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sexta-feira, 30 de novembro de 2012
"O que Israel está fazendo com os palestinos é muito pior do que o apartheid sul-africano”. – por Katarina Peixoto
"O que Israel está fazendo com os palestinos é muito pior do que o apartheid sul-africano”.
Para Ronnie Kasrils, Israel só vai parar com o expansionismo e com a opressão de fora para dentro. “Um movimento de solidariedade internacional aos palestinos tem um papel muito importante. Foi assim que nós derrubamos o apartheid. Nós tínhamos razão. Levou tempo, mas Leclerc teve de libertar Mandela e dizer ‘vamos conversar’, que era o que nós dizíamos que tinha de ser feito. "Eu acredito que este é o aspecto mais importante da luta em solidariedade ao povo palestino. É preciso denunciar os assentamentos, mas é preciso boicotar, também. É preciso constrange-los materialmente, economicamente”, defendeu.
Ele tem 73 anos e nasceu numa comunidade judaica de Joanesburgo, formada por fugitivos do extermínio em Vilna e em Riga, na Lituânia, no início do século XX. Aos 9 anos, numa sessão de cine-notícias entre filmes, viu as imagens que começavam a circular, no mundo, dos campos de concentração nazistas. Voltou para casa e perguntou a sua mãe, a quem diz dever a sua consciência frente à opressão e à intolerância, se o que acontecia na sua vizinhança e no seu país, com a população negra, era a mesma coisa. Se a pobreza, a humilhação e a segregação a que estavam condenados pelos brancos era a mesma coisa que, no cine-notícia que acabara de ver, chamaram de antissemitismo. “A minha mãe, que não era uma intelectual, cuja família tinha uma delicatessen, mas que frequentou a escola até os 16 anos, disse que não, que não era a mesma coisa. Mas que aquilo que eu tinha visto e que tinha acabado de acontecer com o nosso povo na Europa tinha começado dessa mesma maneira que eu descrevera, ali (na África do Sul)”. Esse é o tipo de coisa que Ronnie Kasrils começa a contar, assim que senta na mesa e pede que nos apresentemos, para uma conversa com alguns dos mais proeminentes participantes do Fórum Social Mundial Palestina Livre, que começa nesta quinta (29) e vai até domingo, em Porto Alegre.
Ronnie , ou “Ronaldo”, como ele gosta de se chamar, aqui, é um homem extraordinário e um sujeito adorável. Parece muito mais jovem, talvez pela exuberância, talvez pela natureza de seu compromisso moral com o mundo. É muito raro, quando se trata da questão palestina, que algum militante abra sorrisos tão largos e demonstre tamanho otimismo, como o faz Kasrils, um escritor, ativista, ex-ministro de estado da África do Sul pós-apartheid e membro do Tribunal Russell para a Palestina. Ele começou a falar de sua vida, de suas trajetórias e de suas escolhas. É difícil de acreditar, mas Kasrils, aos dez anos, fez parte do Betar, o movimento da juventude sionista criado por Ze'ev Jabotinsky, o pai do revisionismo sionista, um movimento de extrema direita, que defende o que chamam de Israel bíblica, algo que hoje implicaria a incorporação da Síria, do Líbano, da Jordânia e do norte do Egito. Ronnie contou esse fato pitoresco rindo, para em seguida deixar claro: “Éramos muito influenciados por um professor, que estimulava um sentimento de violência e de conflito, inclusive entre nós, e mesmo físico, como se isso nos fortalecesse, como um projeto pedagógico. Éramos meninos, tínhamos pouco mais de dez anos, mas entendemos que ele era doente. Era um louco”. O seu engajamento no Betar se desfez com essa descoberta e também com a entrada no ensino médio, num colégio da elite branca, onde conheceu um professor história, Teddy Gordon, também judeu, que lhe ensinou sobre a Revolução Francesa.
É difícil descrever à altura o brilho nos olhos do sul-africano, quando falou de seu professor, a quem atribui a mudança mais definitiva na sua vida. Ronnie Kasrils é um homem poderoso e mundialmente conhecido, pegou em armas com Mandela, foi ministro de estado, mas quem mudou a sua vida, em termos políticos, foi o professor de história que lhe deu aula sobre um acontecimento chamado Revolução Francesa. “Eu era, até então, um péssimo aluno, eu era um atleta, não era da ala dos intelectuais, como Richard Goldstone, que era meu colega. Mas quando esse professor começou a dar aula eu me tornei o melhor aluno, e saí do colégio de maneira promissora”, disse, sorrindo, convincente. Kasrils tem aquela capacidade rara de nos ensinar a mirar a história com ganas de atribuir-lhe sentido e com a confiança em tal coisa. A escolha por nos contar essa história, essa pequena parte dela, era uma operação deliberada e ao mesmo tempo refinada. Era como se ele estivesse nos dizendo: olha aqui, gurizada, eu passei a levar a sério um ponto de vista universalista e é deste ponto de vista que eu estou aqui.
A ligação com a esquerda judaica e a luta contra o apartheid sul-africano
“Mas eu também saí do Betar por uma outra razão”, conta, rindo. “As meninas do Habonim Dror eram muito mais bonitas” e, na época, Kasrils não era exatamente um militante da esquerda judaica socialista, que buscava criar um lar nacional judaico a partir da cultura e da educação e da vida kibutziana.
“O que me tornou de esquerda foi o massacre de Shaperville, de março de 1961, em que 69 militantes pacifistas negros foram mortos e centenas ficaram feridos. Ali eu tomei a decisão de que iria fazer alguma coisa. A minha família nunca foi militante, de esquerda, mas eu tinha um tio na Cidade do Cabo que era advogado e comunista. Eu peguei um ônibus e fui para a casa dele. Cheguei lá e disse: eu quero me juntar a vocês”. Ele nos olha bem sério, encosta-se na cadeira, abre um sorriso e completa: “Então foi assim que eu comecei. Eu tinha de pôr em contato os núcleos da resistência ao apartheid, os membros dos partidos comunistas, da esquerda. E o meu tio estava isolado, noutra cidade. Eu disse que iria fazer isso. E fiz”.
Quando Mandela convocou à luta armada, após os acontecimentos de Shaperville, Kasrils se juntou a ele. Treinou na União Soviética, recebeu formação militar e esteve em vários países africanos, quando se tornou chefe de inteligência militar do movimento Lança de Uma Nação, o braço armado do Congresso Nacional Africano, liderado por Nelson Mandela. Passou cinco anos na cadeia, perdeu o emprego como executivo de uma empresa de telefonia, foi perseguido e banido da comunidade branca sul-africana. E se tornou ministro de estado da África do Sul pós-apartheid. Foi então que se voltou para a questão palestina.
A luta contra o apartheid israelense
Com o fim do apartheid e a primeira eleição democrática da África do Sul, Kasrils se tornou ministro de estado. E, depois do ministério da defesa, foi nomeado ministro para assuntos de água e florestas, de 1999-2004. Nesse período, ocorreu a segunda intifada e o muro de anexação de territórios palestinos, pelo então governo de Ariel Sharon, começou a ser erguido, anexando territórios palestinos para construir assentamentos, esmagando casas e vilas palestinas, segregando bairros, vilas e famílias, dividindo a região e instaurando um sistema identificado pelo sul-africano como muito mais hostil que o apartheid sul-africano. Em 2001 ele redigiu a “Declaração de Consciência de Sul-Africanos Judeus”, contra as políticas israelenses nos territórios palestinos ocupados. Passou a ser acusado de antissemita, pela direita judaica local, e viajou para a Cisjordânia, como ministro para assuntos de água e florestas. Lá conheceu Jamal Juma, que dava início ao movimento de resistência não violenta Stop the Wall.
O que você defende como solução, os dois estados, as fronteiras da linha verde, um só estado para dois povos? Eu perguntei e isso parece não ter ecoado como uma questão a ser respondida. Kasrils olha para mim e diz que Israel só vai mudar, só vai parar com o expansionismo e com a opressão de fora para dentro. “Um movimento de solidariedade internacional aos palestinos tem um papel muito importante. Foi assim que nós derrubamos o apartheid. Nós tínhamos razão. Levou tempo, mas Leclerc teve de libertar Mandela e dizer ‘vamos conversar’, que era o que nós dizíamos que tinha de ser feito. Mas é preciso constranger economicamente, não apenas politicamente. O programa de Desinvestimento e de Boicote significou o começo do fim do apartheid e nós terminamos vencendo. Eu acredito que este é o aspecto mais importante da luta em solidariedade ao povo palestino. É preciso denunciar os assentamentos, mas é preciso boicotar, também. É preciso constrange-los materialmente, economicamente”, defendeu. Para Kasrils, o fato de que em Israel os cidadãos palestinos são cidadãos de segunda classe, com direitos limitados e sem o grau de liberdade civil dos israelenses configura apartheid. “No regime do apartheid, diante de um mestiço que não se sabia ao certo se era negro ou não, passavam um pente para ver se iria ou não deslizar sobre o cabelo. Caso o pente parasse, a pessoa iria para os setores dos negros”.
Em Israel não é assim, mas não precisa ser, lembrou. Há um muro que consegue separar as sociedades, anexando territórios dos palestinos, mas que afasta completamente os dois povos, promovendo limpeza étnica e criando “coisas como rodovias em que só judeus podem trafegar. Isso é uma violência que nem o apartheid sul-africano cometeu. O que o estado de Israel está fazendo com os palestinos é muito pior do que aquilo que acontecia no apartheid sul-africano”, concluiu.
O Fórum vai de 29 de novembro a 01 de dezembro e tomará conta da Rua dos Andradas, no centro de Porto Alegre. Confira programação aqui: www.wsfpalestine.netFotos: Carlos Carvalho
Ronnie
É difícil descrever à altura o brilho nos olhos do sul-africano, quando falou de seu professor, a quem atribui a mudança mais definitiva na sua vida. Ronnie Kasrils é um homem poderoso e mundialmente conhecido, pegou em armas com Mandela, foi ministro de estado, mas quem mudou a sua vida, em termos políticos, foi o professor de história que lhe deu aula sobre um acontecimento chamado Revolução Francesa. “Eu era, até então, um péssimo aluno, eu era um atleta, não era da ala dos intelectuais, como Richard Goldstone, que era meu colega. Mas quando esse professor começou a dar aula eu me tornei o melhor aluno, e saí do colégio de maneira promissora”, disse, sorrindo, convincente. Kasrils tem aquela capacidade rara de nos ensinar a mirar a história com ganas de atribuir-lhe sentido e com a confiança em tal coisa. A escolha por nos contar essa história, essa pequena parte dela, era uma operação deliberada e ao mesmo tempo refinada. Era como se ele estivesse nos dizendo: olha aqui, gurizada, eu passei a levar a sério um ponto de vista universalista e é deste ponto de vista que eu estou aqui.
