segunda-feira, 6 de janeiro de 2014

A reaparição do Subcomandante Marcos nos 20 anos do levante zapatista – por Eduardo Febbro


A reaparição do Subcomandante Marcos nos 20 anos do levante zapatista.
Às vésperas de se completarem duas décadas do levante zapatista, o subcomandante Marcos reapareceu com um novo e extenso comunicado

San Cristobal de las Casas – A prosa está intacta. Sutil e envolvente como o sol da tarde que envolve a praça central de San Cristobal de las Casas. Às vésperas de se completarem duas décadas do levante zapatista, o subcomandante Marcos reapareceu com um novo e extenso comunicado semeado com a ideia da “memória e da rebeldia”.

Na abertura, Marcos cita a novela do escritor norte-americano Herman Melville, Moby Dick. Encontro de uma prosa com outra: “Me parece que temos confundido muito esta questão da Vida e da Morte. Me parece que o que chamam de minha sombra aqui na terra é minha substância autêntica”, diz a prosa de Melville. A de Marcos completa o resto do comunicado. O subcomandante, que há uns cinco anos não aparecia em público, escreve: “É território zapatista, é Chiapas, é México, é América Latina, é a Terra. E é dezembro de 2013, faz frio como há 20 anos, e, como então, hoje há uma bandeira que nos cobre: a da rebeldia”.

Em outro momento de seu comunicado, Marcos acrescenta: “Porque a rebeldia, amigos e inimigos, não é patrimônio exclusivo dos neozapatistas. Ela é patrimônio da humanidade. E isso é algo que é preciso celebrar. Em todas as partes, todos os dias e em todas as horas. Porque a rebeldia é também uma celebração. Não são poucas nem débeis as pontes que, desde todos os rincões do planeta Terra, se estenderam até estes solos e céus. Às vezes com olhares, às vezes com palavras, sempre com nossa luta, temos nos cruzado para abraçar esse outro que resiste e luta”.

Ao longo do texto em que se alternam parágrafos poéticos, guerreiros ou irônicos, o Subcomandante zapatista presta homenagem a todos aqueles que, de uma maneira ou de outra, acompanharam o levante de 20 anos atrás: “Aos que, durante a noite, colocaram nas costas a mochila e a história, aos que tomaram com as mãos o relâmpago e o trovão, aos que calçaram as botas sem futuro, aos que cobriram o rosto e o nome, aos que, sem esperar nada em troca, morreram na longa noite para que outros, todos, todas, em uma manhã ainda por vir, possam ver o dia como é preciso fazê-lo, ou seja, de frente, de pé, com o olhar e o coração erguidos. Para eles, nem biografias nem museus. Para eles, nossa memória e rebeldia. Para eles nosso grito: Liberdade! Liberdade! Liberdade! Saúde e que nossos passos sejam tão grandes como nossos mortos”.

Marcos se pronunciou igualmente com um tom crítico contra todos os mandatários que ocuparam a presidência do México desde que surgiu o Exército Zapatista de Libertação Nacional (EZLN): Carlos Salinas de Gortari, Ernesto Zedillo, Vicente Fox, Felipe Calderón e Enrique Peña Nieto. “Vicente Fox é a prova de que o posto de presidente de uma república e de uma filial de uma fábrica de refrigerantes é intercambiável...e que ambos os postos podem ser ocupados por inúteis; Felipe Calderón Hinojosa foi um “presidente valente” (para que outros morressem) e não um psicopata que roubou a arma (a presidência) para seus jogos de guerra (...) e que terminou sendo o que sempre foi: um empregado de segunda em uma multinacional. A propósito do atual presidente, Enrique Peña Nieto, cuja candidatura marcou o regresso do PRI ao poder após 14 anos na oposição, o Subcomandante questionou as reformas que vem adotando desde que foi eleito em fevereiro de 2012, particularmente aquelas no setor da energia:

“Enrique Peña Nieto será um presidente culto e inteligente (bom, é ignorante e tonto, mas hábil), é o novo perfil que se constrói nos grupinhos de analistas políticos, e não um analfabeto funcional”.

O tom deste comunicado é muito menos duro do que o que emitiu no final de 2012. Neste momento e já com o PRI no poder, o EZLN saiu a público, primeiro no dia 21 de dezembro com uma mobilização silenciosa da qual participaram cerca de 40 mil pessoas com o rosto coberto com o famoso gorro dos zapatistas. Nesta ocasião, o líder insurgente emitiu um comunicado onde perguntava: Escutaram? O som de seu mundo ruindo é o do nosso ressurgindo. A marcha do dia 21 foi a maior mobilização protagonizada pelos zapatistas desde que pegaram em armas no dia 1º de janeiro de 1994. Agora chega, pontual e esperado, esse aniversário.

Duas décadas de lutas, de mortos, de injustiças e repressão ao cabo das quais as palavras e o combate seguem vivos.

Fonte: http://www.cartamaior.com.br

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