Metrô-SP: cartel forneceu trens com alto índice de falhas.
Levantamento demonstra: embora novas, composições
vendidas em concorrência manipulada quebram quatro vezes mais que as de trinta
anos e alimentam caos no transporte público
Surgiu o primeiro sinal de que a série de fraudes que
contaminou as concorrências do metrô paulista são parte do caos vivido todos os
dias por milhões de usuários. Levantamento realizado por funcionários da Linha
3 Vermelha do metrô de São Paulo, com base no registro oficial de falhas do
sistema, mostra que trens recentemente adquiridos ou reformados pelo governo do
estado junto a empresas acusadas de formação de cartel apresentam problemas
técnicos em frequência até quatro vezes maior que as composições antigas, com
cerca de 30 anos de uso. Algumas das novas aquisições do metrô chegam a
registrar média de 35 defeitos por dia. Os dados são preliminares. Foram
levantados por trabalhadores impressionados com as constantes quebras e
acidentes envolvendo estes carros. Diante dos dados, é essencial que a
Companhia do Metropolitano apresente as estatísticas oficiais sobre falhas –
que possui mas, até o momento, não disponibiliza.
Os números são resultado da análise do histórico de oito
dos cerca de 50 trens que operam no trecho leste-oeste da malha metroviária
paulista, e foram obtidos após consulta a um sistema conhecido como S-GUT, que
registra informações sobre todas as composições do metrô, tais como
localização, quilômetros rodados, tempo de operação e número de problemas
técnicos denunciados pelos condutores. O S-GUT pode ser acessado a partir de
computadores conectados à rede da empresa, mas apenas permite visualização dos
dados na tela. As informações não podem ser gravadas. Por isso, a contagem de
falhas teve que ser realizada manualmente.
Funcionários do metrô analisaram os últimos 1.000 dias de
operação de trens novos, reformados e antigos que circulam pela Linha 3
Vermelha. Entre os novos, foram averiguados os registros das composições
conhecidas como H59 e H60, construídos pela espanhola CAF e entregues à
Companhia do Metropolitano entre 2008 e 2010. Entre os reformados, foram
escolhidos os trens K01 e K07, modernizados pelo consórcio MTTrens, composto
pelas empresas MPE, Temoinsa e TTrans, em circulação desde 2011. E também os L26
e L27, recondicionados pela francesa Alstom em conjunto com a Iesa a partir do
mesmo ano. Novos e reformados foram comparados aos antigos conhecidos como 302
e 335, fabricados pela Mafersa nos anos 1980.
Alstom, TTrans e CAF estão diretamente envolvidas nas
denúncias de formação de cartel para burlar a concorrência em editais do
governo do estado de São Paulo para reforma de composições e ampliação da malha
metroferroviária na região metropolitana da capital. De acordo com uma das
empresas que integrou o embuste, a alemã Siemens, membros do alto escalão do
governo paulista nas gestões Mário Covas, Geraldo Alckmin e José Serra, todos
do PSDB, teriam participado e acobertado a maracutaia. Cálculos preliminares do
Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) apontam que o conluio teria
provocado prejuízos de R$ 425 milhões ao Erário estadual.
De acordo com o levantamento dos funcionários do metrô,
as composições das frotas K e L, reformadas pela MTTrens e Alstom,
respectivamente, foram as que mais apresentaram falhas. Os defeitos podem
variar de mau funcionamento do ar condicionado a problemas mais graves de
segurança, como trepidações excessivas, deficiência nos freios e panes nos
sensores de descarrilamento. Aliás, pertence à frota K o trem que saiu dos
trilhos no último dia 5 de agosto nas proximidades da estação Palmeiras-Barra
Funda, destruindo 150 metros do sistema de eletrificação e provocando
“curto-circuitos, estouros e fumaça”. Por sorte, dizem metroviários, ninguém
saiu ferido.
A pesquisa dos funcionários do metrô mostra que, em seus
últimos 1.000 dias de operação, os trens da frota K, reformados pela MTTrens,
registraram 27,6 falhas por dia, somando as falhas repetidas – ou seja, as que
são registradas mais de uma vez ao dia pelos condutores. Sem contar as
repetições, o número cai para uma média de 3,75 defeitos diários. Nos trens da
frota L, recondicionados pela Alstom-Iesa, os metroviários encontraram uma
média de 35,75 problemas por dia, incluindo as repetidas. O registro de falhas
únicas diárias chegou a um número diário de 2,6.
As composições novas da frota H, fabricadas pela CAF,
conseguiram um desempenho melhor, mas ainda assim alta para uma frota
recém-inaugurada: são 8,95 falhas por dia, contando as repetidas, e 0,8 falhas
diárias únicas. Mas o melhor desempenho foi observado nos trens antigos. Apesar
de estarem há cerca de 30 anos em circulação, as composições da Mafersa
registraram 1,75 defeitos repetidos por dia, bem menos que os novos trens da
CAF, e 0,9 falhas únicas, praticamente a mesma média de uma frota que está em
operação há menos de cinco anos.
Na comparação, a análise dos metroviários mostra que, em
seus últimos 1.000 dias de atividade, os trens K01 e K07, reformados pela
MTTrens, apresentaram média de falhas diárias 4,17 vezes maior do que as
composições antigas. E os trens L26 e L27, recondicionados pela Alstom-Iesa,
registraram média diária de defeitos 2,8 vezes mais alta que as máquinas que
operam há mais de trinta anos. A grande quantidade de problemas tem feito com
que a média dos quilômetros rodados das composições novas e reformadas, que
ficou em 234 km/dia no período analisado, seja bem menor que a média geral do
metrô: 550 km/dia.
*Tadeu Breda é repórter da revista Rede Brasil Atual
**Vinicius Gomes é colaborador do Outras
Palavras
Fonte: http://outraspalavras.net/blog/
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