A ligação com a esquerda judaica e a luta contra o apartheid sul-africano
“Mas eu também saí do Betar por uma outra razão”, conta, rindo. “As meninas do Habonim Dror eram muito mais bonitas” e, na época, Kasrils não era exatamente um militante da esquerda judaica socialista, que buscava criar um lar nacional judaico a partir da cultura e da educação e da vida kibutziana.
“O que me tornou de esquerda foi o massacre de Shaperville, de março de 1961, em que 69 militantes pacifistas negros foram mortos e centenas ficaram feridos. Ali eu tomei a decisão de que iria fazer alguma coisa. A minha família nunca foi militante, de esquerda, mas eu tinha um tio na Cidade do Cabo que era advogado e comunista. Eu peguei um ônibus e fui para a casa dele. Cheguei lá e disse: eu quero me juntar a vocês”. Ele nos olha bem sério, encosta-se na cadeira, abre um sorriso e completa: “Então foi assim que eu comecei. Eu tinha de pôr em contato os núcleos da resistência ao apartheid, os membros dos partidos comunistas, da esquerda. E o meu tio estava isolado, noutra cidade. Eu disse que iria fazer isso. E fiz”.
Quando Mandela convocou à luta armada, após os acontecimentos de Shaperville, Kasrils se juntou a ele. Treinou na União Soviética, recebeu formação militar e esteve em vários países africanos, quando se tornou chefe de inteligência militar do movimento Lança de Uma Nação, o braço armado do Congresso Nacional Africano, liderado por Nelson Mandela. Passou cinco anos na cadeia, perdeu o emprego como executivo de uma empresa de telefonia, foi perseguido e banido da comunidade branca sul-africana. E se tornou ministro de estado da África do Sul pós-apartheid. Foi então que se voltou para a questão palestina.
A luta contra o apartheid israelense
Com o fim do apartheid e a primeira eleição democrática da África do Sul, Kasrils se tornou ministro de estado. E, depois do ministério da defesa, foi nomeado ministro para assuntos de água e florestas, de 1999-2004. Nesse período, ocorreu a segunda intifada e o muro de anexação de territórios palestinos, pelo então governo de Ariel Sharon, começou a ser erguido, anexando territórios palestinos para construir assentamentos, esmagando casas e vilas palestinas, segregando bairros, vilas e famílias, dividindo a região e instaurando um sistema identificado pelo sul-africano como muito mais hostil que o apartheid sul-africano. Em 2001 ele redigiu a “Declaração de Consciência de Sul-Africanos Judeus”, contra as políticas israelenses nos territórios palestinos ocupados. Passou a ser acusado de antissemita, pela direita judaica local, e viajou para a Cisjordânia, como ministro para assuntos de água e florestas. Lá conheceu Jamal Juma, que dava início ao movimento de resistência não violenta Stop the Wall.
O que você defende como solução, os dois estados, as fronteiras da linha verde, um só estado para dois povos? Eu perguntei e isso parece não ter ecoado como uma questão a ser respondida. Kasrils olha para mim e diz que Israel só vai mudar, só vai parar com o expansionismo e com a opressão de fora para dentro. “Um movimento de solidariedade internacional aos palestinos tem um papel muito importante. Foi assim que nós derrubamos o apartheid. Nós tínhamos razão. Levou tempo, mas Leclerc teve de libertar Mandela e dizer ‘vamos conversar’, que era o que nós dizíamos que tinha de ser feito. Mas é preciso constranger economicamente, não apenas politicamente. O programa de Desinvestimento e de Boicote significou o começo do fim do apartheid e nós terminamos vencendo. Eu acredito que este é o aspecto mais importante da luta em solidariedade ao povo palestino. É preciso denunciar os assentamentos, mas é preciso boicotar, também. É preciso constrange-los materialmente, economicamente”, defendeu. Para Kasrils, o fato de que em Israel os cidadãos palestinos são cidadãos de segunda classe, com direitos limitados e sem o grau de liberdade civil dos israelenses configura apartheid. “No regime do apartheid, diante de um mestiço que não se sabia ao certo se era negro ou não, passavam um pente para ver se iria ou não deslizar sobre o cabelo. Caso o pente parasse, a pessoa iria para os setores dos negros”.
Em Israel não é assim, mas não precisa ser, lembrou. Há um muro que consegue separar as sociedades, anexando territórios dos palestinos, mas que afasta completamente os dois povos, promovendo limpeza étnica e criando “coisas como rodovias em que só judeus podem trafegar. Isso é uma violência que nem o apartheid sul-africano cometeu. O que o estado de Israel está fazendo com os palestinos é muito pior do que aquilo que acontecia no apartheid sul-africano”, concluiu.
O Fórum vai de 29 de novembro a 01 de dezembro e tomará conta da Rua dos Andradas, no centro de Porto Alegre. Confira programação aqui: www.wsfpalestine.netFotos: Carlos Carvalho
quinta-feira, 29 de novembro de 2012
Vítima da invasão humana: Conheça a incrível história do elefante que descarrilou um trem para defender seu rebanho - Por Stephen Messenger (Care2)
Vítima da invasão humana: Conheça a incrível história do elefante que descarrilou um trem para defender seu rebanho
Foto: Reprodução/Care2
No século XIX, época em que começou a expansão urbana contínua em terras selvagens, não faltaram exemplos para destacar a luta entre o mundo natural e o mundo que os seres humanos se esforçaram para construir, e alguns dos exemplos mais angustiantes destas lutas provavelmente foram perdidos através do tempo. Felizmente, não este. As informações são da Care2.
Nos últimos anos, Ky Cheah, de 68 anos de idade, mantém um blog no qual registra memórias de sua infância quando cresceu em Teluk Anson , na Malásia. E enquanto todos esses fatos pessoais serão, sem dúvida, valorizados por sua família e pelas gerações vindouras, estamos todos com sorte pelo fato de uma história oral, em especial, ter sobrevivido sob sua administração.
Cheah escreve que, um dia, quando ainda era um menino e procurava castanhas perto de trilhos antigos na sua cidade, ele se deparou com uma placa misteriosa que dizia: “Está enterrado aqui um elefante selvagem que, em defesa de seu rebanho, descarrilou um trem no dia 17 de setembro de 1894″.
O jovem, muito curioso para conhecer os detalhes que cercavam o incidente, foi procurar por pessoas que estavam vivas no momento para falar sobre o caso, e ouviu muitas histórias sobre o triste episódio do elefante que se suicidou nos trilhos do trem.
Rumores diziam que ele estava buscando vingança por um bezerro morto anteriormente pelo mesmo trem, enquanto outros alegaram que ele estava apenas defendendo seu rebanho do “novo inimigo” que invadiu seu domínio.
A ferrovia ligando Teluk Anson a Tapah foi concluída em 1893 e seu ruído diário através da selva anunciava a ameaça ao habitat dos gigantes e gentis elefantes.
As pessoas contaram que o maquinista não pode fazer nada porque o elefante havia ficado desafiadoramente sobre os trilhos do trem e se recusou a ceder, apesar da assovio alto do trem que se aproximava em sua direção. O animal era muito grande e mais alto do que o “Cavalo de Ferro”, e colidiu com ele na cabeça a 80 km/h . O impacto descarrilou a locomotiva e três vagões.
Em seu blog, Cheah convida outras pessoas a acrescentar mais para a notável história do heroico elefante, mas parece que só a ele restou a responsabilidade de registrar essa história para a posteridade. Felizmente, junto com a história oral, uma velha fotografia granulada confirma que o fato realmente ocorreu.
Cheah suspeita que o humilde marcador do túmulo do elefante tenha sido absorvido pela selva. “Não importa”, diz ele. “Uma selva prosperando de novo talvez seja o maior monumento de todos”.
Este post foi publicado originalmente por Stephen Messenger, pela TreeHugger.
Tradução por Patrícia Tai (da Redação)
Fonte: http://www.anda.jor.br/
Castells vê "expansão do não-capitalismo" - por Paul Mason
Castells vê "expansão do não-capitalismo"
Culturas econômicas alternativas teriam sido reforçadas pela crise. Mas sociólogo adverte: sistema não entrará em colapso por si mesmo
O professor Manuel Castells é um dos sociólogos mais citados no mundo. Em 1990, quando os mais tecnologicamente integrados de nós ainda lutavam para conseguir conectar seus modens, o acadêmico espanhol já documentava o surgimento da Sociedade em Rede e estudava a interação entre o uso da internet, a contracultura, movimentos de protesto urbanos e a identidade pessoal.
Paul Mason, editor de notícias econômicas da rádio BBC, entrevistou o professor Castells na London School of Economics (Escola de Economia de Londres) sobre seu último livro, “Aftermath: The Cultures of Economic Crisis” (“Resultado: as Culturas da Crise Econômica”), ainda sem tradução para português.
Castells sugere que talvez estejamos prestes a ver o surgimento de um novo tipo de economia. Os novos estilos de viver dão sentido à existência, mas a mudança tem também um segundo motor: consumidores que não têm dinheiro para consumir.
São práticas econômicas não motivadas pelo lucro, tais como o escambo, as moedas sociais, as cooperativas, as redes de agricultura e de ajuda mútua, com serviços gratuitos – tudo isso já existe e está se expandindo ao redor do mundo, diz ele. Se as instituições políticas vão se abrir para as mudanças que acontecem na sociedade – é cedo para saber. Seguem trechos da conversa.
O que é surgimento de novas culturas econômicas?
Quando menciono essa Cultura Econômica Alternativa, é uma combinação de duas coisas. Várias pessoas têm feito isso já há algum tempo, porque não concordam com a falta de sentido em suas vidas. Agora, há algo mais — é a legião de consumidores que não podem consumir. Como não consomem — por não terem dinheiro, nem crédito, nem nada — tentam dar sentido a suas vidas fazendo alguma coisa diferente. Portanto, é por causa das necessidades e valores — as duas coisas juntas — que isso está se expandindo.O que é surgimento de novas culturas econômicas?
Você escreveu que as economias são culturais. Pode falar mais sobre isso?
