Como os protestos contra Israel (e o homem da bandeira) salvaram vidas em Gaza
"4.000 pessoas determinadas e pacíficas não podem ser paradas com gás lacrimogêneo ou balas de borracha", disse um oficial do exército israelense de ocupação.
Israel parece ter desistido de um ataque ainda mais massivo a Gaza—por enquanto--, em grande parte por causa dos protestos no Egito e da sensação mais ampla de que “falta legitimidade” a Israel para realizar mais agressões, apesar da garantia de cobertura diplomática dos Estados Unidos. Esta é uma grande vitória do poder do povo e, como consequência, sem dúvida, vidas foram salvas.
Nos últimos dias, os palestinos de Gaza, ao ouvir os sons de jatos de guerra israelenses, explosões e aviões não pilotados à sua volta o tempo todo, se preocuparam com a possibilidade de que Israel estivesse preparando um ataque massivo a Gaza, semelhante à Operação Chumbo Grosso, de 2008, que matou 1.400 pessoas, feriu milhares e destruiu a infraestrutura civil.
O ataque não provocado de Israel a Gaza depois da operação em Eliat
A partir do dia 18 de agosto, Israel lançou uma série de ataques aéreos e realizou várias execuções extrajudiciais em Gaza, como resposta pelo ataque em Eilat daquele dia, no qual desconhecidos mataram oito israelenses, incluindo dois soldados, de acordo com relatos oficiais israelenses.
Apesar de suas acusações iniciais, Israel não ofereceu absolutamente nenhuma prova de que o ataque em Eliat tivesse qualquer coisa a ver com Gaza. No entanto, Israel se lançou a uma matança que ceifou catorze vidas em Gaza, incluindo uma criança de 2 anos de idade, um garoto de 13, um médico e vários membros de facções da resistência.
Antes mesmo da operação em Eliat, Israel já continuava com sua matança de sempre em Gaza, com o assassinato em estilo execução de Sa'ad al-Majdalawi, um adolescente com deficiência mental, em cuja cabeça as forças de ocupação israelenses atiraram dez vezes no dia 16 de agosto.
Apesar da destruição horrorosa, Israel desistiu de um ataque ainda maior e concordou com uma trégua com as facções palestinas que atiravam foguetes em resposta aos ataques aéreos israelenses a Gaza.
Um civil israelense foi morto na cidade de Bir Al-Saba como resultado da retaliação palestina. Até agora, a trégua parece estar sendo mantida.
“Falta legitimidade” a Israel
O ministério israelense decidiu ontem não realizar nenhuma ação que pudesse levar a uma escalada no sul e cooperar indiretamente com a trégua declarada pelo Hamas no domingo, o Haaretz noticiou hoje. O jornal acrescenta:
O que ficou mais claro nas declarações de de Netanyahu e Barak ao ministério é que falta a Israel a legitimidade necessária para uma operação em larga escala em Gaza. A crise diplomática com o Egito limita ainda mais a liberdade de ação de Israel.
“O primeiro ministro crê que seria equivocado apressar uma guerra total em Gaza agora,” disse um dos conselheiros de Netanyahu. “Estamos nos preparando para responder se o fogo continuar, mas Israel não será arrastado a lugares aonde não quer ir”.
Vários assessores de Netanyahu detalharam os limites à ação militar israelense, a maioria dos quais é diplomática.
“Há uma situação sensível no Oriente Médio, que é um grande caldeirão fervente; existe a arena internacional; existe a ida palestina às Nações Unidas em setembro, com a qual os palestinos esperam obter reconhecimento da ONU como estado. Temos que escolher nosso caminho cuidadosamente”.
O jornal reconheceu que a dissuasão militar—a incapacidade de Israel de se defender de forma efetiva contra os foguetes retaliatórios das facções da resistência palestina—cumpriu um papel menor, mas significativo, na interrupção da escalada.
O poder do povo parou o ataque israelense
O que é claro é que os limites “diplomáticos” a Israel não foram obra dos governos mundiais, que permanecem, em grande medida, silenciosos e cúmplices ante os constantes crimes israelenses.
Na verdade, trata-se de governos tendo que responder ao poder do povo, especialmente no Egito, onde dezenas de milhares de pessoas se juntaram em frente à embaixada de Israel no Cairo, em protesto contra o assassinato israelense de cinco militares egípcios durante a operação de Eliat e contra os ataques de Israel aos palestinos.
O protesto produziu um novo herói popular, Ahmad al-Shehat, o chamado #Flagman [homem da bandeira], que escalou o prédio de 22 andares no qual se situa a embaixada e substituiu a bandeira israelense pela bandeira egípcia.
Minha avaliação durante os acontecimentos é que, apesar da retórica bélica, da matança e das ameaças, incluída uma ameaça horrenda de decapitação, feita por Ehud Barak, Israel não iria muito mais longe.
Israel se aterroriza com o poder não-violento do povo
Como a notícia do Haaretz demonstra, os líderes de guerra de Israel também chegaram à mesma conclusão, a de que Israel está estreitamente limitado. Os protestos no Egito foram o fator mais imediato, mas podemos deduzir também que o contexto mais amplo da região também não favorece o comportamento comum de Israel.
Desde os massivos protestos de refugiados palestinos no dia do Nakba, nas fronteiras controladas por Israel com o Líbano e a Síria, Israel tem se aterrorizado com a possibilidade de protestos não-violentos massivos explodirem na Cisjordânia.
Em junho, oficiais israelenses avisaram que o exército não poderia deter protestos massivos até mesmo de alguns poucos milhares de pessoas. Como o Haaretz noticiou:
“Um protesto não-violento de 4.000 pessoas ou mais, mesmo que eles somente marchem até um posto de controle ou um assentamento, e especialmente se a polícia palestina não os detiver, seria imparável”, disse um oficial do exército de ocupação. “Tal número de pessoas determinadas não pode ser parado com gás lacrimogêneo ou balas de borracha”.
Outro oficial do exército de ocupação nos territórios afirmou que “se nós tivermos que encarar protestos parecidos com os do Egito ou da Tunísia, não seremos capazes de fazer nada”.
Portanto, não só protestos reais, mas a mera ameaça de protestos populares de massa, não-violentos, podem limitar os ocupantes israelenses.
Sem dúvida, a ampla campanha de solidariedade internacional, incluindo as flotilhas a Gaza, os esforços de levar os criminosos de guerra israelenses à Justiça através da jurisdição universal e a campanha de boicote, desinvestimento e sanções estão forçando os líderes de Israel a internalizar o fato de que “falta legitimidade” a suas ações e que elas trazem consequências.
Apesar de uma sólida muralha de cumplicidade internacional oficial, para Israel, matar árabes já não é coisa tão desprovida de custos como antes. E isso é graças à ação popular.
Mas não podemos jamais ser complacentes. A mensagem a todos os que estão engajados no trabalho de solidariedade e protestos populares pelos direitos palestinos é: em frente! Essas ações não só fazem com que a justiça e a igualdade estejam mais perto de nós. Elas também, a curto prazo, podem até salvar vidas.
Fonte: www.revistaforum.com.br/
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