as reivindicações da Nicarágua para perseguir diversas áreas do crime organizado dedicadas ao tráfico de drogas no interior do país são ignoradas. E quando uma destas áreas é vasculhada até os manguezais do Rio San Juan, o exército costa-riquenho defende os critérios de soberania nacional e começa um confronto.

Este modelo de regulamentação ambiental de geopolíticas bi-nacionais que usa como argumento a luta contra o narcotráfico parece estar dando seus primeiros passos na Guiana e no Suriname. A presença de tropas estadunidenses na zona já se estabeleceu a partir de acordos do Suriname com os Estados Unidos para a ajuda frente a catástrofes naturais.

O ressurgimento dos velhos e conhecidos vínculos mafiosos de Dési Bouterse em momentos nos quais o Suriname reafirma sérios compromissos de integração sul-americana e o menosprezo dos esforços da Guiana em sua luta contra o narcotráfico privado em seu país são indícios de táticas de reposicionamento hegemônico dos Estados Unidos frente ao Brasil e à Venezuela, utilizando como pretexto estes dois pequenos países limítrofes.

Publicado originalmente em http://rebelion.org
Tradução de Cainã Vidor.
Fonte: http://www.revistaforum.com.br

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