Se queremos trabalhar para ganhar dinheiro, para consumir, é porque acreditamos que comprando um carro novo ou uma nova televisão, ou um apartamento melhor, seremos mais felizes. Isso é uma forma de cultura. As pessoas estão revertendo essa noção. Pelo contrário: o que é importante em suas vidas não pode ser comprado, na maioria dos casos. Mas elas não têm mais escolha porque já foram capturadas pelo sistema. O que acontece quando a máquina não funciona mais? As pessoas dizem “bem, eu sou mesmo burro. Estou o tempo todo correndo atrás de coisa nenhuma”.
Qual a importância dessa mudança cultural?
É fundamental, porque desencadeia uma crise de confiança nos dois maiores poderes do mundo: o sistema político e o financeiro. As pessoas não confiam mais no lugar onde depositam seu dinheiro, e não acreditam mais naqueles a quem delegam seu voto. É uma crise dramática de confiança – e se não há confiança, não há sociedade. O que nós não vamos ver é o colapso econômico per se, porque as sociedades não conseguem existir em um vácuo social. Se as instituições econômicas e financeiras não funcionam, as relações de poder produzem transformações favoráveis ao sistema financeiro, de forma que ele não entreem colapso. As pessoas é que entram em colapso em seu lugar.
A ideia é que os bancos vão ficar bem, nós não. Aí está a mudança cultural. E grande: uma completa descrença nas instituições políticas e financeiras. Algumas pessoas já começam a viver de modo diferente, conforme conseguem – ou porque desejam outras formas de vida, ou porque não têm escolha. Estou me referindo ao que observei em um dos meus últimos estudos sobre pessoas que decidiram não esperar pela revolução para começar a viver de outra maneira – o que resulta na expansão do que eu chamo de “práticas não-capitalistas”.
São práticas econômicas, mas que não são motivadas pelo lucro – redes de escambo, moedas sociais, cooperativas, autogestão, redes de agricultura, ajuda mútua, simplesmente pela vontade de estar junto, redes de serviços gratuitos para os outros, na expectativa de que outros também proverão você. Tudo isso existe e está se expandindo ao redor do mundo.
Na Catalunha, 97% das pessoas que você pesquisou estavam engajadas em atividades econômicas não-capitalistas.
Bem, estão entre 30-40 mil os que são engajados quase completamente em modos alternativos de vida. Eu distinguo pessoas que organizam a vida conscientemente através de valores alternativos de pessoas que têm vida normal, mas que têm costumes que podem ser vistos como diferentes, em muitos aspectos. Por exemplo, durante a crise, um terço das famílias de Barcelona emprestaram dinheiro, sem juros, para pessoas que não são de sua família.
É fundamental, porque desencadeia uma crise de confiança nos dois maiores poderes do mundo: o sistema político e o financeiro. As pessoas não confiam mais no lugar onde depositam seu dinheiro, e não acreditam mais naqueles a quem delegam seu voto. É uma crise dramática de confiança – e se não há confiança, não há sociedade. O que nós não vamos ver é o colapso econômico per se, porque as sociedades não conseguem existir em um vácuo social. Se as instituições econômicas e financeiras não funcionam, as relações de poder produzem transformações favoráveis ao sistema financeiro, de forma que ele não entre
A ideia é que os bancos vão ficar bem, nós não. Aí está a mudança cultural. E grande: uma completa descrença nas instituições políticas e financeiras. Algumas pessoas já começam a viver de modo diferente, conforme conseguem – ou porque desejam outras formas de vida, ou porque não têm escolha. Estou me referindo ao que observei em um dos meus últimos estudos sobre pessoas que decidiram não esperar pela revolução para começar a viver de outra maneira – o que resulta na expansão do que eu chamo de “práticas não-capitalistas”.
São práticas econômicas, mas que não são motivadas pelo lucro – redes de escambo, moedas sociais, cooperativas, autogestão, redes de agricultura, ajuda mútua, simplesmente pela vontade de estar junto, redes de serviços gratuitos para os outros, na expectativa de que outros também proverão você. Tudo isso existe e está se expandindo ao redor do mundo.
Na Catalunha, 97% das pessoas que você pesquisou estavam engajadas em atividades econômicas não-capitalistas.
Bem, estão entre 30-40 mil os que são engajados quase completamente em modos alternativos de vida. Eu distinguo pessoas que organizam a vida conscientemente através de valores alternativos de pessoas que têm vida normal, mas que têm costumes que podem ser vistos como diferentes, em muitos aspectos. Por exemplo, durante a crise, um terço das famílias de Barcelona emprestaram dinheiro, sem juros, para pessoas que não são de sua família.
O que é a Sociedade em Rede?
É uma sociedade em que as atividades principais nas quais as pessoas estão engajadas são organizadas fundamentalmente em rede, ao invés de em estruturas verticais. O que faz a diferença são as tecnologias de rede. Uma coisa é estar constantemente interagindo com pessoas na velocidade da luz, outra é simplesmente ter uma rede de amigos e pessoas. Existe todo tipo de rede, mas a conexão entre todas elas – sejam os mercados financeiros, a política, a cultura, a mídia, as comunicações etc –, é nova por causa das tecnologias digitais.
Então, nós vivemos numa Sociedadeem Rede. Podemos deixar de viver nela?
Podemos regredir a uma sociedade pré-eletricidade? Seria a mesma coisa. Não, não podemos. Apesar de agora muitas pessoas estarem dizendo “por que não começamos de novo?” É um grande movimento, conhecido como “decrescimento”. Algumas pessoas querem tentar novas formas de organização comunitária etc.
No entanto, o interessante é que, para as pessoas se organizarem e debaterem e se mobilizarem pelo decrescimento e o comunitarismo, elas têm que usar a internet. Não vivemos numa cultura de realidade virtual, mas de real virtualidade, porque nossa virtualidade – significando as redes da internet – é parte fundamental da nossa realidade. Todos os estudos mostram que as pessoas que são mais sociáveis na internet são também mais sociáveis pessoalmente.
Existem diversos grupos que hoje protestam sobre o assunto A, amanhã sobre o assunto B, e à noite jogam World of Warcraft (jogo RPG online de aventura). Mas será que eles vão conseguir o que Castro e Guevara conquistaram?
O impacto nas instituições políticas é quase insignificante, porque elas são hoje impermeáveis a mudanças. Mas, se você olhar para o que está acontecendo em termos de consciência… há coisas que não existiam três anos, como o grande debate sobre a desigualdade social.
Em termos práticos, o sistema é muito mais forte do que os movimentos nascentes… você atinge a mente das pessoas por um processo de comunicação, e esse processo, hoje, acontece fundamentalmente pela internet e pelo debate. É um processo longo, que vai das mentes das pessoas às instituições da sociedade. Vamos usar um exemplo histórico: a partir do fim do século XIX, na Europa, existiam basicamente os Conservadores e os Liberais, direita e esquerda. Mas então alguma coisa aconteceu – a industrialização, os movimentos da classe trabalhadora, novas ideologias. Nada disso estava no sistema político. Depois de vinte ou trinta anos, vieram os socialistas e depois a divisão dos socialistas… e os liberais basicamente desapareceram. Isso mudará a política, mas não por meio de ações políticas organizadas da mesma maneira. Por quê? Porque as redes não necessitam de organizações hierárquicas.
Onde isso vai dar?
Tudo isso não vai virar uma grande coalizão eleitoral, não vai virar nenhum novo partido, nenhum novo coisa nenhuma. É simplesmente a sociedade contra o Estado e as instituições financeiras – mas não contra o capitalismo, aliás, contra insitituições financeiras, o que é diferente.
Com esse clima, acontece que nossas sociedades se tornarão cada vez mais ingovernáveis e, em consequência, poderá ocorrer todo tipo de fenômeno – alguns muito perigosos. Veremos muitas expressões de formas alternativas de política, que escaparão das correntes principais de instituições políticas tradicionais. E algumas, é claro, voltando ao passado e tentando construir uma comunidade primitiva e nacionalista para atacar todos os outros movimentos e, finalmente, conseguir ter uma sociedade excluída do mundo, que oprime seu próprio povo.
Mas acontece que, em qualquer processo de mudança social desorganizada e caótica, todos esses fenômenos coexistem. E o modo como atuam uns contra os outros vai depender, em última análise, de as instituições políticas abrirem suficientemente seus canais de participação para a energia de mudança que existe na sociedade. Então talvez elas possam superar a resistência das forças reacionárias que também estão presentes em todas as sociedades.
É uma sociedade em que as atividades principais nas quais as pessoas estão engajadas são organizadas fundamentalmente em rede, ao invés de em estruturas verticais. O que faz a diferença são as tecnologias de rede. Uma coisa é estar constantemente interagindo com pessoas na velocidade da luz, outra é simplesmente ter uma rede de amigos e pessoas. Existe todo tipo de rede, mas a conexão entre todas elas – sejam os mercados financeiros, a política, a cultura, a mídia, as comunicações etc –, é nova por causa das tecnologias digitais.
Então, nós vivemos numa Sociedade
Podemos regredir a uma sociedade pré-eletricidade? Seria a mesma coisa. Não, não podemos. Apesar de agora muitas pessoas estarem dizendo “por que não começamos de novo?” É um grande movimento, conhecido como “decrescimento”. Algumas pessoas querem tentar novas formas de organização comunitária etc.
No entanto, o interessante é que, para as pessoas se organizarem e debaterem e se mobilizarem pelo decrescimento e o comunitarismo, elas têm que usar a internet. Não vivemos numa cultura de realidade virtual, mas de real virtualidade, porque nossa virtualidade – significando as redes da internet – é parte fundamental da nossa realidade. Todos os estudos mostram que as pessoas que são mais sociáveis na internet são também mais sociáveis pessoalmente.
Existem diversos grupos que hoje protestam sobre o assunto A, amanhã sobre o assunto B, e à noite jogam World of Warcraft (jogo RPG online de aventura). Mas será que eles vão conseguir o que Castro e Guevara conquistaram?
O impacto nas instituições políticas é quase insignificante, porque elas são hoje impermeáveis a mudanças. Mas, se você olhar para o que está acontecendo em termos de consciência… há coisas que não existiam três anos, como o grande debate sobre a desigualdade social.
