Corte de linhas e os efeitos de uma decisão tomada sem consultar a população
Há pouco mais de um mês eu me mudei do bairro e cidade onde vivi desde que nasci. Assim como outros milhares de moradores, há mais de 20 anos utilizava as mesmas linhas para ir às regiões centrais da cidade. Mas essa semana meus antigos vizinhos deixaram de contar com muitas daquelas linhas de ônibus. Algum técnico da SPTrans fez meia dúzia de contas e chegou à conclusão de que elas não eram necessárias, que era preciso “racionalizar”.
Conhecemos
bem os efeitos da “racionalização” que a SPTrans costuma promover. A
implantação de terminais como o Campo Limpo, Grajaú e, em menor medida,
Sapopemba veio acompanhada de cortes e alterações de linhas que beneficiaram
somente os empresários – já que ganham cada vez que a catraca gira e um
terminal faz com que todos desçam de um ônibus e subam em outro. Em matéria
publicada no G1 a diretora de planejamento da SPTrans afirmou que eles
têm critérios, que a idéia é ficar menos no ponto e “nunca cortar uma linha sem
a que vai fazer a integração não tenha um intervalo menor que dez minutos”. Me
parece que os critérios não estão favorecendo a população. Uma amiga que mora
quase na divisa com Osasco, lado oposto ao que eu vivia em São Paulo, também
teve a linha(Vila Gomes – Jd Miriam) que utilizava diariamente cortada, restou
a opção de uma linha que passou a ficar superlotada ou fazer várias trocas de ônibus.
O mesmo problema é observado nas periferias sul e leste da cidade.
Em outra
matéria, dessa vez publicada no Estadão, a SPTrans afirma que as mudanças visam melhorar o
sistema, mas para as pessoas que saíram às ruas na zona sul da semana passada e
em São Mateus nessa semana, nenhuma melhora no sistema foi sentida. O que
houve foi um aumento no sofrimento de quem usa o transporte diariamente e esse
sofrimento não é causado pela mudança brusca de hábitos cultivados durante
anos, ele é causado pelo transtorno de ter que mudar de ônibus várias vezes,
enfrentar novas filas, ônibus mais lotados (novamente, porque não é vantagem ao
empresário ter custo com dois ônibus, se ele pode gastar com um só deixando-o
completamente lotado para aumentar o lucro) e aumento no tempo de espera.
Algumas
mudanças que foram promovidas pela Prefeitura recentemente, como a implantação
de faixas exclusivas de ônibus, beneficiam os empresários, já que uma maior
velocidade no sistema reduz seus custos, mas também são positivas para a
população, ao reduzir o tempo de viagem. Esse tipo de medida não gerou
protestos, mas o Movimento Passe Livre (MPL) e as pessoas que protestaram
contra o corte de linhas chegaram a ser taxadas de “atrasadas”. Com alguma boa
vontade, podemos dizer que o adjetivo é no mínimo ingênuo, ou essas pessoas
“evoluídas” acham que alguém estaria reclamando se as linhas fossem cortadas e
no lugar fosse implantado metrô, funcionando a tarifa zero e com intervalo
mínimo entre os trens?
Se existe
algum ponto que me deixa contente nessa história toda, é que os moradores e
moradoras do meu antigo bairro estão se organizando e protestando contra essa
medida arbitrária, fizeram passeata pelas principais avenidas da região e
bloquearam o Terminal São Mateus. As pessoas sabem que só a mobilização
provocará mudanças e devem continuar mobilizadas até que a Prefeitura aprenda
que quem utiliza o transporte coletivo diariamente sabe melhor do que qualquer
técnico quais são as alterações necessárias para a melhoria do sistema. Há anos
linhas são cortadas quase que da noite para o dia, sem que as pessoas possam
decidir sobre as alterações que acabam por favorecer apenas os empresários. Já
passou da hora disso mudar. Quem vai sofrer o impacto das propostas precisa ser
chamado para decidir sobre elas, para decidir sobre o que vai afetar
diretamente suas vidas.
Em junho, quando
houve o aumento da tarifa, a Prefeitura demorou a revertê-lo, deu no que deu,
tomara que dessa vez não cometam o mesmo erro, que o corte de linhas seja
revisto e a população afetada seja incluída no processo que decidirá novas
mudanças.
Violentas
são as decisões vindas de cima!
Fonte: http://passapalavra.info/
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