Arte, mãe de todas as culturas - por Leonardo Brant
Se cultura é a regra, arte é a exceção, dizia o filósofo. Em 2003 houve uma reforma substancial no Ministério da Cultura. As chamadas secretarias finalísticas (Artes Cênicas, Música, Audiovisual, Livro e Leitura) foram substituídas por estruturantes (Políticas Culturias, Articulação, Fomento, Identidade, Cidadania Cultural).Se por um lado o modelo ofereceu um olhar mais abrangente para o desafio da gestão pública de cultura, por outro confinou as artes (menos o Audiovisual, que além de secretaria específica tem a Ancine) a departamentos da Funarte, já sucateada, sem orçamento e capacidade operacional.
A sensação por parte dos artistas é de abandono. Àqueles inseridos no mercado, ampliou-se a insegurança dos novos tempos, novas mídias, pirataria, cultura livre, com uma campanha (aqui veementemente combatida) de esvaziamento do sistema de financiamento, cheio de problemas e defeitos, mas existente e efetivo para um número significativo de produtores e artistas.
Não escondo de ninguém minha (quase eufórica) satisfação com a postura republicana e o discurso da Ministra Ana de Hollanda que, diferente do Ministro anterior (que tem seus méritos, mas já vai tarde), compreende as dificuldades de quem vive da própria arte. E celebra a arte como item de primeira necessidade, indispensável à nossa formação individual e coletiva. Como projeto de desenvolvimento.
Uma arte livre, autônoma, incentivada mas não controlada pelo Estado, indispensável ao projeto de ascenção social (cultural?) dos novos consumidores que surgem quase que em projeção geométrica no Brasil.
Continuar não é repetir, diz Ana de Hollanda evocando Dilma Rouseff. Há uma tentativa inócua de instalar um clima de insegurança em relação ao discurso da nova ministra. O sudeste voltará a reinar? O mercado ganhará força em detrimento das culturas populares? A cultura digital será esquecida?
As conversas de bastidores que tive com Vitor Ortiz, Antonio Grassi, Mamberti, Henilton e tantos outros que celebravam a posse na noite de ontem, reforçam um compromiso que deve ir muito além do discurso, com ações efetivas para uma alteração real do eixo de desenvolvimento, voltado para as classes emergentes, mas sem inoportuno embate geográfico alimentado por Juca Ferreira.
Além de ser a maior vitrine e a alavanca para carreiras internacionais de artistas e criadores de todos os lugares do Brasil (e um dos maiores mercados do mundo, haja visto a enxurrada de espetáculos realizados em 2010 e programados para 2011), SP e RJ tem muito a oferecer para todas as regiões do país, em termos de produção e experiências de mercado.
As culturas populares precisam de mercado, sustentabilidade. É claro que precisam do Estado para reconhecer, valorizar, impulsionar, em alguns casos até para tutelar, de verdade, não com prêmios de R$ 10 mil e abandono permanente. Para isso é preciso um grande plano, que tire a cultura tradicional do lugar eproblema e a valorize de fato, como solução para um país em pleno processo de crescimento econômico.
Economia da cultura, cultura digital, convergência, são palavras-chave no novo ministério. Acredito que as ações serão ampliadas e transformadas em plataforma política de Estado.
Ainda é cedo para dizer qual será a real capacidade de atuação do novo ministério. Sabemos que a estrutura é sucateada, há um sem-número de editais lançados (dentro da campanha #ficajuca) mas sem qualquer estrutura e orçamento; pontos de cultura por todo o Brasil sem receber há mais de um ano…
São milhares de problemas administrativos. O choque de gestão é prioridade. A nova ministra aposta na criatividade de sua equipe para resolver esses problemas: sem reclamar, culpar o outro. A ordem é tocar o barco pra frente.
A nós do Cultura e Mercado foi prometido o diálogo, que já foi respeitoso e aberto na época de Weffort (apesar de muito crítico), franco e colaborativo na época de Gilberto Gil, mas tornou-se truculento e ameaçador na era Juca Ferreira.
Fonte: http://www.culturaemercado.com.br
quarta-feira, 5 de janeiro de 2011
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