Em termos práticos, o sistema é muito mais forte do que os movimentos nascentes… você atinge a mente das pessoas por um processo de comunicação, e esse processo, hoje, acontece fundamentalmente pela internet e pelo debate. É um processo longo, que vai das mentes das pessoas às instituições da sociedade. Vamos usar um exemplo histórico: a partir do fim do século XIX, na Europa, existiam basicamente os Conservadores e os Liberais, direita e esquerda. Mas então alguma coisa aconteceu – a industrialização, os movimentos da classe trabalhadora, novas ideologias. Nada disso estava no sistema político. Depois de vinte ou trinta anos, vieram os socialistas e depois a divisão dos socialistas… e os liberais basicamente desapareceram. Isso mudará a política, mas não por meio de ações políticas organizadas da mesma maneira. Por quê? Porque as redes não necessitam de organizações hierárquicas.
Onde isso vai dar?
Tudo isso não vai virar uma grande coalizão eleitoral, não vai virar nenhum novo partido, nenhum novo coisa nenhuma. É simplesmente a sociedade contra o Estado e as instituições financeiras – mas não contra o capitalismo, aliás, contra insitituições financeiras, o que é diferente.
Com esse clima, acontece que nossas sociedades se tornarão cada vez mais ingovernáveis e, em consequência, poderá ocorrer todo tipo de fenômeno – alguns muito perigosos. Veremos muitas expressões de formas alternativas de política, que escaparão das correntes principais de instituições políticas tradicionais. E algumas, é claro, voltando ao passado e tentando construir uma comunidade primitiva e nacionalista para atacar todos os outros movimentos e, finalmente, conseguir ter uma sociedade excluída do mundo, que oprime seu próprio povo.
Mas acontece que, em qualquer processo de mudança social desorganizada e caótica, todos esses fenômenos coexistem. E o modo como atuam uns contra os outros vai depender, em última análise, de as instituições políticas abrirem suficientemente seus canais de participação para a energia de mudança que existe na sociedade. Então talvez elas possam superar a resistência das forças reacionárias que também estão presentes em todas as sociedades.
Entrevista a Paul Mason | Tradução: Gabriela Leite | Imagem: Binho Ribeiro
Jamal Juma: sem o fim da ocupação, os palestinos farão uma terceira intifada – por Katarina Peixoto
Jamal Juma: sem o fim da ocupação, os palestinos farão uma terceira intifada
"O problema é a ocupação, esse é o maior dos problemas. A aprovação na ONU não vai mudar isso. A ONU fracassou, a comunidade internacional fracassou conosco”. Para ativista palestino, a continuação da ocupação e do expansionismo israelense está tornando uma terceira intifada inevitável.
Porto Alegre - Jamal Juma é um ativista que todos os que fazem parte do mundo do Fórum Social Mundial, em todos os continentes, conhecem. E admiram. Ele é coordenador de um movimento social de resistência não violenta à ocupação israelense, materializada no Muro de Anexação de territórios palestinos, o que começou a ser erguido há pouco mais de dez anos, na Cisjordânia. Sujeito tranquilo, pacifista intransigente, foi preso em fins de 2009 sob a acusação (ou seja, a falta dela) de que estaria plantando oliveiras e liderando marchas de protesto contra o Muro. Se tem alguma evidência do quanto a democracia israelense está corroída, é a prisão de Jamal: mais de dez dias numa sela com vômito e fezes, sem acusação formal, sem processo, pelo fato de ser um pacifista, isto mesmo, de resistir sem violência. A sua libertação se deu graças à pressão internacional mobilizada por Maren Mantovani, ativista italiana e coordenadora de relações internacionais do Stop The Wall, que mora em Ramalah há dez anos. Foi preciso que sete embaixadores interviessem no Knesset, o parlamento israelense, para obrigar Israel a libertar o ativista.
Em janeiro de 2010, num vídeo, Jamal cumprimentou os participantes de uma das edições do FSM,em Porto Alegre . Ele tinha, então, acabado de sair da prisão. Estava abatido, mas sorridente. Nos Fóruns anteriores, ele parecia ainda mais otimista. Defendia que a única saída para os problemas oriundos do expansionismo sionista era a retomada da solução de um estado para dois povos, uma bandeira pacifista originária dos partidos comunistas europeus, na década de sessenta.
Ontem, aquiem Porto Alegre , Jamal parecia mudado. Ele chegou depois de nossa longa conversa com Ronnie Kasrils, sentou-se à mesa e começou imediatamente a falar. Disse que as coisas estavam muito piores, na região, que tinha havido recrudescimento, que Israel seguia de maneira incontrolada com os assentamentos, que a população estava sem esperanças. Perguntei-lhe sobre as expectativas para amanhã (hoje, dia 29/11), quando a Autoridade Nacional Palestina apresentará o projeto de reconhecimento da Palestina como estado observador, na Assembleia Geral das Nações Unidas, e tudo está a indicar que será reconhecida como tal.
“Não tenho expectativas. Não vai mudar nada. Não significa coisa alguma em relação à ocupação e ao muro. E o problema é a ocupação, esse é o maior dos problemas. A aprovação na ONU não vai mudar isso. A ONU fracassou, a comunidade internacional fracassou conosco”. Perguntei-lhe o que pensava sobre as declarações dos membros da diplomacia do Fatah, de que esse reconhecimento seria um primeiro passo para que Israel recue para as fronteiras da linha verde (1967), e ele foi enfático: disse que não acreditava nisso, que uma solução diplomática a partir da comunidade internacional iria demover Israel de sua política expansionista.
Não fiz a pergunta que gostaria de ter feito: a sua posição sobre a solução de dois estados mudou? Agora você defende dois estados, e não mais um só estado? Jamal tem razão em não responder a essas perguntas. “Eu estou aqui para discutir as condições de qualquer debate sobre estado, diplomacia, ONU, Lei Internacional, que Israel não cumpre, mesmo. Estou aqui para falar do que há de mais fundamental, que é o reconhecimento dos direitos do povo palestino”, disse Jamal, em tom grave.
Fracassos da diplomacia, intifadas e expansionismo israelenseSe o movimento diplomático não trará frutos quanto à ocupação e se a população está sem esperanças, sobretudo depois deste último ataque israelense a Gaza, não estaríamos diante de uma terceira intifada? Qual o risco de uma terceira intifada e qual seria a diferença desta intifada em relação às outras? A resposta veio na hora:
“Já estamos caminhando para a terceira intifada, é inevitável isso. A população não aguenta mais. Pagamos duas vezes o preço da água, que nos é racionada, de uma água que é nossa, de nosso território, que foi usurpado, enquanto os assentados vivem em abundância, alguns com piscina em casa, jogando água fora, pagando menos”. Ronnie Raskils, que estava sentado ao lado de Jamal, olha para mim e diz: “Isto é muito pior do que o apartheid. E repete: é inacreditável, mas é verdade. Eu vi com meus olhos, quando estive lá, como ministro”. Por que a proposta palestina na ONU é inútil? Jamal responde que o muro separou vilas, cidades, famílias, que desagregou comunidades inteiras, que recortou populações e que não é uma votação na ONU que vai desfazer o dano causado.
Comentei que a segunda intifada ocorreu há pouco mais de dez anos, quando também começou a instalação do muro de concreto em territórios ocupados. Observei a diferença fundamental entre a primeira e a segunda intifada e perguntei qual seria a característica dessa terceira intifada, que ele aponta como provável e de certa forma já em curso. “A primeira intifada foi um levante popular, e as crianças e adolescentes começaram a jogar pedras após a operação ‘quebra ossos’, comandada, preste atenção nisso, por Yitzhak Rabin. Os militares israelenses chegavam perto dos adolescentes e batiam em seus braços, quebrando os seus ossos, com o objetivo único de amedrontar, calar as bocas e aterrorizá-los. Estávamos em 1987 e a resposta não tardou, eclodiu a primeira intifada, que foi um levante sobretudo contra as lideranças locais, palestinas, que nada faziam diante dessa humilhação. A resposta israelense foi brutal: ataques aéreos sobre ruas cheias de gente, indiscriminadamente. Foi uma repressão tão violenta que sufocou o caráter popular das manifestações”.
Daí vieram os Acordos de Oslo, eu disse. Que Israel não cumpriu, porque não desocupou nada e, numa operação deliberada de provocação, Ariel Sharon deu início a segunda intifada, retrucou Jamal, mais ou menos com essas palavras. A segunda intifada foi caracterizada, do lado palestino, pela figura do homem bomba palestino, pelo fortalecimento do Hamas, sobretudo na Faixa de Gaza e pelo consequente enfraquecimento político do Fatah. Do lado israelense, a resposta à segunda intifada foi especialmente brutal: ataques aéreos em resposta às explosões dos homens bomba, sistematização da demolição de casas e da intensificação das construções nos assentamentos e a precarização e discriminação da cidadania dos árabes israelenses, sobretudo os moradores de Jerusalém. Mas o seu aspecto mais duradouro e medonho foi e segue sendo o erguimento do muro do apartheid, como os movimentos sociais palestinos e de solidariedade à resistência palestina passaram a chamar, e que Israel chama de Muro de contenção de terroristas.
São mais de700 quilômetros de extensão, ladeados por uma faixa de 60 metros de largura, denominada unilateralmente de “zona de exclusão” e incorpora territórios palestinos. Vai sem dizer que, se os governos de Israel dizem a verdade, isto é, que o Muro é uma medida para contenção da infiltração de terroristas e homens-bomba, e não uma medida para anexar à força mais territórios palestinos, não tem justificativa moral para seguir nas construções ilegais, comportando-se como um estado pária em relação à comunidade internacional.
Segundo Jamal, de 2002 para cá, após a construção do muro de anexação, o que houve foi a intensificação dos assentamentos e das construções. Além do incentivo à imigração, do subsídio às construções de condomínios novos em territórios palestinos, um novo elemento foi introduzido, como que para dar suporte ideológico ao expansionismo: líderes, a maior parte rabinos, cujo papel é incentivar a crença teocrática no destino daqueles territórios. “Um dos rabinos, mostrando-se bastante compreensivo, chegou a dizer que os palestinos tinham feito um grande favor ao povo judeu, de cultivar aquelas terras e de prepara-las, para que, quando nós chegássemos, pudéssemos desfrutá-la. Isso foi obra de deus, disse ele”, ironizou o ativista palestino. Perguntei se a percepção de que Israel estaria fomentando uma espécie de “cinturão” de assentados fundamentalista procedia. “Não”, respondeu. Segundo Jamal, apenas 20% dos assentados são ortodoxos ou fundamentalistas. “O resto são imigrantes do Leste Europeu e da Rússia, que chegaram mais recentemente, empobrecidos e que se tornam cativos do discurso fundamentalista no mais das vezes para manter as suas casas, mas não significa que sejam religiosos. São trabalhadores, que foram incentivados a vir para Israel, a viver em nosso território como se fosse deles”.
