2002, 2006, 2008, 2014: continua o genocídio sionista em Gaza
O objetivo do genocídio é a submissão total de um povo a outro; é uma decisão política para quebrar o espírito de resistência dos opositores
Pela sexta
vez, em menos de oito anos, tive de escrever uma página do jornal para relatar
o massacre dos palestinos em Gaza. Um genocídio politicamente autorizado pelo
governo sionista de Benjamin Netanyahu. Um crime contra a humanidade planejado
pelos generais do Tzahal e executado, cada vez mais cientificamente, por 74
mil soldados e centenas de pilotos.
Enfim, um
massacre que 86% daquele povo que se acha predileto e escolhido por Deus
invoca, aplaudindo todos aqueles que o realizam, para depois linchar, física e
verbalmente, quem denuncia e defende o direito dos palestinos em ter um Estado
livre e independente.
Por outro
lado, quem, minimamente critica ou questiona esse contexto sócio-político é
logo censurado, estigmatizado, difamado e, sobretudo, acusado de ser um
anti-semita.
E foi o que
aconteceu com Gianni Vattimo, filósofo e ex-deputado da esquerda no Parlamento
Europeu, que em uma entrevista condenou os sionistas pela forma bárbara com
que perseguem os palestinos desde 1948, sublinhando que “o cerco mortal que o
exército de Israel está realizando em Gaza é a repetição histórica do que
fizeram os nazistas”.
Logo, em
toda a Europa insurgiu o lobby midiático sionista para varrer Gianni Vattimo
com a infamante acusação de ser um anti-semita. Somente indivíduos ignorantes,
sectários e culturalmente pobres que nunca leram um livro desse filósofo
puderam detrair, injustamente, Vattimo. Entretanto, no dia 27 de julho, o lobby
sionista voltou a atuar contra a cantora israelense Noa, que devia realizar um
show em Milão, no Teatro Manzoni. Um cancelamento feito na última hora que, na
realidade, foi decidido em Tel-Aviv e implementado em Milão pela
“ADEI-WIZE-Mulheres Judaicas da Itália”, com o explícito motivo de censurar e
punir Noa, que – por ser uma celebridade em Israel e no mundo – havia “ousado”
ir a Ramallah para se encontrar com o presidente da ANP, Abu Mazem e depois
declarar aos repórteres: “Sim, encontrei o líder dos palestinos em Ramallah e
creio que Abu Mazen quer mesmo a paz , porém, não posso dizer o mesmo do
líder do meu país” – uma atitude que faz lembrar o “ame-o ou deixe-o” da
ditadura brasileira.
Um massacre
histórico
Obama e o
Partido Democrata sabem muito bem que as imagens dos 1.296 civis palestinos, na
maioria crianças, adolescentes e mulheres, assassinados em Gaza pelos jatos e
tanques do exército sionista, bem como os 7 mil feridos terão um peso
determinante na escolha do próximo candidato à presidência dos EUA.
Por isso,
Obama virou um presidente bicéfalo. Quando está fechado na Casa Branca,
declara que Israel tem todo o direito a se defender, repassando-lhe 1,6 bilhão
de dólares para comprar da indústria militar dos EUA jatos, navios, foguetes
e bombas de todo tipo. Depois, quando se encontra com os jornalistas, fala
como um marciano que, pela primeira vez, descobre que na terra há um conflito
em um território chamado Gaza, onde é preciso uma trégua além de abrandar as
operações para socorrer os civis.
O cinismo
de Obama, mas também de François Hollande, Angela Merkel, Nick Cameron e do
próprio presidente italiano, Giorgio Napolitano, é tão seleto, tão bem
dissimulado que muitos acreditam que os apelos para uma trégua humanitária de
8 horas sejam verdadeiros apelos para a paz.
Na realidade,
todos eles querem que o exército do governo sionista seja menos açougueiro e
mais cirurgião. Todos eles esperam que Israel consiga quebrar o Hamas, porque
esse é o último sustentáculo da luta de resistência do povo palestino.
