segunda-feira, 31 de agosto de 2009

10 anos de independência em Timor: “Viva a inteligência, morra a morte!”

10 anos de independência em Timor: “Viva a inteligência, morra a morte!”
30-Ago-2009
Há dez anos realizou-se a consulta popular em Timor Lorosae que conduziria o país à independência. Xanana Gusmão falou da necessidade de “perdoar”, enquanto a Amnistia Internacional denunciou há poucos dias o facto de até hoje nenhuma alta patente indonésia ter sido acusada pelos crimes em Timor-Leste. A pobreza continua a ser o maior problema do país. Mas dez anos depois, não há apenas fome: há também esperança. Um texto de Diana Andringa lembra a importância do referendo e o doloroso processo de libertação.
O primeiro-ministro de Timor-Leste, Xanana Gusmão, defendeu o perdão aos autores dos crimes cometidos até 1999, em nome das boas relações com Jacarta.

Em entrevista à agência Lusa em Díli, Xanana Gusmão explicou que a população será "mais forte" se "perdoar, chamar para o seu lado, em vez de punir" os crimes cometidos durante a presença indonésia em Timor-Leste, entre 1975 e 1999.

"Ficamos admirados, com pena, com o grau de ódio que divide comunidades, seitas, tribos em vários países do mundo, que não se perdoam, usam as armas e a violência na sua mais alta expressão, a guerra, para se destruírem", disse Xanana Gusmão.

Timor-Leste celebra no domingo os dez anos da consulta popular de 30 de Agosto de 1999, que conduziu o país à independência, último acto de uma resistência protagonizado pelo actual chefe de Governo na maior parte dos 24 anos de ocupação e que terminaram com um saldo de 183 mil mortos.

A Amnistia Internacional, num relatório, lembrou que nenhuma alta patente indonésia foi acusada pelos crimes em Timor-Leste, e que ficaram muitos crimes por julgar. A comissão formada pelos dois países para analisar os abusos cometidos durante a consulta popular terminou os trabalhos sem recomendar acusações nem indemnizações individuais.

Na quarta-feira, a Amnistia Internacional classificou de "impunidade" o tratamento dado pela justiça dos dois países aos crimes de 1999.

A 30 de Agosto de 1999 o povo timorense votou expressivamente em favor da independência. Pelo menos 1200 pessoas morreram no período entre o referendo e após os resultados, que ficaram manchados por crimes contra a humanidade e graves violações dos direitos humanos por parte das milícias pró-indonésias e do exército indonésio. As violações incluiram assassínios e desaparecimentos, violações e prisões arbitrárias, ameaças e intimidadções do povo timorense. Os abusos estão bem documentados pelas organziações de direitos humanos sobretudo no relatório de 2800 páginas intitulado “Chega!”, realizado pela Comissão para o Acolhimento, Verdade e Reconciliação (CAVR).

"Abraçamos os valores universais da Justiça mas há uma certa dificuldade de se perceber que cada terra, cada povo, tem as suas próprias formas ou modelos de resolver os seus problemas e conflitos", disse o primeiro-ministro, num sentido contrário ao relatório da Amnistia.

Xanana Gusmão afirmou que “já há resultados na política do perdão”.
"Temos milhares de estudantes na Indonésia, as melhores relações com a Indonésia, melhores talvez do que com vários países do mundo", declarou.

Há ainda o comércio, que "pende mais para a Indonésia do que para qualquer lado do mundo". "Nós, que somos um país essencialmente importador, vemos os benefícios disto: da política de perdoar, deixar para o passado o que foi do passado e construirmos todos, de uma maneira ou outra - ou eles numa forma, nós noutra - um futuro muito mais harmonioso entre os dois povos e entre os filhos desta terra", defendeu o primeiro-ministro.

"Continuo convicto de que é a melhor solução para muitos países, como o nosso", sublinhou o líder histórico da resistência timorense, capturado em 1992 e que esteve preso até 1999 na Indonésia.

Xanana Gusmão disse à Lusa simpatizar com a sugestão de uma amnistia geral, proposta pelo Presidente da República, Ramos-Horta, para os crimes cometidos antes de 1999, lembrando a responsabilidade dos timorenses nos acontecimentos que conduziram à invasão da Indonésia em 1975.

Os partidos timorenses, nascidos após a revolução portuguesa um ano antes, "em vez de aparecerem para sonhar pela liberdade, apareceram para infringir dores uns aos outros", recordou.

"Pessoalmente, não posso negar que fui membro do comité central da Fretilin e tivemos a nossa quota-parte nesse processo todo de 24 anos", reconheceu. "Somos santos e somos pecadores."

Entretanto os ministros dos Negócios Estrangeiros de Portugal, Indonésia e Timor-Leste realizaram este Domingo em Díli uma reunião tripartida, considerada histórica por ser a primeira após décadas de contencioso quanto a Timor-Leste.

De acordo com o ministro português dos Negócios Estrangeiros, Luís Amado, o encontro serviu para debater o futuro das relações entre os três países e marca uma nova fase no relacionamento de Portugal com a Indonésia.

“A Ásia tem um papel cada vez mais importante no novo sistema económico mundial e a nossa presença em Timor-Leste é fundamental para uma presença mais forte de Portugal e é nessa perspectiva que o Governo português continua a investir nas suas relações com Timor-Leste”, declarou Luís Amado no final.

Um texto de Diana Andringa lembra a importância do referendo e o doloroso processo de libertação: “ Sem esquecer uma só das terríveis imagens de 1999, uma só das terríveis histórias de 1999, essa é, para mim, a grande lição do referendo: a opção dos resistentes pela inteligência e pela vida. O terem sabido virar ao contrário o grito de Millán Astray e, sobre a violência e o sangue, terem proclamado. «Viva a inteligência, morra a morte!»

Fonte: http://www.esquerda.net/

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