O impacto da primavera árabe sobre a terceira intifadaE se a terceira intifada está por vir, se é inevitável que ecloda, qual seria a sua característica, em comparação com as outras duas? Fiz essa pergunta porque, entre a explosão da segunda intifada e a véspera da votação do reconhecimento da palestina como estado observador, na ONU, passaram-se mais de dez anos de Fóruns Sociais mundo afora e isso fortaleceu e disseminou a questão palestina , mobilizando organizações em todos os continentes, o que deu uma outra dimensão ao drama palestino e arregimentou muito mais apoio e solidariedade internacional. Eu perguntei mais ou menos isto: na segunda intifada, os palestinos não tinham vocês. Será que agora, dez anos depois, com a dimensão internacional que a questão palestina ganhou, não mudou nada? “Sim”, respondeu.
“Mudou muita coisa. Mas nós somos um povo que vive sob ocupação há cem anos”, respondeu, altivo. Nós aprendemos muito com a ocupação britânica, com as políticas colonialistas de dividir para conquistar, dos ingleses e, de sessenta anos para cá, com a brutalidade sionista, acrescentou Jamal. Foi como se tivesse me dito que não dá para olhar o drama dos palestinos com base nos últimos dez anos, que não é o movimento por ele também criado, não é a resistência pacífica e não violenta que explicariam, isoladamente, um processo de opressão, renegação e exclusão territorial de um século.
Ronnie Kasrils interrompe Jamal e pede que ele volte a falar do que seria a terceira intifada, de quais seriam, na sua opinião, as suas características. “Acredito que a terceira intifada, sobretudo após esse último ataque de Israel a Gaza, será mais parecida com a primeira, terá um caráter mais popular”. Marco Weissheimer então perguntou se a Primavera Árabe, que resultou na mudança de poder no Egito e na Tunísia, explicaria essa característica, de um levante mais popular, socialmente enraizado. Jamal responde que sim, a mudança no Egito e na Tunísia, que enviaram ministros a Gaza, logo que começou o ataque israelense a Gaza e ofereceram ajuda aos palestinos que vivem encarcerados a céu aberto, como lembrou, estabeleceu uma mudança importante no estado das coisas.
Os palestinos saíram do isolamento a que o próprio mundo árabe parece tê-los condenado, e isso implica mudanças nas ações políticas e de resistência não violenta, mas Jamal também mudou. Em contraste com o otimismo de Kasrils, o ativista palestino não demonstra otimismo com o dia de amanhã, para os palestinos.
Em janeiro de 2010, num vídeo, Jamal cumprimentou os participantes de uma das edições do FSM,
Ontem, aqui
“Não tenho expectativas. Não vai mudar nada. Não significa coisa alguma em relação à ocupação e ao muro. E o problema é a ocupação, esse é o maior dos problemas. A aprovação na ONU não vai mudar isso. A ONU fracassou, a comunidade internacional fracassou conosco”. Perguntei-lhe o que pensava sobre as declarações dos membros da diplomacia do Fatah, de que esse reconhecimento seria um primeiro passo para que Israel recue para as fronteiras da linha verde (1967), e ele foi enfático: disse que não acreditava nisso, que uma solução diplomática a partir da comunidade internacional iria demover Israel de sua política expansionista.
Não fiz a pergunta que gostaria de ter feito: a sua posição sobre a solução de dois estados mudou? Agora você defende dois estados, e não mais um só estado? Jamal tem razão em não responder a essas perguntas. “Eu estou aqui para discutir as condições de qualquer debate sobre estado, diplomacia, ONU, Lei Internacional, que Israel não cumpre, mesmo. Estou aqui para falar do que há de mais fundamental, que é o reconhecimento dos direitos do povo palestino”, disse Jamal, em tom grave.
Fracassos da diplomacia, intifadas e expansionismo israelenseSe o movimento diplomático não trará frutos quanto à ocupação e se a população está sem esperanças, sobretudo depois deste último ataque israelense a Gaza, não estaríamos diante de uma terceira intifada? Qual o risco de uma terceira intifada e qual seria a diferença desta intifada em relação às outras? A resposta veio na hora:
“Já estamos caminhando para a terceira intifada, é inevitável isso. A população não aguenta mais. Pagamos duas vezes o preço da água, que nos é racionada, de uma água que é nossa, de nosso território, que foi usurpado, enquanto os assentados vivem em abundância, alguns com piscina em casa, jogando água fora, pagando menos”. Ronnie Raskils, que estava sentado ao lado de Jamal, olha para mim e diz: “Isto é muito pior do que o apartheid. E repete: é inacreditável, mas é verdade. Eu vi com meus olhos, quando estive lá, como ministro”. Por que a proposta palestina na ONU é inútil? Jamal responde que o muro separou vilas, cidades, famílias, que desagregou comunidades inteiras, que recortou populações e que não é uma votação na ONU que vai desfazer o dano causado.
Comentei que a segunda intifada ocorreu há pouco mais de dez anos, quando também começou a instalação do muro de concreto em territórios ocupados. Observei a diferença fundamental entre a primeira e a segunda intifada e perguntei qual seria a característica dessa terceira intifada, que ele aponta como provável e de certa forma já em curso. “A primeira intifada foi um levante popular, e as crianças e adolescentes começaram a jogar pedras após a operação ‘quebra ossos’, comandada, preste atenção nisso, por Yitzhak Rabin. Os militares israelenses chegavam perto dos adolescentes e batiam em seus braços, quebrando os seus ossos, com o objetivo único de amedrontar, calar as bocas e aterrorizá-los. Estávamos em 1987 e a resposta não tardou, eclodiu a primeira intifada, que foi um levante sobretudo contra as lideranças locais, palestinas, que nada faziam diante dessa humilhação. A resposta israelense foi brutal: ataques aéreos sobre ruas cheias de gente, indiscriminadamente. Foi uma repressão tão violenta que sufocou o caráter popular das manifestações”.
Daí vieram os Acordos de Oslo, eu disse. Que Israel não cumpriu, porque não desocupou nada e, numa operação deliberada de provocação, Ariel Sharon deu início a segunda intifada, retrucou Jamal, mais ou menos com essas palavras. A segunda intifada foi caracterizada, do lado palestino, pela figura do homem bomba palestino, pelo fortalecimento do Hamas, sobretudo na Faixa de Gaza e pelo consequente enfraquecimento político do Fatah. Do lado israelense, a resposta à segunda intifada foi especialmente brutal: ataques aéreos em resposta às explosões dos homens bomba, sistematização da demolição de casas e da intensificação das construções nos assentamentos e a precarização e discriminação da cidadania dos árabes israelenses, sobretudo os moradores de Jerusalém. Mas o seu aspecto mais duradouro e medonho foi e segue sendo o erguimento do muro do apartheid, como os movimentos sociais palestinos e de solidariedade à resistência palestina passaram a chamar, e que Israel chama de Muro de contenção de terroristas.
São mais de
Segundo Jamal, de 2002 para cá, após a construção do muro de anexação, o que houve foi a intensificação dos assentamentos e das construções. Além do incentivo à imigração, do subsídio às construções de condomínios novos em territórios palestinos, um novo elemento foi introduzido, como que para dar suporte ideológico ao expansionismo: líderes, a maior parte rabinos, cujo papel é incentivar a crença teocrática no destino daqueles territórios. “Um dos rabinos, mostrando-se bastante compreensivo, chegou a dizer que os palestinos tinham feito um grande favor ao povo judeu, de cultivar aquelas terras e de prepara-las, para que, quando nós chegássemos, pudéssemos desfrutá-la. Isso foi obra de deus, disse ele”, ironizou o ativista palestino. Perguntei se a percepção de que Israel estaria fomentando uma espécie de “cinturão” de assentados fundamentalista procedia. “Não”, respondeu. Segundo Jamal, apenas 20% dos assentados são ortodoxos ou fundamentalistas. “O resto são imigrantes do Leste Europeu e da Rússia, que chegaram mais recentemente, empobrecidos e que se tornam cativos do discurso fundamentalista no mais das vezes para manter as suas casas, mas não significa que sejam religiosos. São trabalhadores, que foram incentivados a vir para Israel, a viver em nosso território como se fosse deles”.
O impacto da primavera árabe sobre a terceira intifadaE se a terceira intifada está por vir, se é inevitável que ecloda, qual seria a sua característica, em comparação com as outras duas? Fiz essa pergunta porque, entre a explosão da segunda intifada e a véspera da votação do reconhecimento da palestina como estado observador, na ONU, passaram-se mais de dez anos de Fóruns Sociais mundo afora e isso fortaleceu e disseminou a questão palestina , mobilizando organizações em todos os continentes, o que deu uma outra dimensão ao drama palestino e arregimentou muito mais apoio e solidariedade internacional. Eu perguntei mais ou menos isto: na segunda intifada, os palestinos não tinham vocês. Será que agora, dez anos depois, com a dimensão internacional que a questão palestina ganhou, não mudou nada? “Sim”, respondeu.
“Mudou muita coisa. Mas nós somos um povo que vive sob ocupação há cem anos”, respondeu, altivo. Nós aprendemos muito com a ocupação britânica, com as políticas colonialistas de dividir para conquistar, dos ingleses e, de sessenta anos para cá, com a brutalidade sionista, acrescentou Jamal. Foi como se tivesse me dito que não dá para olhar o drama dos palestinos com base nos últimos dez anos, que não é o movimento por ele também criado, não é a resistência pacífica e não violenta que explicariam, isoladamente, um processo de opressão, renegação e exclusão territorial de um século.
Ronnie Kasrils interrompe Jamal e pede que ele volte a falar do que seria a terceira intifada, de quais seriam, na sua opinião, as suas características. “Acredito que a terceira intifada, sobretudo após esse último ataque de Israel a Gaza, será mais parecida com a primeira, terá um caráter mais popular”. Marco Weissheimer então perguntou se a Primavera Árabe, que resultou na mudança de poder no Egito e na Tunísia, explicaria essa característica, de um levante mais popular, socialmente enraizado. Jamal responde que sim, a mudança no Egito e na Tunísia, que enviaram ministros a Gaza, logo que começou o ataque israelense a Gaza e ofereceram ajuda aos palestinos que vivem encarcerados a céu aberto, como lembrou, estabeleceu uma mudança importante no estado das coisas.