Se o Hamas
for derrotado, com a consequente desmilitarização e monitoramento
internacional-sionista das atividades políticas na Faixa de Gaza, todo o povo
palestino ficará definitivamente desbaratado e vencido. Pois, nos últimos dez
anos, o Estado de Israel conseguiu aprisionar o povo palestino limitando a
representação política da chamada ANP (Autoridade Nacional Palestina) em territórios,
praticamente separados e fechados pelo Muro da Vergonha e por corredores
rodoviários municiados pelo exército sionista.
Acordos de
Oslo
Por outro
lado, os governos ocidentais e também os árabes ficaram calados diante da
contínua ocupação de terras palestinas para construir colônias e condomínios
judaicos – um projeto financiado por transnacionais e bancos europeus e
estadunidenses que, gradualmente, desarticulam e desintegram a única vitória
de Yasser Arafat nos Acordos de Oslo, isto é: a esperança de construir um
Estado palestino independente.
Hoje, a
esperança de poder, finalmente, realizar o projeto político “Dois Estados
para Dois Povos”, com a criação do Estado da Palestina, livre e independente,
ao lado do Estado de Israel praticamente morreu com a operação militar “Protective
Edge”, na qual prevaleceu a sistematização do massacre e a lógica do
extermínio, nos moldes do que dizia Karl Von Clausewitz “A guerra nada mais é
que a continuação da política por outros meios”.
Porém, é
preciso sublinhar que o governo sionista não foi o único responsável desse
crime histórico. Benjamin Netanyahu e Shimon Peres, hoje, são apenas os
coveiros de um processo histórico repleto de finalidades ambíguas e oportunistas,
já que os Acordos de Oslo, em 1993, foram também a solução que a Casa Branca
encontrou para engavetar as reivindicações de Arafat e permitir a Tel Aviv
controlar a primeira Intifada, que explodiu, em 1987, como um grande levante
popular do povo palestino. Levante que tinha referências políticas específicas
ditadas pelas organizações revolucionárias (Al-Fatah, FPLP, FDLP) que, por
isso, foram massivamente reprimidas pelo exército sionista.
De fato, o
aprisionamento da maior parte dos dirigentes e militantes dessas organizações
foi também uma contribuição política da burguesia palestina que, em troca,
ganhou o direito de enriquecer fazendo grandes negócios com a indústria
israelense graças aos planos de ajuda internacional para a reconstrução das cidades
da Cisjordânia.
Por
exemplo, após o assassinato, por agentes sionistas do Mossad, do então
secretário-geral da FPLP, Abu Ali Mustafá (que substituiu George Habash, um
dos fundadores da FPLP), o governo sionista exigiu, em 2002, que a polícia da
ANP prendesse em Gaza Ahmad Sa’adat, o novo secretário-geral da Frente Popular
pela Libertação da Palestina (FPLP). Ahmad Sa’adat foi preso e depois entregue
aos tribunais israelenses que o condenaram a 30 anos de isolamento, finalizando,
assim, o processo de decapitação política das organizações revolucionárias e
marxistas palestinas.
O papel do
Hamas
Se
organizações como Al-Fatah, FPLP, FDLP, CG-FLP nasceram para derrotar o Estado
de Israel, o Hamas virou opositor de Israel por efeito da conjuntura
política. De fato, o Hamas foi criado em 1987 pelos xeques Ahmed Yassim,
Mohammad Taha e Abdel Aziz al-Rantissi, que representavam a ala palestina na
Irmandade Muçulmana do Egito, oficialmente reconhecida em Israel. A Arábia
Saudita financiou o projeto dos três xeques para, inicialmente, desenvolver
uma ampla assistência social, a construção de mesquitas e uma intensa ação
comunitária na Cisjordânia e na Faixa de Gaza.
