Em memória do Golpe de 1964, o Cordão da Mentira desfilou pelas ruas de São Paulo e o mais interessante, talvez, tenha sido ver uma nova geração de militantes tomar contato com a luta e os lutadores de ontem. Por Passa Palavra

A concentração iniciou-se por volta do meio-dia, em frente ao Cemitério da Consolação, com um sarau feito em homenagem ao poeta, escritor e líder abolicionista Luiz da Gama. Neste momento, diversos poetas e representantes de coletivos culturais tomaram a palavra para denunciar o estado de constante opressão e violência em que vivem moradores das periferias e bairros pobres da cidade, dando concretude para algo que há muito vem sendo pontuado por militantes que lutam pela efetivação de uma Comissão da Verdade, e que fora bem resumido no manifesto lançado pelos organizadores: “Quando admitimos que os crimes do passado permaneçam impunes, abrimos precedentes para que eles sejam repetidos no presente.”



O Cordão continuou pelas ruas da região da Luz até chegar à antiga sede do DOPS (Departamento de Ordem Política e Social), onde foram lembrados os presos políticos torturados durante a ditadura pelo delegado Sérgio Paranhos Fleury, o mesmo que comandou o Esquadrão da Morte. Foi feito então o rebatismo simbólico da “Escola de Música do Estado Tom Jobim” para “Escola Livre de Música Pato N’Água”, relembrando o mestre de bateria da Escola de Samba Vai-Vai, executado pelo Esquadrão da Morte.
Se é que nos é permitida uma breve opinião sobre o ocorrido, vale a pena observar que, em seu conjunto, o desfile do Cordão da Mentira representou algo aparentemente novo no cenário da esquerda – paulistana, pelo menos. A começar pelo caráter musical de considerável bom gosto, deixando um pouco de lado aquelas velhas palavras de ordem que já não parecem alcançar o público passante, sempre apressado e bombardeado pela profusão de informações que caracteriza o ambiente urbano. Também a presença de coletivos e ativistas políticos das mais variadas colorações ideológicas, e que se utilizam de linguagens distintas, é um ponto a ser ressaltado. Contudo, o mais interessante, talvez, tenha sido ver uma nova geração de militantes tomar contato com a luta e os lutadores de ontem – oportunidade realçada pelo turismo político em que de certa forma consistiu a manifestação -, o que se mostra particularmente interessante num momento em que a muitos movimentos que se afirmam como nova tendência, dotados de novas formas, parece faltar uma percepção de continuidade, o que significa a rejeição de outras experiências e o não reconhecimento da História. E aí residem os elementos que poderão revelar algo sobre, não só as deles, mas também as nossas falhas.


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