Os palestinos saíram do isolamento a que o próprio mundo árabe parece tê-los condenado, e isso implica mudanças nas ações políticas e de resistência não violenta, mas Jamal também mudou. Em contraste com o otimismo de Kasrils, o ativista palestino não demonstra otimismo com o dia de amanhã, para os palestinos.
Fotos: Carlos Carvalho
quarta-feira, 28 de novembro de 2012
Como sempre o Povo é enganado com o beneplácito da mídia – por Provos Brasil
Como sempre o Povo é enganado com o beneplácito da mídia
REUTERS/Nacho Doce
Dizem na matéria que será uma “nova linha”, eu não sei mais quem eles querem enganar, os moradores da região Leste de São Paulo estão casados de saber que o transporte coletivo que os atente é um Lixo para dizer o mínimo.
Alguns já se esqueceram da corrida presidencial de 2010, na propaganda eleitoral (acho tão estranho essas matérias/imagens não serem vinculadas em nenhuma das campanhas dos adversários), o candidato José Serra dizia, isso em 2010, que o cidadão iria pegar o Metrô na estação Corinthians-Itaquera e que em 23 minutos estariam na nova estação (que até hoje não existe) da Vila Sônia as portas do Estádio do Morumbi.
Não vou ficar aqui nessa de “pão e circo”, mas torço com toda a força para que um dia o Povão abra os olhos e deixe de ser enganado por essa mídia e por esses políticos canalhas que infectam o nosso Brasil, essa será a “Copa dos Tolos”, reclamam de incentivos fiscais a região em torno de 400 milhões de reais, e tem praças em São Paulo sendo restauradas que custam a metade, vai saber...
O transporte coletivo Paulista é o mais caro e um dos piores, quem utiliza os ônibus, trens e metrôs sabem bem o que é isso, e quando avistarem esses Canalhas por perto, mostre sua Indignação.
Como sempre os que dizem sobre transportes coletivos não fazem uso do mesmo, tudo fica na propaganda, tudo é limpo, claro, organizado e funciona, mas só na TV!
Provos Brasil
Eduardo Galeano: “Quem deu a Israel o direito de negar todos os direitos?”
Eduardo Galeano: “Quem deu a Israel o direito de negar todos os direitos?”
O exército israelense, o mais moderno e sofisticado do mundo, sabe a quem mata. Não mata por engano. Mata por horror. As vítimas civis são chamadas de “danos colaterais”, segundo o dicionário de outras guerras imperiais. Em Gaza, de cada dez “danos colaterais”, três são crianças.
Para justificar-se, o terrorismo de Estado fabrica terroristas: semeia ódio e colhe pretextos. Tudo indica que esta carnificina de Gaza, que segundo seus autores quer acabar com os terroristas, acabará por multiplicá-los.
Desde 1948, os palestinos vivem condenados à humilhação perpétua. Não podem nem respirar sem permissão. Perderam sua pátria, suas terras, sua água, sua liberdade, seu tudo. Nem sequer têm direito a eleger seus governantes. Quando votam em quem não devem votar são castigados. Gaza está sendo castigada. Converteu-se em uma armadilha sem saída, desde que o Hamas ganhou limpamente as eleições em 2006.
Algo parecido havia ocorrido em 1932, quando o Partido Comunista triunfou nas eleições de El Salvador. Banhados em sangue, os salvadorenhos expiaram sua má conduta e, desde então, viveram submetidos a ditaduras militares. A democracia é um luxo que nem todos merecem.
São filhos da impotência os foguetes caseiros que os militantes do Hamas, encurralados em Gaza, disparam com desajeitada pontaria sobre as terras que foram palestinas e que a ocupação israelense usurpou. E o desespero, à margem da loucura suicida, é a mãe das bravatas que negam o direito à existência de Israel, gritos sem nenhuma eficácia, enquanto a muito eficaz guerra de extermínio está negando, há muitos anos, o direito à existência da Palestina.
Já resta pouca Palestina. Passo a passo, Israel está apagando-a do mapa. Os colonos invadem, e atrás deles os soldados vão corrigindo a fronteira. As balas sacralizam a pilhagem, em legítima defesa.
Não há guerra agressiva que não diga ser guerra defensiva. Hitler invadiu a Polônia para evitar que a Polônia invadisse a Alemanha. Bush invadiu o Iraque para evitar que o Iraque invadisse o mundo. Em cada uma de suas guerras defensivas, Israel devorou outro pedaço da Palestina, e os almoços seguem. O apetite devorador se justifica pelos títulos de propriedade que a Bíblia outorgou, pelos dois mil anos de perseguição que o povo judeu sofreu, e pelo pânico que geram os palestinos à espreita.
Israel é o país que jamais cumpre as recomendações nem as resoluções das Nações Unidas, que nunca acata as sentenças dos tribunais internacionais, que burla as leis internacionais, e é também o único país que legalizou a tortura de prisioneiros.
Quem lhe deu o direito de negar todos os direitos? De onde vem a impunidade com que Israel está executando a matança de Gaza? O governo espanhol não conseguiu bombardear impunemente ao País Basco para acabar com o ETA, nem o governo britânico pôde arrasar a Irlanda para liquidar o IRA. Por acaso a tragédia do Holocausto implica uma apólice de eterna impunidade? Ou essa luz verde provém da potência manda chuva que tem em Israel o mais incondicional de seus vassalos?
O exército israelense, o mais moderno e sofisticado mundo, sabe a quem mata. Não mata por engano. Mata por horror. As vítimas civis são chamadas de “danos colaterais”, segundo o dicionário de outras guerras imperiais. Em Gaza, de cada dez “danos colaterais”, três são crianças. E somam aos milhares os mutilados, vítimas da tecnologia do esquartejamento humano, que a indústria militar está ensaiando com êxito nesta operação de limpeza étnica.
E como sempre, sempre o mesmo: em Gaza, cem a um. Para cada cem palestinos mortos, um israelense. Gente perigosa, adverte outro bombardeio, a cargo dos meios massivos de manipulação, que nos convidam a crer que uma vida israelense vale tanto quanto cem vidas palestinas. E esses meios também nos convidam a acreditar que são humanitárias as duzentas bombas atômicas de Israel, e que uma potência nuclear chamada Irã foi a que aniquilou Hiroshima e Nagasaki.
A chamada “comunidade internacional”, existe? É algo mais que um clube de mercadores, banqueiros e guerreiros? É algo mais que o nome artístico que os Estados Unidos adotam quando fazem teatro?
Diante da tragédia de Gaza, a hipocrisia mundial se ilumina uma vez mais. Como sempre, a indiferença, os discursos vazios, as declarações ocas, as declamações altissonantes, as posturas ambíguas, rendem tributo à sagrada impunidade.
Diante da tragédia de Gaza, os países árabes lavam as mãos. Como sempre. E, como sempre, os países europeus esfregam as mãos. A velha Europa, tão capaz de beleza e de perversidade, derrama alguma que outra lágrima, enquanto secretamente celebra esta jogada de mestre. Porque a caçada de judeus foi sempre um costume europeu, mas há meio século essa dívida histórica está sendo cobrada dos palestinos, que também são semitas e que nunca foram, nem são, antissemitas. Eles estão pagando, com sangue constante e sonoro, uma conta alheia.
terça-feira, 27 de novembro de 2012
FSM Palestina Livre anuncia atividades!
FSM Palestina Livre anuncia atividades
Organização divulga mensagem de boas-vindas, programa de conferências e eventos auto-gestionados.
Bem-vindas/os ao Fórum Social Mundial Palestina Livre!
Chegou a hora e, depois de dois anos de debates e trabalho coletivo, milhares de ativistas e organizações de 36 países estão se reunindo em Porto Alegre para fazer deste Fórum Social Mundial Palestina Livre um evento histórico.
Quando decidimos a data para esta convergência em solidariedade ao povo palestino – exatamente 65 anos depois que a ONU aprovou o Plano de Divisão da Palestina – sabíamos que seria realizado em um momento-chave da história. Os recentes ataques a Gaza, que em apenas uma semana deixaram mais de 150 palestinos mortos e quase 1000 feridos, tornaram este evento urgente. Queremos que o mundo escute nosso grito de solidariedade a Gaza e que saiba que apoiamos a luta da Palestina!
Quando as organizações palestinas e brasileiras concordaram no local, Porto Alegre, capital do Rio Grande do Sul, ficamos orgulhosos de trazer o FSM Palestina Livre para esta cidade tão intimamente ligada à história do processo do Fórum Social Mundial. Nos últimos dois anos, o processo de preparação, organização e mobilização para o FSM Palestina Livre aumentou a consciência e solidificou compromissos com o movimento global de solidariedade à Palestina em Porto Alegre , na região e no Brasil em geral, e já criou um impacto duradouro.
O fórum está baseado em um forte processo que construiu um consenso entre os comitês palestino, brasileiro e internacional, fundamentado no Documento de Referência desenvolvido na Palestina no início de 2012. O Documento de Referência faz uma análise básica da situação na Palestina, identifica claramente as principais demandas e indica estratégias de solidariedade para uma paz justa, baseada em direitos humanos e no direito internacional.
O programa de eventos autogestionados e as sessões principais vão expandir e desenvolver ainda mais este consenso através de propostas de discussões e planos de ação, campanhas e iniciativas. As principais conferências estão programadas de forma a apresentar em seqüência os objetivos básicos da luta palestina, os marcos legais das nossas demandas, campanhas de solidariedade ao redor do mundo, formas de construir a solidariedade à Palestina dentro dos movimentos sociais e, finalmente, situar a luta palestina entre as lutas dos movimentos globais e locais por liberação.
Esperamos que o FSM Palestina Livre possa efetivamente contribuir para construir um apoio concreto à causa palestina e reforçar nossa luta comum por um mundo sem os muros da opressão.
Fonte: http://www.ciranda.net/
Estado Assassino: Danos causados pela ofensiva israelense em Gaza passam de US$ 300 milhões!!!
Estado Assassino: Danos causados pela ofensiva israelense em Gaza passam de US$ 300 milhões
A agricultura foi o setor que mais sofreu perdas, cerca de US$ 120 milhões, enquanto o comércio, outros US$ 40 milhões.
Criança observa os destroços de uma casa bombardeada pela força aérea israelense na operação "Pilar Defensivo"
Os danos causados pela operação israelense "Pilar Defensivo" em Gaza já passam de US$ 300 milhões, mais de um terço no setor agrícola, informou neste sábado (24/11) um relatório da câmara de Comércio da Faixa de Gaza. O relatório, que pede que Gaza seja declarada como zona de desastre econômico, inclui nessas estatísticas a destruição ocasionada pelos oito dias de bombardeios israelenses e as despesas extraordinárias de saúde. Na operação, quase 170 foram mortos e mais de 1.300 ficaram feridos.