O partido
político do Hamas apareceu somente depois da primeira Intifada, para depois,
em 2006, assumir uma dimensão nacional derrotando o Al-Fatah nas eleições para
o Parlamento Palestino, para o governo da Faixa de Gaza e das cidades de
Nablus e Qalqilyah. Em 2007, os combates para expulsar o Al-Fatah de Gaza
determinaram a afirmação do braço militar do Hamas, denominado Brigadas Izz
ad-Din al-Qassam. Começava, então, para o Hamas uma nova perspectiva política
e militar, virada para o enfrentamento direto com Estado sionista e para criar
um Estado muçulmano palestino. Uma tese que, em 1988, era vagamente mencionada
na Carta de Princípios do Hamas.
Para o
governo sionista, a atividade beneficente do Hamas continua sendo a fachada
artificial de uma organização fundamentalista, voltada para mobilizar e
transformar os jovens palestinos em terroristas. Na realidade, a popularidade
do Hamas é uma consequência dos erros do grupo político majoritário do
Al-Fatah, ligado a Yasser Arafat, e da conduta corrupta da burguesia
palestina, cujo candidato à sucessão de Arafat foi o inexpressivo Abu Mazen.
Por isso,
nessas condições específicas e com o Estado de Israel que aumentava a repressão
e o latrocínio das terras, o Hamas se tornou o símbolo da resistência para a
maioria dos palestinos. Um sentimento que, inevitavelmente, concretizou-se em
pouco tempo, também, graças às ações violentas praticadas pelos colonos e,
sobretudo, pelo exército sionista nas inúmeras tentativas de subjugar e
expulsar o Hamas de Gaza.
Podemos,
portanto, dizer que em Gaza se fechou o ciclo político do Al-Fatah, a partir
do qual a luta do povo palestino assumiu uma nova dimensão, determinada por um
novo ciclo que as três vertentes políticas do Hamas decidiram assumir diante
da arrogância expansionista do Estado sionista.
Responsabilidades
da ONU
Quando em
julho de 2001, em entrevista a uma rádio, o falecido ministro do Turismo de
Israel, Rehavam Ze’evi, líder da extrema-direita sionista, manifestou-se
publicamente a favor da limpeza étnica dos palestinos, afirmando: “Nós devemos
nos livrar daqueles que não são cidadãos israelenses como quem se livra de um
câncer”, a ONU, e em particular o Conselho de Segurança, deveria ter tomado
uma drástica posição, porque aquelas declarações, proferidas publicamente por
um membro do governo israelense, na realidade, revelavam como a política da
impunidade havia transfigurado os ideais do sionismo.
No Conselho
de Segurança daqueles anos, ninguém quis entender que as palavras de Ze’evi
não eram apenas slogans de um extremista direitista. Lamentavelmente, a partir
desse período, os conceitos de limpeza étnica e de separação territorial
começaram a ganhar o coração e as mentes da maioria dos cidadãos do Estado de
Israel.
Mesmo assim
e apesar do que tinha acontecido em Beirute e no sul do Líbano, o Conselho de
Segurança nunca cautelou o povo palestino com uma resolução efetiva e capaz
de garantir com autoridade a paz e a convivência entre o povo judeu e o
palestino. Um Conselho de Segurança que, também, nunca pensou que os palestinos
tivessem direito a ter um próprio Estado, já que os interesses geoestratégicos
dos Estados Unidos, da Grã-Bretanha e da França sempre justificaram o veto
político, enquanto as poucas resoluções que saíram em favor do povo palestino,
na realidade, nunca foram implementadas.
Hoje, a
patética aparição do secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon evidencia, ainda
mais, a incapacidade estrutural das Nações Unidas de ser, efetivamente, a
entidade mundial que tem uma reconhecida autoridade política e moral apta a
se colocar acima dos interesses dos governos. Por outro lado, a continuação de
um massacre realizado por um exército considerado um dos mais fortes e bem
equipado do mundo demonstra quanto é inútil um Conselho de Segurança que é
eficaz em defender, sobretudo, os interesses geoestratégicos das grandes potências
imperiais, porém, incapaz de garantir a paz, a convivência e a segurança a
todo o mundo.
Fonte: http://www.brasildefato.com.br/