quinta-feira, 5 de maio de 2011

Maria Aparecida Aquino: “Não há razão para comemorar um assassinato” - Fazendo Média

Maria Aparecida Aquino: “Não há razão para comemorar um assassinato”Por Redação.

A primeira reação de grande parte da população americana diante da notícia da morte de Osama bin Laden, o rosto mais famoso do terrorismo internacional, foi sair às ruas para comemorar a derrota de seu inimigo. No entanto, a operação contra o terrorista saudita foi um assassinato sumário e como tal não deveria ser comemorado, de acordo com a análise da historiadora Maria Aparecida de Aquino.

“Há meses vem sendo preparada, junto com o governo do Paquistão, toda uma operação para chegar à casa de Osama bin Laden. A ordem que se tinha era metralhar, a ordem era atirar. Fica difícil pensar em motivo para comemoração”, pondera Aquino, professora em História Social da Universidade de São Paulo (USP).

A pesquisadora também questiona os precedentes abertos pela ação americana. “Isso não significa defender o que aconteceu em 11 de setembro de 2001, que foi um ato terrível e ofendeu a humanidade. Não significa negar o direito da população americana de buscar os culpados.

Mas defender a forma como isso foi feito será dar aos Estados Unidos a possibilidade de amanhã entrar em qualquer uma de nossas casas e dizer: ‘olha, imaginei que aqui houvesse um terrorista e andei metralhando’. É muito grave o que aconteceu”.

Acompanhe a íntegra da entrevista.

UOL Notícias: Os americanos reagiram à notícia da morte de Bin Laden com festa e era possível ver cenas de comemoração e euforia nas ruas. Existe razão para comemorar? Essa euforia é justificável?
Maria Aparecida Aquino: Não. Se a gente admitir que existe razão para comemorações neste momento, então estaríamos admitindo que existe razão para comemorar um assassinato. Uma coisa que normalmente não se comenta é que os Estados Unidos gostam de jogar na cara de todos os outros países que eles são os guardiões da democracia do mundo, e sempre interferem em outros países para assegurar a democracia.

Entretanto, o que eles fizeram nesse caso é simplesmente um assassinato. Se houve um crime e você está atrás de uma pessoa que é teoricamente uma das responsáveis por esse crime, você tem o direito de pegar essa pessoa e submetê-la a um julgamento. Mas o que aconteceu foi simplesmente um assassinato.

O que podemos observar é que toda a euforia inicial nos Estados Unidos já baixou um pouco, porque eles têm um temor muito grande – e devem mesmo; pensar que a Al Qaeda se restringe a um homem só, Osama bin Laden, é uma tolice. A Al Qaeda é uma imensa organização. E é muito possível que haja retaliações. Então, em circunstância alguma teríamos motivos para comemorar, mesmo pertencendo à população americana, mesmo sendo o presidente dos Estados Unidos.

Se pessoas como nós, pessoas comuns, simplesmente coadunássemos com a ideia de comemoração, estaríamos coadunando contra todos os princípios que os próprios Estados Unidos dizem defender com tanta força.

UOL Notícias: Então é possível imaginar que os Estados Unidos poderiam ter feito uma captura sem recorrer a assassinato?
Aquino: Lógico. Eles tinham noção da localização. Planejaram a ação muito cuidadosamente. Chegaram até a casa e uma vez lá não havia condições de reação. Eles simplesmente metralharam quem estava pela frente.

UOL Notícias: Com relação ao corpo, como a senhora interpreta essa decisão dos Estados Unidos jogá-lo ao mar?
Aquino: A notícia de que eles teriam jogado o corpo ao mar é mais grave ainda, porque você não só submete o inimigo a um assassinato, como você também impede o ritual da morte.

Mesmo que não haja uma retaliação imediata, em breve essa ficha acaba caindo, mesmo entre a população, de que nem mesmo o direito à morte foi dado. Um dos maiores pilares da democracia é o habeas corpus, que em uma tradução muito simples do latim quer dizer: que se tenha direito ao corpo. Então foi negado um elemento característico do estado de Direito.

Os americanos têm direito de estar muito zangados com o que aconteceu no 11 de setembro? Sim. Têm direito de investigar quem seriam os responsáveis? Sim. Mas a forma como se faz isso pode acabar por retirar todos os direitos que nos restam.

UOL Notícias: É possível imaginar que os Estados Unidos enxerguem a morte de Bin Laden como a morte do “mal”?
Aquino: É o que eles defendem. No fundo, eles pretendem impor ao mundo inteiro uma ideia: de que estão cobertos de razão, de que a humanidade pode respirar aliviada e de que agora estamos livres do mal, já que o mal estava condensado em uma pessoa. Mas isso é uma ilusão de ótica. É como os mágicos fazem: você olha para o outro lado, não presta atenção na prestidigitação que ele está fazendo com as mãos. Não podemos cair nesta história.

Isso não significa defender o que aconteceu em 11 de setembro de 2001, que foi um ato terrível e ofendeu a humanidade. Não significa negar o direito da população americana de buscar os culpados. Mas defender a forma como isso foi feito será dar aos Estados Unidos a possibilidade de amanhã entrar em qualquer uma de nossas casas e dizer: ‘olha, imaginei que aqui houvesse um terrorista e andei metralhando’. É muito grave o que aconteceu. Ou seja, não há motivo para comemoração.
Fonte:http://www.fazendomedia.com

3 comentários:

Anônimo disse...

Uma morte de forma violenta é sempre indesejável, seja ela de qual fonte vier. Maria Aparecida de Aquino cita que os USA se acham no direito de invadir uma residência e metralhar pessoas a procura de terroristas. Ora, prefiro esta hipótese à possibilidade real de poder ser morto a qualquer momento por um dos milhares (ou milhões?) de marginais espalhados pelo Brasil. Esta sra. deveria desenvolver um trabalho para ajudar a mudar a atual situação da segurança (diga-se MORTE) no nosso país ao invés de se posicionar de forma diletante sobre o ocorrido com Bin Laden. Cerca de 500.000 sêres humanos assassinados neste país nos últimos 10 anos. Porque se preocupar tanto com o terrorista se temos problemas muito maiores.
Porque esta sra. não se pronunciou sobre os assassinatos no Brasil nos últimos anos? Porque aparece agora, com análises prematuras e tendenciosas sobre o ocorrido no Paquistão?
Quer ajudar? Vamos começar pelo Brasil?

Provos Brasil disse...

Obrigado pela visita anônimo, compreendo a sua indignação, mas a critica a Maria não tem sentido, primeiro por que ela foi indagada sobre o “Caso Osama” e não para falar das mortes no Brasil, as observações que ela faz sobre os Estado Unidos e sobre o próprio Osama a meu ver são válidas e ele esta coberta de razão. Agora concordar cabe a cada um que consegue entender e compreender o assunto!

Anônimo disse...

A sra. Maria Aparecida Aquino é historiadora e utilizou seus conhecimentos para comentar a morte do terrorista. Poderia muito bem incluir em suas futuras pesquisas/análises a situação da violência no Brasil. Estamos muito quietos em relação ao que está acontecendo. A sra. Aquino e outras pessoas com maior conhecimento dos fatos poderiam se posicionar em relação à época sombria que estamos vivendo.