Os danos causados pela operação israelense "Pilar Defensivo" em Gaza já passam de US$ 300 milhões, mais de um terço no setor agrícola, informou neste sábado (24/11) um relatório da câmara de Comércio da Faixa de Gaza. O relatório, que pede que Gaza seja declarada como zona de desastre econômico, inclui nessas estatísticas a destruição ocasionada pelos oito dias de bombardeios israelenses e as despesas extraordinárias de saúde. Na operação, quase 170 foram mortos e mais de 1.300 ficaram feridos.
Por setores, o agrícola foi o que mais sofreu perdas, cerca de US$ 120 milhões, enquanto a atividade comercial perdeu outros US$ 40 milhões. O resto das perdas se concentram nos danos às casas, edifícios públicos e infraestruturas de todo tipo que foram atacadas pela Força Aérea israelense.
Para devolver a Gaza seu ritmo habitual de atividade econômica, a Câmara de Comércio pediu que Israel levante as restrições que impôs à Faixa em 2006 e que foram aliviadas em 2010.
Hoje, o escritório do primeiro-ministro Ismail Haniyeh informou que, no marco das negociações para resolver todos os tipos de problemas que são foco de tensão na zona, Israel aceitou a ampliação da zona de pesca em Gaza de três a seis milhas e autorizou que os agricultores trabalharem em suas terras nas zonas próximas à fronteira.
Para devolver a Gaza seu ritmo habitual de atividade econômica, a Câmara de Comércio pediu que Israel levante as restrições que impôs à Faixa em 2006 e que foram aliviadas em 2010.
Hoje, o escritório do primeiro-ministro Ismail Haniyeh informou que, no marco das negociações para resolver todos os tipos de problemas que são foco de tensão na zona, Israel aceitou a ampliação da zona de pesca em Gaza de três a seis milhas e autorizou que os agricultores trabalharem em suas terras nas zonas próximas à fronteira.
Agência Efe!
Fonte: http://operamundi.uol.com.br
O antissemitismo como chantagem política: a propósito da nova agressão de Israel à Faixa de Gaza - por Atilio A. Boron
O antissemitismo como chantagem política: a propósito da nova agressão de Israel à Faixa de Gaza
Quem condena a nova agressão perpetrada por Israel na Faixa de Gaza se expõe a receber uma reiterada desqualificação: “antissemita”. Para esses inveterados racistas, qualquer crítica às políticas genocidas do Estado de Israel, qualquer denúncia de suas atrocidades e de sua barbárie só pode nascer de um intenso ódio ao povo judeu. Tamanha confusão entre povo e regime político não é casual nem gratuita.
Constitui, em realidade, a absurda chantagem metodicamente utilizada pela direita reacionária israelense e seus aliados no império para desacreditar qualquer denúncia de crimes do Estado de Israel e seu curso suicida de ações que, no longo prazo, terá como vítima o próprio povo judeu.
Essa postura não é exclusividade nenhuma dos fascistas israelenses: lembra o que adotavam seus congêneres argentinos quando qualificavam de “campanha anti-argentina” as críticas de dentro e fora do país que se dirigiam contra a ditadura terrorista cívico-militar que semeou destruição e morte na segunda metade dos anos 70.
Eles também equiparavam maliciosamente povo e governo – como hoje fazem os racistas judeus – para desvirtuar qualquer ataque contra o Estado terrorista, como se fosse uma agressão contra o povo argentino. Em ambos os casos, o que se pretende é defender um regime político nefasto que, no caso de Israel, foi denunciado por eminentes personalidades da comunidade judia, dentro e fora do país.
São conhecidas – apesar de oficialmente silenciadas – as dúvidas que Albert Einstein e o grande filósofo judeu Martin Buber abrigavam em relação à forma concreta que estava tomando a criação do Estado de Israel, já em seus primeiros anos de vida. Pouco antes do desencadeamento da operação “Pilar Defensivo”, Noam Chomsky informava sobre o que pôde ver em sua recente visita à Faixa de Gaza, e suas críticas foram demolidoras. Pode-se ver o vídeo correspondente em www.democracynow.org/2012/11/14/noam_chomsky_on_gaza_and_the
A lista de eminentes judeus inconformados com as políticas do Estado de Israel seria interminável: Daniel Barenboim e sua nobre cruzada pacifista com o palestino Edward Said nos vêm imediatamente à mente, o mesmo que o vibrante testemunho de Norman Filkelstein, um cientista político estadunidense, filho de sobreviventes dos campos de concentração do nazismo. Em uma conferência oferecida em 2010 na Universidade de Waterloo (Canadá), disse que “não há nada mais desprezível que usar o sofrimento e o martírio daqueles (que morreram em campos de concentração) para justificar a tortura, a brutalidade, a destruição de lares que Israel promove diariamente com os palestinos. Portanto, me nego a ser pressionado ou intimidado por suas lágrimas de crocodilo” (em referência a uma das assistentes de sua conferência). Essa passagem de sua apresentação na Universidade de Waterloo pode ser vista em https://www.youtube.com/watch?feature=player_embedded&v=gE8GESi35Yw
Ao anterior, poderiam ser agregadas as múltiplas organizações judias que rejeitam essa espúria identificação entre povo e regime. Uma delas, denominada Jews for Justice for Palestinians. Two peoples - one future, tem com lema uma citação do Rabino Hillel, do século I antes de Cristo, que, para horror dos ultraortodoxos de hoje em dia, reza assim: “O que queres para ti não faça com teu vizinho. Isso é toda a Torá. O resto são comentários”. Hillel se antecipou nada menos que em 1800 anos ao célebre imperativo categórico que popularizou Immanuel Kant: “Aja de forma tal que tua máxima ação possa se tornar lei universal”. Obviamente, não serão os ensinamentos daquele sábio judeu ou as do filósofo prussiano que Netanyahu vai assimilar, assim como seu chanceler fascista Avigdor Lieberman e os falcões israelenses; escutarão melhor os torpes balbucios de alguns decrépitos sucessores de Hillel, movidos por um ódio imensurável ao povo palestino, de cujas terras se apoderaram, e dos quais in pectore se coloca em dúvida sua própria condição humana.
Isso permite compreender as razões pelas quais o governo de Israel pôde mobilizar sem escrúpulo algum sua infernal máquina bélica contra um povo indefeso, sem exército, sem aviação, sem marinha de guerra, sem status internacional reconhecido, bloqueado por terra, ar e mar, impossibilitado de receber ajuda externa (medicamentos, alimentos, roupa etc.) e trancafiado como “animais em jaula”, como recorda Chomsky na entrevista supracitada. Mas há algo mais: segundo informa Walter Goobar, o jornalista israelense Aluf Benn publicou no diário Haaretz uma matéria na qual assegura que Ahmed Jabari – o chefe militar do Hamas, cujo assassinato desencadeou a violência – era o “responsável pela manutenção da segurança de Israel na Faixa de Gaza”. Em um giro demasiadamente sinistro dos acontecimentos, Jabari não foi eliminado por ser um chefe terrorista, como disse a propaganda sionista, mas porque estava negociando um acordo de paz.
Como assegura Goobar, “essa não é uma afirmação retórica nem obra de uma manobra de vitimização do Hamas, pois quem o afirma é nada menos que Gershon Baskin, um mediador israelense que levava e trazia propostas entre Jabari e os altos cargos israelenses” (1). Tem um sentido: nem o complexo militar-industrial estadunidense e nem o fundamentalismo racista israelense estão interessados, minimamente, em chegar à paz nessa parte do mundo. A guerra é um grande negócio e também um recurso para tratar de estabilizar a cambaleante situação geopolítica que impera no Oriente Médio.
Além do mais, neste caso, a operação quase não tem custos para Israel, porque não são dois exércitos que se enfrentam – e que poderiam infligir-se danos relativamente semelhantes –, mas uma formidável força militar que conta com todo o apoio da maior potência militar da história da humanidade e uma população civil encurralada e inerme, que só consegue repelir o ataque com o voluntarismo de seus milicianos, mal podendo equiparar a fenomenal desproporção existente entre os armamentos de ambas as partes. A recontagem de vítimas de um e outro lado exime maiores comentários.
Com tais antecedentes à vista, é apropriado caracterizar o Estado de Israel como um “Estado canalha”, que viola flagrantemente, com o incondicional apoio do amo imperial, a legislação internacional, as resoluções da ONU e o direito das pessoas. Tal como destaca Finkelstein, nenhuma chantagem de “antissemitismo” pode dissolver o caráter genocida de tais políticas; nenhum esquema extorsivo, cuja eficácia obedece aos imperdoáveis horrores da shoah perpetrados pelo regime nazista (e tolerados pelas potências imperialistas da época), pode operar o milagre de transformar o vício em virtude ou o crime em bondade.
Diante disso, nenhum homem ou mulher deve permanecer calado. O silêncio cúmplice dos anos 30 e 40 possibilitou o extermínio dos judeus na Alemanha nazista. A comunidade internacional não pode incorrer novamente em semelhante erro, sobretudo quando sabemos que os governos das principais potências, sob a direção dos EUA, não farão absolutamente nada para deter essa carnificina. Porque, desde 1948 até hoje, são cúmplices e participantes necessários de quantos crimes tenha cometido o Estado de Israel. Se existe isso que alguns chamam de “sociedade civil mundial”, deve se manifestar, agora, antes que seja tarde demais.
Fechamos essa breve reflexão citando as atualíssimas palavras de Leon Rozitchner, um grande filósofo marxista, judeu, argentino, falecido pouco mais de um ano atrás. Um mestre no sentido mais integral do termo, que no “Epílogo” de um notável livro de sua autoria, Ser Judeu, se perguntava o seguinte:
“Que estranha inversão se produziu nas entranhas desse povo humilhado, perseguido, assassinado, para humilhar, perseguir e assassinar aqueles que reivindicam o mesmo que os judeus reivindicavam antes para si mesmos? Que estranha vitória póstuma do nazismo, que estranha destruição inseminou a barbárie nazista no espírito judeu? Que estranha capacidade volta a despertar nesta tomada de territórios alheios, onde a segurança que se reclama é sobre o fundo da destruição e dominação do outro pela força e o terror! Vê-se, então, que, quando o Estado de Israel enviava suas armas aos regimes da América Latina e África, já ali era visível a nova e estúpida coerência dos que se identificam com seus próprios perseguidores. Os judeus latino-americanos não esquecemos. Não esqueçamos tampouco de Chatila e Sabra”.
