quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

A história por trás da libertação de Mandela - Por Danny Schechter


A história por trás da libertação de Mandela

Faz 20 anos que a banda da libertação de Nelson Mandela começou a tocar. Enquanto o mundo olhava sem fazer nada, um grande drama humano estava sendo construído a todo vapor na África do Sul.

Nelson Mandela esteve em Groot Drakenstein, mais conhecida como a prisão de segurança mínima Victor Verster, por 14 meses. Havia um grito distante vindo da isolada e draconiana penitenciária da ilha Robben, na qual ele havia passado mais de 27 anos em uma cela minúscula, visitada por mim pela primeira vez em 1995. Ele a tinha designado como sua própria pequena casa, com um carcereiro africâner que progressivamente veio a se tornar seu companheiro de campo.

No último mês de seu longo período de prisão, líderes do CNA (Congresso Nacional Africano) se reuniram com ele. Ele usava terno e foi até mesmo levado para fora da prisão em sigilo, parando em lojas e postos de gasolina onde, na maior parte do tempo, não foi reconhecido por conta das leis de cobertura da mídia durante o apartheid que proibiam qualquer foto dele na imprensa. A libertação estava sendo preparada, e o movimento, o CNA, havia criado um “comitê de recepção” para organizar a sua transição de prisioneiro para líder político.

Enquanto a atenção da mídia estava em Mandela como uma personalidade heróica, sabia-se que sua libertação não fora concedida apenas pelo regime do apartheid. Havia sido vencida. Anos antes, o CNA tomou a decisão de montar uma campanha em torno dele, assegurando que ele se tornasse uma personalidade bem conhecida, e logo a celebridade mais famosa do mundo. Sua história de vida tornou-se objeto de lendas. Seu rosto estava em cartazes, seu nome passou a ter status de marca.

Como advogado de formação, ele próprio negociou os termos de sua libertação – e, antes, a soltura de seus companheiros com ministros e oficiais do governo. Houve diversas reuniões secretas na prisão e fora dela. Ele recusou todas as condições impostas, incluindo a exigência de que abandonasse a violência.

Além disso, outras forças foram responsáveis pela criação de condições políticas condenadas no apartheid. Um movimento global anti-apartheid não estava somente protestando, mas exigindo sanções. Quando o Chase Manhattan Bank se recusou a rolar os empréstimos do governo, ficou iminente que algo aconteceria. A pressão estava subindo.

Sun City
Amplamente desconhecido é o papel que a exigência para sanções culturais desempenhou em grande parte da campanha. Tive o privilégio de ter participado do projeto Sun City que mobilizou 54 artistas conhecidos, sob a liderança de Little Steven e produção de Arthur Baker, para popularizar a necessidade de sanções por meio da música Sun City e vídeo. Isso foi em 1985 e contribuiu para o ambiente político que levou o Congresso norte-americano a anular o veto do presidente Reagan sobre um projeto de sanções apresentado por Ron Dellums. Dellums e outros líderes negros foram presos na Embaixada da África do Sul em Washington. Grupos anti-apharteid protestaram nas universidades de todo o país.

Ao mesmo tempo, os assentamentos da África do Sul foram tomados por uma campanha para tornar o país ingovernável. Houve violência e prisões em massa com 14 mil pessoas na cadeia, em sua maioria, ativistas jovens. Isso chamou a atenção da comunidade internacional e resultou na pressão das Nações Unidas, que enviou pessoas influentes para encontrar Mandela e encontrar uma solução para o agravamento da crise.

Também fora do país, a força da guerrilha do CNA intensificou sua ofensiva quando o governo de Pretória retaliou com bombardeios o vizinho Front Line States (FLS). A campanha de desestabilização estava em andamento com o sul da África apoiado por procuração guerras em Angola e Moçambique e esquadrões da morte secretos desencadeados contra ativistas. Importantes figuras anti-apartheid foram mortas, incluindo brancos como David Webster, em Natal, e Ruth First, em Maputo. Steve Biko foi assassinado antes.

Em 1986, visitei o sul da África com o reverendo Jesse Jackson para fazer uma reportagem desta, em grande parte, não declarada guerra, que levou bilhões de afetados nos países pobres ao programa 20/20 da rede americana ABC.

Eu ajudei o grupo de rap Stetsasonic a produzir um vídeo da música A.F.R.I.C.A, educando jovens sobre o Front Line States.

Os africâners se viram lutando uma guerra contra o pró-soviético Total Assault, uma invenção de sua propaganda. Grupos de direita nos EUA estavam aliados com suas tentativas de parar a independência da Namíbia. A direta norte-americana fez lobby junto a Jack Abramoff, agora na prisão por subornar membros do Congresso, que estava por trás de um filme de propaganda chamado Red Dawn para demonizar as lutas de libertação. Como Obama hoje, ele foi rotulado como marxista e coisa pior.

Cubanos
O que os sul-africanos não contavam era com o papel desempenhado pelo exército cubano que derrotou os sul-africanos na batalha no sul da cidade angolana de Cuito Carnivale e obrigou o regime a recuar. Aquela vitória, acompanhada da independência da Namíbia, foi um precursor do que estava por vir na África do Sul. Foi por isso que Fidel Castro participou e foi aclamado na posse de Nelson Mandela como presidente, em 1994.

Esses foram os pilares da luta para libertação de Mandela e a liberdade da África do Sul. Eles raramente foram mencionados ou explicados pela nossa mídia. O CNA foi considerado uma força terrorista em Pretória e pela administração Reagan. Quando o Congresso pediu a libertação de Mandela, Dick Cheney votou contra a resolução da Secretaria de Estado e se recusou a encontrar-se com o líder do CNA Oliver Tambo, antigo parceiro de Mandela, quando ele visitou Washington.

Toda esta pressão vinda de baixo levou a mudanças no alto. A história não é feita apenas por grandes homens, mesmo aqueles que aparecem na cobertura da TV. Nelson Mandela, que foi libertado há 20 anos, falou isso várias vezes, mesmo quando todas as redes de TV queriam era uma entrevista “exclusiva” com o “Grande Homem”. Eles se referiam a isso como o “Grande Encontro”. A tentativa da Globalvision de contestar esta narrativa, disse, na verdade era outro caminho para contar a história, de um jeito mais verdadeiro.

Danny Schechter é colaborador do Global Research.

Fonte: http://www.operamundi.com.br/

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