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Belo Monte : Privatização da Água e do Território Amazônico
por Rafael Freire
Belo Monte, apesar do nome, tem sido, há três décadas, mais um capítulo do processo de degradação da Floresta Amazônica, do massacre dos povos indígenas, do saque das riquezas brasileiras e da privatização dos setores econômicos estratégicos para a soberania nacional em favor dos monopólios capitalistas.
(...)
Histórico
Ainda em 1975, iniciaram-se os Estudos de Inventário Hidrelétrico da Bacia Hidrográfica do Rio Xingu, para avaliar o potencial de geração de energia elétrica do rio. Em 1980, a Eletronorte (subsidiária da estatal Eletrobrás) passa a estudar a viabilidade técnica e econômica do chamado Complexo Hidroelétrico de Altamira, inicialmente formado por duas futuras usinas: Babaquara e Kararaô.
Já em 1989, durante o 1º Encontro dos Povos Indígenas do Xingu, os participantes se posicionam contra a construção da usina Kararaô e exigem que o nome do projeto seja alterado, em respeito à sua opinião contrária. Neste encontro, uma cena ganhou o mundo e entrou para história. Enquanto o então presidente da Eletronorte, José Antonio Muniz, falava sobre a usina, a índia Tuíra se levantou da plateia e encostou a lâmina de seu facão no rosto de Muniz, numa demonstração de que os povos indígenas da Amazônia estão prontos para ir à luta pela preservação da Floresta e pela sua sobrevivência.
Durante anos, o projeto fica engavetado, e só em 2001, quando foi divulgado um plano de emergência de US$ 30 bilhões para aumentar a oferta de energia no país, com a construção de 15 usinas hidrelétricas, é que Belo Monte volta a ser discutido oficialmente. Em 2002, enquanto o então presidente da República Fernando Henrique Cardoso critica ambientalistas e diz que a oposição à construção de usinas hidrelétricas atrapalha o país, o então candidato e futuro presidente Luiz Inácio Lula da Silva lança um documento intitulado “O Lugar da Amazônia no Desenvolvimento do Brasil”, que cita Belo Monte e diz que “a matriz energética brasileira, que se apoia basicamente na hidroeletricidade, com megaobras de represamento de rios, tem afetado a Bacia Amazônica”.
Em 2007, durante o Encontro Xingu para Sempre, índios entram em confronto com o responsável pelos estudos ambientais da hidrelétrica, Paulo Fernando Rezende, que fica ferido, com um corte no braço. Após o evento, o movimento elabora e divulga a “Carta Xingu Vivo para Sempre”, que especifica as ameaças ao Rio Xingu e apresenta um projeto de desenvolvimento para a região. No mesmo ano, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região, de Brasília, autoriza a participação das empreiteiras Camargo Corrêa, Norberto Odebrecht e Andrade Gutierrez nos estudos de impacto ambiental da usina, numa clara demonstração de quais interesses, de fato, comandarão e sairão ganhando com a construção da usina.
Projeto e leilão
A área total do projeto é de aproximadamente 1.000 km2*. A área inundada com o lago da usina pertence aos municípios de Altamira (267 km2), Vitória do Xingu (248 km2), Brasil Novo (0,5 km2). Estima-se que a obra obrigará o deslocamento forçado e imediato de cerca de 20 mil pessoas e ainda afetará a migração de outras 100 mil entre moradores de Altamira (principal cidade da região), povos indígenas e população ribeirinha que vive ao longo do Rio Xingu e seus afluentes.
O custo da obra está orçado inicialmente em R$ 19 bilhões, mas vários especialistas e até as próprias empresas que participaram dos estudos prévios já disseram que, ao final, tudo sairá por volta dos R$ 30 bilhões. Dinheiro para tal feito não é problema. O Governo Federal já se comprometeu em financiar 80% da obra através do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), com ressarcimento dos empréstimos em até 30 anos. Além disso, as megaempresas exigiram um abatimento de 75% no Imposto de Renda sobre as movimentações relativas à obra; conseguiram.
Após diversas idas e vindas judiciais, com liminares suspendendo e liberando o leilão, este aconteceu no dia 20 de abril e durou apenas 10 minutos.
O governo brasileiro ainda enfrentará pelo menos 15 questionamentos judiciais sobre a viabilidade econômica da obra e os impactos sociais e ambientais na região, sendo 13 deles impetrados pelo Ministério Público Federal do Pará.
O vencedor do leilão foi o consórcio Norte Energia, que ofereceu o valor de R$ 78 por megawatt-hora (MWh). Nele, a participação estatal é de 49,98%. Ou seja. Por apenas 0,02% das ações, grandes empresas privadas serão os acionistas majoritários do empreendimento. Vão mandar e desmandar no processo de construção e gestão da usina e dos recursos hídricos do Xingu.
Mais uma vez, repete-se a velha lógica de usar recursos públicos, dinheiro do povo, para financiar os lucros dos monopólios capitalistas, como ocorreu nas famigeradas privatizações.
Desrespeito aos povos e privatização
Assim, além de privatizar a Amazônia e nossas riquezas, Belo Monte desrespeita frontalmente os povos indígenas, rasgando a Convenção 69 da OIT, da qual o Brasil é signatário, que prevê que o governo precisa conseguir o consentimento prévio, livre e informado dos povos indígenas, antes de tomar medidas que os afetem.
Pois declarou Dom Erwin Kräutler, Bispo do Xingu e Presidente do Cimi ao jornal Voz de Nazaré “Se Belo Monte for construída, a obra será realizada no limite de terras indígenas com inegáveis impactos sociais e culturais causados pela proximidade do canteiro de obras e de pessoas estranhas às aldeias. Ao longo de cerca de 100 km, a volta Grande do Xingu sofrerá "redução da vazão e rebaixamento do lençol freático com impactos biológicos originando um Trecho de Vazão Reduzida (TVR). Essa perda de recursos naturais e hídricos prejudicará diretamente os povos indígenas. Como viver no seco? De que se alimentarão, já que "o conjunto das espécies que vivem neste trecho do rio não sobreviverá sob um regime de vazão", em outras palavras, se aos indígenas falta o peixe?
Em 2007, quando o presidente Lula deu a medalha de Ordem do Mérito Cultural ao cacique Raoni, líder dos indígenas da região, ele disse que não iria assinar a construção da barragem de Belo Monte. Pelo jeito, o presidente Lula também esqueceu suas promessas para satisfazer as grandes corporações capitalistas.
Rafael Freire é diretor do Sindicato dos Jornalistas da Paraíba
Fonte : A Verdade
Fonte: http://peledaterra.blogspot.com/
segunda-feira, 2 de maio de 2011
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