Nota:
1) Ver Walter Goobar, “Os verdadeiros alvos de Benjamin Netanyahu”, em Miradas Al Sur , ano 5, edição número 235. Domingo, 18 de novembro de 2012 http://sur.infonews.com/notas/los-verdaderos-blancos-de-benjamin-netanyahu
Atilio Borón é doutor em Ciência Política pela Harvard University, professor titular de Filosofia da Política da Universidade de Buenos Aires e ex-secretário-executivo do Conselho Latino-Americano de Ciências Sociais (CLACSO). Website: www.atilioboron.com.ar
Tradução: Gabriel Brito.
Fonte: Correio da Cidadania.
segunda-feira, 26 de novembro de 2012
Caça aos abutres - Por Mike Elkin
Caça aos abutres
Um novo site do Quênia, Mavulture.com, que significa “muitos abutres” em swahili, reúne, condensa e publica irregularidades cometidas por dirigentes políticos quenianos
Criado no dia 13, o site é o mais recente projeto do ativista Boniface Mwangi, conhecido por seus grafites e murais políticos em toda Nairóbi , bem como por suas exposições fotográficas sobre a violência desatada neste país depois das eleições presidenciais de 2007. Depois do anúncio dos polêmicos resultados das eleições de dezembro daquele ano, ocorreram enfrentamentos tribais em todo o país, deixando cerca de 1.200 mortos e o deslocamento de 600 mil pessoas.
Fotógrafo independente, Mwangi, 29 anos, recebeu em 2008 e 2010 o Prêmio Fotográfico Mohamed Amin, concedido pela rede de televisão CNN, por sua cobertura da violência pós-eleitoral. “Já visitaram o Mavulture.com?”, perguntou em sua conta no Twitter a revista queniana de entretenimento Blink. “Creio que devem visitá-la antes de votarem no próximo ano”, ressaltou. Os quenianos voltarão às urnas em março de 2013 para escolher um novo presidente.
O ativista político Boniface Mwangi é conhecido por seus grafites e murais em Nairóbi (Mike Elkin/IPS).
O site apresenta até agora os perfis de 17 políticos, incluindo Uhuru Kenyatta, filho do primeiro presidente do Quênia, atual candidato presidencial e um dos homens investigados pelo Tribunal Penal Internacional por crimes contra a humanidade durante a violência de 2007. Lavagem de dinheiro, apropriação de terras, tráfico de drogas e assassinato são algumas das acusações que constam no Mavulture.com. Além dos artigos, o site inclui vídeos e infográficos sobre cada político, bem como cartazes de “Procurado”, ao estilo do Velho Oeste, que podem ser baixados pelos internautas. O site é financiado por doadores anônimos.
Mwangi disse à IPS, em entrevista em seu escritório em Nairóbi, que o objetivo da página é informar os quenianos sobre o histórico de suas autoridades. “Vamos publicar os registros de cada pessoa do governo, cada caso de corrupção em que se envolvem e cada acusação contra eles”, afirmou. “Desta forma, na hora de votar, as pessoas poderão contar com esta plataforma para ter uma perspectiva informada. Temos corrupção em grande escala neste país, e os mesmos tipos envolvidos nos últimos 49 anos”, detalhou.
“Desta forma será possível comparar. Quando dizem que estamos todos unidos, nós vemos que não é bem assim. Nossas crianças não vão a escolas estrangeiras e não têm casas na Grã-Bretanha”, ressaltou Mwangi. O índice de percepção de corrupção de 2011, elaborado pela organização Transparência Internacional, coloca o Quênia com 2,2 pontos em dez, no posto 154 na lista de 183 países relacionados. Segundo a organização, a corrupção custa ao Quênia mais de US$ 357 milhões por ano.
Mwangi contou que se dedicou ao ativismo político após sentir frustração e raiva pela violência pós-eleitoral. Em 2009, criou a exposição fotográfica itinerante Picha Mtaani, com imagens dos assassinatos, para recordar aos quenianos o ocorrido. Depois organizou um grupo de artistas para pintar controvertidos murais por toda Nairóbi, ilustrando os políticos do país como abutres e criticando a população por sempre votar neles.
Em junho deste ano, liderou uma mobilização que colocou 49 ataúdes negros na porta do parlamento enquanto este estava em sessão. Os caixões representavam cada um dos anos que os políticos gozaram de impunidade desde a independência em 1963, e neles estava escrito: “Enterrem os abutres com seu voto”. Cada um também estava identificado com um escândalo político.
As autoridades pintaram por cima de muitos murais na capital, mas uma das imagens mais marcantes de Mwangi permanece intacta, perto do mercado da cidade. Nela, um homem com cabeça de abutre está sentado em um trono mostrando um malicioso sorriso. Em uma das mãos segura uma xícara de chá e a outra está algemada a uma maleta. O homem-abutre está pensando: “Eles saqueiam, violam, queimam e matam em minha defesa. Eu roubo seus impostos e me aproprio de terras, mas os idiotas ainda votam em mim”.
“Você sabe o que faz um abutre?”, pergunta o taxista Kimani Jong Kimani Nganga enquanto olha o mural. “Come carne. Temos políticos que desde as eleições estão nos comendo. Devemos mudar isso”, respondeu. Mwangi explicou que desejava provocar uma resposta entre os quenianos, pois sua indiferença diante de claros abusos políticos e econômicos apenas fortalece os que se aproveitam do sistema.
“Há pouco tempo, professores e médicos fizeram uma greve em protesto por seus baixos salários. Ao mesmo tempo, os legisladores se reuniram no parlamento e em 30 minutos concederam aumento a eles mesmos”, recordou Mwnagi. “Não houve nenhum alvoroço por isso. Duzentos legisladores podem fazer isto em um país de 40 milhões de habitantes e ninguém ir às ruas protestar. Como se chama isso? É ilógico que as pessoas possam ser escravas de um sistema e nunca denunciá-lo. Veem a injustiça diariamente e apenas ficam olhando”, afirmou de forma veemente.
Uma das principais razões do silêncio é o temor de sofrer represálias, reconheceu Mwangi. Por isso ele planeja um protesto em que todos os manifestantes usem máscaras. “Este país é muito pequeno. A maioria das empresas é propriedade de políticos e abutres. Por isso algumas pessoas temem sofrer represálias ou serem demitidas”, enfatizou. O ativista também comentou a ironia de que “com máscaras as pessoas possam mostrar seu verdadeiro rosto”.
Com a colaboração de Lucas Laursen.
IPS/Envolverde
Gaza ou a revisão da história – por José Manuel Pureza - Diário de Notícias
Gaza ou a revisão da história
Há sessenta e quatro anos que Israel usa dois discursos para legitimar as suas intervenções nos territórios ilegitimamente ocupados da Palestina: um é o discurso da "eliminação definitiva do terror palestino"; o outro é o da "legítima defesa contra os ataques de que Israel é alvo". Ambos projetam uma revisão ardilosa da História. Atacar Gaza dá votos e legitima o imobilismo político de Tel Aviv. E sobretudo desvia a atenção da História real para uma História conveniente.
Há sessenta e quatro anos que Israel usa dois discursos para legitimar as suas intervenções nos territórios ilegitimamente ocupados da Palestina: um é o discurso da "eliminação definitiva do terror palestino"; o outro é o da "legítima defesa contra os ataques de que Israel é alvo". Ambos projetam uma revisão ardilosa da História.
Há sessenta e quatro anos que Israel anuncia a vitória definitiva contra os seus inimigos próximos. Para só citar dois momentos recentes, foi assim quando da guerra contra o Hezbollah em 2006 e foi assim de novo na Operação Chumbo Fundido, de 2008-2009, contra o Hamas. Em ambos os casos, o uso claramente desproporcional da força por Israel foi justificado como necessário para pôr fim definitivo às agressões continuadas pelo grupo pró-iraniano no Sul do Líbano ou do grupo dominante na Faixa de Gaza contra o Estado de Israel. Afinal, ambas as eliminações definitivas do terror foram um fiasco absoluto: os foguetes continuam a ser lançados de Gaza e o Hezbollah tem hoje um arsenal de mísseis e uma influência política no Sul do Líbano bem maiores do que os que possuía em 2006.
Falsa é igualmente a narrativa da resposta em legítima defesa. Cada violação dos sucessivos cessar-fogo é invariavelmente apresentada como simples retaliação de ataques anteriores e exteriores. Invariavelmente, Israel projeta dos palestinos a imagem de um povo que faz da agressão o seu modus vivendi, ao passo que Israel será uma vítima inocente que mais não faz do que defender-se. Para ajudar à composição do argumento, os palestinos atacam sempre com poucos mísseis mas maus e agressivos (neste caso, iranianos) e Israel defende-se sempre com muitos mísseis mas bons e defensivos (neste caso, norte-americanos de última geração).
Esta onda de violência que de novo atingiu os 1,7 milhões de pessoas presas no gueto de Gaza voltou a ser explicada da mesma forma enganosa. Faltou dizer, nessa narrativa para consumo preguiçoso, que Netanyahu e Liberman vão a votos em janeiro e que a aliança de governo entre os dois está longe de ter sondagens animadoras. E faltou dizer também que o assassinato do dirigente do Hamas, Ahmed Jabari, associado nesse momento às negociações de um acordo, foi o momento em que a guerra escalou vertiginosamente.
A aposta de Israel num clima de permanente crispação que lhe permita assegurar o apoio dos Estados Unidos e da União Europeia tem no rigor da História o seu grande inimigo. E a História tem três aspetos que nenhuma estratégia israelense de revisionismo conseguirá apagar: primeiro, a ocupação dos territórios palestinianos, contra o Direito Internacional, é a causa primeira e última do conflito; segundo, o povo da Palestina continua privado de ter um Estado, de ter comércio normal, de ter liberdade de movimentos, de ter dignidade; terceiro, a macabra bolsa de mortos (16 palestinos por cada israelense, tendo sido de 111 por 1 em 2009) é como todas as bolsas: alimenta-se a sim própria.
É por isso que este ataque contra Gaza não foi senão o último antes do próximo. Porque, haja calmaria ou não, atacar Gaza dá votos e legitima o imobilismo político de Tel Aviv. E sobretudo desvia a atenção da História real para uma História conveniente.
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